LIVRO PUBLICADO

LIVRO: PASSADO, PRESENTE E FUTURO DA EDUCAÇÃO

OPEN ACCESS PEER-REVIEWED BOOK 

PASSADO, PRESENTE E FUTURO DA EDUCAÇÃO

PAST, PRESENT AND FUTURE OF EDUCATION

 2022 Editora Science / Brazil Science Publisher

SUMÁRIO

CAPÍTULO 1 Pág. 1
BIBLIOGRAFIA E REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: AS NORMAS PORTUGUESAS NP405
BIBLIOGRAPHY AND BIBLIOGRAPHIC REFERENCES: PORTUGUESE STANDARDS NP405
DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152/01
Sofia Vicente Vagarinho

CAPÍTULO 2 Pág. 12
EDUCAÇÃO, MÍDIA E DIREITOS HUMANOS: UM EQUILÍBRIO NECESSÁRIO
EDUCATION, MEDIA AND HUMAN RIGHTS: A NECESSARY EQUILIBRIUM
DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152/02
Milena Barbosa de Melo
Raymundo Juliano Rego Feitosa

CAPÍTULO 3 Pág. 25
DUAS PEÇAS POSSÍVEIS: TEATRO INFANTO-JUVENIL NA ESCOLA
TWO POSSIBLE PLAYS: THEATER CHILDREN AND YOUTH AT SCHOOL
DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152/03
Catarina de Freitas Barbosa Assis
Darcy M. da Glória
Lívia M. Araújo
Roberto Tadeu Pereira Moraes

CAPÍTULO 4 Pág. 41
APLICATIVO METAMORFOSE: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA À EDUCAÇÃO ANTIRRACISTA E TECNOLÓGICA NO CENÁRIO PANDÊMICO
METAMORFOSE APPLICATION: AN EXPERIENCE REPORT TO THE ANTIRACIST AND TECHNOLOGICAL EDUCATION AT THE PANDEMIC CONTEXT
DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.04
Paloma Borges Pietro

CAPÍTULO 5 Pág. 50
OS DESAFIOS DA PESQUISA NA AMAZÔNIA: O PPHIST/UFPA EM OBSERVAÇÃO
THE CHALLENGES OF RESEARCH IN THE AMAZON: THE PPHIST/UFPA IN OBSERVATION
DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.05
Francivaldo Alves Nunes

CAPÍTULO 6 Pág. 60
DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOCENTE E A EDUCAÇÃO AMBIENTAL
TEACHER PROFESSIONAL DEVELOPMENT AND ENVIRONMENTAL EDUCATION
DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.06
Luiz Gustavo Veríssimo e Silva

CAPÍTULO 7 Pág. 70
EDUCAÇÃO ALIMENTAR: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA COM EFEITO PRÁTICO
FOOD EDUCATION: AN EXPERIENCE REPORT WITH PRACTICAL EFFECT
DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.07
Maria Hipólito Almeida Pinheiro
Marcela de Melo Fernandes

CAPÍTULO 8 Pág.78
A INFLUÊNCIA DOS ESTUDOS DE GALILEU NA COMPANHIA DE JESUS: UMA ABORDAGEM SOBRE A COLÔNIA PORTUGUESA
THE INFLUENCE OF GALILEO'S STUDIES ON THE COMPANY OF JESUS: AN APPROACH TO THE PORTUGUESE COLONY
DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.08
João Paulo Pacheco Rodrigues.

CAPÍTULO 9 Pág.91
QUANTO VALE NOSSAS VIDAS? – UMA ABORDAGEM CTS DOS PROCESSOS DE MINERAÇÃO (EXPLORAÇÃO DA TERRA E DA FORÇA DE TRABALHO) A PARTIR DOS CRIMES AMBIENTAIS DE MARIANA E BRUMADINHO
HOW MUCH ARE OUR LIVES WORTH? – A CTS APPROACH TO MINING PROCESSES (LAND EXPLOITATION AND WORKFORCE) FROM THE ENVIRONMENTAL CRIMES OF MARIANA AND BRUMADINHO
DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.09
Maria Eduarda Tavares de Moura

CAPÍTULO 10 Pág.104
FALA TU! – O USO DO INSTAGRAM COMO ESTRATÉGIA DIDÁTICA PARA ENTENDER AS VISÕES DA CIÊNCIA-QUÍMICA E DO EU-CIENTISTA DE ESTUDANTES DO 9º ANO DO FUNDAMENTAL II E DO ENSINO MÉDIO
YOU SPEAK! – THE USE OF INSTAGRAM AS A TEACHING STRATEGY TO UNDERSTAND THE VIEWS OF SCIENCE-CHEMISTRY AND SELF-SCIENTIST OF STUDENTS IN THE 9TH YEAR OF ELEMENTARY II AND HIGH SCHOOL
DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.10
Maria Eduarda Tavares de Moura

CAPÍTULO 11 Pág.118
A LUDICIDADE COMO ESTRATÉGIA DE INCLUSÃO DE CRIANÇAS NO ESPECTRO AUTISTA NAS AULAS DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO BÁSICA: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA
PLAYFULNESS AS A STRATEGY FOR INCLUDING CHILDREN ON THE AUTISTIC SPECTRUM IN BASIC EDUCATION SCIENCE CLASSES: A SYSTEMATIC REVIEW
DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.11
Maria Eduarda Tavares de Moura

CAPÍTULO 12 Pág.130
RESPONSABILIDADE CIVIL DAS INSTITUIÇÕES PRIVADAS DE ENSINO POR ATOS DE BULLYING
CIVIL LIABILITY OF PRIVATE EDUCATIONAL INSTITUTIONS FOR BULLYING ACTS
DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.12
Sílvia Thaís Duarte de Paiva

CAPÍTULO 13 Pág.143
AVALIAÇÃO DA EFICÁCIA DE UM CURSO ONLINE PARA TREINAMENTO EM SEGURANÇA NO TRABALHO
EVALUATING THE EFFECTIVENESS OF AN ONLINE COURSE FOR OCCUPATIONAL SAFETY TRAINING
DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.13
Onildo Ribeiro de Assis II

CAPÍTULO 14 Pág.153
A MATEMÁTICA E A INTERDISCIPLINARIDADE: PERSPECTIVAS PARA A APRENDIZAGEM DOS ESTUDANTES DO ENSINO FUNDAMENTAL DE ACORDO COM DOCUMENTOS OFICIAIS DA EDUCAÇÃO
MATHEMATICS AND INTERDISCIPLINARITY: PERSPECTIVES FOR ELEMENTARY SCHOOL STUDENTS' LEARNING ACCORDING TO OFFICIAL EDUCATION DOCUMENTS
DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.14
Magno Andris Pereira Costa
Joemilia Maria Pinheiro Almeida
Manoel dos Santos Costa
Marcia Valéria Melo e Silva

CAPÍTULO 15 Pág.166
POLÍTICAS PÚBLICAS E AS COMUNIDADES QUILOMBOLAS
PUBLIC POLICIES AND QUILOMBOLAS COMMUNITIES
DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.15
Mariani Bandeira Cruz Oliveira
Luciano de Oliveira

CAPÍTULO 16 Pág.177
A RELAÇÃO ENTRE O ENSINO E A SAÚDE NA PERSPECTIVA DA INTERDISCIPLINARIDADE
THE RELATIONSHIP BETWEEN EDUCATION AND HEALTH FROM THE PERSPECTIVE OF INTERDISPLINARITY
DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.16
Rosa Cruz Macêdo
Maria Francimar Teles de Souza
Edina Nicolau Marques
Francilda Alcântara Mendes
Heloiza Jhennifer de Souza Santos
Flaviane Teles de Souza

CAPÍTULO 17 Pág.188
APRENDIZAGEM ESCOLAR NO PÓS-PANDEMIA
SCHOOL LEARNING IN THE POST-PANDEMIC
DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.17
Lídia Cavalcanti da Silva
Marina Tavares Souza dos Santos
Flávio Borges do Nascimento
Kelly Yuki Komori

CAPÍTULO 18 Pág.208
METODOLOGIAS ATIVAS NO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM EM NUTRIÇÃO BÁSICA PARA ALUNOS DO ENSINO FUNDAMENTAL
ACTIVE METHODOLOGIES IN THE TEACHING-LEARNING PROCESS IN BASIC NUTRITION FOR ELEMENTARY SCHOOL STUDENTS
DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.18
Karina Midori Endo
Akemi Teramoto de Camargo

CAPÍTULO 19 Pág.224
DOCÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR EM SAÚDE E USO DE TECNOLOGIAS DIGITAIS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO
TEACHING IN HIGHER EDUCATION IN HEALTH AND USE OF DIGITAL INFORMATION AND COMMUNICATION TECHNOLOGIES
DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.19
Iara Guimarães Rodrigues
Sueli Heloisa Doriguetto Ferreira
Gabriel Mendes dos Santos

CAPÍTULO 20 Pág.235
PUBLIQUE COM A SCIENCE EM FLUXO CONTÍNUO
PUBLISH WITH SCIENCE IN CONTINUOUS FLOW
DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.20
AUTORES
AUTORES

SOBRE OS ORGANIZADORES DO LIVRO DADOS CNPQ: Pág.237

 

PREFÁCIO À 1ª EDIÇÃO

Será que é fácil pensar no passado, presente e futuro da educação para quem é educador? A resposta é não! Quando falamos de educação, temos um vasto campo, por vezes complexo, que intermeia outras áreas. As mudanças ocorridas não acompanham a evolução industrial intensa, muito menos a tecnologia.

Basta analisar as salas de aula. Elas, em sua maioria, continuam as mesmas de quando seus avós estudaram. As carteiras ficam umas atrás das outras, dividida por fileiras. Os professores ficam a frente da sala, local onde também está a lousa, algumas ainda verdes para escrita com giz e outras brancas.

Aí você diz: Mas não temos tecnologia? Sim temos! Contudo, não aquela semelhante à da empresa na qual você trabalha. A tecnologia educacional, caminha a passos lentos por diversos fatores: falta de verba, formação inadequada dos professores para utilização, falta de estrutura etc.

Desta forma, a má notícia é que o passado e o presente da educação são muito similares. A boa notícia é que vemos professores engajados, que promovem mudanças significativas todos os dias. Por mais moroso que pareça, a educação mudou consideravelmente nos últimos anos do ponto de vista metodológico e sob a perspectiva da inclusão e apoio a diversidade.

A escola do futuro, portanto, será cada acolhedora onde os alunos protagonistas e os professores mediadores, realizarão atividades contextualizadas e focadas no desenvolvimento integral.

O que se deve levar para o futuro é a ideia de que precisamos formar cidadãos conscientes de seus direitos e deveres, propiciando um ambiente pacífico, agradável e lúdico em que os atores se sintam responsáveis uns pelos outros.

Criando assim um ecossistema gerador de boas ideias para a vida em sociedade.

Prof.ª Dr.ª Michele Aparecida Cerqueira Rodrigues

Boa leitura.

Os Organizadores

HOW CITE THIS BOOK:

NLM Citation

Santos ILVL, Rodrigues MAC, Silva CRC, editor. Passado, presente e futuro da educação. 1st ed. Campina Grande (PB): Editora Science; 2022.

APA Citation

Santos, I. L. V. L.; Rodrigues, M. A. C. & Silva, C. R. C. (Eds.). (2022). Passado, Presente e Futuro da Educação (1st ed.). Editora Science.

ABNT Brazilian Citation NBR 6023:2018

SANTOS, I. L. V. L.; RODRIGUES, M. A. C.; SILVA, C. R. C. Passado, presente e futuro da educação. 1. ed. Campina Grande: Editora Science, 2022.

 

Prof. Dr. Igor Luiz Vieira de Lima Santos

Pós-Dra. Michele Aparecida Cerqueira Rodrigues

Pós-Dra. Carliane Rebeca Coelho da Silva

 

ISBN:

978-65-00-45815-2

DOI CROSSREF:

https://doi.org/10.56001/22.9786500458152

CAPÍTULOS PUBLICADOS

CAPÍTULO 1

BIBLIOGRAFIA E REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: AS NORMAS PORTUGUESAS NP405

BIBLIOGRAPHY AND BIBLIOGRAPHIC REFERENCES: PORTUGUESE STANDARDS NP405

 

DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.01

Submetido em: 01/02/2022

Revisado em: 10/05/2022

Publicado em: 23/05/2022

 

Sofia Vicente Vagarinho

St. Peter’s International School

https://orcid.org/0000-0001-8037-0674
 

 

 

Resumo

O trabalho apresentado pretende dar a conhecer o resultado e análise de uma pesquisa efetuada em diversos repositórios científicos sobre as normas portuguesas NP405. Em concreto, existem 4 tipos de normas designadas por NP405-1, NP405-2, NP405-3 e NP405-4 que podem ser utilizadas por investigadores, professores, alunos ou outros interessados na construção dos seus trabalhos. O estudo descritivo permitiu concluir que as NP405 abrangem um vasto conjunto de documentos, de diferentes tipos e estão prontas a ser utilizadas, no entanto, a pouca divulgação e a falta de uma ferramenta automática de integração com os editores de texto atuais (como o Microsoft Word) condiciona o seu sucesso. Uma possível solução é divulgar e exigir trabalhos com base nas normas, principalmente nos organismos públicos e a todos os estudantes, bem como criar um script e disponibilizá-lo a qualquer pessoa, para que seja facilmente importado nos editores de texto, tal como acontece com as normas ABNT.

Palavras-chave: Normas portuguesas, NP-405, bibliografia, referências bibliográficas.

Abstract

The presented work intends to convey the results and analysis of a research carried out in several scientific repositories on the Portuguese NP405 standards. Specifically, there are 4 types of citation styles designated by NP405-1, NP405-2, NP405-3 and NP405-4 that can be used by researchers, teachers, students or others interested in the construction of their works. The descriptive study allowed to conclude that the NP405 cover a wide range of documents, of different types and are ready to be used, however, the little dissemination and the lack of an automatic tool for integration with current text editors (such as Microsoft Word) conditions your success. A possible solution is to disseminate and demand work based on standards, mainly from public bodies and all students, as well as create a script and make it available to anyone, so that it is easily imported into text editors, as with ABNT standards.

Keywords: Portuguese standards, NP-405, bibliography, bibliographic references.

 

 

 

Introdução

A literatura utilizada para desenvolver um trabalho de pesquisa é uma das componentes essenciais para a sua evidência e credibilidade, essa literatura, quando é mencionada ao longo do texto, isto é, na construção do trabalho e tem o nome de bibliografia ou citação (Castilla, 2009, pp. 3-4). Ao terminar o texto, surge, no final do trabalho, em forma de lista um conjunto de dados, pertencentes à bibliografia utilizada, esses dados possuem o nome de referência bibliográfica (Chávez, 2019, p. 52).

Para tornar a bibliografia e as referências bibliográficas consistentes e fáceis de ler nos diversos documentos, existem normas, também conhecidas por regras, que são adotadas por diversas entidades, indicam o estilo de citação, obedecem com rigor a um formato e dependem do local onde se pretende publicar (entidade), por exemplo, livros e revistas (Castilla, 2009, pp. 2-3).

De entre os vários tipos de normas para referências bibliográficas, encontram-se, por exemplo, a NP 405 (Norma Portuguesa), a ABNT (Norma Brasileira) e a APA (American Psychological Association) (Barbosa, Haanstra, Ibraimo, Laita, & Talaquichande, 2017, p. 5). Para este trabalho, é relevante realçar e analisar as normas NP 405, as quais são conjugadas com a norma internacional ISO 960 (Instituto Politécnico de Leiria, 2013, p. 3).

Ao longo da construção deste trabalho, constatou-se que as NP405, são adotadas para criação de documentos internos em várias instituições publicas ou solicitadas aos estudantes para trabalhos académicos por algumas instituições de ensino portuguesas, como por exemplo as Universidades de Aveiro, Coimbra, Leiria, entre outras. Mas não é só no ensino superior que as NP405 são utilizadas, começa-se a assistir, em Portugal, que alguns estabelecimentos do ensino secundário exigem aos seus alunos a utilização das NP 405 nos seus trabalhos, como é o caso da Escola secundária de Arganil[1], Escola Secundária Dr. Joaquim de Carvalho[2] e da Escola Secundária de Caneças[3].

No entanto, o conhecimento dos alunos portugueses sobre a NP405 e a sua divulgação, permanece longe do desejável, isto é, a adoção da NP405 para todos os documentos criados pelas instituições pertencentes ao governo Português como ministérios, universidades, escolas, entre outros), o que pressionaria as instituições privadas a fazer o mesmo. Uma simples procura no google académico, é uma evidência concreta, da fraca quantidade de documentos científicos a divulgar a NP405.

Assim, este trabalho, pretende dar a conhecer as normas NP405 a todos os interessados, isto é, não só aos estudantes portugueses, mas também a todos aqueles que pretendem publicar os seus trabalhos científicos em revistas portuguesas que exijam esta norma na bibliografia. Por outro lado, esta pesquisa pode permitir uma reflexão em torno das normas e abrir um caminho ao debate, o qual pode originar numa melhoria das mesmas.

Metodologia

            O trabalho foi elaborado com recurso à revisão da bibliografia com o objetivo de descrever as normas NP405. A seleção da documentação para a elaboração desta pesquisa foi realizada tendo em conta os seguintes critérios: a) diferentes repositórios para garantir diversidade, b) os repositórios devem ter qualidade e rigor, c) serem relevantes para a pesquisa.

Norma Portuguesa NP 405

As NP 405, são normas portuguesas que abrangem a área da informação e documentação e dividem as referências bibliográficas em quatro tipos de documento, a NP 405-1, NP 405-2, NP 405-3 e a NP 405-4 (Instituto Politécnico de Leiria, 2013, p. 3).

Qualquer tipo de norma mencionada anteriormente possui um conjunto de elementos a incluir nas referências bibliográficas, as quais são classificados de Essenciais (E), Recomendáveis (R) e, Facultativos (F) (Cerveira, 2002, p. 112). Estes elementos variam dependente do tipo de documento. Os elementos Essenciais são aqueles que são indispensáveis à identificação do documento. Os elementos Recomendáveis fornecem uma clareza adicional à identificação de documento, pelo que deverão ser incluídos quando disponíveis. Já os elementos Facultativos são opcionais, isto é, não estão diretamente ligados à identificação do documento, mas fornecem informação útil (Marcos, 2015, pp. 6-7).

  • NP405-1

A NP 405-1 diz respeito a documentos impressos, onde estão compreendidas as monografias, artigos, atas de congresso, publicações em série, teses, documentos legislativos, resumos, relatórios científicos e técnicos, documentos religiosos, normas, patentes, documentos judiciais e música impressa (IPQ, 1994, p. 5).

  • NP405-2

            A NP405-2, estabelece o padrão de referências bibliográficas para matérias não-livro, ou seja, gravuras, postais, registos de vídeo ou som, multimédia, filmes, microformas, objetos (como brinquedos), projeções visuais (como dispositivos ou transparências), cartazes, cartões estereográficos, entre outros (Universidade de Aveiro, 2015, p. 2).

            A informação é obtida através de etiquetas coladas, invólucros, capas ou materiais textuais acompanhantes (Universidade Aberta, 2019, pp. 2-3).

  • NP405-3

            Estabelece as regras de referências bibliográficas para documentos não publicados, como por exemplo, cartas, música manuscrita, materiais cartográficos, manuscritos, circulares, monografias e publicações em série não publicadas comercialmente (Universidade de Aveiro, 2015, p. 2) (IPQ, 2000, p. 5).

  • NP405-4

            Estabelece o modelo de referências bibliográficas para documentos eletrónicos, como por exemplo, monografias, bases de dados, programas de computador, livros eletrónicos, revistas eletrónicas, artigos de revista, listas de discussão e mensagens eletrónicas (Universidade de Aveiro, 2010, p. 2) (IPQ, 2002, p. 6).

            O tipo de suporte, elemento essencial da referência bibliográfica, deve ser indicado entre parêntesis retos, após o título e utilizando palavras como: [CD-ROM], [Disco], [Disquete], [DVD], [Em linha]. Quando o documento é de acesso remoto então deve ser utilizado [Em linha], se o documento é de acesso local então deve ser utilizado palavras como [CD-ROM], [Disco], [Disquete], [DVD] (Marcos, 2016, p. 35).

  • Regras e exemplos de aplicação

            Em seguida são apresentadas as regras com exemplos de aplicação:

  1. Citações ao longo do texto (Universidade de Aveiro, 2015, pp. 4-6):
  • Regra base

            Apelido do autor, ano de publicação do documento, os números das páginas citadas (se necessário). A informação é colocada entre parênteses curvos.

Exemplo:

            1 autor → Vicente (2014, pp. 15–19) OU (Vicente, 2014, pp. 15–19)

            2 ou mais autores → (Vicente et al., 2019) OU Vicente et al. (2019).

 

  • Citações do mesmo autor e do mesmo ano

            Neste caso, deve ser acrescentada a seguir ao ano de publicação uma letra do abecedário por ordem sequencial, ou seja, (Apelido do autor, Ano de publicaçãoa) e posteriormente (Apelido do autor, Ano de publicaçãob)

Exemplo:

            A primeira citação deve ser (Vicente, 2016a)

A segunda citação deve ser (Vicente, 2016b)

 

  • Citação da citação (obras não consultadas)

            São chamadas de referência a fontes secundárias ou citação de citação. Este caso acontece quando durante a leitura de um documento (fonte primária) é referenciado informação relevante de outros autores, isto é, outros documentos (fontes secundárias) mas que por qualquer razão não é possível a consulta dos mesmos, ou seja, (apud APELIDO, Nome do autor da fonte primária – Título do documento da fonte primária, páginas).

Exemplo:

            (apud VICENTE, S. – Aprendizagem de escrita criativa, p. 13).

 

  1. Referências bibliográficas

            As orientações gerais são constituídas por (Universidade de Aveiro, 2010, pp. 4-7):

  • Número de autores

Regra:

            1 autor → APELIDO, Nome do autor

            2 a 3 autores → APELIDO, Nome do autor; APELIDO, Nome do autor; APELIDO, Nome                                do autor

            Mais de 3 autores → APELIDO, Nome do autor [et al.]

Exemplo:

            1 autor → VAGARINHO, Sofia Vicente – Novidades na literatura: componentes e constituição. Lisboa: Universidade de Aveiro, 2020. Dissertação de mestrado.

            2 a 3 autores → LINLEY, P. A.; HARRINGTON, S.; GARCEA, N. – Oxford handbook of positive psychology and work. Oxford: Oxford University Press, 2010. ISBN 9780195335446.

            Mais de 3 autores → BURTON, Nancy W. [et al.] – Toward a definition of verbal reasoning in higher education: research report. Princeton, NJ, USA: Educational Testing Service, 2009 (Relatório n.ETS RR-09-33).

 

  1. Referências bibliográficas por tipo de documento (Instituto Politécnico de Leiria, 2013):
  • Livros impressos (monografias impressas) – NP405-1

            AUTOR(ES) ‐ Título: complemento de título.  Edição. Local de publicação: Editora, ano de publicação. Número de páginas. (Nome da coleção). ISBN.

  1. Obra com editores, organizadores, coordenadores, compiladores:

            APELIDO DO EDITOR, Nome(s), ed. lit. – Título: complemento de título. Edição. Local: Editora, Ano. N.º de páginas. (Nome da coleção). ISBN.

  1. Artigos, capítulos, etc. em livros (contribuições em monografias)

            APELIDO DO AUTOR DA PARTE OU DO CAPÍTULO, Nome(s) – Título da parte ou do capítulo; autor secundário se houver. In APELIDO DO AUTOR DO LIVRO, Nome(s) do autor – Título do livro: complemento de título. Edição. Local: Editora, Ano. ISBN. Páginas da parte ou capítulo.

  1. Livro publicado por associação ou instituição

            NOME DA INSTITUIÇÃO – Título do livro: complemento de título. Edição. Local de publicação: Editora, Ano de publicação. Número de páginas. (Nome da coleção). ISBN.

 

  • Relatórios científicos ou técnicos

            APELIDO, Nome(s) – Título do relatório: complemento de título. Local: Editora, Ano. N.º de páginas. (Nome da coleção, n.º ou volume).

 

  • Livros eletrónicos ou E-books (NP405-4)

            APELIDO, Nome(s) – Título: complemento de título [Em linha]. Edição. Local: Editora, Ano, Data de atualização ou revisão. [Consult. Data de consulta]. Disponível em WWW: . ISBN.

 

  • Artigos em publicações periódicas
  1. Artigo em jornal impresso (NP405-1)

            APELIDO, Nome(s) ‐ Título: complemento. Revista. ISSN. vol. Volume, n.º Número. (data publicação), p. Páginas.

  1. Artigo em revista científica eletrónico (NP-405-4)

            APELIDO, Nome(s) ‐ Título: complemento. Título da revista [Em linha]. Vol. Volume, n.º Número (ano), p. Páginas. [Consult. Data de consulta]. Disponível em WWW: <URL>. ISSN.

  1. Partes / capítulos ou volumes de livro impresso (NP405-1)

Regra:

            APELIDO, Nome(s) – Título da parte ou do volume: complemento de título. Título do livro In. Local de publicação: Editor, Ano de publicação. ISBN. Localização no livro Pt., Vol., p. .

Exemplo:

 

  • Teses, Dissertações e outras provas académicas

            APELIDO, Nome(s) – Título do trabalho: complemento de título. Local: Editora, Ano. N.º de páginas. Notas suplementares.

 

  • Conferências, congressos ou simpósios
  1. Comunicação em Congresso

            APELIDO, Nome(s) – Título da comunicação: complemento de título. Edição. Local: Editora, Ano. N.º de páginas. (Nome da coleção; n.º). Notas suplementares. ISBN.

  1. Ata de Congresso, Simpósio ou Seminário (obra completa)

            NOME DO CONGRESSO, SIMPÓSIO OU SEMINÁRIO, dia, local, ano – Título do Congresso, Simpósio ou Seminário: complemento de título. Local: Editora, Ano.

  1. Artigo num livro de atas de Congresso (Proceedings)

            APELIDO, Nome(s) – Título: complemento de título. In NOME DO CONGRESSO, SIMPÓSIO OU SEMINÁRIO, dia, local, ano – Título do Congresso, Simpósio ou Seminário: complemento de título. Local: Editora, Ano. Número das páginas.

 

 

 

  • Obras de referência (Dicionários e enciclopédias)

            Segue a mesma ordem das referências dos livros (monografias) mencionados anteriormente.

 

  • Legislação

            Segue a mesma ordem das referências dos livros e revistas mencionados anteriormente.

 

  • Audiovisuais (multimédia, filmes registos de vídeo, som, cartazes)

Regra geral:

            APELIDO, Nome(s) – Título do audiovisual [Designação do tipo de material]: complemento de título. Autor secundário. Edição. Local de publicação: Editora, Ano de publicação. Designação da quantidade ou extensão do material: indicações de cor ou físicas; Dimensões + Material acompanhante. (Nome da coleção). Notas adicionais. Nº normalizado.

  1. Filme ou documentário de vídeo (NP405-2)

Regra:

            APELIDO, Nome(s) ‐ Título [Registo vídeo]. Realização de. a ed. Edição. Local de publicação: Editor, Ano de publicação. Designação específica e extensão do material.

Exemplo:

 

  • Internet
  1. Documento da Internet (NP405-4)

            APELIDO, Nome(s) – Título: complemento de título [em linha]. Edição. Local: Ano do documento, Data de atualização ou revisão. [Consult. Data de consulta]. Disponível em WWW: <URL:http://www….>Patentes

  1. Endereços web de organizações (NP405-4)

            NOME DO RESPONSÁVEL PELO SITE – Título do site: complemento de título [Em linha]. Local do site: Nome do autor do site, Data de atualização do site. [Consult. Data de consulta]. Disponível em WWW:<URL:http://www….>.

 

  • Patentes

            ENTIDADE RESPONSÁVEL – Título da patente: complemento de título. APELIDO DO AUTOR, Nome(s). País. Designação do tipo de documento, n.º do documento. Data de publicação. Número de páginas. Código de classificação.

 

  • Normas

            Sigla e nº da Norma. Ano, Área – Título da norma: complemento de título. Local: Editora. N.º de páginas.

Conclusão

            As normas portuguesas NP405, elaboradas pelo Instituto Português da Qualidade, pretendem ser um modelo de referência unificada para bibliografia e referências bibliográficas em Portugal. Determinam um conjunto de diretrizes, simples, claras e bem estruturadas para uma grande diversidade de documentos. Este trabalho dá a conhecer as quatro partes da norma NP405 e as suas regras de aplicação.

            O sucesso da norma, está agora dependente, da sua adoção por todas as instituições portuguesas, sejam elas, publicas ou provadas. As instituições de ensino parecem querer dar o primeiro passo de forma alargada, solicitando aos seus estudantes trabalhos académicos sobre diversos temas, mas com utilização destas normas como um dos requisitos.

            No entanto, não é facilitado a sua utilização no editor de texto Microsoft Word, ou seja, enquanto a norma APA vem instalada por defeito no Microsoft Word e para a norma ABNT é encontrado facilmente locais de downnload de um ficheiro, para que os utilizadores possam importá-lo para o Microsoft Word, na norma Portuguesa isso não acontece e a pouca literatura que esclarece o utilizador sobre a forma de utilizar automaticamente e na prática a NP405, encaminha para a ferramenta Mendeley como meio de utilização e que, posteriormente, pode ser ligada ao Microsoft Word para que se possa tirar partido desta funcionalidade. Parece ser uma forma complexa e desencorajadora para utilizar frequentemente a NP405. Fica aqui um desafio aos investigadores para criarem um script que possa ser importado para o Microsoft Word e que permita um automatismo semelhante ao das outras normas referidas anteriormente.

Bibliografia

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[2] http://esjcff.pt/biblioteca/docs/citacoes_np405.pdf

[3] http://aecanecas.com/images/guiao_elaboracao_trabalhos_2017.pdf

CAPÍTULO 2

EDUCAÇÃO, MÍDIA E DIREITOS HUMANOS: UM EQUILÍBRIO NECESSÁRIO

EDUCATION, MEDIA AND HUMAN RIGHTS: A NECESSARY EQUILIBRIUM

 

DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.02

Submetido em: 15/03/2022

Revisado em: 05/05/2022

Publicado em: 23/05/2022

 

Milena Barbosa de Melo

Universidade Estadual da Paraíba, Centro de Ciências Jurídicas, Campina Grande-PB

http://lattes.cnpq.br/9493866434906962

Raymundo Juliano Rego Feitosa

Universidade Estadual da Paraíba, Centro de Ciências Jurídicas, Campina Grande-PB

http://lattes.cnpq.br/0418144922098686

 

 

Resumo

O processo educacional vem, com o passar dos tempos, apresentando uma dinâmica bastante diferenciada no que se refere ao processo de construção do conhecimento. a mundialização das informações proporcionada pelo uso das tecnologias da informação e, mais especificamente, pelas mídias sociais interfere o processo de construção do conhecimento. Para que seja possível cumprir os objetivos apresentados na pesquisa será necessário se utilizar de um método dedutivo, visto que a utilização ampla do conteúdo será utilizada. não há possibilidade de se pensar Direitos Humanos de maneira restrita, ou seja, sem conexão com outras áreas científicas, pois a estrutura que pode ser observada em qualquer ciência invoca, permanentemente, o respeito aos Direitos Humanos.

Palavras-Chave: Educação, Mídias sociai e Direitos Humanos.

Abstract

The educational process has, over time, presented a very different dynamic with regard to the process of knowledge construction. the globalization of information provided by the use of information technologies and, more specifically, by social media interferes with the process of knowledge construction. In order to fulfill the objectives presented in the research, it will be necessary to use a deductive method, since the broad use of the content will be used. there is no possibility of thinking about Human Rights in a restricted way, that is, without connection with other scientific areas, since the structure that can be observed in any science permanently invokes respect for Human Rights.

Keywords: Education, Social Media, Human Rights Law.

 

 

Introdução

O processo educacional vem, com o passar dos tempos, apresentando uma dinâmica bastante diferenciada no que se refere ao processo de construção do conhecimento, visto que o uso das tecnologias da informação e, em especial, das mídias sociais despontam como instrumentos que influenciam, de maneira bastante asseverada, a maneira como a educação se apresenta.

Atualmente, não se imagina mais um sistema educacional fechado em si próprio, no sentido de desejar a purificação de uma educação voltada para conceitos sem interferência externa.

A questão é que a mundialização das informações proporcionada pelo uso das tecnologias da informação e, mais especificamente, pelas mídias sociais interfere o processo de construção do conhecimento. Entretanto, não se pode deixar de evidenciar que, muitas vezes, essa comunicação com o mundo midiático não é utilizada de maneira adequada e, por vezes, se torna possível identificar uma constante violação de interesses coletivos e individuais que, enfim, se observa a violação dos Direitos Humanos.

Os Direitos Humanos, em virtude de sua capacidade multidisciplinar, revestem-se de uma condição essencial de proteção ao indivíduo e, por isso, em as condições que o sistema educacional apresenta, os Direitos Humanos devem ser incluídos nos discursos acadêmicos como forma de fomentar a construção da cultura de paz na sociedade.

Nesse sentido, surge a seguinte problemática: É possível equilibrar os interesses entre direitos humanos, educação e mídia?

 Como forma de responder ao presente questionamento, o presente texto terá como objetivo geral analisar se é possível um equilíbrio estrutural entre o funcionamento dos Direitos Humanos, Educação e mídia e, como forma de auxiliar o cumprimento deste objetivo será necessário especificar a relação entre mídia, direitos humanos e responsabilidade social e analisar a possibilidade de se aplicar o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos através do uso da mídia.

Metodologia

Diante do que se observa, para que seja possível cumprir os objetivos apresentados acima será necessário se utilizar de um método dedutivo, visto que a utilização ampla do conteúdo será utilizada. No que se refere ao processo de construção de informações, a metodologia será a qualitativa de cunho bibliográfico, pois analisar-se-á o exame dos dados coletados por órgãos nacionais e internacionais, de maneira a valorar o quadro apresentado e as possibilidades factíveis de equilibrar educação, direitos humanos e o uso das mídias sociais. Deste modo, a pesquisa que se encaminha tem como fundamento as doutrinas, base de dados e os documentos das entidades que compõem o MEC e demais associações vinculadas ao tema.

A mídia como instrumento de acentuação dos valores discriminatórios

Para que seja possível compreender a utilização da mídia como instrumento essencial de favorecimento da Educação em Direitos Humanos, torna-se essencial observar que o tema apresenta duas perspectivas quais sejam, uma internacional que estabelece diretrizes essenciais para que os países possam aplicar em suas estruturas internas e, outra, nacional, que é justamente a consequência do compromisso assumido no âmbito internacional.

No que se refere ao funcionamento da mídia, o ordenamento jurídico brasileiro, mais especificamente no artigo 5º, IX da CF estabelece que:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:      IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”. (BRASIL, 1988).

 

À primeira vista, o citado dispositivo normativo no que se refere à liberdade de expressão indica a compreensão de outros direitos essenciais, como é o caso da liberdade de informação, opinião e manifestação. Ainda sobre o mesmo dispositivo, observa-se uma ligação estreita com documentos jurídicos internacionais, como é o caso da Convenção Europeia de Direitos Humanos que, em seu artigo 10º, estabelece o seguinte:

 “toda a pessoa tem direito à liberdade de expressão. Esse direito compreende a liberdade de opinião e a liberdade de receber ou de comunicar informações ou ideias, sem que possa haver a ingerência da autoridade pública e sem consideração de fronteiras. O presente artigo não impede os Estados de submeterem as empresas de radiodifusão, cinema ou televisão a um regime de autorização”. (CEDH, 1950).

Sendo assim, diante do que se observa no âmbito nacional e internacional, a liberdade de expressão e de informação são direitos formalmente reconhecidos e que, portanto, devem ser respeitados. E, dessa maneira, o indivíduo que desejar divulgar informações deve ser respeitado, mesmo que seja através do uso midiático e independente de ter o caráter formativo ou opinativo. É neste contexto da materialização da liberdade de expressão que Ferreira (sd, p.01) apresenta a mídia como um instrumento essencial para o exercício deste direito.

“a mídia é o elemento que concretiza esse processo mediando a interação entre as partes. Pode ser a escrita, mas também o papel em que foi fixada; pode ser a notícia publicada, mas também o jornal que a divulga; a canção ou o disco em que está gravada. Por analogia, pode ser o serviço de alto-falantes da comunidade ou o conjunto dos veículos de comunicação de massa de uma nação’. (FERREIRA, sd, p.01).

Portanto, de acordo com Melo (2022 p.10) a mídia é capaz de construir uma ligação estreita em toda a sociedade, pois possibilita a disseminação de todos os tipos de informação.

“observa-se que a mídia faz parte de um processo de meios de comunicação capaz de formatar uma estrutura relacional entre os povos, sendo revestida, portanto, de variadas formas de conteúdos, como é o caso da mídia eletrônica, impressa, entretenimento, jornalismo ou por fim, através da prestação de serviços. Enfim, o sistema midiático é utilizado pela população como forma de disseminação da informação, da aquisição do conhecimento, da percepção da cultura etc. O resultado é apenas um: democratização da sociedade através do exercício dos direitos fundamentais da liberdade expressão”. (MELO, 2022, p.10).

 

Diante do que se observa e ainda com fundamento no apresentado pelo Melo (2022 p.11), a mídia passa a ser utilizada de maneira intensa, fortalecendo inclusive o viés de indispensabilidade do sistema midiático.

“É justamente a partir deste aspecto que a mídia tem sido utilizada de maneira intensa para a realizada de debates políticos e, ainda ideológicos. E, com o advento das tecnologias da informação, a utilização da internet se massificou ao ponto de se tornar bem essencial para qualquer setor da sociedade seja político, educacional, empresarial ou social”. (MELO, 2022, p.11).

 

Entretanto, convém destacar que, muito a embora, a ideia principal da mídia seja a de informação e formação social, não se pode deixar de lado o seu uso inadequado e, por isso, atualmente o uso da mídia acaba se apresentando como uma dupla função nomeadamente, contributiva para formação da sociedade e a de desestruturação de aspectos políticos e sociais da mesma sociedade.

“A partir do uso da mídia, o que se percebe, contudo, é que ela pode ser considerada com uma dupla capacidade funcional, ou seja, pode tanto auxiliar a sociedade no processo de democratização, como também no processo endurecimento na percepção do coletivo e, com isso, favorecer a cultura que desagrega os povos, já que incute a valorização de condutas que violem os Direitos Humanos, como é o caso da intolerância religiosa, discriminação de gênero, classe social, condição política etc. Sendo assim, o que se percebe, portanto, é que a mídia possui tanto a capacidade de educar através de informações de qualidade, como também a condição de descontruir valores morais e éticos que eram, reconhecidamente, aceitos e praticados. (MELO, 2022, p.12).

 

Diante do que está sendo apresentado, muito embora a legislação brasileira oriente o uso adequado dos serviços midiáticos, o sistema vem se apresentando como instrumento que fomenta um antagonismo formal, visto que pode, ao mesmo tempo, consolidar ou fragilizar os Direitos Humanos.

A realidade brasileira, no que se refere ao uso das mídias sociais para a desinformação, é bastante preocupante, pois prejudica não apenas o acesso à informação, mas essencialmente a democracia, visto que a divulgação de informações inadequadas é realizada.

O gráfico abaixo apresenta dados fornecidos pela Polícia Federal sobre denúncias de violação de Direitos Humanos realizadas entre os anos de 2016 e 2019.

 

 

 

 

 

 

 

 

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Fonte: Autora (2022)

Os dados apresentados no gráfico acima indicam períodos com maior ocorrência de casos, como é o período eleitoral no ano de 2018, onde é possível perceber um aumento dos casos de ofensa e exposição íntima. E, no ano seguinte, os dados sobre a mesma situação, acabam por diminuir quase que pela metade.

Deixando o período eleitoreiro de lado, não se pode deixar de perceber o crescimento ao longo dos anos, de casos relacionados com a violação de Direitos Humanos através do uso da mídia. Entretanto, não se pode deixar de mencionar que, ofensas e divulgação de informações falsas sempre ocorreram, mas percebe-se que o uso das mídias acaba por potencializar tais práticas. Nesse sentido, Melo (2022, p.13) destaca a necessidade de estabelecer uma medida eficaz de solidificação dos Direitos Humanos na sociedade.

“A questão passa, essencialmente, pela compreensão dos valores morais e éticos arraigados na percepção dos Direitos Humanos e como são incorporados no sistema social. Nesse sentido, observa-se a necessidade patente de se realizar uma estrutura específica que se destina ao processo de incorporação dos Direitos Humanos”. (MELO, 2022, p.73).

 

E, parece ser interessante, que a relação equilibrada entre mídia e Direitos Humanos mesmo sendo algo delicado, deva ser assumida pelo ordenamento jurídico e, para que seja possível sua efetivação, um único obstáculo deve ser enfrentado: a desinformação social. 

“A questão da mídia frente aos Direitos Humanos, apesar de essencial, torna-se bastante delicada, pois enfrenta a desinformação social. E, por ser um campo relativamente novo, atravessa alguns desafios para sua consolidação no que se refere ao processo de formação não apenas dos professores, mas de toda a sociedade sobre o que seria, em si, os Direitos Humanos”. (MELO, 2022, p.73).

 

Nesse sentido, como instrumento que se destina ao processo de facilitação de comunicação entre os indivíduos que compõem a sociedade, a mídia pode se transformar como um grande vilão do sistema social, pois acaba por potencializar, a depender do estado de espírito e dos valores morais e éticos da sociedade, os efeitos desta comunicação.

“A mídia em geral, e em particular a imprensa, gosta de investir no senso comum para manter a audiência e assegurar a manutenção do status quo, poucas vezes se preocupando em buscar novo enfoque diante de situação recorrente, mesmo quando os fatos apontam em outra direção e a conjuntura sugere a necessidade de se buscar nova abordagem. Muitos estereótipos e preconceitos arraigados na sociedade são decorrência dessa perseverança de atuar em sintonia com o senso comum, como ocorre com os movimentos sociais e, particularmente, os de defesa dos Direitos Humanos, sempre associados à defesa “de bandidos” quando atuam em prol de vítimas de maus tratos ou arbitrariedades das autoridades policiais ou judiciárias”. (FERREIRA, sd p.6).

 

E, para combater a desinformação social, o caminho viável para que seja possível consolidar uma prática ética e valorativa da democracia é através da educação. Entretanto, existe um padrão de comportamento que deve ser modificado no que se refere às mídias sociais, pois é bem comum observar a exposição desnecessária do indivíduo em muitas ocasiões, como é o caso da sensualidade exacerbada da mulher.

“Uma das violências mais sutis a que estão expostas as mulheres é a violência imposta pela mídia, uma violência naturalizada. A violência de ver seu corpo fragmentado como seios e nádegas para vender cerveja e carro; a violência de ver a dupla jornada de trabalho naturalizada pelas propagandas e novelas; a violência de ser desumanizada e vista apenas como um corpo a ser consumido; a violência de ver os crimes de violência doméstica e feminicídio atenuados pelo jornalismo; de ser excluída dos espaços de decisão e dos processos de criação na mídia; de ser futilizada dia após dia por meio da generalização.” (CHAVES, 2015, p.03).

 

            A referida questão enfrenta um antagonismo clássico, visto que existe um enfrentamento de direitos fundamentais quais sejam, a liberdade de expressão e dignidade do indivíduo. Sendo essencial, portanto, que a sociedade modifique a sua percepção sobre temas que desconstruam a dignidade humana.  Portanto, sabendo da grande influência que a mídia apresenta no cenário social, a produção de informações realizada pela mídia deve favorecer a formação integral do indivíduo, no sentido de que ele seja capaz de compreender com exatidão não apenas o que a lei estabelece, mas essencialmente o que favorece uma sociedade democrática, justa e solidária.

“Responsabilidade pressupõe condições morais para assumir um compromisso e, nesse caso, um compromisso social, com todos os cidadãos, um compromisso firme, transversal e reafirmado cotidianamente com a sociedade, representada pelas relações mais próximas, como os funcionários, fornecedores e parceiros, mas também com cada cidadão. Nas estruturas organizacionais das empresas de mídia não vejo saída a não ser criar ou empoderar áreas destinadas a refletir e a guiar a todos nos princípios da responsabilidade social, como uma ação indutora mesmo”. (PEREZ, 2020, sp).

Portanto, compreende-se como viável a inserção das questões midiáticas no cenário da educação, desde os anos iniciais, visto que, a partir desta conjugação de fatores, será possível que o indivíduo conseguirá não apenas utilizar a mídia adequadamente, mas especialmente, conseguirá interpretar as informações que o sistema midiático apresentará.

No sentido de solidificação da democracia e cidadania, o sistema educacional voltado para mídia deve trabalhar a partir de um sistema de base, ou seja, ensinado desde as séries iniciais, pois a compreensão deste tipo de linguagem irá facilitar a inserção do indivíduo na sociedade e, ainda, irá favorecer a construção de uma sociedade cidadã. (MELO, 2022 p.74).

Partindo desse pressuposto, o sistema de ensino desde os anos iniciais deve fomentar práticas que favoreçam a percepção do que é Direitos Humanos e como ela se encaixa no âmbito da mídia e sociedade.

Cumpre ressaltar ainda que utilizar-se da mídia para fomentar os valores essenciais dos Direitos Humanos é de extrema importância e, a sua utilização, encontra fundamento jurídico tanto nas Diretrizes Nacionais para a Educação em Direitos Humanos (2012) como nas Diretrizes Gerais de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais/REUNI, respectivamente.

Art. 6º – A Educação em Direitos Humanos, de modo transversal, deverá ser considerada na construção dos Projetos Político-Pedagógicos (PPP); dos Regimentos Escolares; dos Planos de Desenvolvimento Institucionais (PDI); dos Programas Pedagógicos de Curso (PPC) das Instituições de Educação Superior; dos materiais didáticos e pedagógicos; do modelo de ensino, pesquisa e extensão; de gestão, bem como dos diferentes processos de avaliação. (BRASIL, 2012).

 

Compreende-se, portanto, que a partir do momento em que se insere no sistema educacional, elementos próprios de percepção dos Direitos Humanos, existe uma probabilidade real de a população conseguir compreender o peso de seus atos através da mídia e, consequentemente, da responsabilidade social que o assunto sugere.

“Busca-se a excelência acadêmica e a pertinência científica estejam associadas à responsabilidade social da instituição universitária, atenta às carências da sociedade brasileira, à superação das desigualdades regionais e aos desafios do desenvolvimento local, regional e nacional. (BRASIL, 2007)

 

Ainda sobre o fundamento de que é possível trabalhar educação, direitos humanos e mídia nas instituições de ensino, convém destacar que SDH (Secretaria de Direitos Humanos) da presidência da república estabelece quais são as diretrizes essenciais para se implementar os Direitos Humanos nas Instituições de Ensino.

“As instituições de ensino, desde escolas básicas até as de ensino superior, devem direcionar seus projetos pedagógicos para os direitos humanos, preocupando-se não só com os conteúdos voltados para o letramento, mas também com a formação do caráter e da personalidade das pessoas. A Educação em Direitos Humanos (EDH) enquanto uma proposta de política pública foi fomentada no cenário nacional com a instituição do Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos – CNEDH e posteriormente com a elaboração e publicação do Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos – PNEDH em 2003, em resposta a uma exigência da ONU no âmbito da Década das Nações Unidas para a Educação em Direitos Humanos (1995–2004). Esse plano é um instrumento orientador e fomentador de ações educativas no âmbito da Educação em Direitos Humanos com o propósito de nortear a formação de sujeitos de direitos, voltados para os reais compromissos sociais.” (SECRETARIA DE DIREITOS HUMANOS DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, 2013, p.11).

 

Entretanto, o grande desafio, neste momento, é conseguir estabelecer um sistema educacional que seja comprometido, definitivamente, com a sociedade. Vejamos, por exemplo, o caso da prática intencional de agressões, realizadas tanto fisicamente como verbalmente, por um grupo de pessoas ou apenas uma única pessoa contra determinada pessoa outro grupo de pessoas. Esta prática também é mundialmente conhecida como bullying e durante muito tempo, sua prática era categorizada como padrão normal de comportamento de crianças, não levando em consideração os efeitos psicológicos e físicos que as agressões podem causar na estrutura da vítima.

            Diante do que se observa, o sistema de ensino (básico e superior) devem envidar esforços no sentido de apresentar propostas capazes de orientar a comunidade acadêmica na construção de uma cultura de paz, que se baseia, essencialmente, na aceitação das mais diversas diferenças (podendo ser tanto física, como econômica, social, gênero, política etc.) com o objetivo de favorecer a construção de um ambiente social fraterno e justo. (MELO, 2022, p.122)

            E, para que isso ocorra, as instituições de ensino devem trabalhar dentro dos próprios conteúdos apresentados em sala de aula, a conscientização sobre as questões que motivam o Bullying. Inclusive, deixando claro, a seriedade do problema e que a prática se refere a uma conduta ilegal, visto que existe previsão normativa sobre a questão. Ademais, as instituições de ensino devem construir um todo harmônico através dos alunos, para que eles sejam capazes de perceber as necessidades e limites do colega através do uso da empatia. (MELO, 2022, p.123)

            Por isso, para que seja possível aplicar as técnicas destinadas a minimizar o problema, as instituições devem capacitar não apenas os professores, mas todo o corpo de funcionários da Instituição de Ensino para que sejam capazes de identificar os casos de agressão e a partir de então, consigam direcionar adequadamente a questão com ações de suporte emocional com a vítima e, de reflexão, com a agressão. (MELO, 2018, p.270)

Assim, a educação em Direitos Humanos é entendida obrigatoriamente como um instrumento necessário para que se consiga construir uma sociedade inclusiva e harmônica e, como consequência, se tornar um sistema capaz de gerar outros direitos. A questão é que a educação em Direitos Humanos se torna, demasiadamente importante, quando se percebe que a compreensão de Direitos Humanos pode modificar o funcionamento de toda uma sociedade e, portanto, transformar os excluídos em incluídos.

O que deve ser destacado, nesta perspectiva, é que o indivíduo deve ser estruturado para se viver em sociedade a partir de um padrão eminentemente de aceitação das diferenças que são observadas entre os indivíduos. O propósito central desta educação tendo por base à diversidade, nos remete a analisar um processo de aceitação de uma multirracialidade no âmbito educacional que, estará intimamente relacionada com a desigualdade social. (MELO, 2018, p.273)

Mídia e educação em Direitos Humanos

Como instrumentos que favoreçam a construção e solidificação do conhecimento é possível identificar a mídia, pois através de seu uso existe a possibilidade real de formação de opinião e, consequentemente, de reflexão sobre a informação absorvida. Dessa maneira, mesmo sabendo que a mídia é bastante utilizada como ferramenta de desconstrução dos Direitos Humanos, torna-se essencial evidenciar que o seu uso pode revestir-se de uma característica agregadora, conforme destaca a Comissão de Direito da ONU (2015 p.16):

A educação em direitos humanos requer estreita cooperação e parcerias dentro e entre as agências governamentais, as instituições nacionais de direitos humanos e a sociedade civil. Isso pode ser reforçado por um conjunto de ações que visem a relacionar as partes interessadas na educação em direitos humanos, tais como: campanhas de conscientização, reuniões locais e nacionais, “comunidades de práticas”, boletins informativos, sites e outras plataformas eletrônicas, como grupos de discussão online, e também por meio do intercâmbio profissional, de apoio ao compartilhamento de conhecimento, lições aprendidas e boas práticas. Podem ser constituídos grupos profissionais e criados jornais e revistas, a fim de promover intercâmbios científicos regulares. (CDH-ONU, 2015 p.16)”

 

Sendo assim, baseado na necessidade de se construir uma cultura de paz a partir do uso de instrumentos midiáticos, o Brasil deve, não apenas indicar, mas essencial aplicar as medidas que são essenciais para o favorecimento da educação dos direitos humanos através do uso da mídia que, de acordo com Melo (2022, p.100) são:

  1. Proporcionar às agências de publicidade mecanismos no processo de produção de publicidade que venha favorecer os Direitos Humanos através de incentivos fiscais, veiculação gratuita das peças de propaganda e premiação das melhores campanhas;
  2. Estabelecer parcerias entre as associações e empresas na área de mídia para que se favoreça a construção dos direitos humanos;
  3. Produzir materiais gráficos que se destinem à disseminação de informações voltadas para os Direitos Humanos, como é o caso do ECA e legislações sociais;
  4. Disseminar as informações brasileiras sobre políticas públicas voltadas para a Educação em Direitos Humanos;
  5. Estruturar campanhas que se destinam à proteção dos Direitos Humanos para que se facilite a divulgação das informações sobre a violação de Direitos Humanos e, ainda, se propicie a dinâmica de denúncias pela sociedade civil;
  6. Estruturar programas que se destinam à formação de profissionais da educação;
  7. Estruturar a criação de observatórios que se destinem ao cumprimento dos Direitos Humanos;
  8. Organizar pesquisas que se destinam à proteção dos Direitos Humanos;

Fomentar a realização de pesquisas em Direitos Humanos em Instituições de Ensino Superior, organizações não governamentais e organizações políticas;

  1. Incentivar a produção de material midiático que se destinam à consolidação dos Direitos Humanos.

 

Dessa maneira, mesmo havendo um conjunto de instrumentos importantes para a construção e solidificação dos Direitos Humanos, não se pode deixar de clamar por uma conduta ética de todos os meios de comunicação do país no que se refere à construção desta harmonização essencial entre os instrumentos.

Este equilíbrio é de substancial importância, pois não se pode pensar os Direitos Humanos de uma maneira limitada, ou seja, sem a conexão adequada com a educação e todos os instrumentos interdisciplinares que promova uma cultura de paz e consequentemente, a solidificação da democracia, pois do contrário, o cenário será de um sistema que não favorece o respeito à dignidade humana, violando, portanto, o evidenciado nas Convenções Internacionais sobre Direitos Humanos.

­­Considerações Finais

A mídia faz parte de um processo de meios de comunicação capaz de formatar uma estrutura relacional entre os povos, sendo revestida, portanto, de variadas formas de conteúdos, como é o caso da mídia eletrônica, impressa, entretenimento, jornalismo ou por fim, através da prestação de serviços.

A questão da mídia frente aos Direitos Humanos, apesar de essencial, torna-se bastante delicada, pois enfrenta a desinformação social. E, por ser um campo relativamente novo, atravessa alguns desafios para sua consolidação no que se refere ao processo de formação não apenas dos professores, mas de toda a sociedade sobre o que seria, em si, os Direitos Humanos.

Dessa maneira, a formação de cidadãos, atributo da escola, passa hoje obrigatoriamente pela habilitação do cidadão para ler os meios de comunicação, sabendo desvelar os implícitos que a edição esconde; sendo capaz de diferenciar, entre os valores dos produtores dos meios, aqueles que estão mais de acordo com a identidade de sua nação.

O sistema de ensino (básico e superior) e, ainda não-formal, devem envidar esforços no sentido de apresentar propostas capazes de orientar a comunidade acadêmica na construção de uma cultura de paz, que se baseia, essencialmente, na aceitação das mais diversas diferenças (podendo ser tanto física, como econômica, social, gênero, política etc) com o objetivo de favorecer a construção de uma ambiente social fraterno e justo.

A educação em Direitos Humanos se torna, demasiadamente importante, quando se percebe que a compreensão de Direitos Humanos pode modificar o funcionamento de toda uma sociedade e, portanto, transformar os excluídos em incluídos.

Referências

AG-ONU. Assembleia Geral das Nações Unidas. Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. 1966. Disponível em: chrome-extension://ohfgljdgelakfkefopgklcohadegdpjf/http://www.unfpa.org.br/Arquivos/pacto_internacional.pdf. Acesso em 21 de outubro de 2020.

ANF. Direitos Humanos para todos. 2018. Disponível em: https://www.anf.org.br/direitos-humanos-para-todos/. Acesso em 21 de outubro de 2020.

BRASIL. Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos. Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos: 2007. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2007. 76 p.

BRASIL. Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos: 2007. Ministério dos Direitos Humanos. Brasília: 2018.

BRASIL. Resolução nº 1, de 30 de maio de 2012. Disponível em: http://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/sem_pedagogica/fev_2016/anexo1_1dia_sp2016.pdf. Acesso em 02 de novembro de 2020.

BRASIL. Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Educação em Direitos Humanos: Diretrizes Nacionais – Brasília: Coordenação Geral de Educação em SDH/PR, Direitos Humanos, Secretaria Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos, 2013.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 1988.

CEDH. Convenção Europeia de Direitos Humanos. 1950. Disponível em: chrome-extension://ohfgljdgelakfkefopgklcohadegdpjf/https://www.echr.coe.int/documents/convention_por.pdf. Acesso em 19 de outubro de 2020.

CHAVES, Fabiana Nogueira. A mídia, a naturalização do machismo e a necessidade da educação em direitos humanos para comunicadores. In: Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação

XIV Congresso de Ciências da Comunicação na Região Norte – Manaus – AM – 28 a 30/05/2015. Disponível em: chrome-extension://ohfgljdgelakfkefopgklcohadegdpjf/https://www.portalintercom.org.br/anais/norte2015/resumos/R44-0606-1.pdf. Acesso em 21 de outubro de 2020.

CDH-ONU. “Plan of Action for the third phase (2015-2019) of the World Programme for Human Rights Education”. 2015. Disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000232922. Acesso em 21 de outubro der 2020.

FERREIRA, Carmélio Reynaldo. Mídia e Direitos Humanos. Sem data. Disponível em: chrome-extension://ohfgljdgelakfkefopgklcohadegdpjf/http://www.cchla.ufpb.br/redhbrasil/wp-content/uploads/2014/04/M%C3%8DDIA-E-DIREITOS-HUMANOS.pdf. Acesso em 20 de outubro de 2020.

PEREZ, Clotide. Em uma empresa de mídia tudo é responsabilidade social. 2020. Disponível em: https://jornal.usp.br/artigos/em-uma-empresa-de-midia-tudo-e-responsabilidade-social/. Acesso em 21 de outubro de 2020.

CAPÍTULO 3

DUAS PEÇAS POSSÍVEIS: TEATRO INFANTO-JUVENIL NA ESCOLA

TWO POSSIBLE PLAYS: THEATER CHILDREN AND YOUTH AT SCHOOL

 

DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.03

Submetido em: 15/03/2022

Revisado em: 10/05/2022

Publicado em: 23/05/2022

 

Catarina de Freitas Barbosa Assis

Especialista em Educação, Pobreza e Desigualdade Social pela Universidade Federal da Bahia/ Bacharela em Biblioteconomia e Documentação pela Universidade Federal da Bahia/ Bacharela em Arquivologia pela Universidade Federal da Bahia. Idealizadora, fundadora e gestora do Instituto Educar – Espaço de Leitura, Mediação e Formação de Leitor

http://lattes.cnpq.br/3696259187557155

Darcy M. da Glória

Pós-Graduada em Psicopedagogia na Teoria Analítica-Jung Faculdade Olga Mettig. Pedagoga pela Faculdade Olga Mettig.

Lívia M. Araújo

Especialista em Novas Tecnologias da Educação pela Universidade Católica de Salvador. Pedagoga pela Universidade Católica de Salvador.

Roberto Tadeu Pereira Moraes

Bacharel em Ciências Contábeis pela Universidade do Estado da Bahia. Licenciado em Química. Licenciado em Matemática. Técnico em Química pela Escola Técnica Federal da Bahia.

http://lattes.cnpq.br/5663280302755190
 

 

 

 

Resumo

São apresentadas duas peças de teatro para encenação por grupos amadores, tais como escolas ou centros comunitários. Enfatiza a função de divertir e não de ensinar que as duas peças tentam exercer, pois não usam a função moralista e didática comuns a alguns textos de teatro, e sugere que outros meios podem e devem ser usados para transmissão desses conceitos.

Palavras-chave: Teatro infanto-juvenil. Teatro amador. Peça de teatro. Teatro na escola.

Abstract

Two plays are presented for staging by amateur groups, such as schools or community centres. It emphasizes the function of entertaining and not teaching that the three plays try to exercise, as they do not use the moralistic and didactic function common to some theater texts, and suggests that other means can and should be used to transmit these concepts.

Keywords: Children’s Theater. amateur theater. Play. Theater at school.

 

 

 

Introdução

Esse trabalho apresenta duas peças teatrais infanto-juvenis que podem ser encenadas em escolas, igrejas, centros comunitários ou bibliotecas públicas.

Os textos foram distribuídos de tal forma que não há protagonismo entre os personagens. Ninguém fala mais do que ninguém. O objetivo disso, além de preservar a igualdade entre as pessoas evitando o estrelismo, é facilitar a memorização das falas, já que as intervenções são curtas e familiares, como também nos preocupamos em dividir cada uma das peças em cenas curtas para facilitar os ensaios.

Assim, as cenas podem ser ensaiadas separadamente e, à medida em que forem sendo mentalizadas pelos atores podem, enfim, ser gradativamente colocadas em ordem cronológica. Isso também permite ensaios paralelos e em locais diversos.

Os textos são leves e totalmente compatíveis com a idade e a capacidade de atuação de adolescentes. Não há saltos, performances cinematográficas ou personagens psicológicos.

A Função do Teatro Infanto-Juvenil 

A proposta é divertir, não educar. Pode parecer que se perde agora a chance de ensinar valores como ética, religião, política, cidadania ou ciências. Ensinar o conteúdo disciplinar, atualmente, não é a única função da escola (MIRANDA et al., 2009). Achamos que há ferramentas outras que podem fazer isso – inclusive teatro. Mas também perderíamos a chance de tornar o mundo mais alegre e divertido. Não que não se possa extrair ensinamentos dessas três peças, pois o teatro é uma forma de arte que engloba várias outras, como a literatura, a música e as artes plásticas (LOPES, 2005), mas essa não é a proposta, como se perceberá pela leitura dos seus textos. A proposta é ensinar teatro, cuidando para evitar que essa atividade se transforme, equivocadamente, em instrumento de pressão e de inibição (MIRANDA et al., 2009).

Quanto ao resultado final… o objetivo era encenar a peça! Nas comunidades para as quais foram escritas essas três peças não há atores profissionais. São alunos, fieis e operários no palco e na plateia. Enfim, pessoas comuns. Risos, fuga de texto e interrupções de cena são comuns e esperados. Claro que esse amadorismo não justifica a falta de empenho, e “atores” não dedicados devem ser identificados e substituídos. De qualquer forma, “o mais importante não é o resultado, mas sim o processo de construção do espetáculo, mesmo que esse seja apenas uma ‘brincadeira’ de sala de aula (MIRANDA et al., 2009).

Conclusão

É possível sim, com textos leves e sem pretensões de substituir ou mesmo apoiar diretamente a educação formal, usar o teatro escolar como instrumento de inserção e desenvolvimento do adolescente. Haverá sim, progressos, pois “ seja no aspecto pedagógico ou no aspecto artístico, assistindo ou encenando, o teatro auxilia a criança no seu crescimento cultural e na sua formação como indivíduo” (ARCOVERDE, 2012).

Por uma questão de brio, a imersão nos trabalhos se dará com mais profundidade a partir da segunda encenação, pois o sentimento de que “poderia fazer melhor” irá florescer nesses jovens. A inibição cederá pelo estímulo mútuo. Teatro não é lugar para desanimados nem desanimadores. E como disse REVERBEL (1989), “ nosso objetivo na escola não é ter o aluno-autor, o aluno-pintor ou o aluno-compositor, mas sim dar as oportunidades a cada um de descobrir o mundo, a si próprio e a importância da arte na vida humana”.

Claro que existem pessoas que naturalmente servem para atuar, outras para apoiar na confecção de cenários e vestuário, ou no coro, ou apenas como figurantes. Outras serão plateia, inclusive para a crítica, mas não se contentarão para sempre lá. Um grupo de teatro é ativo e não deve pertencer a ninguém. Do jeito que o teatro escolar é leve e divertido – sem ser irresponsável – todos se prontificarão a ajudar, a participar de algum modo, e esse é o objetivo, de que todos participem se divertindo e se desenvolvendo. 

Referências

COELHO, P. O teatro na educação. Rio de Janeiro: Ed. Forence – universitária, 1978.

LOMARDO, F. O que é teatro infantil. São Paulo: Brasiliense, 1994.

LOPES, T. Lights, art, Science – action! História, ciências, saúde – Manguinhos. Rio de Janeiro: Fundação Osvaldo Cruz, v. 13, out. 2006.

MAGALDI, S. Iniciação ao teatro. 3º ed. São Paulo: Ed. Ática, 1986.

MIRANDA, J. L. et ali. Teatro e a escola: funções, importância e práticas. Rev. CEPPG, a. 11, nº. 20, p. 172-181. Catalão: CESUC, 2009.

REVERBEL, O. Um caminho do teatro na escola. Belo Horizonte: Scipione, 1989.

 

PRIMEIRA PEÇA:

NEM SANDÁLIAS NEM SAPATOS

 

TEATRO EM SEIS CENAS

(a divisão em cenas visa apenas facilitar os ensaios)

 

ATORES: Homem Maduro ( Pai )

                   Mulher Mais Jovem ( Mãe )

                   Rapaz Ou Moça ( Filho )

                   Homem Ou Mulher ( Colega )

 

VESTUÁRIO:  Os atores vestem-se com muita simplicidade. Pai usa sandálias tipo “havaianas“, um pé, ou tira, de cada cor. Nos calcanhares das sandálias, papel branco circular, colado nos dois lados, simulando furo pelo desgaste.

 

OBJETOS DE CENA: Capacetes de operários (2), um no chão, no centro do palco. O outro faz parte do vestuário da personagem “COLEGA“. Dois maços de estopa. Os atores, ao sair de cena, sentam-se.

 

Originalmente há referência a uma festa (dia dos pais), que pode ser mudada para natal, aniversário etc.

 

CENA UM

 

Pai entra pela direita. Mãe entra pela esquerda. Encontram-se no meio do palco e abraçam-se carinhosamente, mas sem sensualidade.

 

MÃE – A cabeça já está quase toda branca…

 

PAI – Também, 45 anos… Você é que continua tão bonita quanto no primeiro dia. Não mudou nada.

 

MÃE – Não mudei nada mesmo: continuo te amando do mesmo jeito.

 

FILHO ENTRA PELA ESQUERDA

 

FILHO – Mais de vinte anos de casados e ainda namorando?

 

PAI – Graças a Deus!

 

MÃE – Namorando, não. Namoro é gostar. Quando vira amor, vira casamento.

 

FILHO – Sua bênção, pai; sua bênção, mãe.

 

PAI E MÃE, EM UNÍSSONO – Deus te abençoe.

 

CENA DOIS

 

FILHO – Ninguém vai perguntar por que eu cheguei mais tarde hoje?

 

MÃE – Um pouco mais tarde… Meia, uma hora… Bate-papo com colegas, trânsito engarrafado…isso não é motivo para preocupação.

 

PAI – E qual foi o motivo mesmo?

 

FILHO – Vão premiar os melhores alunos… E eu estou na lista.

 

PAI – Filhão!

 

MÃE – Parabéns, filho! Puxou ao pai.

 

FILHO – Puxei aos dois. A senhora também é muito inteligente.

MÃE – Se eu fosse inteligente não trabalhava em casa de família.

 

PAI – Meu bem, profissão depende também de oportunidade. Sem inteligência se anda pouco; sem oportunidade aí é que não se sai do lugar.

 

MÃE – Colégio público dando prêmio?

 

FILHO – Coisa simples: par de tênis, coleção de livros. E vão premiar também por bom comportamento.

 

MÃE – Por um lado ou por outro, você já está com o seu na mão.

 

FILHO – A diretora da escola disse a mesma coisa. Deus ajude. Olha, com licença, vou tomar banho.

 

FILHO SAI DE CENA PELA ESQUERDA

 

CENA TRÊS

 

MÃE – Querido, vou comprar o pão. E hoje você vai dormir cedo; amanhã é domingo, mas tem hora-extra. Nada de conversar até tarde.

 

PAI – Ainda bem! Hora-extra é bom, mesmo sendo dia-dos-pais.

 

MÃE – Esse trabalho te deixa quebrado, não é?

 

PAI – Lá é puxado, mas com a saúde que Deus me deu, não. Fico cansado como qualquer trabalhador.

 

MÃE – Seus irmãos vão se reunir na casa de José, amanhã.

 

PAI – Já sei. Mas é só parabéns, porque tá todo mundo sem dinheiro como sempre.

 

MÃE – É, mas deixe eu ir. Dez pães por um real, só láááá em baixo.

 

PAI – Economiza aí, meu bem.

 

MÃE ( SAINDO PELA ESQUERDA ) – A Margarina tá … No finzinho.

 

CENA QUATRO

 

PAI REFLETE. AJOELHA-SE, BALBUCIA UMA ORAÇÃO. DIZ AMÉM.

 

PAI – Meu Deus, muda minha vida financeira. Chega! Dá um basta nisso! Não agüento mais. Não tenho nem um sapato! Até para o trabalho eu vou com essas sandálias furadas (mostra as sandálias para o alto, virado para a platéia), cada uma de uma cor. Chega, meu Deus! Cadê o Senhor que não responde? Cadê os anjos tocando trombetas?  Cadê sua voz grossa de velho, dizendo: “seu filho vai ganhar um tênis; a patroa de sua esposa vai dar a ela um sapato usado, mas em perfeito estado; no dia dos pais vai amanhecer um enorme pacote debaixo de sua cama com um par de sapatos dentro”. Cadê?

 

MÃE ENTRA PELA ESQUERDA COM APENAS UM PASSO

 

MÃE – Meu bem, já botei o café.

 

FILHO ENTRA PELA ESQUERDA COM APENAS UM PASSO

 

FILHO – Papai…

 

PAI – Não quero nada, não! Vou dormir!

 

PAI SAI PELA DIREITA. MÃE E FILHO DÃO UM PASSO PARA TRÁS, SAINDO DE CENA. PEQUENA PAUSA. PAI ENTRA EM CENA PELA DIREITA, ESPRIGUIÇANDO-SE COMO QUEM ACABA DE ACORDAR

 

PAI – Noite péssima. Dormi, mas não descansei.

 

MÃE ENTRA PELA ESQUERDA, TAMBÉM ESPREGUIÇANDO-SE.

 

MÃE – Bom dia! Foi a chuvinha que deu quando amanheceu. Faz a gente querer ficar na cama.

 

PAI – Nem vi…

 

MÃE – Viu, sim. Você estava acordado, eu também. Você estava chorando…

 

PAI – Chorei mesmo! Deus não fala comigo. Trabalho tanto! Não tenho nem um sapato. E vou encher o pé de lama no caminho.

 

PAI APANHA O CAPACETE NO CHÃO E O COLOCA NA CABEÇA

 

PAI – Vou trabalhar…

 

PAI SAI PELA DIREITA

 

MÃE – Tome o café… Deu pra comprar a margarina…

 

MÃE SAI PELA DIREITA BENZENDO-SE ORANDO

 

CENA CINCO

 

PAI ENTRA PELA DIREITA COM CAPACETE NA CABEÇA E LIMPANDO AS MÃOS COM ESTOPA

 

PAI – Bom dia para todos! A paz do senhor esteja nesse nosso trabalho!

 

ENTRA COLEGA PELA ESQUERDA, USANDO CAPACETE E LIMPANDO AS MÃOS COM ESTOPA.

 

COLEGA – Bom dia, também! Você é católico, que seja! Se orgulha disso e sempre dá graças a Deus. Mas hoje tá diferente, tá mais entusiasmado…

 

PAI – Deus falou comigo. Aliás, Ele sempre fala, eu é que não escuto.

 

COLEGA – Tá, tá. Não diga que você ganhou um par de sapatos pelo dia dos pais.

 

PAI – Não! Como você pode ver, ainda estou usando as sandálias furadas. Venho andando pro trabalho pra economizar o vale-transporte… enchi os pés de lama.

 

COLEGA – E isso é motivo de alegria? Boa vida Deus está te dando.

 

PAI – Você não entende, mas vai entender. Eu chorei quando vi que não ia ganhar o sapato de presente.

 

COLEGA – Você pediu um sapato e Deus não te respondeu. É pra chorar mesmo.

 

PAI – Respondeu, sim. Eu é que chorei antes de ouvir a resposta.

 

COLEGA – E qual foi a resposta? Ele mandou chover e fazer lama pra aumentar seu sofrimento?

 

PAI – Eu estava sem sapatos, mas ali na esquina eu quase esbarrei… Num homem sentado no chão…Num homem que não tinha… Os pés!

 

COLEGA – Sem os pés? Sem os pés? Que sofrimento o dele, hein? Talvez maior do que o seu!

PAI – Eu chorei porque não tinha sapatos, mas me conformei ao ver um homem que não tinha os pés.

 

COLEGA – Que lição você me deu hoje! Deus realmente falou com você, e está te dando uma vida boa! Você fazendo questão de uma coisa mínima, sapatos, mesmo já tendo uma coisa grandiosa, os pés. Aliás, várias coisas grandiosas.

 

CENA SEIS

 

FILHO (ENTRANDO PELA ESQUERDA)- Você tem uma esposa que te ama, tem uma família solidária e unida.

 

MÃE (ENTRANDO PELA DIREITA)- Tem um filho esforçado, que vive longe das drogas e do crime.

 

COLEGA – Tem uma família cristã. Basta olhar em volta e refletir.

 

PAI – Da próxima vez que eu me ajoelhar, vou agradecer mais do que pedir. E rezar por quem não tem pés.

 

MÃE – Isso! Você estava atribulado pelas dificuldades da vida terrena…

 

FILHO – … E não percebeu que Deus já lhe deu tudo, e então…

PAI (PARA A PLATÉIA) -… Chorei porque não tinha sapatos, mas me conformei ao ver um homem que não tinha pés !

 

TODOS (EM UNÍSSONO, PARA A PLATÉIA)- Não devemos chorar porque não temos sapatos, e sim agradecer porque temos pés!

 

F I M

A EXPRESSÃO “CHOREI PORQUE NÃO TINHA SAPATOS, MAS ME CONFORMEI AO VER UM HOMEM QUE NÃO TINHA PÉS” É UM VELHO DITADO ORIENTAL.

FIM

SEGUNDA PEÇA:

PRIMEIRO MILAGRE DE JESUS

 

 Teatro amador em dez cenas

(A divisão em cenas visa facilitar os ensaios)

 

Personagens

   Femininas (3):

   Maria

   Suzana

   Noiva

   Masculinas (4):

   Jesus

   Noivo

   Tiago discípulo

   Amigo do noivo

 

Vestimentas  

Os personagens se vestem com lençóis como túnicas ou usam vestidos com cintos, brancos ou cinza. Calçam sandálias. Os noivos usam tiaras de flores.

 

Objetos de cena

Pandeiros

Bongôs (latas com tampas de plástico, não de metal)

Chocalhos

Flautas

Ramos de palmeiras

Tiaras de flores plásticas

Jarras com água (3)

Jarra grande transparente e vazia (1)

Mesa simples de cozinha

Cadeiras (3)

Refresco em pó sabor uva (2). As personagens Tiago e Noiva deverão impregnar seus dedos médios direitos úmidos com o pó. A personagem Noivo deverá impregnar apenas a ponta do seu dedo médio direito.

 

CENA UM

Procissão de chegada dos noivos

 

Todos os personagens entram juntos no palco em procissão a partir da plateia. Cantam e dançam em volta dos noivos. Tocam flauta, pandeiro, chocalho e bongô. Dão voltas em torno dos noivos. Os personagens e os espectadores que estão nas cadeiras do corredor recebem ramos de palmeiras e os agitam durante a passagem da procissão.

 

TODOS, MENOS OS NOIVOS, CANTANDO:

O Senhor é o pastor que me conduz; Felicidade e todo bem hão de seguir-me.

 

CENA DOIS

Posicionamento no palco

 

Todos os personagens espalham-se no palco. Os noivos sentam ao fundo ao lado do Amigo do noivo. Conversam. Jesus e Tiago ficam do lado esquerdo. Maria e Suzana vão ao centro, em primeiro plano.

CENA TRÊS

Noiva agradece a ajuda das mulheres

 

SUZANA – Oh, Maria, acho que valeu a pena. A festa está muito bonita. Veja como estão todos felizes.

MARIA – Bonita mesmo! Apesar deles serem bem pobrezinhos, com a ajuda dos parentes e amigos conseguimos os bolos, as bebidas e a arrumação.

SUZANA – Fizemos uma festa com tudo, dentro dos recursos.

Noiva se aproxima de Maria e Suzana

NOIVA – Ave, Maria! Ave, Suzana! Obrigada a vocês por terem reunido esse grupo de mulheres para ajudar a preparar a festa. Sei que sozinha não iria conseguir. É muito caro e muito trabalho.

SUZANA – Comunidade é pra isso mesmo: ajudar uns aos outros.

MARIA – Quando dividimos o trabalho ficou mais fácil, um pouquinho pra cada.

SUZANA – Isabel não sabe cozinhar, então ficou descascando verduras.

NOIVA – Soube que foi Ana quem lavou as panelas.

MARIA – Foi, foi…

SUZANA – Cada uma ajudou como pode.

NOIVA – Estou esperando Miriã chegar para agradecer: foi ela quem arrumou meus cabelos. Agora me deem licença que vou na cozinha ver como estão as coisas.

Noiva sai para junto das vasilhas e Maria e Suzana vão para a lateral direita

 

CENA QUATRO

Jesus fala de José

 

Jesus e Tiago vão para o centro do palco

TIAGO – E o velho José? Já se acostumou com a sua ausência?

JESUS – Aceitou, mas ainda não se acostumou, pois só tem 3 dias que deixei a carpintaria. Ele sabe que nasci para ser rabino, e não carpinteiro.

TIAGO – Quando eu e os outros deixamos a pescaria para te seguir já sabíamos disso.

JESUS – Veja! Estão chegando outros companheiros. Vamos recebê-los!

Jesus e Tiago voltam para o lado esquerdo

 

CENA CINCO

Noiva percebe a falta de vinho

 

Noiva se aproxima de Noivo, se inclina e cochicham. Levantam e vão para o centro. Chamam Maria.

NOIVO – Ave, Maria! Precisamos de sua ajuda. O vinho acabou!

MARIA – Mas fizemos tudo certo para isso não acontecer…

NOIVO – Veio mais gente que o esperado. O que vamos fazer? Nos ajude!

MARIA – Vou falar com Jesus.

Noivo e Noiva se afastam e vão para junto de Suzana. Maria fica sozinha no centro

 

CENA SEIS

Maria pede ajuda a Jesus

 

MARIA – Jesus, meu filho, acuda essa família!

Jesus se aproxima

JESUS – O que foi, minha mãe?

MARIA – Eles não têm mais vinho.

JESUS – Minha mãe, ainda não chegou a minha hora de fazer milagres. Mas, o que existe entre nós? O amor entre mãe e filho, não é?

MARIA – Então, meu filho, eu te peço: socorra essa gente!

JESUS – Vou atender seu pedido.

 

CENA SETE

Jesus faz o milagre

 

Jesus volta para junto de Tiago. Maria permanece no centro do palco e chama Noivo e Noiva. Eles se aproximam

MARIA – Façam tudo o que ele mandar!

Jesus e Tiago vão para o centro

JESUS – Tragam vasilhas com água.

Tiago traz a mesa com a vasilha transparente e vazia em cima. Noivo e Noiva trazem  as vasilhas com água a despejam na vasilha em cima da mesa. Colocam as vasilhas esvaziadas no chão. Suzana se aproxima

JESUS – Agitem a água com as mãos.

Noivo agita a água, que fica apenas rósea. Decepção geral

JESUS – Vocês não vão conseguir sozinhos! Vocês precisam ser solidários!

TIAGO – É, precisamos ajudar uns aos outros. Mestre, o que devemos fazer?

JESUS – Os três juntos, agitem a água com as mãos.

Tiago, Noiva e Noivo agitam a água juntos, que dessa vez fica cor de vinho

NOIVO – Milagre, a água virou vinho!

SUZANA – Milagre!

Espanto e alegria geral. Noiva e Tiago retiram mãos da água e Noivo agita a água como se estivesse lavando o rosto

TIAGO – A água virou vinho!

TODOS, ALTERNADAMENTE – Glória a Deus nas alturas! Paz na terra aos homens por ele amados! Hosana! Um profeta entre nós!

 

CENA OITO

O Amigo aprova o vinho

 

Confraternização. Noivo vai buscar Amigo

NOIVO – Experimente o vinho!

Amigo coleta o vinho com a concha da mão e bebe

AMIGO – Maravilhoso! Todos servem primeiro o vinho bom e deixam o menos bom para o final. Você fez o contrário: guardou o vinho bom até agora!

Confraternização. Todos se afastam menos Maria, Noivo e Noiva

NOIVO – Obrigado, Maria, por pedir ajuda a seu filho Jesus.

MARIA – Ele nunca recusa um pedido meu.

Maria sai, Jesus se aproxima

 

CENA NOVE

Agradecendo a Jesus

 

NOIVO – Nossa família estava em grande dificuldade. Obrigado!

NOIVA – Como podemos retribuir esse favor?

JESUS – Façam ao seu próximo bondades de acordo com as necessidades deles e conforme a capacidade de vocês, mas sempre com amor. Como hoje, algumas vezes vou precisar de vocês para agir.

NOIVO – Mas nós não temos nada…

JESUS – Então peçam a quem tem, visitem os presos e os doentes, consolem os desesperados. A oração constante lhes dará forças e orientação.

Tiago se aproxima

 

CENA DEZ

Procissão final

 

TIAGO – Aqui perto há uma casa de caridade. Vamos lá ver do que eles precisam!

JESUS – Vamos todos!

Todos saem em procissão como na entrada, só que em vez dos noivos a figura central agora é Jesus, e eles dançam e cantam em volta dele.

TODOS, INCLUSIVE JESUS – O Senhor é o pastor que me conduz; Felicidade e todo bem hão de seguir- me.

 

F I M

CAPÍTULO 4

APLICATIVO METAMORFOSE: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA À EDUCAÇÃO ANTIRRACISTA E TECNOLÓGICA NO CENÁRIO PANDÊMICO

METAMORFOSE APPLICATION: AN EXPERIENCE REPORT TO THE ANTIRACIST AND TECHNOLOGICAL EDUCATION AT THE PANDEMIC CONTEXT

 

DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.04

Submetido em: 14/11/2022

Revisado em: 01/12/2022

Publicado em: 09/12/2022

 

Paloma Borges Pietro

Universidade do Planalto Catarinense – UNIPLAC, Mestrado em Educação, Lages-SC

http://lattes.cnpq.br/9074346557268431
 

 

 

 

Resumo

Sabe-se que a pandemia permitiu que o professor refletisse sobre a sua prática pedagógica e, portanto, optasse por metodologias ativas para o processo de ensino e aprendizagem. Além disso, o contexto pandêmico também desnudou problemas sociais e educacionais negligenciados ao longo das décadas. Neste sentido, este relato de experiência objetiva a) narrar um projeto educacional que consistiu na produção de um aplicativo antirracista durante o período de pandemia; b) refletir sobre a necessidade de inserir/produzir tecnologias em sala de aula; e c) discutir as contribuições deste projeto à comunidade acadêmica e docente. Sendo assim, o artigo apresenta os resultados referentes à atividade empreendida em sala de aula, ou seja, destaca que a pandemia foi um momento oportuno para que o educador pudesse alfabetizar politicamente os educandos. O principal achado, pois, refere-se ao desenvolvimento do pensamento crítico e, logo, à reflexão sobre a discriminação racial perpetrada/legitimada, que foram aspectos analisados pelos educandos, em função da produção de tal aplicativo. Em síntese, o presente relato demonstra que o professor pode romper com o ensino mecanicista em meio ao isolamento social e, assim, fazer do estudante um protagonista no que se refere à aquisição do conhecimento.

Palavras-Chave: educação antirracista, tecnologia, pandemia

Abstract

It is known that the pandemic allowed the teacher can think about your pedagogic practice, therefore, can choose active methodology to the teaching and learning process. Moreover, the pandemic context also revealed overlooked social and educational problems in long the decades. Therefore, this experience report aims a) to describe an educational project that it was about an application antiracist made in the pandemic period; b) to think about the need to introduce/to make technologies in the classroom; and c) to discuss the project’s contributions to academic and educational community. Therefore, this paper presents the results about the activity made in the classroom, in other words, it highlights the pandemic like a possibility to the teacher can teach politically the students. The major data relates to the critical thinking development and to the thinking on the racial discrimination committed/legitimized, these that they were aspects analyzed for the students due the production of the application. In summary, this experience report shows the teacher can breaks up to the mechanical teaching during the social isolations and to become the student in a protagonist regarding the knowledge acquisition.

Keywords: antiracist education, technology, pandemic

 

 

Introdução

A educação, em decorrência da Covid-19, sofreu alterações estruturais que ultrapassaram até mesmo a ideia de modalidade e abordagem de ensino. Se, por um lado, houve a mudança de perspectiva metodológica por parte de certos educadores; por outro, o contexto pandêmico intensificou/explicitou desigualdades étnicas e socioeconômicas, no que se refere à escolarização. A inacessibilidade ao ambiente escolar físico foi substituída pela dificuldade em se inserir no meio virtual para assistir às aulas – segundo o IBGE (2019), cerca de 39,8 milhões de brasileiros ainda não possuem acesso à internet. Observa-se, portanto, que a ausência de subsídios, no que tange ao Estado em garantir o direito à educação, previsto no Art. 206. da Constituição de 1988, revelou-se novamente. Por outro lado, embora ela tenha acentuado questões já existentes dentro do âmbito educacional, também contribuiu à inovação em sala de aula. É a partir desta concepção de que o avanço tecnológico se fez presente no contexto escolar/pandêmico – de maneira mais incisiva – que o presente relato de experiência se dedica a narrar e, especialmente, analisar esta relação conflituosa, todavia oportuna, entre educação e pandemia.

Sendo assim, este trabalho objetiva: a) narrar um projeto educacional que consistiu na produção de um aplicativo durante o período de pandemia; b) refletir sobre a necessidade de inserir/produzir tecnologias em sala de aula; e c) discutir as contribuições deste projeto à comunidade acadêmica e docente. Para tanto, será explicitado ao leitor, em primeiro lugar, os conceitos teóricos fundamentais ao presente estudo, amparados nas perspectivas de Freire (1981), Oliveira et al. (2020) e Mota (2021); em segundo, narrar-se-ão as etapas, bem como o percurso metodológico do projeto pedagógico empreendido em sala de aula; e, por fim, discutir-se-ão os resultados, ou seja, as evidências e impactos no processo de ensino e aprendizagem dos educandos.

 

 
Referencial Teórico

            Este artigo estrutura-se nas considerações de Freire (1981) no que tange à tecnologia inserida no processo de ensino e aprendizagem, também se embasa no estudo de Mota (2021) em relação à educação antirracista e, afinal, fundamenta-se na análise de pandemia e educação proposta por Oliveira et al. (2020). Em virtude disso, observe-se a seguir as perspectivas adotados por esses teóricos.

  • Tecnologia educacional sob a ótica freireana: possibilidades à educação antirracista

            Freire (1981) explora a ação cultural, entendida como um instrumento de revolução do trabalhador, bem como a relação antagônica entre as classes dominadas e dominantes. Em função disso, observa-se que o autor fornece uma proposição relevante ao objeto de estudo deste artigo: a tecnologia pode ser uma ferramenta aliada ao desenvolvimento do pensamento crítico. Mesmo que ocorra a tentativa de empregar os recursos tecnológicos à manutenção da ordem capitalista e dominante, eles devem ser apropriados dentro do contexto escolar à transformação social. A ótica freireana entende que numa sociedade massificada, os indivíduos estão sujeitos às opressões e desvios perpetrados pelos dominantes e, portanto, é necessário empregar a tecnologia como fonte de conhecimento e instrumento essencial à revolução. Em outras palavras, tal elemento inovador detém a potencialidade de servir aos interesses dos oprimidos, visto que atua diretamente na sua formação crítica e humana.

            Além disso, esta visão libertadora da tecnologia tece uma análise referente ao ensino e aprendizagem, que também é fundamental quando se tem por objetivo evidenciar a potencialidade dos recursos tecnológicos à educação. Trata-se, na definição de Freire (1981), da alfabetização política. Inseridos em um contexto capitalista no qual a educação é produto e o conhecimento é tido também como um produto a ser transferido, o professor inviabiliza o desenvolvimento do senso crítico. Ora, ao reduzir o sujeito (estudante) à condição de objeto em que se deposita o saber, a realidade na qual este sujeito está inserido não é compreendida/analisada/modificada. Nesta abordagem redutora de ensino, a função do educador encontra-se no fornecimento das respostas; e não no estímulo às perguntas. Sendo assim, a alfabetização política só poderá acontecer assim que os sujeitos questionem os componentes da realidade social e, assim, possa transformá-la. Desta concepção libertadora de educação, é que sobressai a ideia de que a educação funciona como elemento eficaz ao questionamento das disparidades e problemas sociais naturalizados cotidianamente.

            Ainda, em relação a isso, é possível afirmar que para Freire (1981) o engajar político do processo de alfabetização consiste em romper com o analfabeto político – que para o autor é um sujeito que observa não criticamente o mundo à sua volta. Sendo assim, a educação verdadeiramente preocupada com o desenvolvimento dos sujeitos, é aquela que opera uma mudança individual – e posteriormente social – no sentido de possibilitar a busca pela compreensão crítica da realidade. Diante disso, há de se depreender que a tecnologia a serviço da educação transformadora é capaz de romper com a formação de analfabetos políticos. Mais do que instrumento mecanicista, seu potencial reside em possibilitar à classe dominada a apreensão da realidade e o livramento da alienação natural ao sistema capitalista. Assim, passa a ser instrumento fundamental para que o estudante questione situações de injustiça e práticas discriminatórias presentes no dia a dia do indivíduo.

            Ao passo que a abordagem freireana reconhece a necessidade de a educação ampliar o acesso à transformação social e, por conseguinte, adequar a tecnologia aos interesses dos oprimidos, a educação antirracista objetiva a análise crítica da desigualdade étnico-racial. Vindo ao encontro da alfabetização política, ela representa a perspectiva de uma minoria marginalizada histórica e socialmente e, logo, contribui ao desenvolvimento da criticidade. De acordo com Mota (2021), esta abordagem educacional possibilita a inserção e a valorização da população negra, no que concerne aos aspectos sociais e históricos do contexto brasileiro. Dessa maneira, objetiva suprimir manifestação racista dentro e fora do espaço escolar – refere-se à formação de estudantes aptos a combater e rejeitar qualquer prática que perpetue o racismo. Para tanto, reconhece a participação ativa da população negra na construção histórica da nação brasileira (MOTA, 2021). Ademais, o antirracismo atua no diálogo entre a comunidade branca e negra, já que todos os sujeitos, independentemente de etnia, têm de questionar a naturalização/legitimação da discriminação racial. Em conformidade à educação libertadora, poder-se-ia ressaltar que é uma forma de alfabetizar politicamente. Diante disso, deduz-se que se a tecnologia, como mencionado anteriormente, é uma ferramenta fundamental à classe dominada, também pode ser usada à luta antirracista. Desta premissa, foi pensado projeto educacional que será relatado mais à frente.

Antes, contudo, de avançar para a descrição dos projetos educacionais, tem-se de destacar o momento histórico, no qual os sujeitos/discentes passaram pelo processo de alfabetização política. Segundo Oliveira et al. (2020), o uso de tecnologias enquanto elementos mediadores do conhecimento em sala de aula foram rejeitados pelo corpo docente e pelo grupo familiar diversas vezes. Embora isso tenha disso uma realidade recorrente, a pandemia da Covid-19 desmistificou em partes esse preconceito. Se num passado recente os docentes relutavam em relação à incorporação das ferramentas tecnológicas na educação; no presente; não há mais como negá-la. Oliveira et al. (2020), destacam também que o ensino durante a pandemia desencadeou uma relação dialógica e bilateral dentro da educação. Isso porque o educando atingiu o patamar de protagonista de sua própria aprendizagem; já o educador pôde desempenhar o seu papel mais ativamente, ou seja, buscar e empregar abordagens que o pusessem como mediador, e não detentor do conhecimento.  É uma relação bilateral, pois a dialogicidade foi o centro da educação em pleno auge do isolamento social.

A partir desta linha de pensamento, nota-se que o uso contínuo e necessário da tecnologia ao longo da pandemia, tanto ao professor quanto ao estudante, se revelou como possibilidade deste elemento adentrar na realidade educacional crítica e ativamente. Ela abriu um caminho ao que Freire (1981) almejara: um mecanismo que destacasse a interdependência entre educando e educador e, consequentemente, possibilitasse a construção do conhecimento coletivamente. O conceito de transferência – incorporado nas escolas pelos opressores – se enfraqueceu com a difusão da tecnologia em sala de aula. Nesta conjuntura oportuna, isto é, neste enfraquecimento da concepção mecanicista de escola, em que o professor teve de optar por abordagens tecnológicas, surgiu o projeto educacional que será relatado a seguir, este cujo objetivo aliava educação, tecnologia e antirracismo.

 Metodologia

O presente relato de experiência refere-se ao projeto educacional intitulado “Verbetes: (re)ssignificando conceitos”, realizado durante as aulas de Língua Portuguesa, em uma instituição escolar da rede privada – localizada no município de Lages, Santa Catarina – entre o período de julho e novembro de 2021 (ainda em isolamento social). Trata-se de uma atividade pedagógica, cujo objetivo principal foi elaborar um WebApp, isto é, um aplicativo no formato de dicionário cujos vocábulos e/ou expressões devem ser evitados no discurso oral e /ou escrito, dado que naturalizam principalmente o racismo, mas também a homofobia, xenofobia etc. Dessa forma, para a produção deste trabalho, contou-se com o auxílio de uma turma de 5º ano (Anos Iniciais – Ensino Fundamental) formada por dezessete discentes.

Sobre a estrutura deste projeto, pode-se afirmar que ela ocorreu em foi estruturado em três etapas:

1ª Etapa (brainstorming): os educandos, com a mediação da professora, selecionaram vocábulos do cotidiano que possuem conotação racista, machista, homofóbica, transfóbica, gordofóbica e/ou termos usados em práticas de bullying, para a elaboração de um brainstorming (tempestade de ideias). Em função disso, usou-se o quadro-negro para o compartilhamento de ideias.

2ª Etapa (pesquisa etimológica e produção de verbete): cada estudante produziu – a partir de um modelo disponibilizado pela educadora – verbetes acerca das palavras selecionadas do brainstorming. A proposta da atividade, portanto, consistia em pesquisar o significado de determinado vocábulo e, por conseguinte, formular verbetes – justificando a necessidade de certa palavra ser evitada na língua falada e escrita. Em razão disso, utilizou-se o Power Point para que os estudantes produzissem esses textos.

3ª Etapa (elaboração do dicionário/aplicativo)[1]: os educandos desenvolveram um dicionário, em formato de aplicativo, que continha os verbetes, cujos vocábulos precisam ser evadidos da prática discursiva. Sendo assim, contou com o auxílio da FabApp – Fábrica de Aplicativos (plataforma para a criação de aplicativos), ou seja, usou-se essa ferramenta tecnológica para o desenvolvimento do app.

4ª Etapa (divulgação do WebApp à comunidade): o aplicativo foi difundido em redes sociais para que toda comunidade lageana pudesse acessá-lo.

Além da contextualização acerca das etapas seguidas, no que se refere à elaboração do aplicativo, é necessário observar aspectos relacionados ao tempo gasto neste processo. Sendo assim, observe o seguinte cronograma.

 

 

Tabela 1: Cronograma de execução do projeto educacional

ETAPAS

JUL  2021

AGO 2021

SET 2021

OUT  2021

NOV 2021

Brainstorming

X

 

 

 

 

pesquisa etimológica

produção de verbete

X

X

 

 

 

elaboração do aplicativo / dicionário

 

 

X

X

 

divulgação do webapp à comunidade

 

 

 

X

X

Fonte: Elaboração da autora.

Resultados e Discussão

Esta proposta pedagógica apresenta como resultado a ampliação do conhecimento dos estudantes, no que se refere ao uso de instrumentos tecnológicos e, sobretudo, à forma como o discurso naturaliza e reproduz discriminações e desigualdades étnicas e sociais. Dito isso, nota-se, por meio de observação e uma roda de conversa, uma mudança discursiva empreendida pelos discentes, ou seja, um cuidado ao escolher as palavras adequadas ao contexto comunicativo, para não injuriar o outro. Observa-se, portanto, um movimento empático no qual os educandos colocam-se no lugar do outro. Em função de o projeto estar em finalizado, pode-se afirmar que os resultados foram atingidos integralmente. Os estudantes usaram as ferramentas tecnológicas, como o aplicativo elaborado, de maneira crítica e ética. Pode-se, ainda, mencionar que há um certo interesse, por parte dos alunos, em criar seu próprio aplicativo e, dessa maneira, compartilhar a pesquisa e os verbetes produzidos.

Destaca-se, finalmente, que a realização deste projeto tem proporcionado, à professora, a reflexão da prática pedagógica dela, pois os estudantes demonstraram possuir conhecimentos prévios sobre a temática do projeto. Sendo assim, ratificou-se a ideia de que o educador não é o detentor do conhecimento e, portanto, sua função não é transmiti-lo; é construí-lo coletivamente. Este projeto, por conseguinte, permitiu à educadora observar que a sua prática de ensino permite o desenvolvimento de sujeitos críticos, atuantes no ambiente social em qual estão inseridos. Garantiu, em suma, que a docente e os discentes contribuíssem para a mudança social/discursiva.

Dessa forma, notou-se que por meio da inserção da tecnologia em sala de aula, pôde-se alfabetizar os educandos politicamente, ou seja, tal projeto educacional permitiu que eles analisassem a própria realidade social a partir do discurso. Além disso, a educação antirracista foi colocada em prática, uma vez que os estudantes analisaram o discurso oral e escrito de forma crítica. O resgate etimológico permitiu o resgate também histórico de grupos sociais marginalizados ao longo da história, como negros, homossexuais, deficientes etc. Isso, por sua vez, instigou o desenvolvimento do senso analítico e da sensibilização em relação a essas populações vítimas da discriminação social e racial. Enfim, os conceitos teóricos propostos por Freire (1981), Mota (2021) e Oliveira et al. (2020) vieram ao encontro dos resultados obtidos, em virtude da efetivação desta atividade pedagógica.

­­Considerações Finais

O projeto escolar intitulado Verbetes: (re)ssignificando conceitos, ou seja, a criação do aplicativo Metamorfose permitiu que a tecnologia fosse inserida crítica e eticamente no contexto escolar. Em um período marcado pelo isolamento social, constatou-se que é possível romper com o ensino mecanicista de Língua Portuguesa e, portanto, empregar recursos tecnológicos no ambiente escolar com vistas à formação de sujeitos críticos – capazes de refletir sobre como o discurso naturaliza/legitima manifestações discriminatórias. Isto posto, depreende-se que a ferramenta desenvolvida pelos educandos poderá ser empregada em outras instituições educacionais, isto é, usada como material didático em disciplinas associadas às Ciências Humanas; ou por todos os indivíduos que lutam pela educação libertadora e à transformação social. Por meio dele foi possível empreender a alfabetização política.

Referências

BRASIL. Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

FREIRE, Paulo. Ação cultural para a liberdade. 5 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. Rio de Janeiro, 2019. Disponível em: <https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/educacao/9127-pesquisa-nacional-por-amostra-de-domicilios.html> Acesso em: 16 ago. 2021.

MOTA, Thiago Henrique (Org.). Ensino antirracista na educação básica: uma introdução. In: ______. Ensino antirracista na Educação Básica: da formação dos professores às práticas escolares. Porto Alegre: Editora Fi, 2021. Disponível em: https://www.ped.ufv.br/wp-content/uploads/2021/06/182-Ensino-antirracista-na-Educac%CC%A7a%CC%83o-Ba%CC%81sica.pdf Acesso em: 13 nov. 2022.

OLIVEIRA, Vanuza Cecilia. et al. De repente 4.0: mudanças de paradigma educacional em tempos de pandemia. In: PALÚ, Janete; SCÜLTZ, Jenerton Alan; MAYER, Leandro (Orgs.). Desafios da Educação em tempos de pandemia. Cruz Alta: Ilustração, 2020. Disponível em: https://c0e13a64-7607-45ad-a19d-4c79c9d0bd5c.filesusr.com/ugd/13f659_0ce6ff53483548818da042f991a368e3.pdf Acesso em: 13 nov. 2022.

1 Pode-se acessar o WebApp denominado Metamorfose, produzido pelos estudantes, por meio deste link: https://app.vc/metamorfose_2710855 . Sugere-se acessá-lo pelo celular, pois a experiência é mais dinâmica.

CAPÍTULO 5

OS DESAFIOS DA PESQUISA NA AMAZÔNIA: O PPHIST/UFPA EM OBSERVAÇÃO

THE CHALLENGES OF RESEARCH IN THE AMAZON: THE PPHIST/UFPA IN OBSERVATION

 

 

DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.05

Submetido em: 15/11/2022

Revisado em: 15/12/2022

Publicado em: 13/01/2023

 

Francivaldo Alves Nunes

Universidade Federal do Pará, Programa de Pós-Graduação em História, Belém-PA

http://lattes.cnpq.br/4125313573133140
 

 

 

Resumo

Neste texto, nos propomos a apresentar as ações desenvolvidas pelo Programa de Pós-Graduação em História Social da Amazônia, da Universidade Federal do Pará, considerando o contexto em que se deu o 28º Congresso da Associação Nacional de Pós-Graduando, em sua edição ocorrida em Belém, no dia 23 de junho de 2022. A partir de uma palestra proferida no evento, procuramos associar a ações do programa com aquilo que entendemos como desafios apresentados para pós-graduação, em um momento de sucateamento das universidades, provocado principalmente pela redução de recursos e investimentos do governo federal nas Instituições de Ensino Superior, assim como na redução de bolsas que atinge diretamente a pós-graduação. Esta situação é analisada considerando a realidade dos programas da região amazônica. Para isso, estamos preocupados em recuperar ações que estão associadas ao planejamento estratégico do programa, a importância da inclusão como política socialmente demandada e necessária, assim como a defesa de uma pós-graduação atuante.

Palavras-chave: Pós-Graduação, Pesquisa, Amazônia.

Abstract

In this text, we propose to present the actions developed by the Postgraduate Program in Social History of the Amazon, at the Federal University of Pará, considering the context in which the 28th Congress of the National Association of Postgraduates took place, in its edition that took place in Belém, on June 23, 2022. Based on a lecture given at the event, we sought to associate the program’s actions with what we understand as challenges presented to graduate students, at a time when universities are scrapping, mainly caused by the reduction of resources and investments by the federal government in Higher Education Institutions, as well as in the reduction of scholarships that directly affects postgraduate studies. This situation is analyzed considering the reality of programs in the Amazon region. For this, we are concerned with recovering actions that are associated with the program’s strategic planning, the importance of inclusion as a socially demanded and necessary policy, as well as the defense of an active postgraduate course.

Keywords: Graduate, Research, Amazon.

 

 

Conhecendo o PPHIST/UFPA

O 28º Congresso da Associação Nacional de Pós-Graduando (ANPG), com o tema “Sucatear para Privatizar: Os desafios da pesquisa na Amazônia em tempos de desmonte da universidade pública” se tornou uma grande oportunidade para se pensar os programas de pós-graduação no Brasil e na Amazônia. Trata-se de um tema oportuno, pensar o sucateamento como estratégia para privatização, pois, de fato é um mecanismo dos governos neoliberais para vender os equipamentos públicos com maior facilidade, pois, se tem a justificativa ideológica de que não funcionam, então se pode comercializar (HARVEY, 2008). Por outro, o tema lembra movimentos históricos, liderados por estudantes que estiveram a frente de uma luta contra a política de privatização do governo Fernando Henrique Cardoso (FHC), um dos últimos e mais fortes ataques feitos pelo governo federal, antes do governo Bolsonaro, claro, que colocou a universidade numa situação de total sucateamento. Como bem destacou Luiz Antonio Cunha (2003, p. 38), tratava-se de uma proposta que se afirmava na necessidade de se estabelecer uma “verdadeira parceria” entre setor privado e governo, entre universidade e indústria, tanto na gestão quanto no financiamento do sistema brasileiro de desenvolvimento científico e tecnológico. Neste momento atual, os agentes da destruição da escola pública e das universidades são outros, mas as estratégias são antigas, assim como as suas justificativas, pois também alegam a necessária parceria com o setor privado, que entendemos que pode resultar na privatização dos serviços públicos de ensino.

Feito essas primeiras considerações permitam-me falar muito do campo de onde estou atuando, atualmente como Coordenador do Programa de Pós-Graduação em História Social da Amazônia (PPHIST), da Universidade Federal do Pará (UFPA). Com um ano e meio de gestão, trata-se da minha primeira experiência ao gerir um programa de pós. Isso significa que minha experiência é muito no campo do ensino, no entanto, já atuo desde 2012 com professor da pós-graduação, o que permite, como interlocutor e observador, acompanhar de perto esse processo de mudança e permanência vivenciado na pós-graduação, principalmente os desafios enfrentados diante de uma política, que entendemos de desmonte das universidades que, claro, atinge os mestrados e doutorados.

Desde sua fundação, em 2004, no nível de Mestrado, e, depois em 2011, com a criação do Doutorado, o PPHIST/UFPA se definiu, a partir de uma perspectiva e eixo norteador fundamental, em aprofundar as reflexões sobre a história da Amazônia, desde o período colonial até o tempo presente. Daí decorre que a área de concentração do programa tenha se mantido a mesma desde o início: “História Social da Amazônia”. Então, além de fazer pesquisa na Amazônia, a Amazônia é o objeto de observação. Se antes a ideia era compreender a atuação social, hoje é compreender como essa atuação se conectava com o mundo atlântico europeu, mas também africano, mundo asiático e com as américas.

Do ponto de vista do perfil do corpo docente, no quadriênio 2017-2020, o PPHIST/UFPA contou com 20 docentes permanentes (dos quais 4 titulares e o restante de professoras/es associadas/os) e 5 docentes colaboradores. Destes, são 8 professores produtividades, para uma média de 40 discentes de mestrado matriculados (razão de 1,6 discente/docente) e 94 discentes de doutorado matriculados (razão de 3,8 discente/docente) por ano no quadriênio. Dos docentes colaboradores, 2 são bolsistas Programa Nacional de Pós-Doutorado (PNPD) da CAPES. Uma das consequências desde desmonte é a perda de um bolsista pós-doutorado, uma vez que o programa foi encerrado e não possibilidade de renovação de bolsas, nem tão pouco de seleção de novos bolsistas.

 

Figura 1: Página do site do PPHIST.

Fonte: Acesso no link: https://www.pphist.propesp.ufpa.br

Um plano estratégico

Do ponto de vista de um planejamento estratégico, o PPHIST/UFPA tem atuado de forma significativa, quanto ao aprofundamento e a produção de conhecimento sobre a Amazônia, cumprindo o objetivo de refletir historiograficamente sobre a diversidade social, étnica e cultural da região na sua relação com a biodiversidade local. Só no programa, mesmo diante da pandemia, são 10 teses produzidas anualmente e até 15 dissertações de mestrado defendidas, podendo ser baixadas no site da pós-graduação, no link: https://www.pphist.propesp.ufpa.br/index.php/br.

Formar quadros de docentes e pesquisadoras/es de instituições espalhadas pelo estado do Pará e demais estados da Amazônia Legal, cumprindo o objetivo de capacitar professoras/es e pesquisadoras/es para a compreensão da realidade regional é uma das principais metas atingidas pelo programa. Hoje professores das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES), como a Universidade Federal do Maranhão, a Universidade Federal do Oeste do Pará, a Universidade Federal do Pará e a Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará, assim como das universidades estaduais a exemplo da Universidade Estadual do Amazonas, Universidade Estadual do Maranhão e Universidade Estadual de Roraima, tem procurado o programa em busca de formação em mestrado e doutorado. Professores das universidades privadas, como a Universidade da Amazônia, docentes na rede pública estadual de educação básica no Pará, no Amazonas, e no Ceará, além dos docentes na rede pública federal de educação básica como do Instituto Federal do Maranhão e Instituto Federal do Pará foram também formados pelo programa. Ainda se observa a formação de docentes da rede pública municipal de educação básica no Pará, servidores da Secretaria de Cultura do Pará e do Amapá, servidores da Universidade Federal do Amazonas e servidor na rede pública federal de educação básica do Piauí. O que mostra a importância da pós-graduação e sua capacidade de inserção nacional e regional.

Atendimento social, em regime de assessorias, consultorias e produtos que são gerados, como os minicursos, publicações e materiais didáticos produzidos, também foram destaque na produção do programa. Ressalta-se ainda a implantação de um laboratório digital para atender os usos das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) no ensino e uso documental.

Adesão ao Programa de Apoio à Qualificação de Servidores Docentes e Técnico-Administrativos (PADT), que entendemos que seja um programa muito importante para formação do quadro técnico de profissionais da UFPA, em que a PROPESP/UFPA auxilia os programas foi muito importante. Em tempos de crise e sucateamento das instituições, esse tipo de investimento pode ficar comprometido.

Para o maior desenvolvimento, as pós-graduações na Amazônia precisam da manutenção do Programa de Apoio à Cooperação Internacional (PACI), que recebe docente de outros países; Programa de Acompanhamento para melhor adequação dos programas e melhor preparo para avaliação das pós; PROAFRI, PROLAC que recebem alunos africanos e da América Latina entre outros, que podem estar comprometidos com os cortes orçamentários a que vem sofrendo a universidade.

A professora Connie McManus, da UnB, em palestra proferida na Pontífice Universidade Católica de São Paulo, em 29 de abril de 2022, aponta números positivos de crescimento da pós-graduação na Amazônia, no caso em 112%. No entanto, esse crescimento só é sustentado com investimentos em bolsas de pesquisa. Como destaca pesquisadora, os novos programas precisam de apoio das agências de fomento, para que possam, em curto espaço de tempo, promover uma formação de qualidade e com pesquisas de reconhecimentos nacional e internacional (JORNAL DA PUC-SP, 29/04/22, p. 1).

Valorizar a inclusão

Precisamos continuar valorizando a inclusão. Isso é fato. No caso, o PPHIST/UFPA acompanha o critério geral adotado pela Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da UFPA, de privilegiar a concessão de bolsas CAPES, cota CNPq, além de cotas concedidas pela Fundação de Amparo a Pesquisa do Pará, a discentes que não tenham vínculo empregatício público permanente. Discentes que entraram por reserva de vagas, como pessoas negras e indígenas, quilombolas e pessoas com deficiência, têm prioridade na distribuição de bolsas. Quero destacar que a adoção de políticas afirmativas pelas universidades brasileiras nas últimas décadas ampliou o acesso de indivíduos de baixa renda, pretos, pardos e indígenas ao ensino superior. No entanto, essa estratégia ainda enfrenta desafios para se consolidar no sistema de pós-graduação. A conclusão consta de levantamentos feitos nos últimos cinco anos por pesquisadores do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) e do Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).

Eles analisaram editais de seleção de 2.763 programas de pós-graduação stricto sensu (mestrado e doutorado) entre 2002 e 2018. Verificaram que o número de programas com políticas afirmativas cresceu 329,3% entre 2015 e 2018, de 174 para 737. Esse contingente, porém, abrange apenas 26,4% da amostra avaliada. “Apesar do crescimento dessas iniciativas, ainda há muito espaço para avançar” (JC NOTÍCIA, 10/03/2022, p. 1).

Precisamos estar preparados e atuar para inclusão de outras pautas como a LGBTQIA+, de Gênero, de forma a assegurar um maior equilíbrio entre homens e mulheres como professores e alunos. Agora mesmo, em 2022, na inclusão das leituras para o ingresso no mestrado, equilibramos os textos entre homens e mulheres, valorizando a produção das professoras que atuam no programa.

Os programas precisam adequar seus espaços para atender alunos e alunas que precisam cuidar dos filhos. Um espaço família se faz necessário, inclusive para higienização de bebês que são trazidos pelas mães e pais. Trata-se de uma pauta importante de professores e alunos, que deve ser assegurada pela gestão superior das universidades.

Uma pós-graduação atuante

Pensar no fortalecimento dos fóruns de debate da pós-graduação, de forma a socializar as experiências e tomar diretrizes e promover ações coletivas deve ser o caminho. Em tempos difíceis, só a unidade nos fortalece. Além disso, precisamos avaliar as ações desenvolvidas na pandemia, os aprendizados e o que é possível de dar continuidade, principalmente quanto as aulas, reuniões e defesas remotas.

Em tempos de cortes orçamentários devemos estabelecer parcerias com o governo do Estado. Hoje temos uma Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia (SECTET) e uma Fundação de Amparo à Pesquisa do Pará (Fapespa), que em muito pode colaborar, com bolsas de pesquisa para alunos da pós-graduação.

Aproximar em diálogos com as gestões do estado e dos municípios, para criação de programas que viabilizem a liberação de servidores para cursar a pós-graduação é uma outra estratégia importante. Para isso o PPHIST/UFPA tem buscado encaminhar documento aos gestores informando da importância da formação em ensino da pós-graduação e da importância do apoio das instituições em que esses discentes estão vinculados.

Entendemos que a gravidade dos cortes de recursos e bolsas de pesquisa que ocorreram neste período devem ganhar o máximo de visibilidade merecida, assim como o descaso com a ciência. Não acreditamos que apenas a questão de emissão das notas de repúdios tenha o efeito desejado. Talvez possamos pensar em outras estratégias que possa surtir maiores efeitos, mobilizando um conjunto maior de pessoas. A sociedade precisa conhecer os problemas que estamos passando. O congresso proposto pelos alunos de pós-graduação é uma saída, mas precisamos criar outras ações. Precisamos nos comunicar com a sociedade. As redes de comunicação são canais importantes.

Só para termos uma ideia, o corte sistemático, como estamos observando no Brasil em comparação com outros países do mundo, por exemplo, a porcentagem de investimento do PIB brasileiro em ciência – 1,26% – é inferior à média mundial – 1,79%), gera uma grande insegurança no sistema como um todo. Também é digno de nota o valor das bolsas de pós-graduação, que não têm reajuste desde 2013 e são de R$ 1.500,00 e R$ 2.200,00, respectivamente, para mestrado e doutorado.

 

Figura 2: Prédio do PHIST, localizado no Campus da UFPA em Belém-Pará.

 

O que buscamos

Pautas importantes, tais como a regulação do Sistema Nacional de Pós-Graduação (SNPG), a retomada e conclusão do processo da Avaliação Quadrienal (2017-2020) e a reversão dos cortes no PLOA 2022, Projeto de Lei Orçamentária, em prol da educação, ciência, tecnologia e inovação e do cumprimento de dispositivo constitucional quanto ao descontingenciamento do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), são os desafios postos para 2022 e 2023.

Estamos trabalhando para identificarmos os alunos do programa em maiores condições de vulnerabilidade social e econômica. Isso vai ser fundamental para dialogarmos como o colegiado do programa para construirmos diretrizes de atendimento destes estudantes.

Não dar para cobrarmos que um estudante que já está a 15 ou 20 anos em formação, ou peça que ele fique mais um tempo na pós-graduação e que de conta própria se mantenha na pós. Bolsa é uma necessidade e uma pauta não somente de alunos, mas também impacta na qualidade dos trabalhos de conclusão, sejam as dissertações como as teses.

Estamos passando por uma situação tão difícil, quando podíamos debater investimentos em pesquisa e bolsas, pois algumas pesquisas dos alunos precisam de investimento para seus projetos e para preparo de seu produto, estamos lutamos para assegurar o que temos, inclusive evitar a redução dos valores das bolsas.

Outros desafios ainda se apresentam. Observamos a necessidade de buscarmos um equilíbrio entre a preparação de professores para o ensino superior, a de pesquisadores e a de profissionais diversos que buscam seu aprofundamento teórico, cultural, científico ou tecnológico. Com flexibilização de tempos e de possibilidades nas trajetórias dentro dos cursos, este equilíbrio talvez possa ser atingido. Daí devemos pensar em funcionamentos de disciplinas em formatos e horários diversos que melhor aproveite a demanda social. A convivência de modalidades diferentes numa mesma instituição e em um mesmo programa, que se qualifica também pela pesquisa e produção cultural de outras naturezas, pode dar sustentação a um ambiente adequado de convivência com formas diversificadas de produzir e utilizar conhecimentos.

Se os programas podem e devem se constituir em lugar de construção de aprendizagens, de exercício da investigação científica, de maturação quanto a teorias e tecnologias e de preparação para o exercício da docência em nível superior, novas relações educacionais internas a eles devem ser construídas. Isto requer alterações em papéis consagrados, criação de ambiências de aprendizagem para além das aulas e atividades estruturadas, criação de opções para estudo, atividade laboratoriais diversas, que implique uma relação também com a graduação e a extensão. Temos de enfrentar o conformismo ao modelo único, de finalidade única, e buscar formas organizacionais que tornem o espaço da pós-graduação espaço no qual de fato se exercite a exploração intelectual de problemas e temas, que crie uma ação de serviço para a sociedade, no interior de suas experiências formativas.

Estamos defendendo um olhar social mais sensível, tendo questões de equidade como referência. Nesse caso, é necessário considerar as condições reais de quem hoje procura esse nível formativo, dos que potencialmente virão a procurá-los, e dos objetivos que em relação a ele começam a ter pessoas de diferentes segmentos sociais e setores do trabalho. Considerando que os objetivos são socialmente construídos e não pré-determinados abstratamente, entendemos que há a necessidade de maior interlocução suficientemente ampliada dos acadêmicos com diversificados setores que começam a exigir interfaces com esse tipo de formação.

O que se observa é que cada vez mais os estudantes de pós-graduação têm que arcar com os custos deste ensino e dividir seu tempo entre trabalho e estudo. Este é o horizonte que se descortina no Brasil para os demandantes à pós-graduação. Assim, a questão de prazos rígidos para a conclusão dos cursos – e que afetam sua avaliação e os fomentos que podem receber – toma outra feição, pelo menos dentro de um pensar mais democrático de possibilidades de acesso ao saber. Os mestrandos e doutorandos não-bolsistas, que aos poucos se tornam a maioria dos alunos desses cursos, obviamente têm outras condições quanto à dedicação de tempo aos estudos, mas nem por isto são menos qualificados para aí estarem. Nesse caso, fechar possibilidades a este tipo de pós-graduando é criar mais um espaço de exclusão. É preciso considerar também que, trabalhando em geral em áreas afins aos seus estudos, os pós-graduandos emprestam a estes uma nova qualidade que advém da experiência no trabalho e do seu trato cotidiano com variados e concretos tipos de problemas.

A questão do aluno-trabalhador e dos prazos de formação trazem um desafio e tanto para o modelo credencialista vigente e, diante das necessidades e condições reais dos estudantes nesse nível, esse modelo, com sua rigidez, parece colocar-se na contramão da história social. Estamos aqui compartilhando com as reflexões Jacques Velloso e Lea Velho (1997), que analisando a pós-graduação, discutem a questão do tempo imposto rigidamente para a realização destes cursos, ponderando que a fixação de prazos inadequados, constitui não apenas fonte de frustração mas também de desperdício de tempo e dinheiro por parte dos estudantes e das instituições.

Os contrastes entre conhecimento científico, conhecimento ético e equidade social deverão ser merecedores de uma ampla e pública discussão, se os que atuam neste nível de ensino desejarem ser partícipes das transformações que despontam no horizonte desses cursos. Esta participação será essencial à medida que se reconhecer que mestrados e doutorados devem estar envolvidos com uma ética da vida que implique a superação de processos que alimentam a excessiva desigualdade entre pessoas e grupos. Isto conduz à necessidade de rearticulação dos domínios do conhecimento com a responsabilidade social. Um novo tipo de consciência humano-social-científica será requerido para encaminhar estas transformações. Estamos, portanto defendendo, uma pós que precisa está comprometida com valores sociais, defesa do meio ambiente, da sustentabilidade, do envolve com grupos marginalizados, um sistema de pós forte comprometida com a mudanças sociais, combate a pobreza, ao trabalho digno, a cidadania, a vida.

Referências

CUNHA, L. A. O ensino superior no octênio FHC. Educação Sociedade, Campinas, vol. 24, n. 82, p. 37-61, abril, 2003.

JC NOTÍCIAS. Ações afirmativas enfrentam desafios para se consolidar na pós-graduação. Disponível: https://gepa-avaliacaoeducacional.com.br/acoes-afirmativas-enfrentam-desafios-para-se-consolidar-na-pos-graduacao/, 2022.

HARVEY, D. (2008). O Neoliberalismo – história e implicações. São Paulo: Edições Loyola, 2008.

JORNAL DA PUC. Pós-graduação no Brasil: área tem grandes desafios para os próximos dez anos. Disponpível em: https://j.pucsp.br/noticia/pos-graduacao-no-brasil-area-tem-grandes-desafios-para-os-proximos-dez-anos, 2022.

VELLOSO J, VELHO L. Política de bolsas, progressão e titulação nos mestrados e doutorados. Cadernos de Pesquisa, 101, Fundação Carlos Chagas & Autores Associados, 50-81, 1997.

CAPÍTULO 6

DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOCENTE E A EDUCAÇÃO AMBIENTAL

TEACHER PROFESSIONAL DEVELOPMENT AND ENVIRONMENTAL EDUCATION

 

 

DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.06

Submetido em: 08/01/2023

Revisado em: 12/01/2023

Publicado em: 13/01/2023

 

Luiz Gustavo Veríssimo e Silva

Universidade Federal de São Carlos – Campus Sorocaba, Sorocaba-SP

http://lattes.cnpq.br/7752066614010991
 

 

 

 

Resumo

Este ensaio é resultado do trabalho final da disciplina Formação e Atuação de Professores das Ciências no Brasil, cursada no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de São Carlos campus Sorocaba. Aqui discuto um pouco sobre minha área de pesquisa no doutorado, a Educação Ambiental, e o Desenvolvimento Profissional Docente (DPD), que traz uma outra visão sobre a constituição profissional docente, a visão de um processo contínuo de transformação do sujeito dentro de um campo profissional específico. Para falar dessa relação me utilizo de Cecília Meireles e Paulo Freire que me apoiam ao dizer que nós fazemos educadores, pois estamos constantemente desconstruindo e construindo, aprendendo, desaprendendo e reaprendendo. Também me utilizo de diversos autores, autoras e trabalhos para dizer que a Educação Ambiental é muito importante para o desenvolvimento profissional do professor, já que o trabalho com as questões ambientais promove práticas colaborativas por meio da interdisciplinaridade e do trabalho com temas e contribui para que o professor crie conhecimento e reflita sobre sua própria prática. E finalizo este ensaio com uma poesia de Manoel de Barros para refletirmos sobre o meio em que vivemos, o não-humano. Que ele também seja possibilidade de renovação de transformação. É preciso nos renovarmos usando borboletas.

Palavras-chave: Sujeito ecológico. Formação de professores.

 

 

Ensaio

                Neste ensaio busco falar um pouco sobre o conceito de Desenvolvimento Profissional Docente e sua relação com a Educação Ambiental. E para falar desse tema primeiramente me utilizo do trabalho de André (2010) para dizer que a formação de professores tem se consolidado como um campo autônomo de estudos no decorrer dos anos. Apoiada em pesquisa da área e no trabalho de Marcelo Garcia a autora identifica nesse campo de estudos um objeto de conhecimento próprio, uma metodologia de pesquisa específica, um grupo de cientistas que define um código de comunicação próprio, a incorporação dos participantes da pesquisa no seu desenvolvimento e reconhecimento da formação de professores como um elemento fundamental na qualidade da ação educativa. E entre disputas de poder pela consolidação das diferentes áreas de conhecimento, todos esses elementos têm contribuído para que essa área se estabeleça com um campo de estudos consolidado com o passar dos anos.

Nesse processo, diferentes visões sobre como professoras e professores se constituem como sujeitos dentro do seu campo profissional vem sendo discutidas. E para falar de onde parti para a construção desse ensaio, falo primeiro um pouco sobre mim, e as diferentes visões que encontrei no meu caminho acadêmico.

Durante a minha formação no curso de licenciatura em Ciências Biológicas conheci e sempre trabalhei com os termos formação inicial e formação continuada. Nos meus anos de graduação escrevi alguns trabalhos de disciplinas e trabalhos para congressos e em todos eles utilizei esses dois termos. Sempre pensando a formação do professor como um processo que acontece na universidade, a formação inicial, e um processo que acontece nas formações dadas aos professores nas escolas e outros espaços em que podem ocorrer, a formação continuada.

No meu mestrado me afastei das discussões sobre a formação de professores e me debrucei apenas sobre as questões relativas ao ensino de um determinado conteúdo. Assim, meu entendimento sobre esse tema continuou o mesmo.

Já no doutorado, na disciplina de Formação e Atuação de Professores das Ciências no Brasil conheço o termo Desenvolvimento Profissional Docente (DPD). Com a leitura dos textos indicados e as discussões realizadas em aula pude conhecer uma outra visão sobre a constituição profissional docente, a visão de um processo contínuo de transformação do sujeito dentro de um campo profissional específico (FIORENTINI; CRECCI, 2013). E esse processo se dá ao longo do tempo, a longo prazo, não apenas na universidade e em oficinas e workshops dadas aos professores em exercício. Ele inclusive se dá antes do ingresso nos cursos de licenciatura. Nesse sentido, segundo Marcelo (2009, p.9) “o conceito ‘desenvolvimento’ tem uma conotação de evolução e continuidade que, em nosso entender, supera a tradicional justaposição entre formação inicial e formação contínua de professores”. E é dessa disciplina que surge esse ensaio. Ele é o trabalho final realizado nela e surgiu da minha vontade de conhecer mais sobre esse termo e sua relação com a minha área de pesquisa no doutorado que é a Educação Ambiental (EA).

Ao ler sobre esse termo, buscando conhecer mais sobre o DPD, me lembrei de duas coisas. A primeira é uma poesia de Cecília Meireles, que além de poeta, pintora, jornalista, foi também professora. Eu sempre gostei muito de ler poesias e por isso as carrego comigo em todos os lugares. Essa poesia fez parte da minha dissertação de mestrado e deu início ao primeiro capítulo, que trata do referencial teórico. Penso que ela diz muito sobre esse processo de constituição do professor como um desenvolvimento, algo que acontece todos os dias.

 

Hoje desaprendo o que tinha aprendido até ontem

e que amanhã recomeçarei a aprender.

Todos os dias desfaleço e desfaço-me em cinza efêmera:

todos os dias reconstruo minhas edificações, em sonho eternas.

 

Esta frágil escola que somos, levanto-a com paciência

dos alicerces às torres, sabendo que é trabalho sem termo.

E do alto avisto os que folgam e assaltam, donos de riso e pedras.

Cada um de nós tem sua verdade, pela qual deve morrer.

 

De um lugar que não se alcança, e que é, no entanto, claro,

minha verdade, sem troca, sem equivalência nem desengano

permanece constante, obrigatória, livre:

enquanto aprendo, desaprendo e torno a reaprender.

 

                       

Essa poesia fala sobre o nosso processo de constante transformação. Cecília Meireles mostra com suas palavras que estamos constantemente desconstruindo e construindo, aprendendo, desaprendendo e reaprendendo. É um processo sem termo, como disse a autora. E a poesia vai ao encontro do termo desenvolvimento profissional docente. Não trata do DPD propriamente dito, mas trata desse processo de vir a ser, de transformar-se ao longo do tempo pelo qual também passa o professor no seu processo de constituição como tal (FIORENTINI; CRECCI, 2013). E o poema traz isso de uma forma que comove, que sensibiliza e desperta sentimentos, por isso trago ele aqui. Com ela percebemos que nosso processo de constituição como sujeitos não se dá por características herdadas, mas é um processo de interação constante com o mundo que nos rodeia. A nossa constituição como sujeitos e como profissionais acontece nos diferentes espaços em que estamos inseridos e com os diferentes sujeitos com os quais interagimos. Somos seres históricos e sociais, e interagimos de forma dinâmica com as influências exteriores e nessa interação nos transformamos (MARQUES, 2021).

            A segunda coisa que me veio à mente ao ler sobre o DPD é um escrito de Paulo Freire no seu livro A Educação na Cidade. O livro trata do seu período como Secretário de Educação da cidade São Paulo entre os anos de 1989 e 1991. O autor diz:

Ninguém começa a ser educador numa certa terça-feira às quatro horas da tarde. Ninguém nasce educador ou marcado para ser educador. A gente se faz educador, a gente se forma, como educador, permanentemente, na prática e na reflexão sobre a prática. (FREIRE, 1991, p.58)

            Esse trecho dito por Freire é importante para pensarmos primeiro que ser professor não é dom, algo que estamos predestinados por Deus ou geneticamente e fazemos por amor. Nós fazemos educadores. Marques (2021, p.41) ao dissertar sobre o assunto também salienta que a “constituição profissional docente não se dá no campo das relações hereditárias ou pelas aptidões naturais que ele apresente para desenvolver determinada atividade em detrimento de outra”, mas sim nos nossos movimentos pelos diferentes contextos, processos e pelas diferentes práticas que participamos em nossas vidas, nos quais interagimos com diversos outros que fazem parte dos nossos múltiplos espaços em que nos inserimos (LAVE, 2015; FIORENTINI; CRECCI, 2013).

            Paulo Freire no fim do trecho anteriormente citado traz algo muito importante para o DPD que é a reflexão sobre a prática. Segundo Marcelo (2009, p.11) uma nova perspectiva de DPD tem entendido o professor “como um sujeito prático reflexivo, alguém que é detentor de conhecimento prévio quando acede à profissão e que vai adquirindo mais conhecimentos a partir de uma reflexão acerca da sua experiência.”. É importante considerar que se constituir professor não é um processo passivo, mas sim dinâmico, em que o professor busca a direção de suas aprendizagens e de seu próprio desenvolvimento em um processo de análise crítica das próprias ideias e práticas (REALI; REYES, 2009). Voltando ao que escreveu Cecília Meireles, é um aprender, desaprender e reaprender com a própria prática.

            Além da reflexão sobre a prática, Marcelo (2009) também cita o trabalho colaborativo como uma característica dessa nova perspectiva de DPD. Em práticas colaborativas, segundo Damiani (2008, p.215) os sujeitos “se apoiam, visando atingir objetivos comuns negociados pelo coletivo, estabelecendo relações que tendem à não-hierarquização, liderança compartilhada, confiança mútua e corresponsabilidade pela condução das ações.”. Na escola, essa colaboração pode acontecer entre os próprios professores do ensino básico, entre esses e os professores do ensino superior e também desses todos com os demais sujeitos que fazem parte da comunidade escolar. Em práticas colaborativas os professores “compartilham, discutem e negociam significados sobre o que fazem, falam, sentem, pensam e produzem conjuntamente.” (CRECCI; FIORENTINI, 2018, p.4). Com isso buscam e constroem novos conhecimentos e aprendizados através da reflexão e da investigação conjunta sobre a prática de ensinar e aprender na escola (CRECCI; FIORENTINI, 2018).

            Ao unir essas duas características, Crecci e Fiorentini (2018, p.11) escrevem sobre o trabalho colaborativo entre professores do ensino básico e professores do ensino superior:

Em comunidades investigativas, os professores e formadores trabalham de modo colaborativo para transformar disciplinas e o currículo; examinar criticamente os conteúdos e as avaliações, bem como atuar como leitores críticos e conscientes consumidores de materiais e programas; além de desenvolver abordagens válidas para identificar e interpretar uma série de resultados educacionais significantes.

            Assim, com práticas reflexivas e com o trabalho colaborativo, os professores terão mais chances de implementar transformações necessárias no cenário escolar (MARQUES, 2021). E um campo importante para que o professor repense a sua prática em uma perspectiva colaborativa é a Educação Ambiental.

A questão ambiental se faz presente resolução CNE/CP Nº 2, de 20 de dezembro de 2019 que define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial de Professores para a Educação Básica e institui a Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica. Na página 13 da resolução uma das competências gerais docentes é

Desenvolver argumentos com base em fatos, dados e informações científicas para formular, negociar e defender ideias, pontos de vista e decisões comuns, que respeitem e promovam os direitos humanos, a consciência socioambiental, o consumo responsável em âmbito local, regional e global, com posicionamento ético em relação ao cuidado de si mesmo, dos outros e do planeta. (BRASIL, 2019, p.13)

Também nas leis que instituem a EA no Brasil, é citada a formação de professores. As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental (DCNEA) de 2012 estabelecem que a dimensão socioambiental deve ser contemplada na formação inicial e continuada dos profissionais da educação (BRASIL, 2012).

Assim, a questão ambiental deve estar presente no processo de formação do professor e aqui irei defender a importância desse campo no desenvolvimento profissional docente, tendo em vista que esse é um campo potente para o trabalho colaborativo e para o trabalho investigativo em sala de aula.

Para falar sobre a potência da EA para o trabalho colaborativo, é importante trazer um pouco do que está escrito nas leis brasileiras sobre EA. Nas Políticas Nacionais de Educação Ambiental de 1999 a Educação Ambiental é tratada como componente essencial e permanente da educação no país e o documento ainda diz que ela deve estar presente em todos os níveis e modalidades de ensino de forma articulada (BRASIL, 1999). Já na nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental (DCNEA) a Educação Ambiental continua como componente integrante e essencial da educação nacional, porém o documento diz que ela deve ser desenvolvida em práticas integradas interdisciplinares (BRASIL, 2012).

As diretrizes de 2012 apresentam um ponto interessante para pensar o trabalho colaborativo que é a interdisciplinaridade. Trabalhar interdisciplinarmente sozinho, apesar de alguns autores entenderem como possibilidade (HARTMANN; ZIMMERMANN, 2007), é algo complicado de se pensar falando de professores do segundo ciclo do ensino fundamental e do ensino médio, etapas da escolarização nas quais o ensino é disciplinar, com um professor diferente para cada disciplina. Segundo Silva e Gebara (2015, p.47) são múltiplas as leituras sobre esse termo, porém essas leituras parecem “convergir para a ideia de que a prática interdisciplinar promove uma unidade entre saberes”. Ainda segundo as autoras trata-se de uma mudança de postura frente a forma linear e fragmentada como são tratados os conhecimentos trabalhados nas escolas. E nesse processo de mudança de postura, de desenvolvimento profissional, o professor precisa vivenciar experiências interdisciplinares, interativas. As questões ambientais, pela sua complexidade, envolvem diferentes áreas do conhecimento no seu estudo e na sua compreensão. Por isso, a interdisciplinaridade e a colaboração entre os professores são fundamentais no trabalho com essas questões em sala de aula.

Além disso, o trabalho com temas também é algo muito ligado tanto à Interdisciplinaridade quanto a EA. Para pensar a formação do sujeito ecológico, definido por Carvalho (2012, p. 67) como “um sujeito ideal que sustenta a utopia dos que creem nos valores ecológicos”, os temas ambientais, locais e significativos devem ser tomados como ponto de partida para reflexões e para apropriação crítica dos conhecimentos sobre as questões ambientais (TOZONI-REIS, 2006). E o trabalho com temas também implica em um trabalho colaborativo, com os professores de diferentes disciplinas tratando de um mesmo tema. As questões e problemas ambientais são temas que devem estar presentes em sala de aula segundo as leis brasileiras e elas permitem tratar de diversos conceitos ligados às diferentes disciplinas.

Um exemplo disso é o projeto “Ribeirão Anhumas na Escola” coordenado pelo professor Maurício Compiani do Instituto de Geociências da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) com colaboração de outros professores da UNICAMP, professores de outras universidades, como a Universidade do Estado de São Paulo (USP) e a Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL), e de professores de duas escolas estaduais de Campinas, Escola Estadual Ana Rita Godinho Pousa e Escola Estadual Adalberto Nascimento. O tema do projeto foi o ribeirão anhumas que corre próximo a essas duas escolas e buscou construir uma nova forma de tratar as relações entre sociedade e ambiente a partir da interdisciplinaridade, contextualização e autonomia do professor e da escola. Um de seus objetivos foi “a constituição de uma cultura de colaboração e construção de conhecimentos escolares e propostas curriculares entre universidade, instituto de pesquisa e rede pública por meio da concepção de pesquisa colaborativa” (COMPIANI, 2013, p.8).

Nesse projeto, os pesquisadores também tiveram como objetivo o “desenvolvimento de conhecimento escolares contextualizados e integradores entre disciplinas qualifiquem o lugar da escola e seus alunos” (COMPIANI, 2013, p.8). Esse processo se deu por meio da pesquisa dos professores da educação básica das escolas envolvidas e é esse o outro ponto que defendo aqui da importância da EA no desenvolvimento profissional docente.

O trabalho com problemas ambientais que fazem parte do contexto em que a escolas e os estudantes estão inseridos requer dos professores um trabalho investigativo para compreender o problema a ser levado para trabalho em sala de aula e suas ramificações naquele contexto em que se insere. E essa prática, segundo Compiani e Silva (2015), leva a uma melhoria no processo de ensino-aprendizagem, visto que com ela o professor produz novos conhecimentos escolares e novos modos de trabalhar os conteúdos em sala de aula. A pesquisa permite ao professor, no processo de investigação, encontrar diferentes metodologias de trabalho, desnaturalizando questões que são consideradas como normais em sala de aula, como os alunos não aprenderam algum conteúdo pois ele é difícil (COMPIANI; SILVA, 2015). Assim, o trabalho com problemas ambientais requer essa prática de investigação e produção de novos conhecimento e formas de trabalhar, permitindo que o professor reflita sobre a própria prática, muitas vezes enraizada em certas formas de trabalhar o conteúdo.

Tudo isso evidencia a importância do campo da EA para o desenvolvimento profissional do professor, já que o trabalho com as questões ambientais promove práticas colaborativas por meio da interdisciplinaridade e do trabalho com temas e contribui para que o professor crie conhecimento e reflita sobre sua própria prática.

Ainda gostaria de salientar que inúmeros são os locais em que pode se dar a prática com as questões ambientais. Para citar alguns: museus, zoológicos, jardins botânicos, parques, reservas e em festivais e mostras de cinema ambiental. Esse último é meu objeto de estudo no doutorado. As obras cinematográficas apresentam a realidade pelas lentes das câmeras e nos colocam em contato com diferentes culturas, modos de vida, paisagens e problemas ambientais. Problemas que podemos encontrar no nosso quintal ou no nosso país. Esses espaços são produtores de oportunidades de aprendizagem por participação, através das experiências e vivências com os filmes. E como foi dito no início desse texto, se constituir professor envolve movimento através dos diferentes contextos em que nos inserimos e nas diferentes práticas que nos engajamos. Por isso, faço aqui a minha defesa da Educação Ambiental como um campo importante para o DPD e das mostras e festivais de cinema ambiental como espaços de constituição profissional docente.

Por fim, gostaria de dizer que esse ensaio é apenas um pouco das minhas reflexões sobre o que foi discutido na disciplina e das leituras feitas sobre o assunto. O DPD foi uma surpresa muito boa no meu percurso de doutorado e espero poder continuar caminhando para compreender esse termo e tudo que ele envolve.

E para pensar a EA como transformação do sujeito deixo aqui uma poesia de Manoel de Barros que pensa em nos renovar usando borboletas. Que o meio em que vivemos, o não-humano, seja também possibilidade de renovação de transformação.

 

A maior riqueza do homem é a sua incompletude.

Nesse ponto sou abastado.

Palavras que me aceitam como sou — eu não aceito.

 

Não aguento ser apenas um sujeito que abre

portas, que puxa válvulas, que olha o relógio, que

compra pão às 6 horas da tarde, que vai lá fora,

que aponta lápis, que vê a uva etc. etc.

 

Perdoai.

Mas eu preciso ser Outros.

Eu penso renovar o homem usando borboletas.

Referências Bibliográficas

ANDRÉ, Marli. Formação de professores: a constituição de um campo de estudos. Educação, Porto Alegre, v.33, n.3, p.174-181, 2010.

BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial de Professores para a Educação Básica. Resolução cne/cp nº 2, dezembro de 2019. Brasília, 2019.

BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental. Resolução n°2, Junho de 2012. Brasília, 2012.

BRASIL. Presidência da República: Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Política Nacional de Educação Ambiental. Lei 9.745, de 27 de Abril de 1999. Brasília, 1999.

COMPIANI, Maurício. RIBEIRÃO ANHUMAS NA ESCOLA: projeto de formação continuada elaborando conhecimentos escolares relacionados à ciência, à sociedade e ao ambiente. 1 ed., Curitiba – PR: Editora CRV, 2013.

CRECCI, Vanessa Moreira; FIORENTINI, Dario. Desenvolvimento profissional em comunidades de aprendizagem docente. Educação em Revista, Belo Horizonte, n.34, p.1-19, 2018.

DAMIANI, Magda Floriana. Entendendo o trabalho colaborativo em educação e revelando seus benefícios. Educar, Curitiba, n. 31, p. 213-230, 2008.

FIORENTINI, Dário; CRECCI, Vanessa. Desenvolvimento Profissional Docente: Um Termo Guarda-Chuva ou um novo sentido à formação? Form. Doc., Belo Horizonte, v. 05, n. 08, p. 11-23, 2013.

FREIRE, Paulo. A Educação na Cidade. São Paulo: Cortez, 1991.

HARTMANN, Angela Maria; ZIMMERMANN, Erika. O trabalho interdisciplinar no Ensino Médio: A reaproximação das “Duas Culturas”. Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências, v. 7, nº 2, 2007.

LAVE, Jean. Aprendizagem como/na prática. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, ano 21, n. 44, p. 37-47, jul./dez, 2015.

MARCELO, Carlos. Desenvolvimento profissional: passado e futuro. Sísifo – Revista das Ciências da Educação, n.8, p.7-22, 2009.

MARQUES, Francine de Fátima da Cunha. Elementos do processo de constituição profissional de professores de física: um estudo a partir da licenciatura e das atividades iniciais de docência. Tese (Doutorado em Ensino de Ciências e Matemática) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2021.

REALI, Aline Maria de Medeiros Rodrigues; REYES, Claudia Raimundo. Reflexões sobre o fazer docente. São Carlos: EdUFSCar, 2009.

SILVA, Fernanda Keila Marinho da; COMPIANI, Maurício. A pesquisa na prática docente em projeto de formação continuada: ideias e práticas em debate. Educ. Soc., Campinas, v. 36, nº. 133, p. 1099-1115, 2015.

SILVA, Fernanda Keila Marinho da; GEBARA, Maria José Fontana. Interdisciplinaridade em contexto formativo de professores: possibilidades acenadas pela prática docente. In: COMPIANI, Maurício (Org). RIBEIRÃO ANHUMAS NA ESCOLA: pesquisa colaborativa entre escola e universidade gerando conhecimentos contextualizados e interdisciplinares. 1 ed., Curitiba – PR: Editora CRV, 2015.

TOZONI-REIS, Marília Freitas de Campos. Temas ambientais como “temas geradores”: contribuições para uma metodologia educativa ambiental crítica, transformadora e emancipatória. Educar, Curitiba, n. 27, p. 93-110, 2006.

CAPÍTULO 7

EDUCAÇÃO ALIMENTAR: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA COM EFEITO PRÁTICO

FOOD EDUCATION: AN EXPERIENCE REPORT WITH PRACTICAL EFFECT

 

DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.07

Submetido em: 13/05/2023

Revisado em: 20/05/2023

Publicado em: 23/05/2023

 

Maria Hipólito Almeida Pinheiro

Instituto Federal de Minas Gerais, Departamento de Educação, Arcos – Minas Gerais

http://lattes.cnpq.br/2811480115774423

Marcela de Melo Fernandes

Instituto Federal de Minas Gerais, Departamento de Educação, Arcos – Minas Gerais

http://lattes.cnpq.br/0040316589656094

 

 

 

Resumo

O termo saúde, pode ser definido por múltiplos aspectos, que combinados, auxiliam e beneficiam o bem-estar físico, mental, social e espiritual. Sob o ponto de vista do processo saúde-doença, as suas múltiplas dimensões e objetos de conhecimento envolvidos, aproximam a Educação Física Escolar, do tema transversal saúde, no currículo escolar. Portanto, o trabalho teve como objetivo proporcionar a conscientização e assimilação sobre alimentação, nutrição e das doenças relacionadas às deficiências nutricionais para promover autonomia e melhorar a qualidade de vida dos alunos. O presente relato de experiência, refere-se ao projeto educacional “Educação Alimentar: Um recurso didático para um efeito prático”, realizado durante três semanas. De maneira geral, os resultados se mostraram positivos quanto à adesão de um estilo de vida mais saudável, quanto à autonomia para tomar decisões sobre consumo de alimentos prejudiciais e benéficos para saúde, quanto à preocupação em relação às doenças relacionadas às deficiências nutricionais e principalmente quanto à participação e engajamento nas aulas. Em conclusão, a principal barreira que a Educação Física escolar tem esbarrado e encontrado dificuldades para transpassar é o fenômeno do sedentarismo, associado ao aumento da má alimentação. Portanto, medidas precisam ser tomadas para que os efeitos no futuro não sejam tão catastróficos.

Palavras-chave: Alimentação, Deficiências Nutricionais, Educação Física Escolar, Saúde.

Abstract

The term health can be defined by multiple aspects, which combined, help and benefit physical, mental, social and spiritual well-being. From the point of view of the health-disease process, its multiple dimensions and objects of knowledge involved, bring School Physical Education closer to the cross-cutting theme of health in the school curriculum. Therefore, the work aimed to provide awareness and assimilation about food, nutrition and diseases related to nutritional deficiencies to promote autonomy and improve the quality of life of students. This experience report refers to the educational project “Food Education: A didactic resource for a practical effect”, carried out for three weeks. In general, the results were positive regarding the adherence to a healthier lifestyle, regarding the autonomy to make decisions about the consumption of harmful and beneficial foods for health, regarding the concern regarding diseases related to nutritional deficiencies and especially regarding participation and engagement in classes. In conclusion, the main barrier that school Physical Education has encountered and found it difficult to overcome is the phenomenon of sedentary lifestyle, associated with the increase in poor diet. Therefore, measures need to be taken so that the effects in the future are not so catastrophic.

Keywords: Food, Nutritional Deficiencies, School Physical Education, Health.

 

 

Introdução

O termo saúde, pode ser definido por múltiplos aspectos, que combinados, auxiliam e beneficiam o bem estar-físico, mental, social e espiritual (ARAÚJO, 2017). Dessa maneira, sabe-se que não basta ‘não estar doente’ (sem presença de doença diagnosticada) para ter saúde, é preciso estar fisicamente disposto, mentalmente saudável e socialmente integrado (ARAÚJO, 2017).

Os termos saúde e doença têm uma relação estreita, mas ao mesmo tempo oposta. Portanto, sob o ponto de vista do processo saúde-doença, as suas múltiplas dimensões e objetos de conhecimento envolvidos, aproximam a Educação Física Escolar, do tema transversal saúde, no currículo escolar (MARINHO; SILVA; FERREIRA, 2014).  Contudo, apesar da relevância social em ambas as abordagens, a quantidade de informação sobre o tema tem se mostrado insuficiente para o desenvolvimento de comportamentos favoráveis à promoção e manutenção da saúde dos educandos (BRASIL, 1998; MARINHO; SILVA; FERREIRA, 2014)

A alimentação e a nutrição são requisitos básicos para serem abordados quando se trata de desenvolvimento e manutenção da saúde e da qualidade de vida dos educandos (BRASIL, 1999). Assim, é necessário que a inserção e a compreensão dos temas sejam iniciadas desde a infância, proporcionando uma base adequada para práticas alimentares, as quais podem ser preponderantes para a diminuição do risco de doenças relacionadas a deficiências nutricionais como: obesidade, anorexia, bulimia e outras, que podem vir a ser diagnosticadas a partir dessas (SICHIERI, 2000).

Em vista disso, a educação precisa ser pensada levando em consideração os aspectos envolvidos no cotidiano do aluno, e dos fatores que influenciam na formação de hábitos e atitudes desses educandos (BRASIL, 2018). De tal maneira que a relação entre a prática de atividades corporais e a recuperação, a manutenção e a promoção da saúde, devem ser embasadas nas experiências e condições pessoais do educando, no meio ao qual está inserido (BRASIL, 1998).

Assim, a Educação Física escolar acaba por tornar-se também responsável por, além de lidar com a cultura corporal do movimento, ter de lidar com alguns aspectos relativos aos conhecimentos procedimentais, conceituais e atitudinais do tema transversal saúde, incluindo alimentação e nutrição (BRASIL, 1998).  A Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2018), traz consigo algumas competências da Educação Física relacionadas ao termo saúde, como, por exemplo, a reflexão acerca das relações entre práticas corporais e os processos de saúde/doença e a alimentação e a promoção da saúde; a identificação de padrões de saúde, beleza e estética corporal, analisando, criticamente, os modelos disseminados pela mídia.  O currículo é o conjunto de atividades, para cuja existência, não basta apenas o saber sistematizado, é preciso criar as condições necessárias para que esse saber, seja transmitido e, acima de tudo, assimilado (CASTELLANI FILHO et al., 2014 apud SAVIANI, 1991, p.26).

No entanto, para que o saber seja de fato assimilado, é imprescindível compreender que os educandos, possuem diferentes estilos de aprendizagem. Isso dá-se porque cada indivíduo possui quatro etapas/ dimensões de aprendizagem, dividia em dois polos cada. Dessa maneira, existem 16 diferentes perfis, quando combinadas as dimensões de aprendizagem. Em cada etapa da aprendizagem, o indivíduo pode ser, na percepção: sensorial ou intuitivo; na entrada: visual ou verbal; no processamento: ativo ou reflexivo e no entendimento: sequencial ou global (PEREIRA; VIEIRA JUNIOR, 2013 apud FELDER; SILVERMAN, 1988). Assim, o educando recebe, processa e organiza o conhecimento, intrinsecamente, de acordo com sua personalidade e tipologia (PEREIRA; VIEIRA JUNIOR, 2013 apud LOPES,2002). Ensinar, utilizando diferentes metodologias de ensino, de modo a englobar os diferentes estilos de aprendizagem, possibilita a assimilação do saber por um número maior de alunos do que se usada apenas uma metodologia de ensino.

Nesse sentido, além de compreender os estilos de aprendizagem para um ensino melhor e do direcionamento dado pela BNCC, a educação básica conta também com os parâmetros nacionais curriculares (PCN’s), que buscam, através dos temas transversais, desenvolver a autonomia dos educandos, para que na vida adulta, sejam sujeitos conscientes e capazes de tomar decisões criticamente analisadas (BRASIL, 1998). Para (DARIDO, 2012), os temas transversais são problemas de emergência social na população brasileira e que buscam, em sua abordagem, encontrar soluções para sanar complicações geradas por eles, como doenças relacionadas à alimentação: obesidade, anorexia e bulimia. Portanto, o trabalho teve como objetivo proporcionar a conscientização e assimilação sobre alimentação, nutrição e das doenças relacionadas às deficiências nutricionais para diferentes estilos de ensino-aprendizagem, no intuito de promover autonomia para melhorar a qualidade de vida dos alunos.

Metodologia

O presente relato de experiência, refere-se ao projeto educacional “Educação Alimentar: Um recurso didático para um efeito prático”, realizado durante três semanas, na disciplina de Educação Física de uma escola pública da rede federal do município de Rio Pomba/ MG. Participaram trinta alunos da turma do 1° ano do ensino médio. A intervenção foi dividida em três etapas (uma por semana), sendo que cada nova etapa se iniciava após uma aula semanal. As aulas e a intervenção ocorreram na modalidade de Ensino Remoto Emergencial (ERE).

            A intervenção educacional, tratou do tema conscientização e assimilação sobre alimentação’, levando em consideração a disciplina de educação física (área da saúde), buscando integrar o conteúdo com diferentes estilos de ensino-aprendizagem dos alunos. Desde que muitos alunos têm perfis mais globais (compreendem o todo primeiro, para depois as partes) e tantos outros, têm perfis de entendimento analítico (necessário entender todas as partes para chegar a um entendimento global.  Nesse sentido, a intervenção teve duração de 3 semanas, onde cada uma representava uma etapa, e um produto final, como mostrado na tabela 1.

Primeira etapa: Explanação geral sobre gasto e consumo energético diário (GIANNINI, 2007). Preenchimento de registro alimentar 24h. Auxílio do aplicativo ‘TACO App: Tabela nutricional’.

Segunda etapa: Satisfação corporal, composição e adiposidade corporal, índices de aptidão física, estado nutricional e sintomas de anorexia e bulimia em adolescentes (BRAGGION; MATSUDO; MATSUDO, 2000; GIANNINI, 2007; MARTINS et al., 2010). Recomendações nutricionais gerais. Auxílio do aplicativo ‘IMC CALCULADORA’ e ‘TACO App’.

 

Terceira etapa:  Relação entre gasto energético e requerimento de energia diário para população adolescente brasileira de 14 a 18 anos, de acordo com o nível de atividade física (BRASIL, 1999; FREITAS et al., 2020; GIANNINI, 2007). Relação entre perfil alimentar e gasto/ requerimento energético em diferentes populações.

Produto final: Material em que os alunos conceituam sua percepção de saúde, doenças, alimentação, consumo energético e imagem corporal. Declarando-se a adesão (ou não) à intervenção e possíveis efeitos benéficos associados à intervenção e os conhecimentos adquiridos por meio de diferentes estilos de aprendizagem.

 

Tabela 1: Cronograma de conteúdo, estilo de aprendizagem e atividade da semana 1.

SEMANA 1 – RECORDATÓRIO ALIMENTAR

Parte 1

Impacto da pandemia de COVID-19 na alimentação e sedentarismo. Alimentação, doenças relacionadas e qualidade de vida.

Parte 2

Alimentação e nutrientes para qualidade de vida.

Parte 3

Recordatório alimentar de 24h.

 

SEMANA 2 – IMAGEM CORPORAL

Parte 1

Obesidade, anorexia e bulimia, e associação a doenças crônico-degenerativas. Índice de Massa Corporal (IMC).

Parte 2

Doenças relacionadas às deficiências nutricionais. Recomendações nutricionais gerais para uma alimentação saudável.

Parte 3

Respondendo à imagem corporal e identificando IMC.

DESAFIO: Adição de alimento saudável na alimentação da semana.

 

SEMANA 3 – PRODUÇÃO ANALÍTICA INDIVIDUAL

Parte 1

Avaliação qualitativa dos recordatórios alimentares. E orientações gerais sobre a relação gasto/ consumo energético.

Parte 2

Relação entre o perfil de consumo alimentar e composição corporal de atletas, população geral, obesos e sedentários.

Parte 3

Produto final: Apresentação sobre saúde, alimentação e doenças relacionadas; declarando os efeitos da intervenção, individualmente.

Fonte: As autoras (2023).

Resultados

Com intervenção pedagógica em questão, os resultados positivos foram melhores do que o esperado. Apesar de nem todos os alunos terem aderido de maneira integral à proposta, a maioria o fez. Dos alunos que aderiram, foi possível observar pelo nível de embasamento e conteúdo teórico, empreendidos em discussões e autoquestionamentos durante as aulas, que houve grande compreensão, interesse e dinamismo no que se refere à saúde, alimentação, níveis de atividade física e principalmente aos impactos gerados pela adesão (ou não) de um estilo de vida saudável.

Observou-se grande adesão ao consumo de verduras, legumes e frutas, identificados pelo recordatório alimentar de 24h. Além disso, após a apresentação do recurso do IMC, os alunos se mostraram empenhados em adquirir ou manter um estilo de vida mais saudável. Dessa maneira, pôde-se observar também que os alunos, motivados pelas aulas, compreenderam melhor a relação entre saúde e imagem corporal. Destaca-se ainda o fato de que muitos alunos não conheciam muitas das doenças crônico degenerativas que são ocasionadas, por exemplo pela obesidade. Além disso, a bulimia e anorexia não eram doenças as quais eles se mostravam interessados antes de saber os impactos que geravam no corpo.

De maneira geral, os resultados se mostraram positivos quanto à adesão de um estilo de vida mais saudável, quanto à autonomia para tomar decisões sobre consumo de alimentos prejudiciais e benéficos para saúde, quanto à preocupação em relação às doenças relacionadas às deficiências nutricionais e principalmente quanto à participação e engajamento nas aulas.  

Discussão

É preciso dosar e sequenciar o conteúdo, de modo que o aluno passe a compreendê-lo e dominá-lo. É preciso ter a competência para adequar o conteúdo à capacidade cognitiva, ao seu estilo de aprendizagem e à vivência social do aluno, ao conhecimento e às experiências dele enquanto sujeito histórico. 

Assim, cabe à Educação Física escolar, como área da saúde, a responsabilidade de lidar de forma específica com situações e conhecimentos relacionados às esferas conceituais, atitudinais, procedimentais, característicos do movimento corporal e a saúde. Nesse sentido, segundo (BRASIL, 1998).

A “preocupação e a responsabilidade na valorização de conhecimentos relativos à construção da autoestima e da identidade pessoal, ao cuidado do corpo, à nutrição, à valorização dos vínculos afetivos e a negociação de atitudes e todas as implicações relativas à saúde da coletividade, são compartilhadas e constituem um campo de interação na atuação escolar” (BRASIL, 1998).

Dessa maneira, é inegável o papel importante que a Educação Física escolar assume na vida das crianças que passam a entender conceitos relativos não só relacionados aos elementos da cultura corporal do movimento, mas também à saúde, levando em consideração à identidade sociocultural, pessoal e de grupo.  É possível trabalhar com os alunos, de forma simplificada, os conceitos relacionados à cultura corporal do movimento, à saúde e às diferenças de condicionamento físico entre eles. Para tal, existem propostas que podem ser adotadas para melhor desenvolvimento das atividades de trabalho como as atividades em grupo, a prática e adesão à diferentes exercícios físicos que trabalhem as capacidades de maneira isolada e, ainda mais importante, da relação desses exercícios com a saúde do corpo, de maneira crítica e consciente.

Em conclusão, a principal barreira que a Educação Física escolar tem esbarrado e encontrado dificuldades para transpassar é o fenômeno do sedentarismo, associado ao aumento da má alimentação que, com o aumento da tecnologia, cresce cada vez mais. Portanto, se medidas não forem tomadas para que os educandos se tornem autônomos na maneira de pensar a sua saúde e qualidade de vida, os efeitos no futuro poderão ser catastróficos.

Referências

ARAÚJO, C. E. Atividade física e exercício físico na promoção da saúde. 2017.

BRAGGION, G. F.; MATSUDO, V. K. R.; MATSUDO, S. M. M. Consumo alimentar, atividade física e percepção da aparência corporal em adolescentes. Revista Brasileira de Ciência e Movimento, v. 8, n. 1, p. 15–22, 2000.

BRASIL, M. DA E. Base Nacional Comum Curricular. 2018.

BRASIL, M. DA E. E DO D. Introdução aos parâmetros curriculares nacionais. Brasília: MEC-Secretaria de Educação Fundamental, 1998.

BRASIL, P. NACIONAL DE ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO. Política nacional de alimentação e nutrição. Brasília, DF: Ministério da saúde, 1999.

CASTELLANI FILHO, L. et al. Metodologia do ensino de educação física. [s.l.] Cortez Editora, 2014.

DARIDO, S. C. Temas transversais e a educação física escolar. Universidade Estadual Paulista. Caderno de formação: formação de professores didática dos conteúdos., v. 6, p. 76–89, 2012.

FREITAS, A. S. et al. Obesidade na adolescência: IMC, circunferência abdominal e aptidão física em escolares do Norte de Minas. RBONE-Revista Brasileira de Obesidade, Nutrição e Emagrecimento, v. 14, n. 84, p. 37–45, 2020.

GIANNINI, D. T. Recomendações nutricionais do adolescente. Adolescência e Saúde, v. 4, n. 1, p. 12–18, 2007.

MARINHO, J. C. B.; SILVA, J. A. DA; FERREIRA, M. A educação em saúde como proposta transversal: analisando os Parâmetros Curriculares Nacionais e algumas concepções docentes. História, Ciências, Saúde-Manguinhos, v. 22, p. 429–444, 2014.

MARTINS, C. R. et al. Insatisfação com a imagem corporal e relação com estado nutricional, adiposidade corporal e sintomas de anorexia e bulimia em adolescentes. Revista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul, v. 32, p. 19–23, 2010.

PEREIRA, E. J.; VIEIRA JUNIOR, N. Os Estilos de Aprendizagem no Ensino Médio a partir do Novo ILS e a Sua Influência na Disciplina de Matemática. [s.l: s.n.].

CAPÍTULO 8

A INFLUÊNCIA DOS ESTUDOS DE GALILEU NA COMPANHIA DE JESUS: UMA ABORDAGEM SOBRE A COLÔNIA PORTUGUESA

The influence of Galileo’s studies on the Company of Jesus: An approach to the Portuguese Colony

 

 

DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.08

Submetido em: 04/09/2023

Revisado em: 10/09/2023

Publicado em: 14/09/2023

 

João Paulo Pacheco Rodrigues

Programa de Pós- Graduação em História Universidade Estadual de Maringá.

PPH/UEM – Maringá-PR

http://lattes.cnpq.br/1673126629080517

 

 

 

Resumo

A Revolução Científica, foi marcada por um período de profundos avanços no pensamento científico e na metodologia experimental que ocorreu principalmente nos séculos XVI e XVII, essa teve uma relação complexa com a Companhia de Jesus. As escolas jesuítas, conhecidas por seu rigor acadêmico, desempenharam um papel fundamental na disseminação do método científico, da filosofia natural (ciência) e da matemática. Muitos estudiosos jesuítas eram astrônomos, matemáticos e cientistas. Os jesuítas incorporaram o método científico em sua abordagem educacional. Eles enfatizaram a observação cuidadosa, a experimentação e a lógica em suas aulas, contribuindo para a formação de jovens cientistas. Nesse artigo realizaremos uma breve discussão sobre a evolução do pensamento filosófico e científico e como ela está inserida no contexto de fundação da Companhia de Jesus.

Palavras-chaves: Revolução Científica, Galileu Galilei, Companhia de Jesus

Abstract

The Scientific Revolution was marked by a period of profound advances in scientific thinking and experimental methodology that occurred mainly in the 16th and 17th centuries, which had a complex relationship with the Society of Jesus. Jesuit schools, known for their academic rigor, played a key role in disseminating the scientific method, natural philosophy (science), and mathematics. Many Jesuit scholars were astronomers, mathematicians and scientists. The Jesuits incorporated the scientific method into their educational approach. They emphasized careful observation, experimentation and logic in their classes, contributing to the formation of young scientists. In this article we will carry out a brief discussion about the evolution of philosophical and scientific thought and how it is inserted in the context of the foundation of the Society of Jesus

Keywords: possimus, ducimus, architecto, distinctio, galisum

 

 

Introdução

O termo “revolução científica” foi criado por Alexandre Koyré[1], em 1939, e se configura dentro da história das ciências a partir do momento em que o conhecimento ganhou tons mais práticos e estruturados[2]. Porém, cabe ressaltar que, conforme Henrique Leitão, no artigo “Os primeiros telescópios em Portugal” há ainda controvérsias quanto à utilização do termo, muito utilizado pela história política para descrever os acontecimentos científicos ou culturais nesse período. No entanto, a denominação continua sendo empregada para descrever acontecimentos que se desabrocharam em seu bojo (o renascimento cultural, os escritos herméticos, o surgimento da imprensa e a reforma protestante) e serviram como base sólida para o da revolução científica.

Durante os séculos XVI e XVII, inicia-se uma mudança na natureza contemplativa do homem, principalmente a influenciada pelas descobertas de Galileu.  As revelações do físico ressaltam a utilização de instrumentos científicos (empíricos) para problematizar e não apenas observar questões ligadas à natureza e toda a vida terrestre.

  • Os estudos de Galileu e suas implicações filosóficas e religiosas.

No seu extenso arcabouço de experimentos e descobertas, o pai da ciência moderna (o matemático é assim denominado pelo contraste de sua obra com as pesquisas de Aristóteles) foi responsável pelos estudos iniciais do movimento uniformemente acelerado e do movimento do pêndulo, assim como a lei dos corpos, o princípio da inércia, o desenvolvimento do telescópio e a criação do heliocentrismo.

Galileu recebeu sua educação inicial em escolas jesuítas em Florença, Itália. A Companhia de Jesus era conhecida por suas instituições de ensino e teve uma influência significativa na educação na época. Essa educação jesuíta influenciou o seu pensamento inicial. A formação que Galileu recebeu nas escolas jesuítas enfatizava o método científico e a observação cuidadosa do mundo natural. Essa abordagem contribuiu para sua futura carreira como cientista e astrônomo.

Metodologia

Joseph Schwartz, na obra “O momento criativo: mito e alienação na ciência moderna” mencionam que em sua juventude, Galileu estudou na escola dominical de Vallombrosa, na Itália; posteriormente decidiu estudar matemática, abandonando os estudos em 1585, e mudou-se para Florença. Foi na região da Toscana, que Galileu inventou a balança hidrostática e descobriu o isocronismo do pêndulo, no qual Colin Ronan, na obra “História Ilustrada da Ciência: Universidade de Cambridge” originou o relógio de pêndulo.

No final da década de 1580 e início da década de 1590, em sua passagem pela Universidade de Pisa, Galileu desenvolveu pesquisas sobre as experiências de queda de corpos inclinados e estudos copernicanos, assim como outras temáticas ligadas à matemática e à física, marca registrada do italiano. Segundo Sezinando Luis Menezes e Célio Juvenal Costa, “após aprimorar a luneta, passou a utilizá-la para observações astronômicas. Com base na observação do mundo que o cercava, no conhecimento empírico, Galileu comprovou as teorias de Copérnico sobre o movimento dos planetas” (MENEZES; COSTA, 2012, p.1).

Constata-se na carta escrita de Galileu para Kepler[3], em 1597, que menciona estar pesquisando os estudos de Copérnico:

 

O vosso livro, doutíssimo, o qual me enviastes através de Paulus Amberger, eu recebi não há poucos dias, mas há apenas algumas horas; como o mesmo Paulus informou-me de seu próximo retorno à Alemanha, eu seria muito ingrato se não vos agradecesse imediatamente: eu recebi vosso livro o mais prazerosamente, à medida em que o considerei como prova de ter sido digno de vossa amizade. Até aqui eu apenas percorri o prefácio de vossa obra, mas, com base nisso, eu obtive alguma noção de sua intenção, e eu me congratulo em ter como associado no estudo da verdade alguém que é um amigo da Verdade. Pois é uma miséria que existam tão poucos que busquem a Verdade, e não pervertam a razão filosófica. Contudo não é este o lugar para deplorar as misérias de nosso século, mas agradecer a vós pelos argumentos engenhosos que encontrastes para provar a verdade (CARTA DE GALILEU A KEPLER 63 Pádua, 4 de agosto de 1597).

 

É fundamental ressaltar que na defesa pela teoria de Copérnico, Galileu contemplou em seus estudos, além do caráter matemático e físico, o filosófico. Conforme aponta Jerry Luis Soares:

 

Na sua defesa da teoria copernicana, Galileu sempre enfatizará, além do caráter matemático da teoria, o seu caráter filosófico, isto é, físico: o copernicanismo será compreendido por ele como um sistema de mundo, e por isso objeto de estudo da filosofia natural. Ele rejeitará as interpretações, então predominantes nos meios intelectuais, que impunham à astronomia em geral (e à teoria copernicana em particular), a condição de ser apenas uma disciplina de caráter técnico e instrumental, que teria por objetivo apenas “salvar os fenômenos”, sem se pronunciar a respeito da configuração real do Universo (SOARES, 2013, p.52).

 

Centralizaremos a nossa discussão sobre o desenvolvimento do telescópio[4]por Galileu Galilei. A importância do telescópio como instrumento de observação torna-se fundamental uma vez que o mesmo, segundo Henrique Leitão, “veio trazer evidência observacional de importância crucial para muitos debates que então ocupavam os estudiosos” (LEITÃO, 2000, p.108). 

O início do século XVII foi marcado pelo surgimento dos primeiros telescópios na Holanda. No entanto, é a partir de 1610 com o desenvolvimento por Galileu Galilei que o telescópio ganhou contornos notáveis no campo científico.  Embora não exista um consenso sobre o inventor do telescópio, é notável que somente a partir da experiência de Galileu que o telescópio se configurou como instrumento para a pesquisa e para a história das ciências.

Um dos primeiros telescópios, criado pelo físico italiano, tinha aptidão de aumentar determinados objetos em até nove vezes. Após diversas tentativas, outro instrumento foi elaborado, originando algo inédito para o período. Dessa vez, o telescópio criado por Galileu que possibilitava o aumento de visão em até 30 vezes. Para Henrique Leitão:

 

Embora o telescópio tenha sido construído e as suas notáveis potencialidades militares rapidamente percebidas desde setembro de 1608, quando Hans Lipperhe, o seu presumível inventor, o mostrou em denHaag ao Conde de Nassau, comandante chefe das forças da Republica, só em finais do ano seguinte o seu extraordinário poder como instrumento cientifico seria demonstrado. Essas primeiras lunetas eram certamente muito modestas. Recorde-se brevemente que mesmo os melhores telescópios construídos por Galileu no inicio de 1610 eram instrumentos de performances muito deficientes- uma observação que torna ainda mais notáveis as excepcionais observações realizadas pelo famoso físico italiano ( LEITÃO, 2000, p.11).

 

 

Essa ferramenta ajudou a impulsionar os estudos do astrônomo italiano, uma vez que possibilitou a observação da Lua, os planetas e outras estrelas. Foi durante esse período que Galileu pode constatar que a Lua não possuía uma superfície lisa, mas com grande número de crateras, que a via láctea não era composta por astros fixos, mas por um vasto conjunto de estrelas que se movia.

No entanto, a controvérsia maior sobre as teorias do filósofo grego refere-se à afirmação de que a Terra não era o centro do universo. Ao analisar os planetas e os satélites naturais, o físico realizou talvez uma de suas maiores descobertas, colocando em xeque a teoria teocêntrica de Aristóteles, adotada pela Igreja Católica naquele período (século XVII).

Galileu reuniu os resultados das suas observações e experimentos no livro Sidereus Nuncius (Mensageiro das Estrelas)[5].Ao observar as estrelas de Júpiter e outros astros celestiais, o físico constatou que elas não estavam estáticas. Quando oferecido o instrumento (luneta) ao clérigo, foi recusado imediatamente. Sobre essa negação, Sezinando Luis Menezes e Célio Juvenal Costa apresentam argumentos extremamente contemplativos:

Na situação representada por Brecht, esse personagem tinha consciência de que não poderia aceitar as ideias de Galileu. Admitir que os planetas se encontravam em movimento equivaleria a aceitar a noção de que o mundo estava em transformação. Assim, para o personagem, as observações sobre o movimento da Terra tornariam possível aos camponeses acreditar que eles também poderiam ser capazes de se movimentar, inclusive socialmente e, por exemplo, deixar de ser camponeses. Assim, os membros da Igreja não poderiam admitir a possibilidade do movimento dos orbes celestes (MENEZES; COSTA, 2012, p2).

 

Na imagem, a seguir, observamos outra constatação pelo físico: a ilustração das fases da Lua, em aquarela, elaborada por Galileu por meio da observação telescópica entre outubro de 1609 e janeiro de 1610.

 

 

 

Figura 1: Fases da Lua. Galileu Galilei. Domínio Público. Tamanho desta antevisão: 429 × 600 pixels. Outras resoluções: 171 × 240 pixels | 585 × 818 pixels.

Fonte: Galileo Galilei, Disegni originali delle Lune, 1609, Biblioteca Nazionale Centrale, Firenze.jpg

 

Ao analisar a Figura 1, podemos observar certo desequilíbrio geométrico no que tange às crateras reproduzidas por Galileu nas fases da Lua. Não existe consenso sobre a razão pela qual Galileu exagerou tanto no tamanho da cratera mostrada. São desconhecidas as razões para tal exagero, porém é cabível o argumento que ele foi elaborado com a finalidade de ressaltar o efeito da sobra na cratera, ou até mesmo que o exagero tenha acontecido por alguma falha no próprio instrumento de observação do astrônomo, que não abrangia toda superfície do corpo celeste.

Atentamos para as contribuições de Galileu Galilei. Estudando a relação entre os planetas e os satélites, Galileu percebeu que a Terra não era o centro do universo, como dizia Aristóteles em sua teoria teocêntrica, adotada pela Igreja Católica. Para Galileu, nosso planeta era apenas um astro orbitando ao redor do Sol. Foi a partir daí que passou a defender o heliocentrismo e começou a ter problemas com a Inquisição[6].

A relação entre Galileu e a Igreja Católica, da qual os jesuítas faziam parte, tornou-se tensa quando suas observações astronômicas e defesa do heliocentrismo (a ideia de que a Terra gira em torno do Sol) entraram em conflito com o geocentrismo (a ideia de que a Terra era o centro do universo) apoiado pela Igreja. Galileu enfrentou a Inquisição e foi condenado por heresia em 1633, sendo forçado a se retratar publicamente de suas crenças heliocêntricas.

A história de Galileu está intrínseca em um contexto no qual a Igreja Católica enrijeceu as suas políticas dogmáticas como forma de combate a outras doutrinas que despontavam no período como a reforma protestante[7]. O historiador Jerry Luis Soares aponta que Galileu era cristão e tinha relacionamento razoável com o papa Urbano VIII, no entanto essa condição não poupou o físico italiano de ser julgado pelo tribunal inquisitório mesmo adoecido.

Após uma audiência longa, Galileu foi condenado a renegar publicamente os seus escritos e condenado à prisão por tempo indeterminado. Posteriormente o físico conseguiu mudar a sua pena de prisão a um confinamento, primeiro no palácio do embaixador do grão-duque da Toscana, em Roma; em seguida, na casa do arcebispo Piccolomini, em Siena, e por último na sua própria casa de campo em Arcetri.

No entanto, suas ideias foram publicadas em países onde o protestantismo caminhava a passos largos, como a Holanda.  No final da década de 1630, quando estava completamente cego, Galileu publicou um de seus escritos mais relevantes discute temas relativos à constituição da matéria, as leis do movimento, o papel da experimentação, o movimento uniforme, a aceleração e as trajetórias parabólicas.

O físico faleceu em 1642, em Arcetri, na região da Florença, e foi enterrado na Basílica de Santa Cruz, local onde também foi sepultado o pintor renascentista, Michelangelo. O Papa João Paulo II expressou pesar pelos erros cometidos no caso de Galileu e reconheceu suas contribuições à ciência. Em 1992, a Igreja Católica formalmente reverteu a condenação de Galileu, reconhecendo que ele estava correto em suas teorias sobre o heliocentrismo.

 

  • Os jesuítas e a produção do conhecimento.

Para a filósofa Maria Lucia Arruda Aranha (2006), as consequências do processo inicial da revolução científica, no século XVI e XVII, acarretaram uma mudança no pensamento e nas relações humanas, principalmente no âmbito religioso (Reforma Protestante e a Contrarreforma), nesse contexto está inserido o papel fundamental da Companhia de Jesus. 

A Ordem de Santo Inácio de Loyola, (fundada em 1534 por um grupo de estudantes da Universidade de Paris), foi reconhecida pelo Vaticano por meio de Bula Papal em 1540, (mesmo ano em que se instalou em Portuga) e teve como finalidade desenvolver papel fundamental na ciência e na cultura. Esta ação deveria envolver não apenas o país luso, mas todo seu império.

A Companhia de Jesus “foi fundada como instrumento consciente ou não do ponto de vista de seus fundadores, da reforma da Igreja e dos novos de expansão do cristianismo católico” (MENEZES; COSTA, 2012, p374). Para o historiador Amailio Jr Ferreira [8], os jesuítas surgiram em um período tumultuado e com grandes transformações. Os séculos XV e XVI também foram conhecidos como períodos em que ocorreram as grandes navegações, em que mais do que conquistar novos territórios, era necessário também “conquistar” e difundir a religião cristã, que tinha a finalidade de levar a mensagem de Cristo e a bandeira do cristianismo para as mais distintas regiões do mundo, como Japão, Brasil, Peru e México.

 

A Companhia de Jesus surgiu nesse contexto histórico engendrado a partir do século 16. Canonizada pelo Papa Paulo III, por meio da Bula Regimini Militantis Ecclesiae (1540), a Ordem religiosa criada por Inácio de Loiola nasceu para apostolar no mundo secular com três objetivos muito bem definidos: defender o Papa, reconverter os cristãos, particularmente os reformados, e evangelizar os chamados “povos bárbaros” que habitavam os outros continentes (FERREIRA JR., p. 9, 2007).

 

O Colégio de Jesus foi fundado em 1542, um ano antes da publicação dos famosos livros de Copérnico e Vesálio. No mesmo ano foi erguido o Colégio das Artes, em Portugal, marcos do início do processo de expansão do conhecimento jesuítico. Cabe ressaltar que os principais componentes da formação da Companhia de Jesus pertenciam ao meio acadêmico, (muito antes de evangelizar) principalmente ligados às universidades da França.

Resultados e discussões

Foi imprescindível a contribuição dos jesuítas para um novo olhar do conhecimento no período moderno, por meio de estudos da geografia, astronomia e matemática. Assim, instigados pelo fundador Loyola, a busca pelo conhecimento acarretou a fundação e criação de muitas instituições de ensino pelo ocidente e oriente, com uma sistemática organização metodológica. O historiador português, Antônio Lopes, destaca inclusive que os jesuítas teriam sido os primeiros pensadores a perceber a necessidade de romper com os métodos aristotélicos da física.

No século XVI, mencionamos alguns jesuítas que se atrelavam em saberes da física, astronomia e mecânica, como Cristóvão Clávio[9] (1538 – 1612); professor de matemática, Manuel de Góis (1543 – 1597) e o italiano Matteo Ricci[10] (1552 – 1612) nos campos da física e cartografia, respectivamente.

Nos estudos em que os jesuítas foram preparados, disciplinas como a filosofia, teologia e ciências naturais foram fundamentais para a formação intelectual e diversificada dos padres. Aliás, cabe ressaltar que Rene Descartes, criador do princípio da geometria analítica foi aluno de jesuítas.

O historiador Jonathan Wright, na obra “Os Jesuítas; Missões, Mitos e História”, destaca a contribuição no campo das ciências da Companhia de Jesus. 

 

Os jesuítas contribuíram para o desenvolvimento do relógio de pêndulo, dos pantógrafos, barômetros, telescópios e microscópios refletores e para o desenvolvimento de campos científicos tão variados quanto o magnetismo, a ótica e a eletricidade. Observaram, em alguns casos antes de qualquer pessoa, os anéis coloridos na superfície de Júpiter, a nebulosa de Andrômeda e os anéis de Saturno. Teorizaram sobre a circulação sanguínea (independentemente de Harvey), da possibilidade teórica do voo, da maneira como a lua afetava as marés e da natureza ondulatória da luz. Mapas estelares do hemisfério Sul, lógica simbólica, medidas de controle de cheias nos rios Pó e Adige, introdução de sinais de mais e menos na matemática italiana – todas essas foram conquistas típicas dos jesuítas e cientistas tão influentes como Fermat, Leibniz e Newton não estavam sozinhos em incluí-los entre os seus mais louvados correspondentes (WRIGHT, 2006:198).

 

Assim como aconteceu na Europa ocidental, podemos observar exemplos de estudos e pesquisa sobre o desenvolvimento científico no Brasil colonial, empregado pelos padres jesuítas. A historiadora Viviane Caminha São Bento, doutora em história das ciências, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, afirma que a primeira noção de conhecimento científico no Brasil teria ocorrido em 1549, ano que marca a chegada dos jesuítas ao país.

A historiadora reforça que o extenso território nacional, praticamente, obrigou os membros da companhia a exercerem estudos sobre a física, astronomia, química, geografia e áreas da saúde. Logo, não apenas temáticas ligadas à espiritualidade eram postas em práticas na colônia de Portugal, embora essa fosse a maior finalidade dos padres.

Sobre o ensino de matemática, precursor com a chegada dos jesuítas, a historiadora pontua:

 

O ensino de Matemática no Brasil iniciou-se pela Lição de Algarismos ou primeiras operações. Em 1605, nos Colégios da Bahia, Rio de Janeiro e Pernambuco era ministrada a Aula da Aritmética que apareceu tempos depois, em 1757, no Colégio da Bahia com o status de Faculdade de Matemática. Dentre os matemáticos da Companhia que estiveram no Brasil destacaram-se Inácio Stafford, mestre de matemática do Colégio de Santo Antão de Lisboa que entre outras obras deixou a Geometria de Euclides – Elementos Matemáticos, livro de texto conhecido na Bahia, e Teoremas Matemáticos, impresso em Lisboa em 1636.

Manuel do Amaral, professor de matemática na Universidade de Coimbra que chegou ao Maranhão em 1690 por pedido de missão. Jacques Cocle (JacoboCocleo), professor de matemática em Portugal e no Brasil cartógrafo valoroso. E, Valentin Stansel (Valentim Estansel ou Valentin de Castro), professor de matemática nas Universidades de Praga, Olmutz e Elva e também da Aula da Esfera do Colégio de Santo Antão de Lisboa, que viveu 42 anos no Brasil. O padre Stansel, estudado pelo historiador Carlos Ziller, exerceu na colônia intensa atividade de matemático e cientista (SÃO BENTO, 2013, p.4).

 

 

Os estudos jesuíticos no Brasil não estavam associados apenas à matemática, mas também a outros campos como a astronomia com o Padre Antonio Vieira, nas áreas de saúde, principalmente, na área da farmacologia e medicina, em que elementos da natureza do Brasil eram incorporados em suas pesquisas, conforme ressaltou Serafim Leite:

 

A necessidade local obrigou, pois os jesuítas a terem abundante provisão de medicamentos; e também logo a procurarem os que a terra podia dar, com as suas plantas medicinais, que começaram a estudar e a utilizar em receitas próprias, como as do Irmão Manuel Tristão de que Purchas dá notícia em 1625. Destes remédios e tisanias, iniciadas no século XVI, se foi pouco e pouco ampliando a preparação de outros, com ingredientes europeus e da terra, até se estabelecer a farmacopeia brasileira (LEITE, 1953:86).

É importante ressaltar que o cristianismo que aportou no oceano atlântico era extremamente lúdico e festivo. Nestor Canclini (1983) argumenta: tais celebrações que eram realizadas nesse período estavam imbricadas à “totalidade da vida de cada comunidade”, incluindo-se a sua “organização econômica (…) suas estruturas culturais e as suas relações políticas” (1983, p. 54).

 Pois, além de manifestações lúdicas, esses ritos expressavam comportamentos, valores e visões de mundo de um grupo e tinham no catolicismo uma expressão inigualável desde os tempos da colonização, representando para o Estado português uma forma de agregação sociocultural, na qual, além da experiência comunitária religiosa, ocorriam trocas culturais com diversas faces e sentidos.

Atentamos para a difusão do conhecimento por meio das ações jesuíticas no Brasil. Outro indicador da produção científica da Companhia de Jesus é expresso por meio das cartas escritas por Fernão Cardin que:

 

Inclui uma seção inteira relacionada à medicina com um conteúdo classificado pelos seguintes temas: clima e feridas; feridas na perna, na cabeça; mortandade e mortalidade infantis, na Baía; diferença de salubridade entre as várias terras do país, entre outros” (SÃO BENTO,2013, p.7).

 

Tratamento de doenças, como a flebotomia e doenças venéreas, era registrado nas cartas endereçadas a Portugal. Segundo São Bento (2013), alguns medicamentos vinham de terras lusas. No entanto, as ações de piratas e dificuldades da navegação impediam que muitos navios com medicamentos aportassem nas terras brasileiras.

Segundo Serafim Leite (2000), livros, acervos documentais, bibliotecas (bem estruturadas com obras sobre pensadores como Clávio, Kircher, Newton e Descartes), e colégios também foram criados nesse período em um processo de propagação do conhecimento, em alusão ao que era difundido na Europa. São exemplos o Colégio da Bahia, criado no final século XVII, com um acervo de mais de 3 mil livros.

Considerações Finais

Nesse artigo, analisamos como a revolução científica foi fundamental para uma mudança da concepção do conhecimento e como nesse contexto a Companhia de Jesus está inserida. A relação entre a Revolução Científica e a Companhia de Jesus foi caracterizada por um profundo envolvimento dos jesuítas na promoção da educação científica, na aplicação do método científico e em contribuições significativas para o avanço do conhecimento científico. Apesar de momentos de conflito, a relação entre a Igreja Católica e a ciência evoluiu ao longo do tempo, resultando em um reconhecimento crescente das contribuições dos jesuítas para a ciência e a educação.

Vista como reacionária desde sua fundação no século XVI e até contrária aos avanços da ciência, os jesuítas passaram a ter sua atuação reavaliada nos últimos 25 anos, quando os historiadores passaram a ressaltar a importância da companhia de Inácio de Loiola, na idade moderna e, principalmente, das suas ações nas Américas Portuguesa e Espanhola.

No âmbito das missões jesuítas na América Latina e em outras partes do mundo, os jesuítas coletaram dados astronômicos detalhados, incluindo observações de cometas e estrelas. Isso não apenas contribuiu para o entendimento científico, mas também teve implicações na determinação precisa das coordenadas geográficas. Vários jesuítas fizeram importantes contribuições científicas durante a Revolução Científica. Por exemplo, o padre jesuíta Christoph Scheiner fez observações detalhadas do Sol e foi um dos primeiros a observar as manchas solares. O padre Athanasius Kircher contribuiu para diversas áreas do conhecimento, incluindo óptica e geologia.

 Na colônia portuguesa e em outros países da América do Sul, os jesuítas desenvolveram técnicas nas áreas da saúde, como a manipulação de plantas medicinais e o tratamento de doenças já supracitadas. Além de pesquisas e estudos sobre astronomia, física e matemática.

Foi com os jesuítas que a educação colonial deu seus primeiros passos, com a construção de bibliotecas e colégios no litoral baiano que possuíam acervo diversificado e ligado a discussões que aconteciam na Europa, como os princípios de Galileu.

Referências bibliográficas

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GALILEI, Galileo. Scritture in difesa del sistema copernicano. In: FAVARO, A. (Ed.). Edizione nazionale delle opere di Galileo Galilei. Firenze: G. Barbèra, 1932 [1613-1616]. v. 5, p. 261-412.

LEITÃO, Henrique, “Os Primeiros Telescópios em Portugal. The First Telescopes in Portugal”, Actas do 1º Congresso Luso-Brasileiro de História da Ciência e da Técnica (Évora: Universidade de Évora, 2001) pp. 106-118.

LEITE, Serafim. Artes e Ofícios dos Jesuítas no Brasil (1549 – 1760). Lisboa: Brotéria, 1953.

LEITE, Serafim. História da Companhia de Jesus no Brasil. Belo Horizonte – Rio de Janeiro: Editora Itatiaia, 2000.

LOPES, António, “Os Jesuítas pioneiros relativamente a Galileu?”, Brotéria, 5-6, (1988) pp. 499-518.

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MOSCHETTI, Marcelo. (2010). “Galileu e o plano inclinado: geometria, medidas e propaganda”: SCHWARTZ, Joseph. O momento criativo: Mito e alienação na ciência moderna. São Paulo: Best Seller/Círculo do Livro, 1992. 1 vol. vol. 1.

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RONAN, Colin A.. História Ilustrada da Ciência: Universidade de Cambridge. 1 ed. São Paulo: Círculo do Livro, 1987. 4 vol. vol. III – Da Renascença à Revolução Científica.

SÃO BENTO. Viviane Carminha.  A Companhia de Jesus e a cultura cientificam na colônia. ANPUH. 2013. Natal-RN

SOARES.  Jerry Luiz. A defesa do copernicanismo por Galileu Galilei. Dissertação.PPH/UFM.2012

[1]Alexandre Koyré nasceu na cidade Taganrog, no dia29 de agosto de 1892 e faleceu no dia 28 de abril de 1964 em Paris.  Foi um pesquisador que se dedicou aos estudos sobre a história e filosofia da ciência.

[2]Não é finalidade deste artigo realizar uma discussão minuciosa sobre as causas e origens da revolução científica, mas apontar alguns dos seus desdobramentos (como a criação do telescópio), principalmente em solos lusitanos e como ele se aplicou no movimento de expansão ultramarina dos países ibéricos.

[3]Johannes Kepler nasceu em Weil der Stadt, na Alemanha, no dia 27 de dezembro de 1571 e faleceu em Ratisbona, em 15 de novembro de 1630.  Astrônomo e matemático, considerado uma das figuras mais importantes da revolução científica, por ter formulado as três leis fundamentais da mecânica celeste, conhecidas como leis de Kepler.

[4] No site do Instituto e Museu da História e da Ciência, em Florença, Itália é possível fazer uma simulação virtual da luneta de Galileu. Para acessar clique neste link: http://brunelleschi.imss.fi.it/esplora/cannocchiale/dswmedia/simula/esimula1.html

[5]Em seu livro Sidereus Nuncius (Mensageiro das Estrelas), em que relata as suas descobertas sobre o relevo da Lua, a composição estelar da Via Láctea e os satélites de Júpiter, Galileu se refere aos satélites de Júpiter como “quatro planetas até” então nunca vistos”, e os denomina de “Medicea Sidera” (Astros Mediceus) em homenagem a Cósimo de Médici, grão-duque da Toscana, a quem dedica o livro. A publicação do Sidereus Nuncius foi inicialmente recebida com desconfiança pelos cientistas aristotélicos, que negavam a existência dos satélites de Júpiter e recusavam-se a olhar pelo telescópio, alegando que ele produzia efeitos caleidoscópicos. Apesar disso, Kepler, que já era um dos astrônomos mais respeitado da época, deu imediato aval às descobertas de Galileu, enviando-lhe uma carta confirmando a existência dos satélites.

Disponível em:  http://www.if.ufrgs.br/mpef/mef008/aulas_11/Galileu_observacoes_tel_v3.htm

[6]No ano 2000, o Papa João Paulo II emitiu finalmente um pedido formal de desculpas por todos os erros cometidos pela Igreja Católica nos últimos 2.000 anos, incluindo o julgamento de Galileu Galilei pela Inquisição. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u73742.shtml

[7]Cabe ressaltar, conforme Menezes e Costa (2012), a Igreja Católica não era, em início, contrária aos estudos sobre da natureza.

[8]Amarilio Ferreira Jr. é Professor Titular do Departamento de Educação da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Realizou doutorado em História Social pela Universidade de São Paulo (USP) e estágio de pós-doutorado em História da Educação no Institute of Education da University of London (Bolsa FAPESP), Instituição com a qual mantém vínculo de Academic Visitor no International Centre for Historical Research in Education da University College London (https://blogs.ucl.ac.uk/ichre/academic-visitors/). É bolsista de produtividade em pesquisa do CNPq e credenciado no Programa de Pós-Graduação em Educação da UFSCar (mestrado e doutorado), com ênfase em História, Filosofia e Sociologia da Educação. No âmbito da pesquisa tem produzido nas seguintes temáticas de História da Educação: educação jesuítica colonial, políticas educacionais da ditadura militar, movimento sindical dos professores da escola pública e educação soviética. O professor-pesquisador defende a universidade pública, laica, gratuita e de qualidade. http://lattes.cnpq.br/0748545841167046

[9] Estudou no colégio dos jesuítas em Coimbra, entre 1556 e 1560 e foi um dos maiores responsáveis pela propagação da obra do português Pedro Nunes, na Europa.

[10]Ele é considerado o fundador das modernas missões católicas na China, contribuindo de modo fulcral para a introdução do catolicismo na China.

CAPÍTULO 9

QUANTO VALE NOSSAS VIDAS? – UMA ABORDAGEM CTS DOS PROCESSOS DE MINERAÇÃO (EXPLORAÇÃO DA TERRA E DA FORÇA DE TRABALHO) A PARTIR DOS CRIMES AMBIENTAIS DE MARIANA E BRUMADINHO

HOW MUCH ARE OUR LIVES WORTH? – A CTS APPROACH TO MINING PROCESSES (LAND EXPLOITATION AND WORKFORCE) FROM THE ENVIRONMENTAL CRIMES OF MARIANA AND BRUMADINHO

 

 

DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.09

Submetido em: 30/09/2023

Revisado em: 04/10/2023

Publicado em: 12/10/2023

 

Maria Eduarda Tavares de Moura

Universidade Federal Rural de Pernambuco, Departamento de Química, Recife-PE

http://lattes.cnpq.br/2424831962164468

 

 

 

Resumo

A abordagem CTS consiste em uma perspectiva de investigação filosófica e sociológica da ciência, tomando como frente três grandes aspectos: o campo da pesquisa, propondo uma reflexão sobre os moldes academicistas de produção científica; o campo da política pública, facilitando discussões democraticamente necessárias em questões tocantes à política científico-tecnológica e o campo da educação. Neste trabalho, estabelecemos historicamente uma visão da exploração da terra e da força de trabalho a partir dos processos da indústria de mineração, reconhecendo as origens e fundamentos dos principais processos tecnológicos de tratamento dos minérios explorados no Brasil, destacando a importância socioeconômica da mineração na vida dos brasileiros e discutindo acerca das políticas públicas e como elas influenciam na efetivação das legislações ambientais. Este trabalho foi aplicado na Escola Técnica Estadual Alcides do Nascimento Lins, em Recife-PE, em uma oficina do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID). A partir disso, o projeto foi engajado na construção de discussões sobre os eixos ambiental, social, econômico e ético que tangenciam os crimes ambientais de Mariana e Brumadinho. Partindo da análise das atividades aplicadas na oficina, fica claro que o uso da abordagem CTS no Ensino de Química fomenta um processo mais crítico e reflexivo na construção do conhecimento.

Palavras-Chave: Vale, mineração, exploração, crime ambiental, CTS.

Abstract

The CTS approach consists of a perspective of philosophical and sociological investigation of science, taking three major aspects as a front: the field of research, proposing a reflection on the academic models of scientific production; the field of public policy, facilitating democratic discussion and resolution of issues pertinent to scientific-technological policy and the field of education. In this work, we historically establish a vision of the exploitation of land and the workforce based on the processes of the mining industry, recognizing the origins and foundations of the main technological processes for treating ores explored in Brazil, highlighting the socioeconomic importance of mining in life of Brazilians and discussing public policies and how they influence the implementation of environmental legislation. This work was applied at the Alcides do Nascimento Lins State Technical School, in Recife-PE, in a workshop of the Institutional Teaching Initiation Scholarship Program (PIBID). From this, the project was engaged in building a discussion on the environmental, social, economic and ethical axes that touch on the environmental crimes of Mariana and Brumadinho. Based on the analysis of the activities applied in the workshop, it is clear that the use of the CTS approach in Chemistry Teaching encourages a more critical and reflective process in the construction of knowledge.

Keywords: Vale, mining, exploration, environmental crime, CTS.

 

 

Introdução

          Enquanto campo de conhecimento, a Química possibilita expandir a concepção da natureza e suas transformações, bem como, compreender as relações dos avanços científicos, tecnológicos e suas implicações na sociedade (ZANOTTO; SILVEIRA; SAUER, 2016).

Contudo, segundo Bouzon et al., (2018)

A Química ainda é vista como uma ciência de difícil compreensão pela maioria das pessoas. Um dos motivos que justificam este pensamento é a forma meramente propedêutica pela qual os conteúdos desta disciplina são ensin ados aos alunos, de maneira descontextualizada e fragmentada, tornando-se distante de seu cotidiano. Tendo isso em vista, o ensino focado na tríade Ciência-Tecnologia-Sociedade (CTS) vem ao encontro desta problemática, como uma abordagem que busca superar esse quadro e que se preocupa em ampliar o processo de ensino-aprendizagem para além dos muros da escola, se utilizando da compreensão dos conteúdos não com um fim em si mesmo, mas como um meio capaz de promover a formação crítica do indivíduo (BOUZON et. al., 2018).

 

O surgimento da CTS veio para delinear o processo científico – tecnológico, iniciado primeiramente na Europa, Estados Unidos, Canadá e Austrália, iniciando-se no Brasil só na década de 70, tendo uma grande importância na educação para proporcionar a formação de amplos seguimentos sociais com as novas imagens da ciência e tecnologia no contexto social (VAZ, 2009).

No campo da educação, novos programas e disciplinas CTS foram introduzidos no ensino médio e universitário, referidos à nova imagem da ciência e da tecnologia, em que conteúdos científicos e tecnológicos são trabalhados a partir de uma visão crítica e da utilização de temas de relevância social, estabelecendo-se relações entre os seus aspectos históricos, éticos, econômicos, políticos e sociais (VON LINSINGEN, 2007; AULER; BAZZO, 2001; SANTOS; MORTIMER, 2000; SANTOS; SCHNETZLER, 2000 apud GONDIM; SANTOS, 2016).

 

A partir disso, segundo LIMA et al., (2015) as Oficinas Temáticas são um instrumento facilitador para integração de diferentes áreas do conhecimento, tal como prevê o enfoque que caracteriza o movimento CTS, cuja finalidade é formar cidadãos críticos, com conhecimentos científicos e tecnológicos suficientes para atuação na realidade física e social.

A oficina, no sentido que se quer atribuir, pode representar um local de trabalho em que se buscam soluções para um problema a partir dos conhecimentos práticos e teóricos. As oficinas são temáticas, na perspectiva de tratar de uma dada situação problema que, mesmo tendo um dado foco, é multifacetada e sujeita a diferentes interpretações (MARCONDES, 2008).

As principais características pedagógicas de uma oficina temática, segundo Marcondes (2008), podem, assim ser resumidas, facilitando o processo de ensino e aprendizagem das Ciências, como demonstrado na Figura 1:

  • Utilização da vivência dos alunos e dos fatos do dia a dia para organizar o conhecimento e promover aprendizagens.
  • Abordagem de conteúdos da Química a partir de temas relevantes que permitam a contextualização do conhecimento.
  • Estabelecimento de ligações entre a Química e outros campos de conhecimento necessários para se lidar com o tema em estudo.

Figura 1 – Oficinas temáticas e suas perspectivas.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Fonte: Marcondes (2008).

 

Dessa maneira, em uma oficina temática, o cotidiano é problematizado e revisitado nas atividades propostas, isto é, estudado à luz do conhecimento científico e de outros relativos a aspectos sociais, históricos, éticos que possam auxiliar a compreensão da situação problema em foco (VILCHES et al., 2001; GIL-PÉREZ et al., 2005).

 

Visualização da construção histórica e social da exploração da terra e da força de trabalho a partir dos aspectos dos processos de mineração no Brasil

 

Passados 300 anos de exploração mineradora no estado de Minas Gerais, não há como negar a importância desta atividade na formação do estado. Durante 80 anos o Estado foi responsável por produzir cerca de dois terços do ouro e uma grande quantidade de gemas e diamantes que eram extraídos no país e esse fato contribuiu significativamente para o crescimento populacional no estado (QUEIROZ; OLIVEIRA, 2017).

Mostra-se importante pontuar o desenvolvimento continuado e progressivo da ciência e tecnologia na época, a partir do espectro das empresas que aqui aportaram tecnologia e estudos nas mais diversas áreas. Inicialmente procurando aplicar os mesmos métodos com os quais tiveram sucesso nas suas pesquisas externas na Europa, adaptando-os, depois, de forma mais satisfatória às nossas condições, ou abandonando-os por serem inaplicáveis aqui. Além disso, este avanço proporcionado pela comunicação entre as empresas, estudiosos e técnicos da mineração foi impulsionado, a partir da década de 1970, com a criação do Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM).

Apesar de toda contribuição das práticas mineradoras para o desenvolvimento do estado, vale ressaltar que desde o século XVII a exploração mineral veio acompanhada da exploração de mulheres e homens, escravos e pobres, que trabalhavam sob condições extremas para satisfazerem os lucros dos grandes mineradores da época, num cenário de grande desigualdade social (QUEIROZ; OLIVEIRA, 2017).

Mesmo com mais de três séculos desde o início das atividades mineradoras no estado e país, não obstante ainda exista trabalho escravo, as violações permanecem em diversas estruturas. Protegidas por esquemas políticos e econômicos e pelo discurso do desenvolvimento, as grandes mineradoras têm feito parte de uma triste história que se relaciona com os graves impactos causados por sua atuação, explorando recursos naturais e forças de trabalho sem qualquer limite ou controle (QUEIROZ; OLIVEIRA, 2017).

O crime ambiental de Mariana ocorreu em 5 de janeiro de 2015 e, talvez, seja um dos maiores exemplos de como a atividade mineradora atual pode representar um risco real de violação de direitos da população. O rompimento da barragem na cidade de Mariana causou, segundo estudo, 19 mortes e cerca de 536 lesionados ou feridos de alguma forma (QUEIROZ; OLIVEIRA, 2017).

 

Até hoje os afetados colhem frutos desta tragédia anunciada que de início comprometeu o fornecimento de água e comida, ocasionou problemas na regulação do clima, levando a proliferação de doenças transmitidas por vetores diversos, presença de animais peçonhentos, que tiveram seus habitats destruídos, proliferação de doenças respiratórias, a partir da inalação de material particulado proveniente do rejeito da mineração, impactos psicossociais e mentais. Além disso, a população dos índios Krenak teve seu modo de vida, cultura e religião afetados pelo desastre. Sem ainda mencionar os impactos socioeconômicos e ambientais e os impactos futuros de uma forma geral para a população atingida direta ou indiretamente por esse acidente (QUEIROZ; OLIVEIRA,2017).

 

Infelizmente, no dia 25 de janeiro de 2019 nos deparamos com mais um cenário de devastação socioambiental ocasionado pelo rompimento da barragem I da Mina do Feijão, em Brumadinho também em Minas Gerais, confirmando um total de 242 mortos e milhares de pessoas afetadas por aspectos como a falta de água potável e a morte do rio Paraopeba. Parece razoável perceber que não aprendemos com o erro passado, carregando nas costas uma tragédia anunciada ainda maior do que ocorreu em 2015 e que mais uma vez os esquemas políticos e econômicos do Estado juntamente com empresas privadas como a Vale se colocam acima das demandas da população brasileira.

Apesar dos diversos aspectos da atividade mineradora acima relatados, que poderiam ser apontados como negativos, seja do ponto de vista histórico ou contemporâneo e do ponto de vista dos trabalhadores, parece-nos claro que o país ainda não pode prescindir da produção oriunda desse setor da indústria. Há cidades inteiras cuja dinâmica econômica depende da atividade mineradora e, portanto, seu fim repentino estaria virtualmente fora de cogitação (QUEIROZ; OLIVEIRA,2017).

É justamente a complexidade do tema e a inexistência de uma solução simples que torna sua abordagem no ensino de ciências tão potencialmente frutífera (QUEIROZ; OLIVEIRA,2017).

 

Metodologia

A oficina foi proposta mediante apresentação de um projeto escrito como implementação do Projeto Ensino Médio Inovador (PROEMI) na Escola Técnica Alcides do Nascimento Lins como atividade do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência da Universidade Federal Rural de Pernambuco (PIBID-UFRPE). O projeto contou com a participação de bolsistas de Química, Biologia e História orientados pelos seus coordenadores institucionais e professores de área. As atividades foram realizadas com 20 (vinte) alunos de uma turma do 2º ano do Ensino Médio. Os encontros tinham 1h30min de duração e foram realizados no período de março a junho de 2019.

Inicialmente o projeto foi dividido em quatro blocos, sendo eles: Inquietações iniciais; Aspectos históricos, sociológicos e filosóficos da mineração brasileira; A correlação entre a Química e a mineração e os Impactos ambientais e aspectos biológicos da atividade mineradora no Brasil. Cada bloco foi trabalhado e elaborado por todos os bolsistas, buscando sempre correlacionar as três áreas do conhecimento com o aspecto específico abordado em cada encontro.

O primeiro bloco contou com três encontros, o segundo com dois, o terceiro com três, o quarto com dois encontros. Além disso, foi realizada uma aula de campo no Espaço Ciência, uma aula de revisão dos aspectos abordados durante todo projeto e a preparação e apresentação da culminância.

Resultados e Discussão

Inicialmente foram realizadas atividades introdutórias apresentando as ideias e objetivos do projeto, buscando evidenciar as concepções informais dos alunos atrelando os crimes ambientais de Mariana e Brumadinho com os âmbitos éticos, sociais, econômicos e ambientais. Além disso, apresentamos as definições de crime, tragédia, desastre e acidente, fomentando discussões acerca das posições conceituas sobre esses acontecimentos, evidenciando os posicionamentos da mídia, da empresa Vale, da população local e das autoridades. Neste primeiro momento também foi aplicado um questionário.

 

 

 

 

Tabela 1 – Cronograma de elaboração do primeiro bloco da oficina temática.











Bloco 1

    Encontros

Atividades

1º encontro (28/02)



 

2º encontro (07/03)






3º encontro (14/03)

Apresentação do projeto e dinâmica de interação inicial.

 

 

 

Sensibilização através do vídeo “Tão longe, tão perto onde          Mariana e Brumadinho se encontram” e da música “Quanto vale a vida” de Engenheiros do Hawaii; jogo de palavras e elaboração de um brainstorming sobre os eixos geradores da oficina.

 

Roda de diálogos trazendo as concepções iniciais dos alunos sobre os aspectos de Mariana e Brumadinho e os conceitos       de       crime, tragédia, desastre       e            acidente; aplicação do questionário e encenação de um jornal a partir de notícias disponibilizadas.

Fonte: Autoria própria.

 

No segundo momento da oficina as atividades realizadas buscaram apresentar e discutir o desenrolar da mineração brasileira ao longo da história do país, dando destaque nos impactos e consequências desse processo, utilizando de registros como fonte histórica. Além disso, fomentou-se a reflexão sobre a relação homem e natureza, pontuando a primitiva atração do homem pelo ouro desde a civilizações antigas. Ademais, foi analisado o processo de mineração no solo brasileiro, com foco no período colonial e do império, abordando o progresso técnico – científico e o impacto na história dos dias atuais.

 

Tabela 2 – Cronograma de elaboração do segundo bloco da oficina temática.

 











Bloco 2

Encontros

Atividades

4º encontro (21/03)










5º encontro (28/03)

Apresentação e discussão sobre o desenrolar da mineração brasileira ao longo da história do país, dando destaque aos impactos e consequências desse processo.

 

 

 

 

 

 

Utilização de registros como fonte histórica acerca de crimes ambientais e através desses registros iniciou uma roda de reflexões    a   respeito   da

relação Homem x Natureza.

Fonte: Autoria própria.

No terceiro momento da oficina, as atividades elaboradas buscaram abordar o processo de mineração, reconhecendo os conceitos químicos presentes no referido processo. Buscou- se identificar o funcionamento geral das atividades mineradoras no Brasil, investigando como ocorreu o rompimento das barragens de Mariana e Brumadinho e abordando sobre a definição de rejeitos de minérios e sua composição.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Tabela 3 – Cronograma de elaboração do terceiro bloco da oficina temática.

 















Bloco 3

Encontros

Atividades

6º encontro (04/04)








7º encontro (11/04)








8º encontro (25/04)

Identificação dos aspectos gerais do processo das atividades mineradoras, relacionando as questões éticas, sociais, econômicas e ambientais envolvidas com os fatos ocorridos em Mariana e Brumadinho.

 

 

Organização dos conceitos relacionados a mineração e suas tecnologias de forma lúdica e dinâmica. A aula foi desenvolvida com a aplicação de jogos didáticos e a construção de um mapa conceitual.

 

 

 

Realização      de experimentações pautando a utilização dos óxidos e características macroscópicas e microscópicas relacionadas aos minerais.

Fonte: Autoria própria.

 

Neste último momento da oficina as atividades realizadas tiveram por objetivo apresentar os mais diversos problemas ambientais ocasionados pelos rompimentos das barragens nas regiões e Mariana e Brumadinho, explicando sobre a interdependência dos seres vivos bem como os fatores contribuintes para o desequilíbrio ambiental pós devastação, indicando alternativas de recuperação ambiental e abordando sobre as políticas públicas e legislações em defesa do meio ambiente que existem atualmente.

 

 

 

 

 

 

 

Tabela 4 – Cronograma de elaboração do quarto bloco da oficina temática.

 




Bloco 4

Encontros

Atividades

9º encontro (02/05)









10º encontro (09/05)

“Quanto VALE um pedaço de Mata Atlântica perdido?”. A aula foi estruturada abordando as temáticas

problematizadoras, tratando de aspectos como a bioacumulação dos metais pesados e o assoreamento de rios.

 

 

 

 

Realização    de experimentação sobre assoreamento            e esquematização                      de fluxogramas sobre os conceitos teóricos abordados.

Fonte: Autoria própria.

Em um último momento da oficina, foi realizada uma aula em campo no Espaço Ciência com o objetivo de apresentar aos alunos alguns desafios e perspectivas da educação ambiental no Brasil. A apresentação da trilha ecológica buscou evidenciar alguns aspectos sobre poluição, desmatamento e consequências desses processos, além de tratar um pouco da relação homem e natureza e o papel de cidadão como parte integrante da sociedade em uma reflexão de pertencimento ao meio em que vivemos.

 

 

 

 

 

Figura 2 – Aula de campo no Espaço Ciência.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Fonte: Autoria própria.

 

Além disso, o projeto foi finalizado com a realização de uma culminância para toda a escola e comunidade. Na culminância os alunos elaboraram uma linha do tempo apresentando todos os momentos do projeto, aplicaram o jogo didático que foi elaborado pelos iniciantes à docência durante o terceiro bloco do projeto, realizaram uma oficina de simulação de assoreamento dos rios e propuseram um jogo de perguntas e respostas ao final da apresentação.

Figura 3 – Culminância da oficina Quanto VALE nossas vidas?



 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Fonte: Autoria própria.

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Considerações Finais

A partir dos resultados mencionados acima, a proposta apresentada na construção desta oficina temática a partir de uma abordagem CTS mostrou-se significativamente importante no processo de ensino-aprendizagem, pois viabilizou a expansão sobre a concepção da natureza e suas transformações, bem como, a compreensão dos aspectos químicos que se relacionam com os avanços científicos, tecnológicos e suas implicações na sociedade. Assim como afirma Marcondes (2008), em conjunto com a análise dos resultados obtidos, a construção desta oficina temática possibilitou a utilização da vivência dos alunos e dos fatos do dia a dia para a organização do conhecimento e a promoção de aprendizagens, abordando os conteúdos da Química a partir de temas relevantes que permitam a contextualização e estabelecimento de ligações entre essa ciência e outros campos de conhecimento necessários para lidar com o tema em estudo.

Referências

BOUZON, J.D et al. O Ensino de Química no Ensino CTS Brasileiro: uma revisão bibliográ fica de publicações em periódicos, São Paulo. Química Nova na Escola, 2018.

GONDIM, M. S. C.; SANTOS, W. L. P. CTS e ensino de Química: um olhar do que tem sido feito com perspectiva para o futuro. In: ENCONTRO NACIONAL DE ENSINO DE QUÍMICA

(ENEQ), 18., 2016, Florianópolis. Anais … Florianópolis: UFSC, 2016. Disponível em: . Acesso em: 07 jul. 2019.

GIL-PEREZ, D. et al. ¿Cómo promover el interés por la cultura científica? Una propuesta didáctica fundamentada para la educación científica de jóvenes de 15 s 18 años. In: Década de la Educación para el desarrollo sostenible . UNESCO (Oficina Regional de Educación para América Latinay el Caribe), 2005

LIMA, J.D.F de V; SOUSA, A.N. de; SILVA, T.P. da. Oficinas Temáticas no Ensino de Química: Discutindo uma proposta de trabalhos para professores do ensino médio. Paraíba, 2015.

MARCONDES; M.E.R. Proposições metodológicas para o Ensino de Química: Oficinas Temáticas para a aprendizagem da ciência e o desenvolvimento da cidadania. Uberlândia, 2008.

MONTEIRO, B.A.P et al . A Química das funções inorgânicas e o conflito das atividades mineradoras: história, trabalho e meio ambiente. In: OLIVEIRA, R. D. V. L. de; QUEIROZ,

  1. R. P. C. Conteúdos Cordiais: Química Humanizada para uma Escola sem Mordaça. São Paulo. Editora Livraria Física, p. 27-35, 2017.

VAZ, Caroline Rodrigues; FAGUNDES, Alexandre Borges; PINHEIRO, Nilcéia A. Maciel. O surgimento da ciência, tecnologia e sociedade (CTS) na educação: uma revisão. Anais do I Simpósio Nacional de Ensino de Ciência e Tecnologia, Curitiba, 2009.

ZANOTTO, R. L.; SILVEIRA, R. M. C. F.; SAUER, E. Ensino de conceitos químicos em um enfoque CTS a partir de saberes populares. Ciência & Educação, v. 22, n. 3, p. 727- 740, 2016.

CAPÍTULO 10

FALA TU! – O USO DO INSTAGRAM COMO ESTRATÉGIA DIDÁTICA PARA ENTENDER AS VISÕES DA CIÊNCIA-QUÍMICA E DO EU-CIENTISTA DE ESTUDANTES DO 9º ANO DO FUNDAMENTAL II E DO ENSINO MÉDIO

YOU SPEAK! – THE USE OF INSTAGRAM AS A TEACHING STRATEGY TO UNDERSTAND THE VIEWS OF SCIENCE-CHEMISTRY AND SELF-SCIENTIST OF STUDENTS IN THE 9TH YEAR OF ELEMENTARY II AND HIGH SCHOOL

 

 

DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.10

Submetido em: 30/09/2023

Revisado em: 04/10/2023

Publicado em: 12/10/2023

 

Maria Eduarda Tavares de Moura

Universidade Federal Rural de Pernambuco, Departamento de Química, Recife-PE

http://lattes.cnpq.br/2424831962164468

 

 

 

Resumo

O presente artigo discute a utilização do Instagram enquanto TDIC como estratégia para entender as visões do Ser-Eu-Cientista de estudantes do Ensino Médio, evidenciando tais visões identificadas e as estratégias adotadas para a superação das mesmas. Para tal, a autora se apoia em referências expressivas da literatura sobre a temática e em sua experiência na aplicação da intervenção durante a disciplina de Estágio Obrigatório. Fica claro que a intervenção proposta identificou bem as visões dos estudantes e buscou desmistificar tais concepções buscando a construção de uma figura mais humanística do cientista.

Palavras-Chave: Instagram; cientista; ensino de química.

Abstract

This article discusses the use of Instagram as a TDIC as a strategy to understand the views of Being-I-Scientist of high school students, highlighting such identified views and the strategies defined to overcome them. To this end, the author relies on significant references in the literature on the subject and on her experience in applying the intervention during the Mandatory Internship discipline. It is clear that the proposed intervention agrees well with the students’ views and seeks to demystify such conceptions, seeking to construct a more humanistic figure of the scientist.

Keywords: Instagram; scientist; chemistry teaching.

Introdução

Em dezembro de 2019, surgiu uma nova cepa do coronavírus, identificado primeiramente em Wuhan na China, denominado COVID-19, que pode causar uma variedade de condições, do resfriado comum a quadros avançados, como a síndrome respiratória aguda grave (OPAS, 2020). Diante disso, por conta da rápida disseminação do vírus e sua capacidade de propagação, instaurou-se um estado de pandemia em todo mundo, modificando o modo de vida das pessoas. Diversos setores do comércio, funcionamento público e também as instituições de ensino, tiveram suas atividades paralisadas por tempo indeterminado e, rapidamente, o rumo da educação teve que ser adaptado ao sistema de aulas através do ensino remoto.

Para Behar (2020) diferentemente do EaD, o ensino remoto é caracterizado por ser uma modalidade de ensino que pressupõe o distanciamento geográfico de professores e alunos e que foi adotado de forma temporária. É claro que essa adaptação súbita proporcionou um completo descontrole no processo de ensino e aprendizagem e escancarou as grandes dificuldades do sistema educacional brasileiro, que tem seu cerne na estruturação da educação no Brasil arraigada na tendência liberal tradicional que, segundo Luckesi (1992), pressupõe que os conteúdos de ensino são os conhecimentos e valores sociais acumulados por gerações adultas, os métodos devem baseados na exposição verbal e/ou demonstração e o relacionamento no professor-aluno predomina a autoridade do professor e exige a postura passiva do aluno, não havendo comunicação e relação entre eles em sala de aula.

Diante disso, é claro que a tendência liberal tradicional alimenta e corrobora o estabelecimento do conhecimento científico como algo inalcançável, pertencente apenas a indivíduos superiores, mistificando a ciência e extinguindo a possibilidade da mesma como um produto social e que sofre influência em diversos aspectos. Enquanto campo de conhecimento científico, a Química possibilita expandir a concepção da natureza e suas transformações, bem como, compreender as relações dos avanços científicos, tecnológicos e suas implicações na sociedade, predispondo-se da ideia de que a ciência não é neutra. (ZANOTTO; SILVEIRA; SAUER, 2016)

Entretanto, ainda é vista como uma ciência de difícil compreensão pela maioria das pessoas, e, como afirma Bouzon et al., (2018), um dos motivos que justificam este pensamento é a forma meramente propedêutica pela qual os conteúdos desta disciplina são ensinados aos alunos, de maneira descontextualizada e fragmentada, tornando-se distante de seu cotidiano.

Sendo assim, partindo do princípio de que o Ensino de Química por si só já é um desafio a ser enfrentado, durante o estabelecimento do ensino remoto, essas dificuldades são expostas de maneira escancarada, sendo um dos grandes desafios a necessidade de manter o interesse dos estudantes pela Química, caracterizada principalmente por suas aulas práticas.

Nesse contexto, um dos enfoques pensado em superar essas dificuldades é o uso das Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação (TIDC). Considerando-se as possibilidades de utilização e de direcionamentos que esses recursos oferecem, sua inserção na ciência Química no meio didático configura-se como uma possibilidade eficaz, promovendo o aumento da motivação dos alunos, ao passo que disponibiliza atividades diversas e atrativas, constituindo-se como um instrumento multifacetado que favorece o aprender e/ou resolver problemas, através da interação com o saber. (SOUSA; MIOTA; CARVALHO, 2011)

Para Coutinho e Bottentuit Junior (2005), novas ferramentas podem revolucionar a forma de aprender, desde que a sua aplicação vise amplos objetivos promotores de interação e de construção conjunta do conhecimento, o que, por si, implicaria em   uma   nova   cultura   de   aprendizagem. Hoje, as redes sociais são hoje um dos maiores canais de comunicação, que atinge as mais variadas gerações, tendo os jovens a sua maior concentração.

E, para Benite et al. (2009), a rede social influência tanto a difusão quanto a propagação do conhecimento que oportuniza o desenvolvimento de inovações por manter canais e fluxos de informação em que a confiança entre atores os aproxima     e levam ao compartilhamento de conhecimento detido por eles, modificando-o e ampliando-o.  As ligações estabelecidas na rede social acentuam a capacidade de inovação individual e organizacional, capacidade esta que reflete em seus atores promovendo o desenvolvimento local.

A partir disso, esse projeto visa propor uma intervenção a partir da criação de um perfil no Instagram a fim de debater ideias e concepções acerca das definições da Ciência-Química e da figura do Ser-Eu-Cientista, buscando uma interação com os sujeitos da pesquisa e desmistificar concepções preconceituosas sobre tais aspectos.

Metodologia

Para alcançar os objetivos propostos, o presente trabalho será desenvolvido por abordagem qualitativa, visto que para Chizzotti (2003) “o termo qualitativo implica uma partilha densa com pessoas, fatos e locais que constituem objetos de pesquisa, para extrair desse convívio os significados visíveis e latentes que somente são perceptíveis a uma atenção sensível”. Dessa forma, cabe ao autor realizar a interpretação e buscar os possíveis sentidos atribuídos aos seus objetivos, posteriormente transformando-os em um texto com competência científica.

A referida pesquisa também se caracterizará enquanto exploratória, ou seja, participante, uma vez que para Marconi e Lakatos (2003) tem o objetivo de familiarizar o pesquisador com seu objeto de estudo, a fim de torná-lo mais explícito ou de construir novas hipóteses, proporcionando ao pesquisador uma forma de observação participante, ou seja, em que terá o contato direto, empírico, com aquilo que será estudado. Ainda assim, cabe mencionar que a observação participante será dada de forma artificial, segundo a classificação de Marconi e Lakatos (2003), isto é, em que para fazer a pesquisa, a autora, enquanto observadora, irá integrar-se ao grupo, por um determinado tempo com o objetivo de obter informações.

O contexto de pesquisa será inserido em uma escola particular da Rede de Ensino do Estado de Pernambuco, localizada na zona litorânea do munícipio de Paulista, situada no bairro do Janga. Devido aos protocolos de combate ao novo coronavírus, pandemia do Covid-19, adotadas pelo Governo Federal e Estadual, e consequentemente a dificuldade e impossibilidade de contato em diversas circunstâncias, o recolhimento das informações para diagnose foi adaptado.

Com o objetivo de caracterizar o local e os sujeitos da pesquisa foi disponibilizado um formulário para os estudantes, um outro para os professores e um para a coordenação, visando entender as diferentes perspectivas inseridas no contexto escolar e realizar uma análise integral da realidade.

Para concretizar e chegar ao objetivo proposto, este projeto foi dividido em cinco partes:

 

 

 

  • Identificação das concepções iniciais dos estudantes sobre o que é a Ciência-Química, o que é ser cientista e a familiaridade dos mesmos com o Instagram, bem como vislumbrar a possibilidade do uso dessa plataforma para fins educativos. Para essa coleta será aplicado um questionário, pois é a melhor forma para conseguir atingir o maior número de estudantes;
  • Análise dos dados obtidos a partir do questionário e a elaboração do material que será utilizado no Instagram;
  • Disponibilização do material através do Instagram e coleta de dados a partir dos comentários e participações dos estudantes nos post’s e stories;
  • Aplicação de questionário de avaliação do projeto, com o intuito de verificar se houve mudanças nas concepções iniciais dos estudantes;
  • Análise de dados obtidos ao longo da intervenção e escrita do artigo.
Resultados e Discussão

Todo material elaborado e disponibilizado através do perfil do Instagram foi pensado em trazer uma visão humanística para a figura do cientista e desmistificar a ideia da Química enquanto ciência difícil e sem utilidade. Todas as fotos utilizadas foram solicitadas e previamente autorizadas pelas pessoas expostas. Sendo assim, os posts e stories foram organizados da seguinte forma:

Apresentação + Formulário

Figura 1 Template disponibilizado no stories 1.

 

 

 

 

 

 

Fonte: A autora.

Figura 2 Template disponibilizado no post 1.

 

 

 

 

                                                                

 

 

 

 

Fonte: A autora.

Qual tem mais cara de cientista?

 

Figura 3 Template disponibilizado no stories 2.

 

 

 

 

 

 

Fonte: A autora.

Cientistas que você nunca ouviu falar

Figura 4 Template disponibilizado no post 2.

Fonte: A autora.

 

 

 

Quando me falam sobre ser cientista

Figura 5 Template disponibilizado no stories 3.

Fonte: A autora.

 

Especial Dia do Químico – Cientistas que você já pode ter ouvido falar

Figura 6 Template disponibilizado no post 3.


Fonte: A autora.

Cientistas não conhecidos e seus trabalhos

 

Figura 7 Template disponibilizado no stories 4.

 

 

 

 

 

 

 


Fonte: A autora.

Todos nós temos um pouco de cientistas e todo cientista tem um pouco de nós


Figura 8 Template disponibilizado no post 4.

Fonte: A autora.

 

Você acha que isso tem a ver com Química?

Figura 9 Template disponibilizado no post 6.

Fonte: A autora.

Agradecimentos + Formulário

 

Figura 10 Template disponibilizado no post 7.

 


Fonte: A autora.

Com o objetivo de caracterizar o local e os sujeitos da pesquisa foi disponibilizado um formulário para os estudantes, um outro para os professores e um para a coordenação, visando entender as diferentes perspectivas inseridas no contexto escolar e realizar uma análise integral da realidade.

Além disso, foi aplicado um questionário para análise das concepções iniciais dos estudantes e ficou claro que a visão de cientista dos estudantes ainda é bastante estereotipada, como sendo aquele indivíduo que segue rigorosamente um método científico para realizar grandes descobertas acerca da natureza e do mundo, sempre dando explicações concisas, corretas, como se essas não fossem passíveis de questionamentos. Além disso, uma das respostas chama a atenção pelo desinteresse do estudante pela profissão, muito pelo ponto de vista de vê-la como distante de sua realidade ou de seu cotidiano, talvez reforçando um estereótipo do cientista como um gênio isolado que realiza apenas grandes descobertas.

             Todo material elaborado e disponibilizado através do perfil do Instagram foi pensado em trazer uma visão humanística para a figura do cientista e as intervenções ocorreram em formato de post’s e stories, além de vídeos produzidos no TikTok, sempre buscando uma aproximação com a realidade dos estudantes e a linguagem por eles utilizadas.

             O cerne das intervenções foi buscar a desmistificação das visões identificadas inicialmente, abrindo espaço para um conceito aberto do cientista enquanto indivíduo pertencente a uma sociedade e que trabalha e faz por ela, mas também sofre e exerce influência sobre.

­­Considerações Finais

            As intervenções realizadas no perfil do Instagram mostraram-se capazes de captar as visões de cientistas dos estudantes, bem como através da realização de post’s e stories, ampliar a discussão sobre a desmistificação do estereótipo do cientista, possibilitando uma visão mais humanística do mesmo.

Referências

BACHELARD, G. A epistemologia. Lisboa: Edições 70, 2006.

BENITE, A. M. C.; NETO, L.L.; BENITE, C. R. M.; PROCOPIO, M.V.R.; FRIEDRICH, M. Formação de professores de ciências em rede social:  uma perspectiva dialógica   na educação inclusiva. Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências, v. 9, n. 3, 2009.

BEHAR, P. A. O Ensino Remoto Emergencial e a Educação a Distância. 2020. Disponível em: https://www.ufrgs.br/coronavirus/base/artigo-o-ensino-remoto-emergencial-e-a-educacao-a–distancia/. Acesso em: 17/05/2021.

BOUZON, J.D. et al. O Ensino de Química no Ensino CTS Brasileiro: uma revisão bibliográfica de publicações em periódicos, São Paulo. Química Nova na Escola, 2018.

CASTELLS, M. A Era da Informação: o Poder da Identidade. São Paulo: Paz e Terra, 2002.

CHIZZOTTI, A. A pesquisa qualitativa em ciências humanas e sociais: evolução e desafios. Revista Portuguesa de Educação. v. 16, a. 2, p. 221-236. Universidade do Minho. Braga, Portugal. 2003.

COUTINHO, C. P.; BOTTENTUIT    JUNIOR, J. B. Comunicação educacional: do modelo unidirecional para a comunicação multidireccional na sociedade do conhecimento, 2005.

GIL-PÉREZ, D.; MONTORO, I. F.; ALÍS, J. C.; CACHAPUZ, A., PRAIA, J. Para uma imagem não deformada do trabalho científico. Ciência & Educação, v. 7, n. 2, p. 125-153, 2001.

JAPIASSU, H. Um desafio à educação: repensar a pedagogia científica.  São Paulo: Letras & Letras, 1999.

KENSKI, V. M. Tecnologias e ensino presencial e a distância. 2. ed. Campinas: Papirus,2004. (Série Prática Pedagógica).

KENSKI, V. Educação e tecnologias. O novo ritmo da informação. Campinas: Papirus Editora, 2013.

KOSMINSKY, L.; GIORDAN, M. Visões de ciências e sobre o cientista entre estudantes do Ensino Médio. Química Nova na Escola. São Paulo, n. 15, p. 11-18, 2002.

KUHN, T. A Estrutura das Revoluções Cientificas. Perspectiva: São Paulo, 2004.

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LUCKESI, C. C. Filosofia da Educação. Editora Cortez: São Paulo, 1992.

MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Fundamentos de metodologia científica. 5. ed.-São Paulo: Atlas, 2003.

ORGANIZAÇÃO PAN AMERICANA DE SAÚDE. Coronavírus. Disponível em: https://www.paho.org/pt/topicos/coronavirus. Acesso em: 17/05/2021.

CAPÍTULO 11

A LUDICIDADE COMO ESTRATÉGIA DE INCLUSÃO DE CRIANÇAS NO ESPECTRO AUTISTA NAS AULAS DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO BÁSICA: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA

PLAYFULNESS AS A STRATEGY FOR INCLUDING CHILDREN ON THE AUTISTIC SPECTRUM IN BASIC EDUCATION SCIENCE CLASSES: A SYSTEMATIC REVIEW

 

 

DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.11

Submetido em: 11/10/2023

Revisado em: 11/10/2023

Publicado em: 12/10/2023

 

Maria Eduarda Tavares de Moura

Universidade Federal Rural de Pernambuco, Departamento de Química, Recife-PE

http://lattes.cnpq.br/2424831962164468

 

 

 

Resumo

O transtorno do espectro autista (TEA) ou autismo é considerado um distúrbio do desenvolvimento neurológico de aparecimento precoce (desde a infância), caracterizado por dificuldades de aprendizagem, déficits nas habilidades sociocomunicativas e de comportamentos estereotipados. Considerando as especificidades do aluno autista, a introdução do ensino de Ciências em sua formação tende a trazer importantes contribuições para o seu desenvolvimento, uma vez que a educação científica tem grande potencial para a promoção das habilidades de uma criança. Com isso surge a seguinte problemática: como a ludicidade pode contribuir no processo de ensino e aprendizagem de crianças no espectro autista nas aulas de ciências na Educação Básica? Diante disso, o objetivo deste trabalho é, através de uma revisão da literatura, identificar os principais benefícios associados à inclusão da ludicidade nas aulas de ciências na Educação Básica para alunos no espectro autista. Para responder ao problema de pesquisa e alcançar o objetivo proposto, o presente trabalho lançou mão de uma discussão descritiva qualitativa. Após a busca manual, foram selecionados cinco artigos para compor esta revisão. A partir da proposta de pesquisa desenvolvida neste trabalho de conclusão, espera-se ter contribuído tanto para o ensino de Ciências, em geral, como para as pesquisas da área de ensino de Ciências e inclusão de crianças no espectro na Educação Básica.

Palavras-Chave: ludicidade; Transtorno do Espectro Autista; ciências; educação básica.

Abstract

Autism spectrum disorder (ASD) or autism is considered an early-onset neurological development disorder (since childhood), characterized by learning difficulties, deficits in socio-communicative skills and stereotypical behaviors. Considering the specificities of autistic students, the introduction of Science teaching in their training tends to make important contributions to their development, since scientific education has great potential for promoting a child’s skills. This raises the following problem: how can playfulness contribute to the teaching and learning process of children on the autistic spectrum in science classes in Basic Education? Therefore, the objective of this work is, through a literature review, to identify the main benefits associated with the inclusion of playfulness in science classes in Basic Education for students on the autism spectrum. To answer the research problem and achieve the proposed objective, the present work used a qualitative descriptive discussion. After the manual search, five articles were selected to compose this review. Based on the research proposal developed in this conclusion work, it is expected to have contributed both to Science teaching, in general, and to research in the area of ​​Science teaching and inclusion of children on the spectrum in Basic Education.

Keywords: playfulness; Autism Spectrum Disorder; sciences; basic education.

 

 

Introdução

O transtorno do espectro autista (TEA) ou autismo é considerado um distúrbio do desenvolvimento neurológico de aparecimento precoce (desde a infância), caracterizado por dificuldades de aprendizagem, déficits nas habilidades sociocomunicativas e de comportamentos estereotipados (APA, 2013). Griesi-Oliveira e Sertié (2017) destacam em seu trabalho que o fenótipo das pessoas autistas pode variar muito, “abrangendo desde indivíduos com deficiência intelectual grave e baixo desempenho em habilidades comportamentais adaptativas, até indivíduos com quociente de inteligência (QI) normal, que levam uma vida independente” (p. 233).

Considerando as especificidades do aluno autista, a introdução do ensino de Ciências em sua formação tende a trazer importantes contribuições para o seu desenvolvimento, uma vez que a educação científica tem grande potencial para a promoção das habilidades de uma criança, tais como o desenvolvimento do pensamento abstrato, da linguagem e da comunicação (CARVALHO, 2010).

Diante dessa realidade, surgem as seguintes indagações: o aluno dos anos iniciais com TEA têm acesso à educação científica por meio de estratégias pedagógicas adequadas às suas especificidades? Como fomentar a educação científica junto às crianças autistas, de modo a favorecer o seu desenvolvimento sociocomunicativo?

A educação inclusiva constitui uma temática amplamente estudada por pesquisadores e educadores de diversas áreas, na tentativa de compreender e proporcionar uma educação de qualidade e com equidade para que esses alunos possam realmente ter sucesso escolar (SILVA; ROSEK; SEVERO, 2017).  Apesar disso, é preciso avançar mais concernente à atenção escolar dada ao caso das crianças que possuem Transtorno do Espectro Autista.

Apesar do avanço proporcionado pela “Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro do Autismo” (BRASIL, 2012), o trabalho escolar com crianças autistas enfrenta muitas barreiras, como a falta de preparação de profissionais e de envolvimento da comunidade escolar, a ausência de investimentos em infraestrutura e recursos para a promoção da inclusão escolar e os retrocessos recentes trazidos pelo Decreto Nº 10.502/2020 (BRASIL, 2020), que instituiu a “Política Nacional de Educação Especial: Equitativa, Inclusiva e com Aprendizado ao Longo da Vida”. Nesse contexto, as barreiras existentes no recinto escolar necessitam ser superadas pela comunidade escolar, principalmente no que está relacionado aos instrumentos utilizados no atendimento adequado para o processo de ensino e aprendizagem do estudante autista.

Com relação ao ensino de Ciências, essas barreiras também devem ser rompidas.  A transmissão do conhecimento científico deve ser um processo democratizado abrangendo os alunos regulares e os que apresentam necessidades especiais, pois ele pode ser considerado um instrumento que contribui para a autonomia e para o desenvolvimento da sociedade (SILVA; AMARAL, 2020).

Com isso surge a seguinte problemática: como a ludicidade pode contribuir no processo de ensino e aprendizagem de crianças no espectro autista nas aulas de ciências na Educação Básica?

Diante disso, o objetivo deste trabalho é, através de uma revisão da literatura, identificar os principais benefícios associados à inclusão da ludicidade nas aulas de ciências na Educação Básica para alunos no espectro autista.

Metodologia

O presente trabalho foi desenvolvido no sentido de responder à seguinte questão de pesquisa: como a ludicidade pode contribuir no processo de ensino e aprendizagem de crianças no espectro autista nas aulas de ciências na Educação Básica?

É na perspectiva de buscar respostas para a questão de pesquisa em tela que se apresenta o percurso metodológico desta pesquisa em termos da abordagem dos dados, das etapas metodológicas e critérios de elegibilidade.

Para responder ao problema de pesquisa e alcançar o objetivo proposto, o presente trabalho lançou mão de uma discussão descritiva qualitativa, uma vez que leva em consideração a interpretação pessoal, motivações e emoções e individualidades pertencentes à pesquisa (OLIVEIRA, 2013).

A referida pesquisa também se caracteriza enquanto exploratória, uma vez que objetiva familiarizar o pesquisador com seu objeto de estudo, a fim de torná-lo mais explícito ou de construir novas hipóteses.

Realizou-se uma revisão da literatura, a partir da pesquisa bibliográfica de artigos originais sobre o uso da ludicidade no processo de ensino e aprendizagem de crianças no espectro autista na disciplina de ciências da Educação Básica. Como critérios de inclusão, utilizados para a realização desta investigação adotou-se: 1) Artigos publicados em português, 2) Publicados nos últimos 5 anos (2018 a 2023), 3) Artigos oriundos de pesquisa de campo e estudos originais. E como critérios de exclusão: 1) Artigos que não apresentam relação com a temática, 2) Revisões da literatura. Para realização da pesquisa, foram utilizadas as seguintes palavras chaves: Ludicidade; Transtorno do Espectro Autista; Ciências e Educação Básica. A seleção e inclusão dos artigos foram realizadas através de uma busca manual no Google Acadêmico, configurada como mostra o Organograma 1.

Organograma 1: Seleção de artigos nas bases de dados.

 

Fonte: Autoria própria.

Resultados e Discussão

No Brasil, o 2º artigo do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) define que criança é aquele indivíduo até os doze anos de idade incompletos. A infância é um período único do desenvolvimento humano e compreende o tempo desde o nascimento até o início da puberdade, subdividindo-se em primeira infância (dos dois aos seis anos de idade) e segunda infância (dos sete aos doze anos de idade) (GALLAHUE; OZMUN; GOODWAY, 2018). Neste intervalo de tempo de apenas dez anos, ocorrem as mais expressivas alterações em todos os domínios do comportamento humano, a saber, o domínio cognitivo, afetivo-social e motor.

Esse período também é de grande importância pois, a partir do início de sua fase escolar, a criança tem um convívio social além do núcleo familiar, o que possibilita ao indivíduo se relacionar e viver em sociedade, desenvolvendo habilidades fundamentais à formação humana, além das capacidades cognitivas e motoras.

Com base no Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, (RCNEI) (BRASIL, 1998): A criança é um ser social que nasce com capacidades afetivas, emocionais e cognitivas, tem desejo de estar próxima às pessoas e é capaz de interagir e aprender com elas de forma que possa compreender e influenciar seu ambiente. Ampliando suas relações sociais, interações e formas de comunicação, as crianças sentem-se cada vez mais seguras para se expressar.

Ainda assim, cabe destacar a dificuldade de adaptação das crianças à essa nova realidade. Se esse cenário já é difícil para crianças típicas, as condições para crianças dentro do espectro autista se agravam ainda mais. Nesse contexto, surge o paradigma da inclusão que constitui, então, um processo bilateral no qual as pessoas, ainda excluídas, e a sociedade buscam, em parceria, equacionar problemas, decidir sobre soluções e efetivar a equiparação de oportunidades para todos (VEIGA, 2008).

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) o autismo afeta uma em cada 160 crianças no mundo. O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um transtorno comportamental no desenvolvimento infantil, caracterizado por prejuízos nas habilidades sociais e de comunicação, nos padrões repetitivos e restritos de comportamento e interesses. O TEA é classificado dentro dos Transtornos Globais do Desenvolvimento, que engloba diferentes síndromes de acordo com CID 10: F84, e pode ser tratado de acordo com a gravidade: leve, moderada ou severa (DE MORAES; DE JESUS, 2017).

Segundo Zanolla et al. (2015), com a abordagem do DSM-5, entendem-se os TEA hoje, como um grupo de transtornos que apresentam déficits clinicamente significativos e persistentes na comunicação e nas interações sociais, manifestadas de todas as maneiras seguintes: déficits expressivos na comunicação não verbal e verbal usadas para interação social; falta de reciprocidade social; incapacidade para desenvolver e manter relacionamentos de amizade apropriados para o estágio de desenvolvimento; padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses e atividades. Estes comportamentos são representados por comportamentos motores ou verbais estereotipados, comportamentos sensoriais incomuns; excessiva adesão/aderência a rotinas e padrões ritualizados de comportamento; interesses restritos, fixos e intensos.

Os transtornos globais de desenvolvimento inicialmente devem ser identificados a partir de uma visualização da família sobre possíveis dificuldades de linguagem, comunicação e socialização, em conjunto com a escola. A visualização inicial desses aspectos é de grande importância, pois possibilita o diagnóstico prévio e a implantação rápida de um tratamento e acompanhamento com uma equipe multidisciplinar de profissionais capacitados atuando em suas diversas áreas específicas, proporcionando maior qualidade de vida para essas crianças.

O trabalho com crianças autistas nas instituições de ensino requer o enfrentamento de muitos desafios por parte dos profissionais envolvidos nessa tarefa, desde a mudança de concepção e de postura perante esse sujeito até a própria capacitação para trabalhar com elas.

Ademais, há que se considerar que essa atuação ocorrerá em um campo da educação que vem sofrendo várias alterações nos últimos tempos, tanto na sua forma de conceber a criança e de gerir políticas voltadas para seu atendimento quanto nas questões que envolvem o fazer pedagógico (VEIGA, 2008).

A partir disso, pensa-se nos princípios de uma educação libertadora, que, como afirma Freire (2014), é uma prática que estimula o estudante a desenvolver o pensamento crítico e ter capacidade de decisão perante a realidade em que ele vive e os conflitos que ele vivencia, possibilitando o debate e participação ativa do mesmo na construção do conhecimento, bem como no desenvolvimento de uma consciência crítica de sua situação na sociedade e colocando-o como protagonista nesse processo de transformação do meio em que ele vive.

Adicionalmente, segundo Paulo Freire (1968), a educação possui uma característica “bancária” marcada por uma relação de educador e educando, na qual o educador é o detentor do saber e o que conduz o educando a uma memorização mecânica do conteúdo por ele narrado, e o educando é o depósito de informações. Por conseguinte, é imposta a passividade aos educandos, tornando a educação um instrumento de repressão.

Vive-se hoje em um mundo notadamente influenciado pela ciência e tecnologia, devido a dependência da produção científica e tecnológica para o desenvolvimento de um país no mais amplo sentido que se possa imaginar.

Esse desenvolvimento acelerado e sua dependência direta com as atividades científicas e tecnológicas tem levado as sociedades a confiar na ciência e na tecnologia como se fossem divindades, corroborando com o mito do cientificismo, explicado por Popper (2004), como a crença dogmática na autoridade do método científico e nos seus resultados, pois seria o conhecimento científico o único que poderia gerar explicações perfeitas para a realidade.

Essa visão de ciência como dogma tomou conta dos currículos escolares, mais particularmente da disciplina de ciências, durante muito tempo por meio de uma educação tecnicista, na busca de uma única verdade, seguindo rigorosos métodos.

Para Paulo Freire (2014), a educação deve se colocar como prática para a liberdade, buscando uma conscientização política como contraponto para as desigualdades sociais, estimulando o estudante a participar ativamente do processo de ensino e aprendizagem, questionando a realidade ao seu redor.

Sendo assim, essa prática ressignifica a relação professor-aluno e o conhecimento é colocado como ponte para a construção de um mundo mais justo, ético, humano e solidário. Além disso, busca-se romper com os preceitos do cientificismo que tanto distanciam os estudantes da ciência.

A partir disso, podemos pontuar o papel da ludicidade neste processo de ensino e aprendizagem mais amplo com objetivo de superar essas dificuldades ainda existentes.

Através da brincadeira é possível aprender e obter resultados, aplicando técnicas pedagógicas que despertem o interesse e a criatividade do seu público-alvo. Autores como Vygotsky (1984), Huizinga (1990), Negrime (1994) defendem a ideia de que o brincar é uma atividade que contribui positivamente para o desenvolvimento da criança. Este pode ser linguístico, social, cognitivo, motor, físico, sensorial e afetivo (DALLABONA; MENDES, 2004).

Partindo da definição do termo lúdico que: […] se o termo tivesse ligado a sua origem, o lúdico estaria se referindo apenas ao jogo, ao brincar, ao movimento espontâneo, mas passou a ser conhecido como traço essencialmente psicofisiológico, ou seja, uma necessidade básica da personalidade do corpo, da mente, no comportamento humano.

As implicações das necessidades lúdicas extrapolam as demarcações do brincar espontâneo de modo que a definição deixou de ser o simples sinônimo do jogo. O lúdico faz parte das atividades essenciais da dinâmica humana, trabalhando com a cultura corporal, movimento e expressão (ALMEIDA, 2008 apud SILVA, 2011).

Ao considerar a classificação do homo ludens dada por Aristóteles, pode-se afirmar que brincar, ação que está intimamente ligada ao lúdico, é uma ação que faz parte do ser humano integral e favorece o desenvolvimento social e afetivo, intensifica a convivência em grupo (MARTINS, 2003 apud LUVIZOTTO, 2010). Partindo dos conceitos acima, o termo lúdico remete tudo aquilo que proporciona o ser humano ao se distrair e estimular a sua criatividade, ocasionando um curto prazer e bem-estar.

Desta forma, fica claro que trabalhar o processo de ensino e aprendizagem com crianças no espectro autista a partir de atividades estruturadas de forma lúdica, efetivamente, trará bons resultados na aprendizagem.

A pesquisa foi baseada na análise dos seguintes artigos científicos relacionados à temática da ludicidade no processo de ensino e aprendizagem de Ciências de crianças no espectro autista. Após a leitura completa desses estudos, todos os conteúdos foram analisados especificamente com o foco para os objetivos da pesquisa e considerações acerca de suas metodologias.

 

Quadro 1 – Levantamento dos artigos incluídos na revisão.

Título

Autoria/Ano

Objetivos

Métodos

Principais Resultados

“As estratégias didáticas com alunos autistas: as experiências de professores de Ciências e especialistas em educação especial”

GOMES; DE OLIVEIRA, 2021.

Apresentar as  estratégias  didáticas  que  os  professores  de ciências utilizam com o conteúdo “Cadeia Alimentar” e as recomendações dos especialistas do atendimento educacional especializado, para um trabalho mais efetivo na disciplina de Ciências.

O levantamento das informações foi realizado de forma remota, com uso de um formulário eletrônico (google forms) enviado pelo aplicativo whatsapp. O estudo contou com a participação de 41 profissionais da educação básica do estado do Pará que relataram diversas experiências e orientações para o ensino de ciências com alunos autistas.

É preciso que se tenha estratégias como trabalhar  sempre  com  o  visual, muitas figuras, estimulador de reforço e outros..É importante identificar quais as características predominantes no seu aluno,  habilidades,  o  que  ele  gosta,  o  que  não  gosta,  quais recursos  e metodologia chamam mais sua atenção, pois  cada  um  tem  suas  peculiaridades,  e  o  que  funciona  para  um,  nem sempre irá funcionar para o outro.

“A mochila sensorial de ciências: o uso de recursos didáticos adaptados e adequados no ensino de ciências para estudantes com transtorno do espectro autista”

SOUZA, 2020.

Propor um recurso

didático, a Mochila sensorial em Ciências”, para estudantes com TEA a fim de estimular o letramento científico.

A metodologia foi qualitativa com utilização de narrativas. Para construção das informações serão utilizadas a entrevista narrativa episódica e a entrevista narrativa mediada.

Os resultados denotaram que todo/a aluno/a com TEA consegue aprender, inclusive os

saberes científicos, mas necessita de estratégias alternativas, como a utilização de recursos didáticos concretos adaptados/adequados A reformulação de cursos de formação é urgente para a promoção de um contexto inclusivo para educandos/as com TEA, assim deve-se considerar as narrativas docentes daqueles/as que trabalham com o/a aluno/a com TEA na formulação dessa capacitação docente.

“Construção De Sequências Didáticas Com Realidade Aumentada Para Alunos Com Transtorno Do Espectro Autista Nos Anos Finais Do Ensino Fundamental -6º Ano”

MELO, 2021.

Criar e validar sequências didáticas com a utilização de realidade aumentada de forma que o aluno com TEA estivesse mais engajado na aula e pudesse, também, mostrar ao seu professor/auxiliar ferramentas para a criação

de outras sequências didáticas independente do componente curricular.

 

Pesquisa classificada como exploratória, com a utilização dos procedimentos aplicados nos estudos de casos.

Com esta pesquisa ficou claro o potencial da realidade aumentada como ferramenta para engajar e possibilitar incorporar atividades escolares adaptadas de modo a termos uma maior participação dos estudantes com TEA.

“Necessidades educacionais para inclusão de um aluno autista no ensino de ciências”

DE SOUZA PEREIRA; DOS SANTOS SILVA; LOPES, 2022.

Investigar as necessidades educacionais para a inclusão de um aluno com TEA no processo  de  ensino-aprendizagem  de  Ciências.

Para  isso  foi  realizada  uma  pesquisa  qualitativa  de alcance descritivo com aplicação de formulário para a diretora e professora de Ciências de uma escola do  campo  de  Várzea  Grande,  Piauí.  A  mãe  do  aluno  também  participou  da  pesquisa.

A  partir  desta  pesquisa,  entendemos  que  são  necessárias  mais  investigações  que captem  as  fragilidades  da educação  oferecida  para pessoas com  necessidades  especiais  nas escolas do campo. É preciso também um olhar a partir do ponto de vista da pessoa autista, considerando a sua perspectiva distinta de vida e de mundo no ensino de Ciências.

“O ensino de ciências para crianças com transtorno do espectro autista sob a perspectiva histórico-cultural.”

DA SILVA MARTINS; PEREIRA, 2021.

Analisar o desenvolvimento sociocomunicativo de um grupo de crianças com transtorno do espetro autista (TEA) dos anos iniciais do Ensino Fundamental.

A coleta de dados deu-se a partir de entrevistas semiestruturadas com as professoras responsáveis pelos alunos, e também houve a utilização um diário de campo durante a aplicação de uma oficina. Para a realização da oficina, foram desenvolvidos maquetes e objetos lúdicos relacionados à higiene bucal.

Os resultados evidenciaram ausência de aulas de Ciências, uma vez que a escola privilegia a alfabetização. Durante a oficina, observamos diferentes formas de interação com os objetos e com a mediadora, em que o contato visual e a interação com os objetos foram as formas de comunicação não verbal mais frequentes ao longo da atividade.

Fonte: Autoria própria.

­­Considerações Finais

O objetivo desta pesquisa foi o de identificar quais os benefícios da ludicidade no processo de ensino e aprendizagem de crianças no espectro autista nas aulas de ciências da Educação Básica.

Nesse sentido, a proposta foi desenvolvida a partir de uma revisão integrativa e exploratória da literatura. Cabe destacar que buscou-se contemplar estudos que trouxessem uma abordagem dos pressupostos freirianos da educação libertadora e a inclusão de crianças do espectro autista. 

A partir da proposta de pesquisa desenvolvida neste trabalho de conclusão, espera-se ter contribuído tanto para o ensino de Ciências, em geral, como para as pesquisas da área de ensino de Ciências e inclusão de crianças no espectro na Educação Básica.

Reconhece-se que as pesquisas científicas se constituem como ações contínuas, e dessa forma, não se considera este trabalho como concluído. Acredita-se que a partir desta pesquisa outras podem ser realizadas. Então, a partir do desenvolvimento da proposta apresentada será possível compreender seus impactos em relação à inclusão de crianças no espectro autista nas aulas de ciências da Educação Básica, com vistas à libertação no sentido freireano do termo.

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BRASIL. Lei Nº. 12.764, de 27 de dezembro de 2012. Institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro do Autismo; e altera o § 3º do art. 98 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990. 

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CAPÍTULO 12

RESPONSABILIDADE CIVIL DAS INSTITUIÇÕES PRIVADAS DE ENSINO POR ATOS DE BULLYING

CIVIL LIABILITY OF PRIVATE EDUCATIONAL INSTITUTIONS FOR BULLYING ACTS

 

 

DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.12

Submetido em: 10/10/2023

Revisado em: 11/10/2023

Publicado em: 12/10/2023

 

Sílvia Thaís Duarte de Paiva

Pós-Graduada em Direito Constitucional

Instituto Elpídio Donizetti, Belo Horizonte – MG, Brasil

 

 

 

Resumo

O presente artigo visa estabelecer as hipóteses de aplicação do instituto da responsabilidade civil das escolas privadas de ensino primário e secundário em casos de ocorrência de danos causados por atos de Bullying ocorridos no interior destes estabelecimentos. Ainda, busca-se realizar uma delimitação teórica dos temas abordados estabelecendo conceitos doutrinários acerca do tema, a fim de determinar os limites para esta responsabilização. Buscamos apresentar os posicionamentos mais atualizados e a discussão presente na doutrina entendendo pela possibilidade de configuração do dano moral nas situações de Bullying entre alunos, a partir da responsabilidade civil objetiva fundada no risco da atividade das instituições privadas enquanto prestadoras de serviço.

Palavras-Chave: Bullying. Escolas Particulares. Responsabilidade Civil. Relação Consumerista.

Abstract

This article aims to establish the chances of applying the institute civil liability of private schools in primary and secondary education in cases of damage caused by acts of bullying occurring within these establishments. Still, we try to achieve a theoretical definition of the themes establishing doctrinal concepts on the subject in order to determine the limits for this institute. We seek to present the most current positions and the doctrine’s discussions understanding the possibility of setting the moral damage in situations of bullying among students, from the objective liability based on the risk of the activity of private institutions as service providers.

Keywords: Bullying. Private Schools. Civil Liability. Consumerist Relationship.

Introdução

A fim de dar caráter verdadeiramente científico à presente pesquisa, frente à vastidão de caminhos que o tema “Bullying” possibilita em termos de discussão, delimitaremos este trabalho à análise das situações em que a prática de Bullying ocorre: a) dentro dos muros das escolas particulares; e b) tanto os agressores (bullies) quanto as vítimas são os alunos menores incapazes.

No contexto hodierno em que não apenas o mundo real, mas também o virtual é palco para cenários de agressões psíquicas, este artigo escolheu estudar apenas os episódios em que o Bullying é praticado dentro das instituições de ensino, a fim de analisar o dever que tais entidades possuem de indenizar as vítimas dessas agressões.

Entretanto, ainda assim, após fazer essa demarcação ambiental, tem-se que no interior desses locais há várias formas de estruturação de um quadro de Bullying, no que concerne à composição agressor-vítima. A violência pode ocorrer de diversas maneiras: entre professores, coordenadores e demais funcionários, caracterizando uma agressão intrínseca à relação laboral (nesses casos, mais adequado seria a expressão “mobbing”); ou, ainda, o Bullying professor-aluno, onde o educador é o agente ativo da intimidação (o “bullie”); ou o Bullying aluno-professor, onde o professor é alvo das intimidações sistemáticas dos alunos.

E ainda tantas outras estruturações, visto que estas práticas traduzem uma triste realidade das relações sociais, e, como tais, admitem as mais diversas composições que ensejarão as mais diversas proteções jurídicas.

Portanto, aqui estudaremos as situações em que tanto o agressor (o “bullie”) como a vítima são alunos, menores e incapazes, a fim de nortear uma discussão a respeito de quem teria a responsabilidade de indenizar a vítima, já que o agressor, como incapaz, com base no art. 3º do Código Civil, não pode figurar no polo passivo de uma ação de reparação de dano, ressalvada as circunstâncias do art. 928 do mesmo diploma, em que o incapaz responde pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele responsáveis não tiverem obrigação de fazê-lo ou não dispuserem de meios suficientes.

Ainda no tocante à demarcação temática, a análise aqui abordada trata das instituições de ensino privado básico (ensino fundamental) e secundário (ensino médio), pois caso falássemos de instituições públicas, estudaríamos aqui a responsabilidade civil do Estado, enquanto administrador dessas entidades.

Não seria o caso, portanto, de uma responsabilidade civil contratual decorrente de uma relação de consumo, mas sim de uma responsabilidade civil objetiva do Poder Público pelos danos a que os agentes públicos houverem dado causa, por ação ou por omissão.

Trabalhamos com o ensino fundamental e médio, também, tendo em vista que os alunos de ensino superior, em regra, não estão acobertados com o manto da incapacidade civil, em razão da maioridade. Portanto, não há maiores debates a respeito da responsabilidade quando da prática de Bullying entre discentes de instituições de ensino superior, visto que, na medida em que se encontram plenamente capazes para os atos da vida civil, responderão pessoalmente por seus atos.

Além disso, nos estabelecimentos de ensino superior, em regra, há “missão de instruir e não de vigiar, e o aluno não se encontra, normalmente, sob a vigilância do professor ou do educandário”[1].

Dessa forma, há de ser estudado as hipóteses de responsabilização das entidades de ensino particulares, seus limites e suas abrangências, frente a atos de Bullying ocorridos em suas acomodações.

1. Responsabilidade Civil: Generalidades e Classificações

A priori, nos faz indispensável apresentar noções gerais acerca da responsabilidade civil, a fim de que possamos nos situar na compreensão deste instituto e enxergar seus fins almejados, para que concluamos sobre os limites da sua aplicação às escolas particulares que sediam a prática do Bullying.

Como nos ensina Maria Helena Diniz, o termo “responsabilidade” advém do verbo latino respondere, designando o fato de ter alguém se constituído garantidor de algo[2]. Entretanto, ao sujeito responsável apenas será aplicada a obrigação gerada pela responsabilidade civil quando o sujeito não executou o seu dever. Para Serpa Lopes, a responsabilidade é a obrigação de reparar um dano, seja por decorrer de uma culpa ou de outra circunstância legal que justifique, como a culpa presumida, ou por uma circunstância meramente objetiva[3].

Sendo assim, conclui Maria Helena Diniz nos dando o seguinte conceito de responsabilidade civil.

A responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar o dano moral ou patrimonial causado a terceiro em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda ou, ainda, de simples imposição legal[4]

O Direito das Obrigações impõe a todos nós, enquanto indivíduos integrantes de um conjunto social, deveres de conduta. Esses encargos que nos são impostos resultam de um dever geral de conduta segundo o Direito ou decorrem de obrigações contraídas de forma voluntária.

Nessa primeira situação, quando não há um contrato regulando a relação, diz-se que a responsabilidade civil é aquiliana ou extracontratual, pois, nesse caso, inexiste vínculo jurídico entre vítima e causador de dano. A responsabilidade, aqui, deriva de um ilícito extracontratual e tem disciplina no Código Civil de 2002 nos arts. 186, 927, 188 e 928 a 954. Esta responsabilidade decorre da lesão a um direito subjetivo ou da prática de um ato ilícito, sem que haja vínculo entre lesado e lesante.

A responsabilidade civil extracontratual pode ser fundada na culpa ou fundada no risco, conforme o art. 927. À primeira chama-se de subjetiva. Sendo fundada na culpa, é dever do lesado demonstrar a existência da imprudência, imperícia ou negligência, para obter a reparação do dano sofrido.

Ainda de acordo com Maria Helena Diniz, a responsabilidade civil extracontratual pode ser classificada quanto ao agente: direta, se oriunda de ato da pessoa imputada; e, indireta, se resultar de ato de terceiro, com o qual o agente tem vínculo legal de responsabilidade de fato de animal ou de coisa inanimada sob sua guarda[5].

Já a segunda hipótese de responsabilidade civil, em que a responsabilidade surge a partir da transgressão de um dever voluntariamente pactuado, é aquela que emana de um contrato, a partir de uma inadimplência. Esta, portanto, conforme a classificação doutrinária, é a responsabilidade civil contratual. Essa espécie de responsabilidade tem sua amplitude limitada ao que foi ajustado entre as partes. Inclusive, o contrato pode até́ excluir o dever de indenizar, que pode ser cláusula válida (a cláusula de não indenizar[6]), onde os contratantes convencionam que se exima o faltoso de fazer a reparação.

Essa espécie de responsabilidade, ensejada quando uma pessoa causa prejuízo a outrem por descumprimento de uma obrigação contratual, é a que estudaremos aqui. Como o fornecimento de serviços de ensino dá-se numa típica relação de consumo estabelecida entre a instituição de ensino privada e o aluno, usaremos como norte normativo, além da Legislação Civil, o Código de Defesa do Consumidor.

2.  O Bullying Como Causa de Danos Extrapatrimoniais

A fim de construir a corrente pesquisa a respeito dos limites da responsabilidade dos colégios particulares diante de situações de Bullying vivenciadas intramuros, faz-se necessário inaugurar o debate estabelecendo as definições que este termo abarca e as razões por que esse tipo de prática enseja uma responsabilidade civil.

 O “Bullying” é frequentemente definido pelos psicólogos do desenvolvimento como uma ação ou um comportamento agressivo e intencional que é praticado por um grupo ou indivíduo, de forma reiterada, e ao longo de um determinado período contra uma vítima que não consegue se defender com facilidade (Campbell, 2005; Olweus, 2001; Whitney; Smith, 1993).

O Bullying consiste, portanto, em uma forma de abuso que se baseia em um desequilíbrio de poder; pode ser definido como um abuso de poder sistemático (Rigby, 2002; Smith; Sharp, 1994).

O termo Bullying, palavra de origem inglesa, sem tradução para o português, tem como raiz a palavra bully, que significa “brigão”. Esse “brigão”, o agressor, agente ativo da violência aqui retratada, pode agir de duas formas principais: através do Bullying físico ou do Bullying psicológico.

O Bullying físico é, em geral, retratado como “declarado” porque normalmente envolve ataques públicos a uma vítima, ficando ainda piores quando outros indivíduos observam. De fato, estudos revelam que quanto maior o incentivo recebido pelos autores, mais grave se torna o abuso físico (Salmivalli et al., 1996).

O Bullying físico extremo pode assumir muitas formas, incluindo bater, trancar os colegas nos armários escolares, estrangular, empurrar ou usar objetos para machucar. Estes são apenas alguns dos muitos exemplos dos tipos de ações que os alunos realizam para impor uma relação de poder na qual as vítimas ficam dominadas e indefesas.

Já o Bullying psicológico geralmente envolve infligir um sofrimento mental de modo que os alvos temam por sua segurança física, ou destruir-lhes a autoestima e a autoconfiança. O Bullying psicológico verbal é “declarado”, no sentido de que as brincadeiras e os insultos podem ser ouvidos ou lidos por testemunhas e provados pelas vítimas.

Enquanto o Bullying psicológico dissimulado (não verbal) visa excluir ou isolar por meio da perseguição e/ou do ostracismo da vítima. Esta é a forma mais difícil de se provar, porque os professores não podem vê̂-la nem comprovar que tenha ocorrido. Os autores podem de uma hora para a outra ignorar as vítimas ou se recusar a trabalhar junto com elas nos trabalhos de aula ou em outras atividades. Podem espalhar boatos não confirmados que constranjam a vítima ou a façam parecer desonesta ou desleal aos seus pares.

Essas vítimas de Bullying podem sofrer efeitos tanto de curto como de longo prazo. No curto prazo, podem se tornar depressivas, perder o interesse nos estudos e até mesmo evitar ir à escola. Um estudo conduzido na Holanda com alunos do 9º ao 12º ano concluiu que vítimas de Bullying mostravam uma incidência muito maior de cefaleia, insônia, dor abdominal, cansaço e depressão do que jovens que não experimentavam Bullying.[7]

Os efeitos desse tipo de agressão sistemática podem persistir na vida adulta. Um estudo longitudinal de homens vítimas de Bullying na infância constatou que aos 20 anos eles se mostravam mais depressivos e com autoestima mais baixa do que seus pares que não foram vítimas de bullying na infância (Olweus, 1993).

Nos casos de Bullying escolar, o responsável pela omissão da instituição de ensino se obrigará quanto ao dano causado pelo aluno – que se encontrava sob sua disciplina – a outro aluno. Trata-se assim de responsabilidade civil contratual. Desse modo, o civilmente responsável tem a obrigação decorrente de uma imposição contratual de indenizar a vítima do dano a que deu causa.

Posto isso, afirma Sérgio Cavalieri Filho que o primeiro fim da obrigação de indenizar é colocar a vítima na situação anterior à ocorrência do fato danoso[8].

Entretanto, em casos como o Bullying, o dano causado é prioritariamente extrapatrimonial, mas ninguém irá ousar dizer que não há dano na esfera psíquica ou moral, vez que já é previsto o dano moral na nossa Constituição Federal textualmente no seu art. 5, V, segundo a qual: É assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem[9].

A indenização nos casos de danos extrapatrimoniais é dotada de fim compensatório, numa tentativa de monetizar o dano psíquico causado no lesado, mas também é dotada de um importante objetivo pedagógico, conforme se observa na seguinte decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região:

DANO MORAL. VALOR ARBITRADO. CARÁTER INDENIZATÓRIO E PEDAGÓGICO. A fixação do valor da indenização por dano moral fica ao prudente arbítrio do Juízo, que deve analisar as circunstâncias do caso concreto, arbitrando um quantum que seja razoável para a reparação do ofendido e para que o caráter pedagógico da medida seja alcançado. No entanto, o valor não pode ser tão elevado a ponto de comprometer a continuidade das atividades da reclamada, que é microempresa. Dou parcial provimento ao recurso para reduzir o valor da indenização.[10].

Assim, a aplicação do instituto da responsabilidade civil nos casos de prática de Bullying possuiria a finalidade tríplice inerente à aplicação do dano moral: compensatória, punitiva e preventiva (ou educativa). Isto é, a criança ou adolescente que sofreu a violência e que foi vítima do dano, perceberia a finalidade compensatória do dano moral, que tenta que a situação retorne, da forma mais adequada possível, ao status quo ante. O causador do dano perceberia a função punitiva, como uma das formas de sanção para o ato praticado. E, por último, o caráter educativo, preventivo ou psicológico que é percebido por toda a sociedade por enxergar que há uma repressão por parte do Estado para condutas daquele feitio.

3. Aspectos Consumeristas do Contrato de Ensino Privado

O contrato firmado entre os pais ou representantes do estudante menor e a instituição de ensino recebe a tutela do Código do Consumidor, uma vez que os contratantes se adequam, respectivamente, nas qualidades de consumidor e fornecedor estabelecidas nos artigos 2° e 3º do referido código. 

O Código de Defesa do Consumidor define como consumidor, em seu artigo 2°, toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Desse modo, ensina-nos José Geraldo Brito Filomeno que:

O conceito de consumidor adotado pelo Código foi exclusivamente de caráter econômico, ou seja, levando-se em consideração tão somente o personagem no mercado de consumo que adquire bens ou então contrata a prestação de serviços, como destinatário final, pressupondo-se que assim age com vistas ao atendimento de uma necessidade própria e não para o desenvolvimento de uma outra atividade negocial. [11] 

Desse modo, o CDC adotou expressamente a teoria finalista que parte do conceito econômico de consumidor, propondo uma interpretação restrita da expressão destinatário final. Consumidor seria aquele que põe fim à cadeia de produção (Garcia, 2012, p.19).

Assim, percebe-se que aquele que contrata uma instituição privada de ensino é o consumidor da relação, uma vez que é o destinatário final da prestação do serviço.

Nessa mesma relação, temos que a Instituição de ensino se adequa no conceito de fornecedor estabelecido pelo artigo 3° do Código de Defesa do consumidor: fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

Por fim, temos que a instituição de ensino presta o serviço educacional, que se adequa ao conceito de serviço previsto no art. 3° parágrafo 2° do Código supracitado, o qual considera como serviço qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração.

Assim, é inegável a qualidade de contrato consumerista do contrato de prestação de serviços educacionais. Desse modo, a prestação deste serviço deve ser norteada pelos princípios protetores da relação de consumo. 

O consumidor é protegido pelo Código de Defesa do Consumidor por possuir vulnerabilidade. Nesse sentido, o STJ reconheceu a vulnerabilidade do Consumidor no seguinte julgado: 

O ponto de partida do CDC é a afirmação do princípio da vulnerabilidade do consumidor, mecanismo que visa garantir igualdade formal-material aos sujeitos da relação jurídica de consumo. (STJ, REsp 586316/ MG, Rel. Min. Herman Benjamin. DJe 19/03/2009.) 

Portanto, a vulnerabilidade do consumidor é presunção estabelecida no CDC como fenômeno de direito material com presunção absoluta – jure et de juris. 

Além da vulnerabilidade do consumidor, temos no CDC os princípios da boa-fé objetiva, princípio da função social e o princípio da equivalência material. 

A boa-fé objetiva estabelece deveres de conduta para fornecedores e consumidores, os quais têm o dever de agir com lealdade e confiança. Assim, a boa-fé objetiva é um conjunto de padrões éticos de comportamento aferíveis objetivamente, que devem ser seguidos pelas partes contratantes em todas as fases da existência da relação contratual (Garcia, 2012, p. 47). 

Desse modo, é como corolário da boa-fé objetiva que se entende ser atribuição do estabelecimento educacional a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos ocorridos durante a prestação do serviço (art, 6°, VI, CDC). 

Outro princípio é o da função social do contrato que está previsto no CDC como o intervencionismo estatal que tenta frear uma possível disparidade entre os contratantes, que possa afetar a real intenção dos mesmos na consecução do contrato.  

Em decorrência deste princípio, temos que é dever da instituição de ensino a adoção de medidas tendentes a evitar condutas de Bullying no recinto escolar. 

Entendemos ainda que é função do estabelecimento escolar a interação com os responsáveis pelos menores a fim de cientificar os mesmos dos possíveis casos de Bullying, além de propor medidas para a extinção da prática de tais atos. 

Já o princípio da equivalência material determina que as cláusulas contratuais sejam interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor (art. 47, CDC), o que implica dizer que, sob qualquer pretexto, a cláusula sendo ambígua, contraditória, capciosa ou sem defeito aparente, será interpretada de modo mais favorável ao consumidor. 

4. Hipóteses e Limites da Responsabilidade das Escolas Particulares

Tendo que as instituições de ensino privadas estabelecem com os pais ou representantes do aluno menor de idade uma relação de consumo, quando há a ocorrência de um dano ocasionado em razão da defeituosa prestação de serviço, os representantes legais da entidade responderão objetivamente pela reparação desse dano, nos termos do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor.

A ocorrência de casos de Bullying no âmbito escolar caracteriza-se como uma falha prestação de serviço, tendo em vista que é dever da escola, através de seus funcionários – professores ou dirigentes – zelar pela integridade física e psíquica de seus alunos. A fim de materializar essa obrigação, deve-se vigiar, fiscalizar e empreender medidas que visem prevenir e evitar que a escola seja um cenário para a prática do Bullying.

É certo que o Bullying cometido na escola caracteriza gritante violação aos deveres de vigilância, fiscalização e eleição em relação aos seus discentes, recaindo nas hipóteses de responsabilização civil.

Os funcionários de uma escola devem estar atentos a possíveis sinais de incidência dessa prática, tendo em vista se tratar de uma realidade cada vez mais presente nas escolas ao redor do mundo. Nesse sentido, além do dever de fiscalização e vigilância, ao tomarem ciência da situação, cabe aos responsáveis adotar medidas efetivas para sanar a questão.

Em artigo de Beatriz Santomauro, são elencadas as seguintes providências para a solução do Bullying:

  1. a) Reconhecer os sinais: é comum a vítima se queixar de dores e da falta de vontade de ir à escola; b) Fazer um diagnóstico: aplicar questionários para verificar como os alunos se relacionam; c) Falar com os envolvidos: conversa particular com a vítima e o agressor, focando a recuperação de valores essenciais, como o respeito; d) Encaminhar os casos a outras instâncias: em situações extremas levar o problema para delegacia.[12]

Caso o estabelecimento de ensino permaneça inerte e omisso diante de um contexto de Bullying, será ele o responsável pela reparação do dano, uma vez que, ciente da conduta, nada fez para impedi-la ou saná-la.

Por ser a instituição de ensino particular, prestadora de serviço, cabe-lhe o dever de tomar medidas preventivas e, ainda, quando da ocorrência da violência entre alunos, deve buscar solucionar a questão. Caso não o faça, responderá pelos danos causados à vítima que se encontrava sob sua custódia, nos termos do art. 6º do Código de Defesa do Consumidor.

Após tomar conhecimento de práticas de Bullying entre os alunos, além de tomar as devidas providências, como as citadas supra, entre outras pertinentes ao caso em concreto, a instituição deve também dar ciência do ocorrido aos pais dos envolvidos, ou seja, relatar aos responsáveis dos alunos que estes estão inseridos em uma situação de violência escolar, estejam eles em qualquer dos polos da relação: tanto os responsáveis pelo agressor como os responsáveis pelo agredido devem estar cientes da situação vivenciada na escola.

Essa necessidade de fornecimento de informação aos pais ou responsáveis legais pelos menores deve ocorrer em função do dever legal que possuem sobre estes, em decorrência do poder familiar, do qual decorre a obrigação de educar, segundo os arts. 1.634, inciso I, 932, inciso I e 933, todos do Código Civil pátrio.

Tomadas as devidas providências repressivas pela entidade escolar diante dos atos de Bullying, que só poderá ter sua eficácia mensurada conforme a análise de cada circunstância em concreto, e, além disso, dada a devida ciência da situação aos pais/responsáveis/tutores, caso estes últimos não procedam com demais atitudes inibitórias frente à conduta de seus filhos, serão também civilmente responsáveis.

Aos pais, detentores do poder familiar e do exercício do direito de guarda e proteção em relação à pessoa dos filhos menores, incumbe o dever de incutir princípios morais rígidos na formação de seus filhos, dentre eles, respeito e consideração aos seus semelhantes, orientação para que o filho entenda que a escola é ambiente para convivência social e de construção da civilidade e cidadania, além de exercer sobre eles vigilância contínua para que não causem prejuízo a outrem, sob pena de responder pelo pagamento da indenização causada por estes atos de Bullying praticados na escola, tratando-se de responsabilidade com base na culpa por falha na vigilância (“in vigilando”) e na educação (“in educando”).

O magistério de JOSÉ DE AGUIAR DIAS ilustra bem a responsabilidade do(s) pai(s) em educar seus filhos no seu mais amplo sentido:

Quando se cogita da responsabilidade paterna, tem-se em vista o inadimplemento real ou presumido dos deveres que ao pai corre em relação ao menor. Esses deveres são de duas ordens: a) assistência, que não é só a material, traduzida na prestação de alimentos e satisfação de necessidades econômicas, mas também moral, compreendendo a instrução e a educação, esta no seu mais amplo sentido; b) vigilância. Na primeira categoria se entende incluída a obrigação de propiciar ao menor, ao lado da prestação de conhecimentos compatíveis com as suas aptidões e situação social e com os recursos do pai, o clima necessário ao seu sadio desenvolvimento moral, inclusive pelo bom exemplo. A vigilância é o complemento da obra educativa, e far-se-á mais ou menos necessária, conforme se desempenhe o pai da primeira ordem de deveres. Esses os motivos por que se presume a responsabilidade do pai. Um filho criado por quem observe à risca esses deveres não pode ser autor de injusto prejuízo para outrem.[13]

            Nesse sentido, tem-se que os pais poderão responder solidariamente com a instituição de ensino (ou com o Estado, caso aqui falássemos de instituições públicas).

A responsabilidade dos estabelecimentos de ensino é objetiva, independe de culpa e é fundada na Teoria do Risco que, neste caso, é a Teoria do Risco Criado. Essa teoria é adotada quando o agressor cria o risco, decorrente de outra pessoa ou coisa. Para que haja a responsabilidade objetiva dos estabelecimentos, é necessário se provar a culpa do agressor do Bullying. Se não se provar a sua culpa, não há que se falar em responsabilidade objetiva destes estabelecimentos.

Conclusão

            Este trabalho buscou elucidar as hipóteses de incidência de responsabilidade civil dos estabelecimentos privados de ensino primário e secundário diante de situações de Bullying vivenciadas em suas dependências.

            Depreende-se desse estudo que as escolas, enquanto prestadoras de serviço, constituem com seus contratantes uma relação consumerista. Dessa forma, diante de atos de Bullying praticados por seus alunos, a responsabilidade dessas instituições é objetiva, fundando-se no risco de sua atividade.

Ao assumir um contrato de prestação de serviço de ensino, tais entidades se obrigam também a zelar pela integridade física e psíquica de seus alunos. Portanto, resta evidente sua falha diante da configuração de um quadro de violência sistemática entre seus alunos (consumidores do serviço fornecido).

Com base no presente estudo, podemos afirmar que a sociedade deve enfrentar com seriedade a questão do Bullying, com o intuito de eliminá-lo do cenário escolar. Certamente a tarefa é árdua, porém não é impossível se houver comprometimento das escolas, da família, dos educadores, dos alunos, pois como diz Gabriel Chalita, “ninguém gosta de viver a violência, nem como professor, nem como aluno, nem como vítima, nem como agressor, tampouco como testemunha de atos desumanos”[14].

Portanto, é necessário que se admita que há hipóteses de responsabilização dos estabelecimentos de ensino. Entretanto, tal responsabilidade deve ser averiguada em conjunto com os demais fatores sociais que permeiam o tema, uma vez que é intrínseca a relação entre pais, alunos e a escola.

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[1] DIAS, Aguiar. Da responsabilidade, cit., 4. ed., n. 194; Mazeaud e Mazeaud, Responsabi- lité civile, cit., v. I, n. 804; Demogue, Traité, cit., t. 5, n. 852, apud Caio Mário da Silva Pereira, Responsabilidade, cit., p.107

[2] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, vol. 7: responsabilidade civil. Ed. Reformulada. São Paulo: Saraiva, 2009, pág. 34

[3] SERPA LOPES, Miguel Maria de. Curso de Direito Civil, 2.ed. Volume 5. Freitas Bastos, 1962, pág. 188, 189.

[4] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, vol. 7: responsabilidade civil. Ed. Reformulada. São Paulo: Saraiva, 2009, pág. 35

[5] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, vol. 7: responsabilidade civil. Ed. Reformulada. São Paulo: Saraiva, 2009, pág. 526

[6] “A cláusula de não indenizar é aquela pela qual uma das partes contratantes declara que não será responsável por danos emergentes do contrato, seu inadimplemento total ou parcial. Trata-se da exoneração convencional do dever de reparar o dano.” (in: VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil, Responsabilidade Civil, Volume 4, 2ª edição, Editora Atlas S.A., São Paulo, 2002)

[7] SANTROCK, John W. Psicologia educacional – 3. ed. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre: AMGH, 2010.

[8] CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

[9] BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado,1998.

[10] GOIÁS, Tribunal Regional do Trabalho, 1078201000318002 GO 01078-2010-003-18-00-2. Relator: Breno Medeiros. Publicação: DEJT Nº 930/2012, de 02.03.2012, pág.41.

[11] FILOMENO, José Geraldo Brito. In: GRINOVER, Ada Pellegrini. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 9. ed.  Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p. 28.

[12] SANTOMAURO, Beatriz. Artigo: Violência Virtual. Revista Nova Escola. Editora Abril. São Paulo Junho/Julho/2010, p.72.

 

[13] DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994

[14] CHALITA, Gabriel. Pedagogia da Amizade – Bullying: o sofrimento das vítimas e dos agressores. São Paulo: Ed. Gente, 2008.

CAPÍTULO 13

AVALIAÇÃO DA EFICÁCIA DE UM CURSO ONLINE PARA TREINAMENTO EM SEGURANÇA NO TRABALHO

EVALUATING THE EFFECTIVENESS OF AN ONLINE COURSE FOR OCCUPATIONAL SAFETY TRAINING

 

DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.13

Submetido em: 12/10/2023

Revisado em: 20/10/2023

Publicado em: 27/10/2023

 

Onildo Ribeiro de Assis II

Universidade Federal da Paraíba, Centro de Tecnologia, João Pessoa-PB

http://lattes.cnpq.br/9395514914006549

 

Resumo

Este estudo analisa a viabilidade da aplicação do curso online de segurança no trabalho da Rede Senai de Educação a Distância como ferramenta de internalização do conhecimento para um grupo de operários de uma construtora localizada na Paraíba, Brasil, se tratando, portanto, de um estudo de caso. Os resultados não apontam para uma conclusão generalista por apresentar uma amostra pequena em relação à quantidade de trabalhadores existentes na construção civil. Contudo, algumas particularidades podem ser consideradas a saber: a linguagem utilizada no curso deveria ser mais acessível; a disposição dos links é ruim; apesar do curso ter a possibilidade de acesso em qualquer computador conectado a internet, a amostra estudada, em sua maioria não possuem facilidade de acesso a computadores; e por fim, apesar da boa qualidade do conteúdo, os termos utilizados distanciam-se da realidade encontrada nos trabalhadores pesquisados. Como conclusão, verifica-se que mesmo com a implantação de boas práticas das instituições governamentais e do setor privado, percebe-se um déficit no que tange aspectos de inclusão digital e usabilidade de ferramentas de TI para treinamento e capacitação dos trabalhadores da construção civil. Dessa forma, sugere-se a readaptação do curso nos aspectos de linguagem e navegação, procurando uma aproximação desse público, uma vez que o curso se destina principalmente a esses indivíduos, que estão diretamente ligados a uma atividade de risco, apresentando geralmente, baixa escolaridade, devido às sequelas de formação educacional.

Palavras-Chave: educação a distância, segurança no trabalho, gestão do conhecimento.

Abstract

This study analyzes the feasibility of applying the online safety course at work from the Senai Distance Education Network as a tool for internalizing knowledge for a group of workers from a construction company located in Paraíba, Brazil. case. The results do not point to a general conclusion as they present a small sample in relation to the number of workers in construction. However, some particularities can be considered, namely: the language used in the course should be more accessible; the layout of the links is bad; although the course has the possibility of access on any computer connected to the internet, the sample studied, for the most part, does not have easy access to computers; and finally, despite the good quality of the content, the terms used are far from the reality found in the workers researched. In conclusion, it appears that even with the implementation of good practices by government institutions and the private sector, there is a perceived deficit regarding aspects of digital inclusion and usability of IT tools for training and qualification of construction workers. Therefore, it is suggested that the course be readapted in terms of language and navigation, seeking to bring this audience closer together, since the course is mainly aimed at these individuals, who are directly linked to a risky activity, generally presenting a low level of education. , due to the consequences of educational training..

Keywords: distance education, occupational safety and health, knowledge management.

 
Introdução

A gestão do conhecimento, conforme Teixeira, Silva e Lapa (2004) pode ser considerada como um conjunto de processos que visa à criação, utilização e disseminação do conhecimento dentro da organização. Carrión, González e Leal (2004) dividem o processo da gestão do conhecimento em três elementos: indivíduo, processo e tecnologia, esta última serve como suporte para o processo baseado em conhecimento.

A tecnologia é abordada como um facilitador do processo, e conforme Fehér (2006) diminui as barreiras do conhecimento, tendo assim, um papel fundamental no suporte as práticas da gestão do conhecimento. Segundo Medeiros et al. (2009), é papel das organizações identificar a tecnologia de informação (TI) mais adequada para o uso em conjunto com a gestão do conhecimento. Contudo, a tecnologia da informação não resolve todos os problemas da organização. Segundo Younes e Papadiouk (2007), a TI é fundamental para a combinação dos conhecimentos explícitos, facilita a externalização do conhecimento, porém não dá a certeza sobre a sua contribuição para o formato tácito do conhecimento.

Tendo em vista esses conceitos, esta pesquisa apresenta o estudo da viabilidade de um curso online como ferramenta para auxiliar nas práticas de conscientização da segurança no trabalho para operários de uma construtora, verificando como as características de um sistema online (linguagem, navegação, acessibilidade, conteúdo e rendimento) podem contribuir na internalização de um conhecimento tão importante como a segurança no ambiente de trabalho.

O curso sobre segurança no trabalho abordado nesta pesquisa tem duração de 14h e é disponibilizado de forma gratuita pelo Núcleo de Educação a Distância do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI). Este departamento foi criado visando possibilitar o atendimento às demandas por educação profissional dos trabalhadores e das empresas através da união das áreas de informática com educação, oferecendo assim, diversos cursos gratuitos à distância sobre temas que desenvolvem capacidade para a iniciação no mundo do trabalho ou, no caso de quem já está trabalhando, para a atualização das competências profissionais.

O curso aborda, conforme descrição oficial no site, temas como a preservação da saúde e da integridade dos trabalhadores, através da antecipação, reconhecimento, avaliação e consequente controle da ocorrência de riscos ambientais existentes ou que venham a existir no ambiente de trabalho, tendo em consideração a proteção do meio ambiente e dos recursos naturais.

A justificativa de estudar esse setor produtivo está na grande importância que a construção civil representa para o país, segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior da Secretaria de Tecnologia Industrial – MDIC/STI (2021), a Construbusiness, nome dado à cadeia produtiva do setor, representou 70% dos investimentos em capital fixo da economia brasileira. Contudo, esses grandes números também acompanham um número elevado de acidentes no trabalho, conforme os dados do Ministério da Previdência Social no Anuário Estatístico da Previdência Social – AEPS apresentado pelo Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (2020) o número de acidentes do trabalho registrados em 2006 foi de 512.232, em 2007 aumentou para 659.523 e em 2008 atingiu o surpreendente número de 747.663 casos de acidentes do trabalho. Tem-se então, a importância da internalização dos conceitos sobre segurança do trabalho no ambiente em que estes indivíduos estão inseridos.

Metodologia

Este estudo analisa a viabilidade do curso online de segurança no trabalho como ferramenta da gestão do conhecimento, precisamente no que diz respeito à verdadeira internalização do conhecimento repassado pelo sistema de informação adotado, no caso, o curso online da Rede Senai de Educação a Distância.

A pesquisa foi realizada com operários de uma construtora localizada em João Pessoa, Paraíba, Brasil, se tratando, portanto, de um estudo de caso. Para tanto o estudo foi dividido em quatro etapas: primeiramente a realização de pesquisas bibliográficas sobre o tema com finalidade de desenvolver uma contextualização referente ao assunto abordado; em seguida foram realizadas entrevistas como forma de obtenção de informações referentes às características que descrevem o grupo, como idade, grau de escolaridade e acesso a computadores com internet.

Na terceira etapa do estudo, o curso foi levado aos funcionários que se dispuseram a participar, através de três notebooks com acesso a internet, em horários estimulados pela empresa estudada, sendo acordado para quatro vezes por semana, na segunda, terça, quarta e quinta entre as 17h e 18h nas duas primeiras semanas que datam do dia 23 de agosto de 2010 com término no dia 02 de setembro do mesmo ano. Na terceira semana, foram na quarta e na quinta, também das 17h até as 18h , completando, no total, 10 dias de aula.

Na quarta e última etapa, foram feitas novas entrevistas no intuito de identificar informações referentes à linguagem, navegação, acessibilidade e conteúdo do curso ao ponto de vista do público estudado, concluindo assim, a sua aceitação ou não, referente ao curso e as informações contidas nele.

Resultados e Discussão

Nesta etapa, inicia-se o procedimento de análise dos dados, que partiu da apresentação dos dados dos trabalhadores abordados, deixando claro suas características pessoais relacionadas ao grau de escolaridade, faixa etária e tempo de trabalho no setor da construção civil, dispondo também das análises dos dados obtidos da pesquisa em campo. Em seguida são apresentados os modos de conversão do conhecimento das informações repassadas pelo curso de Segurança no Trabalho oferecido pelo Senai. Por fim, é apresentada uma discussão sobre o último modo, a internalização, onde é discutido detalhadamente este processo.

  • Público-alvo

O público-alvo é o conjunto de funcionários de uma empresa do setor de construção civil, localizada na cidade de João Pessoa, Paraíba, Brasil. A empresa possui um total de 30 funcionários, sendo nove pedreiros, treze serventes, dois armadores, um eletricista, um encanador, três carpinteiros e um mestre de obra, todos do sexo masculino. A maioria dos funcionários, 30% deles, está na faixa de 18 a 24 anos. 23% estão de 25 a 32 anos, 27% de 33 a 39, 10% de 40 a 46 e 10% acima de 46 anos de idade, de acordo com o gráfico 1.

 

 

Gráfico 1: Faixa etária do público-alvo de funcionários de uma empresa do setor de construção civil na cidade de João Pessoa, Paraíba, Brasil.

Fonte: Dados da pesquisa

Sobre o grau de escolaridade, verifica-se que muitas dessas pessoas largaram os estudos quando crianças para começar a trabalhar e ajudar nas despesas de casa, o que caracteriza o grupo com índice bastante baixo neste quesito. Destes, 13% do total dos funcionários não sabem ler nem escrever, 43% apresentam apenas a educação infantil, 27% cursaram até a quarta série do ensino fundamental, 10% completaram o ensino fundamental e 7% concluíram o ensino médio, sendo que nenhum chegou a cursar o nível superior de ensino. conforme gráfico 2.

Gráfico 2: Grau de escolaridade dos funcionários de uma empresa do setor de construção civil na cidade de João Pessoa, Paraíba, Brasil.

Fonte: Dados da pesquisa

Em relação ao tempo que estão trabalhando na construção civil, a grande maioria está a menos de 4 anos no setor, onde se enquadra 50% dos funcionários nesta categoria. Outros 23% dos funcionários estão de quatro a oito anos, 20% de nove a doze, 7% de treze a dezesseis anos e nenhum com mais de dezessete anos no setor. O trabalho na construção civil é considerado de alto risco por 70% dos funcionários da empresa estudada, os 30% restantes consideram como uma atividade normal. Do total, 77% sofreram algum tipo de acidente e 23% nunca sofreram nada relacionado ao tema.

Diante desses números, 10% do publicado estudado se dispuseram a participar do curso online. Estes nunca participaram de nenhum curso sobre segurança no trabalho, não possuem computador em casa e não possuem habilidades no seu uso. Todos já haviam sofrido acidentes de trabalhos, contudo só usam equipamentos de segurança por ser obrigatório na empresa e não por ter conhecimento sobre este assunto.

  • Os modos de conversão do conhecimento no curso EAD

Há quatro modos de conversão do conhecimento propostos, conforme as definições de Nonaka e Takeuchi (1995). Estes modos foram estudados nesta pesquisa através da perspectiva de criação e uso de um sistema de informação voltada para a educação à distância na construção civil.

O primeiro modo, está relacionado à Socialização do conhecimento, onde há o processo de compartilhamento de experiências entre os indivíduos. Neste caso, há entre os portadores do conhecimento teórico sobre Segurança no Trabalho e os portadores do conhecimento técnico sobre desenvolvimento de sistemas online uma conversação sobre as linguagens de programação e os meios computacionais usados para o desenvolvimento do sistema.

O segundo modo, Externalização, há a transformação do conhecimento tácito em conhecimento explícito. Neste caso, os portadores do conhecimento teórico sobre segurança no trabalho formalizam o seu conhecimento em forma de textos sobre o tema e os portadores do conhecimento técnico em desenvolvimento de sistemas fazem o modelo do curso, apresentando o layout e a disposição dos links suporte e todas as ferramentas necessárias para criação do curso online;

Em seu terceiro modo, chamado de Combinação, acontece a fusão dos conhecimentos citados anteriormente, ou seja, o conteúdo relativo à segurança no trabalho é aplicado seguindo as especificações definidas no modelo proposto pelos programadores ou responsáveis pelo conhecimento técnico. Neste momento é criado o curso online sobre segurança no trabalho, como podemos verificar nas figuras a seguir.

Figura 01: Tela principal do curso online oferecido pelo SENAI.

Fonte: Senai (2020).

A figura acima retrata o ambiente de estudo do curso, nesta tela estão dispostos os links suporte e o acesso aos primeiros módulos de estudo do curso. Já na figura a seguir, um dos módulos está representado, contendo as informações referentes ao próprio conteúdo do curso.

Figura 02: Exemplo de módulo de estudo do curso online oferecido pelo SENAI.

Fonte: Senai (2020).

Para ser aprovado e consequentemente receber o certificado do curso a distância, o aluno precisa passar por uma prova contendo 10 questões sobre o tema abordado. Ele terá apenas uma chance para obter nota superior a sete, caso não consiga, terá que iniciar todo o curso novamente.

Figura 03: Avaliação do curso online oferecido pelo SENAI.

Fonte: Senai (2020).

O quarto modo de convenção do conhecimento é chamado de Internalização, que consiste na incorporação do conhecimento explícito em conhecimento tácito. O processo de transformação para conhecimento tácito se dá a partir do momento em que os alunos acessam o curso online, e tem acesso aos dados apresentados, contudo, os dados só se transformaram em aprendizagem se estes forem assimilados e entendidos ao ponto de alterar a “visão” do receptor sobre o assunto tratado. Sendo assim, o tópico a seguir apresenta os resultados deste processo.

  • Discussão sobre o processo de internalização do conhecimento para o grupo estudado

Um fator importante que influenciou bastante mal o resultado deste processo foi o grau de ensino do público estudado, pois quando abordados sobre a linguagem do curso, os funcionários consideraram de nível regular com tendência para difícil. Estes afirmam, em sua maioria, que não conheciam alguns dos termos usados na comunicação e que por isso, não assimilaram o conteúdo passado, logo a linguagem deveria ser da forma mais simples e objetiva possível, possibilitando o fácil entendimento deste público.

Em relação à acessibilidade, o grupo pesquisado entendeu seu melhor acesso em relação aos demais meios de ensino, pelo fato deste tipo de sistema necessitar apenas de um computador ligado a internet. No entanto avaliaram como regular, já que não possuíam computador, nem facilidade de acessar qualquer outro com internet.

Apesar de anteriormente não participarem de nenhum curso de segurança, ficaram impressionados com o número de informações dispostas no curso a distância, e consideraram bom o nível de informações expostas. No entanto, mesmo com um bom número de dados e conteúdo, todos consideraram péssimo o rendimento diante da ferramenta, devido, principalmente a baixa habilidade no uso do computador e a falta de experiência em sistemas como o que foi abordado na pesquisa. Essa falta de habilidade influenciou bastante no quesito navegação, que foi avaliado como regular/ruim, haja vista a disposição dos links.

­­Considerações Finais

Nesse estudo, foi avaliada a viabilidade do treinamento dos funcionários através do curso básico de segurança no trabalho on-line. Verifica-se que a internalização do conhecimento passado pelo curso não foi totalmente alcançada para o público estudado. No entanto, nota-se a importância deste estudo destinado ao setor produtivo da construção civil, que segundo Silva et al. (2009), apresenta, entre outras características, a sua forma peculiar no processo de produção,      que oferecendo aos operadores e funcionários riscos operacionais de execução, de ambiente insalubre e demais aspectos inerentes a esse tipo de processo. Necessitando assim, de um programa de segurança no trabalho.

Quanto à ferramenta propriamente dita, acredita-se que atualmente esse tipo de curso ainda não é tão eficiente quanto planejado, ou seja, o curso presencial por suas características, provavelmente terá uma maior eficiência para este público. Contudo, é recomendado para trabalhos futuros, um estudo com um número maior de trabalhadores da construção civil, como forma de concluir pesquisas mais abrangentes sobre o tema.

Verifica-se portando que mesmo com a implantação de boas práticas das instituições governamentais e do setor privado, percebe-se um déficit no que tange aspectos de inclusão digital e usabilidade de ferramentas de TI para treinamento e capacitação dos trabalhadores da construção civil. Dessa forma, sugere-se a readaptação do curso nos aspectos de linguagem e navegação, procurando uma aproximação desse público, uma vez que o curso se destina principalmente a esses indivíduos, que estão diretamente ligados a uma atividade de risco, apresentando geralmente, baixa escolaridade, devido às sequelas de formação educacional.

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CAPÍTULO 14

A MATEMÁTICA E A INTERDISCIPLINARIDADE: PERSPECTIVAS PARA A APRENDIZAGEM DOS ESTUDANTES DO ENSINO FUNDAMENTAL DE ACORDO COM DOCUMENTOS OFICIAIS DA EDUCAÇÃO

MATHEMATICS AND INTERDISCIPLINARITY: PERSPECTIVES FOR ELEMENTARY SCHOOL STUDENTS’ LEARNING ACCORDING TO OFFICIAL EDUCATION DOCUMENTS

DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.14

Submetido em: 14/11/2023

Revisado em: 25/11/2023

Publicado em: 27/11/2023

 

Magno Andris Costa Pereira

Secretaria Municipal de Educação (SEMED), Bequimão – MA

https://orcid.org/0009-0006-8259-9353

Joemilia Maria Pinheiro Almeida

Universidade Ceuma (UNICEUMA), São Luís – MA

https://orcid.org/0000-0003-3667-7112

Manoel dos Santos Costa

Instituto Estadual de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão (IEMA) e

Universidade Federal do Maranhão (UFMA), São Luís – MA

https://orcid.org/0000-0002-8774-9633

Marcia Valéria Melo e Silva

Universidade Ceuma (UNICEUMA), São Luís – MA

https://orcid.org/0000-0003-3599-9048

 

Resumo

O presente artigo tem por objetivo fazer uma reflexão acerca do ensino de Matemática nos anos finais do Ensino Fundamental sob a perspectiva da interdisciplinaridade, de acordo com as recomendações de documentos oficiais da Educação. Trata-se, portanto, de uma pesquisa bibliográfica, de natureza qualitativa, cujo objeto de análise foi o arcabouço documental que inclui, dentre outros, documentos oficiais. As reflexões apresentadas no presente artigo nos levam a pensar na importância do currículo escolar e na necessidade de buscar novas perspectivas para o ensino, em sua concepção e em sua reforma. O Ensino Fundamental, etapa obrigatória a todos os cidadãos, deve levar em consideração a realidade social e as características culturais de nossa sociedade, e aproveitar todos os meios de que hoje se dispõe. Por isso, a organização do currículo e o desenvolvimento dos conteúdos, de forma fragmentada/isolada, em sala de aula, eliminam a possibilidade do exercício da produção interdisciplinar no processo de ensino-aprendizagem.

Palavras-Chave: Educação Matemática, Ensino Fundamental, Documentos oficiais, Interdisciplinaridade.  

Abstract

The aim of this article is to reflect on the teaching of mathematics in the final years of elementary school from the perspective of interdisciplinarity, in accordance with the recommendations of official education documents. It is, therefore, qualitative bibliographical research whose object of analysis was the documentary framework which includes, among others, official documents. The reflections presented in this article lead us to think about the importance of the school curriculum and the need to seek new perspectives for teaching, in its conception and reform. Primary education, a compulsory stage for all citizens, must take into account the social reality and cultural characteristics of our society, and take advantage of all the means available today. For this reason, the organization of the curriculum and the development of content in a fragmented/isolated way in the classroom eliminates the possibility of exercising interdisciplinary production in the teaching-learning process.

Keywords: Mathematics education, Elementary school, Official documents, Interdisciplinarity.

 
Introdução

O conhecimento matemático é necessário para todos os alunos da Educação Básica, inclusive os do Ensino Fundamental, seja por sua grande aplicação na sociedade contemporânea, seja pelas potencialidades na formação de cidadãos críticos, cientes de suas responsabilidades sociais. Ou seja, a Matemática nesse nível de ensino é de suma importância para os estudantes, pois ela desenvolve o pensamento lógico e é essencial para a construção de conhecimentos em outras áreas, além de servir como base para os anos/séries da escolaridade subsequente.

É nesse sentido que o antigo documento de referência curricular brasileiro, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), enfatiza a importância de a Matemática desempenhar, equilibrada e indissociavelmente, seu papel na formação de capacidades intelectuais, na estruturação do pensamento e do raciocínio dedutivo dos estudantes, na sua resolução de problemas e situações da vida cotidiana, assim como em atividades do mundo do trabalho, e no apoio à construção de conhecimentos em outras áreas do conhecimento (Brasil, 1998).

Além disso, de acordo com esse documento, o ensino de Matemática costuma provocar reflexões contraditórias tanto para o professor quanto para os alunos; de um lado, traz a constatação de que se trata de uma área do conhecimento e de um importante componente curricular para a Educação na construção da cidadania, na medida em que a sociedade se utiliza, cada vez mais, de conhecimentos científicos e recursos tecnológicos dos quais os cidadãos devem se apropriar; de outro, a insatisfação diante dos resultados negativos em relação à sua aprendizagem, obtidos em avaliações externas, como, por exemplo, a Prova Brasil.

Para o atual documento de referência curricular, a Base Nacional Comum Curricular – BNCC (Brasil, 2018), o Ensino Fundamental deve ter compromisso com o desenvolvimento do letramento matemático, definido como competências e habilidades de raciocinar, representar, comunicar e argumentar matematicamente, de modo a favorecer o estabelecimento de conjecturas, a formulação e a resolução de problemas em uma variedade de contextos, utilizando conceitos, procedimentos, fatos e ferramentas matemáticas. Ainda de acordo com o documento, o letramento matemático assegura aos estudantes reconhecerem que os conhecimentos matemáticos são fundamentais para a compreensão e a atuação no mundo, e perceberem o caráter intelectual da Matemática como um aspecto que favorece o desenvolvimento do raciocínio lógico e crítico, que estimula a investigação e que, além disso, pode ser prazeroso.

Nessa perspectiva, documentos oficiais da Educação, como a BNCC, e os currículos devem apresentar papéis complementares de uma forma que possam assegurar aos estudantes as aprendizagens essenciais definidas em cada etapa da Educação Básica, uma vez que tais aprendizagens só se materializam mediante o conjunto de decisões que caracterizam o currículo em ação. Isso significa que essas decisões devem se adequar à realidade local, considerando a autonomia dos sistemas ou das redes de ensino e das instituições escolares, assim como o contexto e as características dos estudantes. Ou seja, cada etapa da formação básica deve ser composta por competências articuladas como um todo indissociável, enriquecidas pelo contexto histórico, econômico, social, ambiental, cultural local, do mundo do trabalho e da prática social, e, por isso, deverá ser organizada por áreas de conhecimento.

Além disso, essas decisões, que resultam de um processo de envolvimento e participação das famílias e da comunidade, referem-se, entre outras ações, a:

[…] decidir sobre formas de organização interdisciplinar dos componentes curriculares e fortalecer a competência pedagógica das equipes escolares para adotar estratégias mais dinâmicas, interativas e colaborativas em relação à gestão do ensino e da aprendizagem (Brasil, 2018, p. 16).

Essa organização interdisciplinar implica, dentre outros, o fortalecimento das relações entre os saberes e a sua contextualização para a apreensão e intervenção na realidade, requerendo planejamento e execução conjugados e cooperativos dos professores. Dessa forma, o currículo pode ser planejado e desenvolvido dentro das áreas, envolvendo os diversos componentes curriculares.

Para Asensio (apud Hernández; Ventura, 2017), a interdisciplinaridade é uma tentativa voluntária de integração entre as diferentes ciências, com um objetivo de conhecimento comum. Essa integração, segundo o autor, pode ser produzida entre componentes curriculares próximos, em seus métodos ou nos objetos que abordam, ou entre saberes distantes frente aos quais se faz necessário “um considerável esforço entre seus modos de ver a realidade e entre seus conteúdos” (p. 53).

Diante do exposto, o presente estudo se propõe a fazer uma reflexão acerca da aprendizagem matemática dos estudantes dos anos finais do Ensino Fundamental e do contexto da interdisciplinaridade, de acordo com as orientações de documentos oficiais da Educação.

Fundamentação Teórica

De acordo com as Diretrizes Curriculares do Estado do Maranhão (DCM), cada nível de ensino tem um foco, ou seja, uma formação específica no processo de escolarização. No caso da Educação Básica, o foco é fornecer meios para que os alunos progridam no trabalho e em estudos posteriores. Nessa perspectiva, cada etapa e modalidade de ensino que integra a Educação Básica tem uma missão específica na formação dos alunos, para que essa finalidade se efetive (Maranhão, 2014). 

Ainda segundo o documento, a formação escolar promovida no Ensino Fundamental no Estado do Maranhão tem como objetivo assegurar a todos os estudantes um tempo maior de permanência na escola, de modo que se possam assegurar melhores oportunidades para a construção de uma aprendizagem mais qualitativa, dentre elas o pleno domínio do cálculo matemático. 

A preocupação do documento com a aprendizagem matemática dos estudantes é porque ela se encontra presente no cotidiano de todos, seja na educação escolar, quando se aprende a contar, comparar e resolver problemas, seja na administração econômica do país ou no mercado financeiro, de forma concreta. No entanto, as dificuldades manifestadas por parte dos professores em fazer as conexões entre os conhecimentos teóricos e práticos fazem com que os estudantes tenham desinteresse; por isso, encontram obstáculos no seu processo de aprendizagem.

Um ponto de partida importante para que o professor tenha êxito nesse processo é a valorização da experiência trazida pelos alunos para a sala de aula, que funcionará como elemento básico para a organização do seu planejamento. Dessa forma, irá estimular o estudante a refletir e a fazer as primeiras relações entre e a teoria e a prática, desenvolvendo, assim, o pensamento matemático.

Neste sentido, Rosamund (2009, p. 43) afirma que:

As crianças não apenas trazem suas experiências escolares prévias em matemática para uma nova situação de aprendizagem, mas também trazem suas experiências de fora dela. Ao longo dos anos escolares, as crianças participam, junto com adultos e outras crianças, de toda uma gama de práticas matemáticas cotidianas relacionadas ao trabalho e ao tempo livre que podem influenciar sua aprendizagem de matemática na escola, tais como jogar cartas, ajudar com tarefas gerais em casa, planejar um feriado, trabalhar em uma loja ou trabalhar com um irmão mais velho em sua tarefa de casa.

Assim, é de grande relevância para o processo de aprendizagem a participação ativa do professor na (re)construção do conhecimento do estudante, pois alguns que ainda estão concluindo o Ensino Fundamental já estão inseridos no mercado de trabalho, como jovens aprendizes, assumindo responsabilidades perante a família e ansiosos por melhores condições de vida. Portanto, é preciso que o ensino de Matemática esteja ancorado em contextos sociais que mostrem claramente as relações existentes entre o conhecimento matemático e o trabalho (Brasil, 1998).

No entanto, para a maioria dos alunos, a Matemática é apenas um componente curricular difícil, cujo estudo se resume apenas em “decorar” uma série de fórmulas, sem compreendê-las e sem perceber suas aplicações, ou seja, sem entender sua utilidade; por isso, eles não têm uma relação bem definida com a Matemática.

Segundo os PCN (Brasil, 1998), o professor precisa fazer uso de vários métodos, por exemplo, fazer uso em suas aulas, da História da Matemática, que pode servir como fonte de interesse para os estudantes, na medida em que esta permite refletir a respeito do conhecimento acumulado pela humanidade, e de situações do cotidiano, que podem ajudar os alunos a ampliarem suas percepções, tornando-se autônomos diante de certas vivências, como administrar o dinheiro de sua mesada, suas prioridades de gastos e até na organização de suas atividades de lazer.

As necessidades cotidianas fazem com que os alunos desenvolvam uma inteligência essencialmente prática, que permite reconhecer problemas, buscar e selecionar informações, tomar decisões e, portanto, desenvolver uma ampla capacidade de lidar com a atividade matemática (Brasil, 1998, p. 37). 

Sabemos que a Matemática está presente em diferentes atividades que realizamos diariamente. Conseguir enxergá-la no cotidiano é um movimento que nos faz perceber a sua importância e a sua conexão nas diferentes áreas do conhecimento. Essas situações mostram aos estudantes que o ensino da Matemática é concebido numa visão sociointeracionista, na qual eles podem utilizar suas experiências de vida de forma articulada aos conteúdos, o que possibilitará a aquisição do conhecimento por meio de uma construção coletiva da aprendizagem.

Assim, a escola e os professores precisam avançar no sentido de romper com as práticas tidas como “tradicionais” no ensino de Matemática; no entanto, é necessário, de acordo com o documento curricular do território maranhense (DCTM), que:

[…] as ações pedagógicas sejam realizadas partindo de uma concepção de um currículo crítico e reflexivo, que aborde o conhecimento de forma interdisciplinar e se utilize de temas transversais, que seja capaz de auxiliar na formação humana e cidadã dos estudantes […] (Maranhão, 2019, p. 18).

Desse modo, as ações dos professores e os conteúdos a serem desenvolvidos devem ir ao encontro dessa intencionalidade, pois são requisitos essenciais para a formação integral e cidadã dos estudantes, uma vez que possibilitam a compreensão e a transformação de sua realidade; por isso, é necessário que o planejamento escolar esteja de acordo com as perspectivas que priorizem a formação do aluno e que possibilitem sua aprendizagem. Sendo assim, o currículo de Matemática deve ser organizado de acordo com a legislação vigente e deve receber tratamento metodológico com ênfase na contextualização e na interdisciplinaridade, ou em outras formas de interação e articulação entre diferentes componentes curriculares, com o intuito de dar significado ao aprendizado do estudante; ou seja, pode ser organizado por temáticas que melhor atendam à aprendizagem do estudante e que favoreçam um constante diálogo dentro da Matemática e entre a Matemática e outras áreas do conhecimento.

Por meio da interdisciplinaridade, as ações pedagógicas dão dinamicidade aos processos de ensino e aprendizagem da Matemática, de forma que a compreensão das abordagens metodológicas dos conteúdos matemáticos possibilite o entendimento do papel da própria Matemática, considerando seus elementos construtivos.

Aspectos Metodológicos

O presente estudo surgiu a partir de nossas inquietações acerca de como o currículo de Matemática do Ensino Fundamental vem sendo desenvolvido no contexto escolar. A partir daí, buscamos realizar um estudo de natureza descritiva e explicativa, de cunho bibliográfico, cujo objeto de análise foi o arcabouço documental, ou seja, aquele que é realizado por materiais escritos, que, em nosso estudo, foram obtidos em fontes (primárias e secundárias) confiáveis e concretas (publicados em livros e, principalmente, em documentos oficiais da Educação), que serviram como fonte de informação (Fiorentini; Lorenzato, 2012).

Os documentos oficiais da Educação que utilizamos foram as Diretrizes Curriculares do Estado do Maranhão e o Documento Curricular do Território Maranhense (Maranhão, 20214; 2019), e também os de referência nacional, como os Parâmetros Curriculares e a Base Nacional Comum Curricular (Brasil, 1997; 1998; 2018), tendo como foco a reflexão acerca do ensino de Matemática no Ensino Fundamental, na perspectiva interdisciplinar. Ou seja, o estudo foi centrado nesses documentos e nas contribuições que autores da Educação trazem como referência, que retratam esse panorama no ensino e que possibilitam a aprendizagem dos estudantes.

Para Marconi e Lakatos (2010), esse tipo de estudo não é constituído apenas por um único material, ou seja, é importante fazer uso de materiais publicados em livros e documentos oficiais, por exemplo, que permitem ao leitor colocar em prática as experiências. Dessa forma, Lüdke e André (2017) consideram a pesquisa bibliográfica/documental como um método valioso na abordagem dos dados qualitativos, pois busca identificar informações concretas nos documentos a partir de questões ou hipóteses de interesse.     

A Interdisciplinaridade e a Matemática no Ensino Fundamental

Ao longo do Ensino Fundamental, os alunos se deparam com desafios de maior complexidade, sobretudo, devido à necessidade de se apropriarem das diferentes lógicas de organização dos conhecimentos relacionados às diversas áreas. Tendo em vista essa complexidade, é importante que os componentes curriculares retomem e ressignifiquem as aprendizagens nos anos finais no contexto das diferentes áreas, visando ao aprofundamento e à ampliação do repertório dos estudantes (Brasil, 1998; 2018). 

Nessa direção, compete ao professor fazer a adequação de suas metodologias de ensino de acordo com os conteúdos a serem desenvolvidos, com o intuito de promover discussões sobre os significados matemáticos presentes nos diversos contextos. Assim, o desenvolvimento dessas metodologias objetiva a construção de um processo educativo que interligue os fenômenos em estudo e as práticas sociais, culturais e físicas que constituem a realidade.  

Diante disso, questionamo-nos: Do que trata a interdisciplinaridade? Qual o seu papel na Educação Matemática? A interdisciplinaridade, segundo Freire (1987), é o processo metodológico de construção do conhecimento pelo sujeito com base em sua relação com o contexto, com a realidade e com sua cultura. De acordo com Fazenda (2013), a interdisciplinaridade pode ser definida como a relação entre as diferentes áreas do conhecimento, abrangendo um objeto de estudo em comum, uma grande temática, por exemplo, e contemplando as características específicas de ambas.

A interdisciplinaridade também pode ser entendida como um movimento de reconstituição de sentido dos estudantes pelos conhecimentos aprendidos, como uma possibilidade de traçar novos caminhos frente aos problemas que vivenciam na contemporaneidade (Tavares, 2018).

A partir dessas definições, assumimos, então, que a interdisciplinaridade é um método de ensino que se propõe a integrar diferentes componentes curriculares, abordando os conteúdos por meio de determinadas temáticas, de modo a estabelecer uma relação entre eles para permitir que o aluno elabore uma visão mais ampla a respeito dessas temáticas. Dessa forma, é válido destacar que na Matemática, é possível trabalhar com temas integradores, de forma interdisciplinar e contextualizada, que estão inseridos nas habilidades desse componente curricular em todas as etapas da Educação Básica.

Vale ressaltar que a interdisciplinaridade na Educação brasileira foi influenciada pela Lei n. 5.692 (Brasil, 1971) e pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN, n. 9.394 (Brasil, 1996), dando origem aos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN (Brasil, 1997; 1998).

De acordo com os PCN, as propostas curriculares oficiais deveriam ser organizadas em disciplinas (componentes curriculares) e/ou áreas do conhecimento. As instituições de ensino também poderiam optar por princípios norteadores, eixos ou temas, desde que abordassem os conteúdos de modo interdisciplinar, buscando integrar o cotidiano social ao saber escolar. No entanto, a interdisciplinaridade e os objetivos específicos de cada componente curricular deveriam ser preservados, através do diálogo, tratando e contextualizando um tema comum entre eles, ou seja, as questões sociais deveriam ser relacionadas entre os componentes curriculares com foco na ética, saúde, meio ambiente, orientação sexual e pluralidade cultural.

De acordo com o documento, esses temas foram escolhidos por envolverem problemáticas sociais que precisavam (e ainda precisam) de intervenções, estabelecendo um conhecimento escolar não fragmentado, mas contextualizado com a sociedade. Ou seja, o documento recomenda que esse trabalho deva ser desenvolvido entre os diversos componentes; no entanto, relacionar as diferentes áreas do conhecimento sempre foi um desafio para os professores, isso porque construir um aprendizado contextualizado, interligado e atrativo exige muitas vezes flexibilizar o currículo, exigindo do professor esforço e criatividade.

No Ensino Fundamental, esse tipo de atividade é importante, pois estimula o estudante a valorizar a Matemática como instrumento para compreender o mundo à sua volta, exercendo a cidadania, e poder perceber essa área do conhecimento como uma das que estimulam o interesse, a curiosidade, o espírito de investigação e o desenvolvimento da capacidade de resolver problemas, promovendo, assim, o aprofundamento dos conteúdos pelos alunos.

Para isso, os documentos oficiais sugerem a utilização de estratégias de ensino de forma interdisciplinar e contextualizada. Ou seja, o ideal seria o desenvolvimento curricular de forma não linear, o que significa dizer que a interdisciplinaridade não elimina os componentes curriculares, mas integra-os para a construção de novos conhecimentos por meio da interação entre eles. Para tanto, é essencial contar com o apoio solidário dos sistemas de ensino e da escola, de adequadas condições de trabalho e de recursos pedagógicos com padrões mínimos de qualidade de ensino.

Desenvolver os conteúdos dessa forma serve para inserir os estudantes no mundo do trabalho, no mundo das relações sociais e no mundo da cultura, de modo que eles possam desenvolver o senso crítico diante das questões sociais. Portanto, é importante refletirmos a respeito da colaboração que a Matemática tem a oferecer, com vistas à formação para a cidadania, pois “o significado da Matemática para o aluno resulta das conexões que ele estabelece entre ela e as demais disciplinas, entre ela e seu cotidiano e das conexões que ele estabelece entre os diferentes temas matemáticos” (Brasil, 1997, p. 19).

Conforme apontamos na Introdução deste trabalho, a interdisciplinaridade também é abordada na BNCC, com o intuito de formar estudantes com habilidades e conhecimentos considerados essenciais para o século XXI, incentivando a modernização de recursos que promovam a atualização das práticas pedagógicas dos docentes. É possível perceber essa recomendação em uma das competências específicas de Matemática para o Ensino Fundamental, em que o documento recomenda:

Desenvolver e/ou discutir projetos que abordem, sobretudo, questões de urgência social, com base em princípios éticos, democráticos, sustentáveis e solidários, valorizando a diversidade de opiniões de indivíduos e de grupos sociais, sem preconceitos de qualquer natureza (BRASIL, 2018, p. 267).

Trabalhar nessa perspectiva implica produzir mudanças no ensino de Matemática, pois propicia a aprendizagem pelo “saber fazer” por meio de conteúdos, temáticas ou situações dinâmicas que estabeleçam relações entre as áreas e, consequentemente, a construção do conhecimento por meio da interdisciplinaridade.

É nesse sentido que a BNCC também recomenda que os conteúdos de Matemática no Ensino Fundamental sejam desenvolvidos por meio das conexões entre suas unidades temáticas (Números, Álgebra, Geometria, Grandezas e medidas e Probabilidade e Estatística), de modo que os estudantes possam relacionar as observações empíricas do mundo real e as representações (tabelas, figuras e esquemas), associando essas representações a uma atividade matemática (conceitos e propriedades), fazendo induções, elaborando e testando conjecturas.

Assim, é importante que o professor faça um planejamento que determine os conteúdos que se relacionam e que possam ser trabalhados de forma interdisciplinar, e que contemple uma aprendizagem com significado para os estudantes. Ou seja, espera-se que dessa maneira, os alunos desenvolvam a capacidade de identificar oportunidades de utilização da Matemática para resolver problemas, aplicando conceitos, procedimentos e resultados para obter soluções e interpretá-las segundo os contextos das situações.

Outro aspecto a ser considerado pelo documento é o estudo de conceitos básicos de economia e finanças, visando à educação financeira dos alunos. Assim, podem ser discutidos assuntos como taxas de juros, inflação, aplicações financeiras (rentabilidade e liquidez de um investimento) e impostos. Segundo o documento, as discussões dessa temática favorecem um estudo interdisciplinar envolvendo as dimensões cultural, social, política e psicológica, além da econômica, sobre as questões do consumo, trabalho e dinheiro. É possível, por exemplo, desenvolver um projeto com a História, visando ao estudo do dinheiro e sua função na sociedade, da relação entre dinheiro e tempo, dos impostos em sociedades diversas, do consumo em diferentes momentos históricos, incluindo estratégias atuais de marketing.

Essas questões, além de promover o desenvolvimento de competências pessoais e sociais dos alunos, podem se constituir em excelentes contextos para as aplicações dos conceitos da Matemática Financeira e, também, proporcionar contextos para ampliar e aprofundar esses conceitos (Brasil, 2018, p. 269).

Vale ressaltar que, mesmo com as orientações dos documentos oficiais, tradicionalmente a prática mais frequente no ensino de Matemática tem sido aquela em que o professor apresenta o conteúdo oralmente, fragmentado, partindo de definições, exemplos, demonstrações de propriedades, seguidos de exercícios de aprendizagem. Ou seja, o aluno apenas reproduz o que o professor ensina e, assim, considera-se que uma reprodução correta é evidência de que ocorreu a aprendizagem.

No entanto, é necessário eliminar o método “tradicional” de ensino da Matemática e integrá-la a outras áreas do conhecimento, envolvendo projetos e construções coletivas. Nesse sentido, a Matemática deve desempenhar um papel importante no currículo, que, portanto, deve ser equilibrado e indissociável, na formação da capacidade intelectual, na estruturação do pensamento, na agilização do raciocínio do aluno, na sua aplicação à resolução de problemas, a situações da vida cotidiana, a atividades do mundo do trabalho, e no apoio à construção de conhecimentos em outras áreas curriculares (Brasil, 1998, 2018).

Considerações Finais

Ensinar Matemática não tem sido uma tarefa fácil. As dificuldades inerentes ao conteúdo somam-se às decorrentes de uma visão distorcida que se dá a essa área do conhecimento, estabelecida, muitas vezes, desde os primeiros contatos do professor com o aluno. No entanto, o ensino de Matemática costuma provocar sensações contraditórias, tanto para quem ensina (o professor) como para quem aprende (o aluno). De um lado, a constatação de que se trata de uma área importante; do outro, a insatisfação diante dos resultados negativos em relação à sua aprendizagem.

As reflexões apresentadas no presente artigo levam a pensar sobre a importância do currículo escolar e a necessidade de buscar novas perspectivas para o ensino, em sua concepção e em sua reforma. O currículo para o Ensino Fundamental, obrigatório a todos os cidadãos, deveria considerar a realidade social e as características culturais de nossa sociedade, e aproveitar todos os meios de que hoje se dispõe. A melhoria na qualidade do ensino deve partir dessas novas realidades.

Outro ponto sobre o qual buscamos refletir no presente texto se refere à maneira como o currículo vem sendo desenvolvido no espaço escolar, criando e/ou fortalecendo, muitas vezes, a fragmentação do conhecimento.

Por isso, questionamo-nos: até que ponto o currículo tem contribuído para fragmentar o conhecimento produzido e para promover sua dispersão como cultura?

Em nosso entendimento, o desenvolvimento dos conteúdos, de forma fragmentada/isolada, em sala de aula, elimina a possibilidade do exercício da produção interdisciplinar no processo de ensino-aprendizagem. Assim, defendemos que a interdisciplinaridade se apresenta como uma condição que serve de base e que pode ser usada na construção de um princípio que sustente o modo de se apropriar do conhecimento produzido na mediação entre o professor e seu aluno.

Nessa perspectiva, assumimos que o currículo escolar, na perspectiva da interdisciplinaridade, deve servir para a construção social e cultural que se produz no espaço escolar, deve ser válido a todos os tipos de saberes: curriculares, disciplinares e experienciais (Tardif, 2014), e deve produzir mecanismos de inclusão. Portanto, no âmbito de sua constituição (externa ou formal), ele deve contribuir para superar o caráter fragmentário e desigual do conhecimento.  

Referências

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 BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Introdução aos Parâmetros Curriculares Nacionais: Matemática. 3. ed.- Brasília: MEC, 1997. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro01.pdf. Acesso em: 08/09/2023.

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BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2018.  Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf. Acesso em: 10/09/2023.

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TARDIF. M. Saberes docentes e formação profissional. 17. ed. Petrópolis: Vozes, 2014.

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CAPÍTULO 15

POLÍTICAS PÚBLICAS E AS COMUNIDADES QUILOMBOLAS

PUBLIC POLICIES AND QUILOMBOLAS COMMUNITIES

 

 

DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.15

Submetido em: 19/12/2023

Revisado em: 23/12/2023

Publicado em: 28/12/2023

 

Mariani Bandeira Cruz Oliveira

Secretaria de Estado da Educação do Paraná, Paraná, Professora de História, Ponta Grossa- PR

 http://lattes.cnpq.br/2444152773218060

Luciano de Oliveira

Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, Mato Grosso do Sul, Professor do Curso de Ciências Sociais, Amambai-MS

  http://lattes.cnpq.br/4403084220760372

 

 

 

Resumo

O objetivo deste artigo é debater sobre as comunidades Quilombolas no Brasil, com foco no Estado do Paraná, após a aprovação da Constituição Federal de 1988. Discute as relações de sociabilidade desses povos e como foi tratado o processo de reconhecimento de seus direitos, em especial de seus territórios o que gera e incorpora “nova” identidade cultural desses sujeitos. Amparado em uma abordagem qualitativa a partir de revisão bibliográfica e análise documental da legislação evidencia-se que os quilombolas continuam reafirmando a importância de sua identidade como um dos mecanismos para reivindicar direitos territoriais e étnicos via políticas governamentais. Outra constatação é que com a promulgação de alguns decretos a partir principalmente dos anos 2000, contribuíram para autoafirmação da identidade quilombola, conquista essa que traz ainda muitos desafios entre eles ainda prevalece o preconceito velado ou nem tanto, na sociedade brasileira. 

Palavras-Chave: políticas públicas, identidade, cultura, quilombolas.

Abstract

The objective of this article is to discuss Quilombola communities in Brazil, focusing on the State of Paraná, after the approval of the 1988 Federal Constitution. It discusses the sociability relationships of these people and how the process of recognizing their rights was handled, especially in their territories, which generates and incorporates “new” cultural identity of these subjects. Supported by a qualitative approach based on a bibliographical review and documentary analysis of the legislation, it is evident that quilombolas continue to reaffirm the importance of their identity as one of the mechanisms to claim territorial and ethnic rights via government policies. Another observation is that with the promulgation of some decrees mainly from the 2000s, they contributed to the self-affirmation of the quilombola identity, an achievement that still brings many challenges among them, veiled or not so much prejudice still prevails in Brazilian society.

Keywords:  public policies, identity, culture, quilombolas.

 

 

Introdução

Após um período de retrocesso político com relação ao debate sobre às pautas sobre povos originários, comunidades tradicionais e minorias, há paulatinamente uma retomada dessas discussões tanto por parte do Estado como também na academia.  Em se tratando dos quilombolas em específico os temas em voga estão relacionados a sua cultura e aos processos de identidade coletiva.

A recorrência dessas reflexões em parte foi desencadeada por certa hegemonia e credibilidade que as instituições, grupos de pesquisas conquistaram principalmente após os anos de 1990, após a aprovação da Constituição Federal de 1988. Algumas dessas produções deram suporte ao escopo desse artigo como REIS e GOMES (2000), MARIN (2009) e PAOLIELLO (2009).

Podemos trazer para o foco o fato de que, com a promulgação da Constituição Federal Brasileira de 1988, houve a garantia de artigo específico que ampara o reconhecimento dos territórios das Comunidades Tradicionais no Brasil. No artigo 68 deste documento legal, os debates ampliaram-se em muitas áreas do conhecimento como História, Geografia, Antropologia entre outros. Portanto, trataremos em parte desses aspectos legais relacionados a questão quilombola no Brasil ao utilizar como uma das fontes os documentos legais. Tal legislação antecede outros aparatos legais com vistas a legitimidade de direitos no cenário brasileiro. Exemplo disso, situa-se em 2007, data em que se promulgou um Decreto que instituiu a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos povos e Comunidades Tradicionais, buscando protegê-los.

Mesmo assim, a regularização desses territórios é feita com muita dificuldade, em virtude entre outros fatores da falta de interesse político em efetivar esses direitos na prática. Neste texto trataremos alguns aspectos sobre esses embates, onde alguns autores discutem a regulamentação dos territórios e também a polissemia do termo quilombola, bem como a repercussão disso no autorreconhecimento desses povos. 

Os estudos recentes apontam que, para os remanescentes de quilombos a busca pelo direito ao território funciona como fator de reconhecimento e simboliza a conquista pela preservação dos seus costumes, práticas religiosas, o saber, o conhecimento, o culto aos seus ancestrais.

 A partir destes aspectos, este texto quer debater as comunidades tradicionais, especificamente os quilombolas a partir das políticas públicas. Optou-se metodologicamente pela pesquisa qualitativa de caráter bibliográfico tendo como fontes os documentos legais sobre esses sujeitos. Pretende-se assim suscitar aspectos que possam ser pertinentes principalmente na efetivação de direitos, mas também a reflexão acadêmica.

Desenvolvimento

                Os remanescentes de quilombos, ao longo da história, vêm travando uma luta constante para manter suas tradições. Essa luta estende-se desde a conquista do reconhecimento de seus territórios, da liberdade de expressão, de crenças e identidade religiosa.

            A promulgação da Constituição Federal em 1988 representou um passo importante no que tange a garantia de direitos a todos os brasileiros. A princípio com uma redação mais ampla no que se refere aos direitos das pessoas, paulatinamente foram sendo constituídos textos mais precisos sobre os direitos de grupos específicos.

            Nesse ínterim, a busca por mais visibilidade no assentamento de direitos a grupos específicos e, diga-se também, excluídos, sem que outrora fossem totalmente incluídos nas políticas públicas, ganham espaço e discussão.

            Ao trazer para o foco os grupos de quilombolas é necessário destacar que a implementação no texto legal sobre esse grupo é fruto de muitos embates na sociedade.

Ressalte-se neste cenário a constituição de grupos de debates, instituições, Organizações não governamentais, que paulatinamente buscam assegurar a reflexão, os debates, objetivando primordialmente a consolidação de políticas públicas que vão ao encontro das necessidades básicas dessa população.

Conforme Alfredo Wagner Berno de Almeida, uma das dificuldades para efetivação legal dos direitos básicos das comunidades tradicionais refere-se as tensões relativas ao seu reconhecimento jurídico-formal, sobretudo, porque há um rompimento com a invisibilidade social.

Almeida acrescenta ainda que o fato de o governo ter incorporado a expressão “populações tradicionais” na legislação não significa um acatamento absoluto das reivindicações encaminhada pelos movimentos sociais (ALMEIDA, 2004, p.10).

Essas considerações nos levam a enfatizar a importância de debates acerca destes textos. Este aspecto tratado nos leva a afirmar o descompasso que há entre o proposto e o efetivado nas políticas públicas.

Paulatinamente os estudos sobre as comunidades quilombolas ultrapassaram o tratamento meramente de marginalizados e resistência. Isso se deve a multiplicação de pesquisas principalmente nas universidades. Tanto os procedimentos metodológicos como as bases teóricas foram ampliadas. REIS e GOMES (2000) asseveram também sobre estes paradigmas das pesquisas ao tratar sobre algumas bases teóricas, as quais foram construídas algumas pesquisas sobre os quilombolas.

Ao mesmo tempo, que isso traz contribuições às pesquisas, provocam um acirramento sobre os múltiplos conceitos, especialmente com relação a quilombola, comunidades tradicionais e remanescente. Vários autores como MOURA (1972), LEITE (2000), trataram sobre isso e a cada dia são travadas novas discussões.

MUNANGA explica que:

 

A palavra quilombola tem a conotação de uma associação de homens, aberta a todos sem distinção de filiação a qualquer linhagem, na qual os membros eram submetidos a dramáticos rituais de iniciação que os retiravam do âmbito protetor de suas linhagens e os integravam como co-guerreiros num regimento de super-homens invulneráveis às armas de inimigos (MUNANGA, 2001, p.25).

           

No Brasil, por sua vez a acepção adquiriu historicamente contornos diferentes que por sua vez tem impacto na questão legal. Moura (1972) afirma que o termo foi uma expressão de ruptura com aquele sistema brasileiro escravista.

Destaca-se aqui a afirmação de Calheiros e Standtler:

 

Se a instituição legal da escravidão marcou o início da organização quilombola no país, não se pode, entretanto, imaginar que a sua proibição pôs fim aos quilombos mesmo quando escravizar tornou-se ilegal, as práticas opressoras continuaram se reproduzindo contra a população negra e daí a manutenção da sua resistência (CALHEIROS e STADTLER, 2010, p.136).

 

Um século depois da Lei Áurea que determinou ao negro o direito de ir e vir, a Constituição Federal Brasileira de 1988, reconheceu em seu artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT): “remanescente de quilombo a propriedade definitiva das terras que estejam ocupando”, obrigando o Estado a emitir os respectivos títulos.

Neste sentido, um dos aspectos relevantes com relação a essa população, segue para além da emissão dos títulos, embora estes sejam de suma importância, trata-se do espaço que ocupam tanto para sua sobrevivência, quanto para cultivo de sua identidade.

Com relação a questão ao vocábulo remanescente corrobora Calheiro e Stadtler, quando afirma que o termo “remanescente”:

 

serviu naquele momento para o constituinte identificar populações que não poderiam ser confundidas com os quilombos históricos, e nem associadas por descendência somente. Grupos que passaram a contar com o reconhecimento oficial de identidade e cultura, mas também com consequências diretas para sua militância e principalmente para os conflitos fundiários (CALHEIRO e STADTLER, 2010, p. 137).

 

Ao buscarmos no Decreto nº 4.487 de 20 de novembro de 2003, podemos argumentar sobre os diversos aspectos que ele contempla, que vão desde a questão do território até a autodefinição da própria comunidade. Tal decreto em seu artigo 68 regulamenta que:

 

Consideram-se remanescente das comunidades dos quilombos, para fins deste Decreto, os grupos étnico-raciais, segundo critérios de auto-atribuição, com trajetória histórica própria, dotado de relações territoriais específicas, com presunções de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida. § 1º para fins deste Decreto, a caracterização dos remanescentes das comunidades dos quilombos será atestada mediante autodefinição da própria comunidade (BRASIL, 2003).

 

Não é pretensão neste texto discutir meramente a questão do conceito de remanescente ou quilombola, mas esse debate é fértil à medida que nos permite perceber o intuito dos projetos, programas e políticas que são propostas e também os embates advindos disso, como explicitado de modo breve anteriormente. Isso remete a complexidade no tratamento da questão quilombola, pois:

 

Não apenas os aspectos referentes à identidade dos negros no Brasil, mas vários atores envolvidos e os inúmeros interesses conflitantes sobre o patrimônio material e cultural brasileiro, ou seja, questões de fundo envolvendo identidade cultural e políticas das minorias de poder no Brasil. (LEITE, 2000, p. 342).

 

     Portanto, tratar a questão quilombola envolve uma multiplicidade de fatores, sejam eles sociais, culturais, históricos entre outros.

 

Territorialidade Quilombola

            Conforme explicitado anteriormente os quilombolas constituem um grupo ainda em processo para aquisição de direitos constitucionais.  Rosa Elizabeth Acevedo Marin enfatiza que, atualmente grupos se autodenominam quilombolas, isso constitui um posicionamento como sujeito, para acessar tanto direitos territoriais como étnicos. Argumenta sobre avanços entre os anos de 1996 a 2000, porém alerta que “Não obstante esses avanços, salientados entre 1996 e 2000, o intervalo de 2003 a 2007 mostra um processo de estancamento no tocante à titulação das terras quilombolas, praticamente paralisada” (MARIN, 2009, p.224).

Embora o trabalho da autora destaca especificamente a região do Pará, contribui para reflexão sobre a titulação atribuídas as diversas comunidades no Brasil. Conforme dados do Relatório do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) de 2012 sobre os territórios quilombolas, registra o número de processos para emissão de título territoriais por ano. Assim de 2003 a 2012 totalizam 1.167.

Importante frisar que a certificação das comunidades quilombolas constitui o primeiro passo para efetivação do direito a terra. Tem como responsável da emissão a Fundação Cultural Palmares, veiculada ao Ministério da Cultura. Logo em seguida, há uma série de procedimentos burocráticos para regularização da titulação de território quilombola.

Conforme o Relatório de 2012 do INCRA são 9 etapas até a conquista do registro do título. A etapa 1 trata-se da elaboração do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID), que inclui a elaboração de relatório antropológico, de levantamento fundiário, de planta e memorial descritivo, assim como o cadastramento das famílias quilombolas.

Na segunda etapa há a publicação do RTID. Na terceira etapa há a questão da abertura de contraditório para interessados e julgamento de possíveis contestações ao RTID.

A quarta etapa é constituída pela publicação de portaria de reconhecimento de território. Quinta etapa é a decretação do território como interesse social.

A sexta etapa trata-se da desintrusão dos ocupantes não quilombolas com pagamento de indenização pela terra nua e pelas benfeitorias. Sétima etapa é o georeferenciamento e cadastramento do território. Na oitava e nona etapas há a titulação e o registro do título emitido respectivamente.

Essa descrição do processo nos ajuda entender o processo burocrático que as comunidades precisam enfrentar. Isso pode levar anos, décadas e às vezes alguns grupos não conseguem essa documentação em sua totalidade.

Rosa Elizabeth Azevedo Marin corrobora para esta reflexão ao destacar os processos de territorialização, bem como o reconhecimento dos direitos territoriais e étnicos desses grupos:

A diversidade dos processos de territorialização (terras de preto, mocambos, comunidades negras rurais) evidencia a pluralidade de categorias de uso na vida social que demandam reconhecimento. Quilombos e quilombolas como formas de identidade coletiva e de organização política objetivam-se como movimento social no Brasil contemporâneo. A questão central é onde esbarra o reconhecimento dos direitos territoriais e étnicos desses grupos. Grupos dominantes da elite têm-se mostrado céleres e eficientes para coagir esses processos encontrando apoio na tecnoburocracia do Estado. Essas terras figuram nos planos de expansão do agronegócio, da mineração, da pecuária extensiva, dos projetos de infraestrutura (MARIN, 2009, p.225).

 

Renata Medeiros Paoliello em estudo sobre os remanescentes de quilombos no Vale de Iguape, no sudeste paulista enfatizou que as relações sociais entre os quilombolas se modificaram com o processo de reconhecimento de seus direitos territoriais e a incorporação da nova identidade quilombola que essa legitimação institucional aporta (PAOLIELLO, 2009, p.229). Segundo ela, os grupos buscam seu autorreconhecimento a fim de utilizar-se das políticas destinadas aos remanescentes de comunidades tradicionais. Vale lembrar que a autodefinição dos membros é aparato fundamental na legislação.

Convém destacar que muitas comunidades no Brasil, ainda possuem somente a certificação. Temos muitos exemplos no Paraná, como a Comunidade Sutil, na região dos Campos Gerais. As terras deste quilombo faziam parte da Fazenda Santa Cruz, que foi deixada em testamento aos seus escravos em meados do século XIX. Percebe-se nesta comunidade que após a emissão da certificação houve uma série de avanços na comunidade, porém não podemos afirmar da total efetivação dos direitos prescritos nos Decretos.

Entre as ações governamentais destaca-se a entrega pelo governo do Estado Roberto Requião em 2007 de 27 casas e um barracão para realização de atividades da comunidade. Os Programas também foram inseridos como o Paraná Alfabetizado.

Tais Programas governamentais vão ao encontro da perspectiva de que essas ações Estatais provavelmente foram efetivadas em decorrência da emissão do primeiro passo para reconhecimento oficial da comunidade como quilombola. Assim, ainda perceber-se que tanto nesta comunidade como em outras na mesma situação a questão da presença do Estado realiza-se a medida que são constituídas e efetivadas políticas territoriais.  Abaixo há um mapa do Instituto de Terras, Cartografia e Geociências que ilustra a população negra e as comunidades quilombolas no Estado do Paraná.

 

Fonte: Instituto de Terra, Cartografia e Geociência, 2009.

 

O processo de reconhecimento de quilombo pelos órgãos governamentais tem corroborado também no processo de autorreconhecimento do grupo. A busca pela conquista de seus territórios segue além das fronteiras demarcadas geograficamente.

Conforme Azevedo (2001) são as políticas públicas que dão visibilidade e materialidade ao Estado e por isso elas são definidas como o Estado em ação.

Estudos recentes apontam que, para os remanescentes de quilombos a busca pelo direito ao território funciona como fator de reconhecimento e simboliza a conquista pela preservação de suas tradições.

De acordo com Alfredo Wagner Berno de Almeida:

 

 Justamente com o processo de territorialização tem-se a construção de uma nova “fisionomia étnica”, através da autodefinição do recenseamento, e de um redesenho da sociedade civil, pelo advento de centenas de novos movimentos sociais, através da autodefinição coletiva. Todos estes fatores concorrem para compor o campo de significados do que se define como “terras tradicionalmente ocupadas”, em que o tradicional não se reduz ao histórico e incorpora identidades redefinidas situacionalmente numa mobilização continuada (ALMEIDA, 2004, p.29).

 

Essa política étnica analisada por Almeida (2004) caracteriza-se por ações governamentais precisas, dispersas e atreladas a outras políticas governamentais, como política agrária, educacional, saúde, habitação e segurança alimentar.

Atualmente a conquista da territorialidade para alguns quilombolas consistem no direito de manter seus costumes, tradições. Emerge-se o desejo dos quilombolas em preservar sua identidade. Os conflitos, as formas que as pessoas fazem para manter-se no espaço geram uma territorialidade. E essa territorialidade é constituída também pelo aspecto simbólico. 

Neste caso, a conquista territorial se configura muito mais pela busca de reconhecimento cultural do que propriamente no âmbito legal. Neste sentido, a organização interna das comunidades quilombolas, bem como, seu autorreconhecimento são fatores que contribuem para a provocação da demanda por direitos.

 Considerações Finais

Após este debate é possível verificar que o Estado brasileiro coopta instituições com certa hegemonia intelectual para legitimar suas ações no âmbito das políticas públicas.

Neste ínterim, entre os remanescentes de quilombo as relações sociais vêm passando por modificações com o processo de reconhecimento de seus direitos territoriais e a incorporação da “nova” identidade que essa busca pela sua legitimação aporta.

Esses agentes buscam a afirmação de sua identidade quilombola para reivindicar direitos territoriais e étnicos garantidos pelas políticas governamentais. O problema concreto que se suscita reflexão é que o direito garantido na Constituição Federal de 1988 desencadeou um debate legítimo de assentamento de direitos, porém novos desafios ainda permanecem.

Um deles relaciona-se a efetivação de Políticas de Estado em detrimento de Políticas de Governo. Tal problemática imprime um caráter de construção e desconstrução de processos de efetivação de direitos a partir dos interesses desses sujeitos. A busca pela conquista de seus territórios segue além das fronteiras demarcadas geograficamente.

Percebe-se que com a promulgação de alguns decretos a partir principalmente dos anos 2000, contribuíram para autoafirmação da identidade quilombola, conquista essa que traz ainda muitos desafios entre eles ainda prevalece o preconceito velado ou nem tanto, na sociedade brasileira.

Embora alguns relatórios de autoria do Estado enfatizem o cumprimento dos Decretos sobre a questão quilombola é sabido que isso não é correspondente ao que se verifica nas comunidades. Antes de serem constituídas como comunidades quilombolas essas pessoas, são sujeitos de direitos, no entanto, há evidências que em alguns casos os grupos precisam reivindicarem sua ancestralidade para depois seus direitos.

Referências

ALMEIDA, Alfredo Wagner Berno de. Terras tradicionalmente ocupadas: processos de territorialização e movimentos sociais. In:  ESTUDOS URBANOS E REGIONAIS V.6, N.1 / MAIO 2004.

AZEVEDO, Janete. A educação como política pública. 2ed. São Paulo: Autores Associados, 2001.

BRASIL. Decreto 4.887, de 20 de novembro de 2003. Disponível em: http//WWW.planalto.gov.br. Acesso em 20 de junho de 2014. 

CALHEIRO, Felipe Peres e STADTLER, Hulda Helena Coraciara. Identidade étnica e poder: os quilombos nas políticas públicas brasileiras. In: Revista Kátal. Florianópolis, v.13(1), 2010, 133-139.

LEITE, Ilka Boaventura. Os quilombos no Brasil: questões conceituais e normativas. In: Etnografia, vol 12(2), 2000, p.333-354.

MARIN, Rosa Elizabeth Acevedo. Quilombolas na Ilha de Marajó: território e organização política. In: GODOI, Emilia Pietrafesa de; MENEZES, Marilda Aparecida de; MARIN, Rosa Acevedo (Orgs.). Diversidade do campesinato: expressões e categorias: construções identitárias e sociabilidades, v.1.  São Paulo: Editora UNESP; Brasília, DF: Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural, 2009. P.209-227.

MOURA, Clovis. Rebeliões da senzala: quilombos insurreições e guerrilhas. São Paulo: Conquista, 1972.

MUNANGA, Kabengele. Origem e histórico dos quilombos em África. In: MOURA, Clovis. (Org.). Os quilombos na dinâmica social do Brasil. Maceió: Edufal, 2001, p.21-31.

REIS, João José e GOMES, Flávio dos Santos. Liberdade por um fio. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

PAOLIELLO, Renata Medeiros. “Condição camponesa” e novas identidades entre remanescentes de quilombos no Vale do Ribeira de Iguape. In: GODOI, Emilia Pietrafesa de; MENEZES, Marilda Aparecida de; MARIN, Rosa Acevedo (Orgs.). Diversidade do campesinato: expressões e categorias: construções identitárias e sociabilidades, v.1.  São Paulo: Editora UNESP; Brasília, DF: Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural, 2009. P.228-250.

CAPÍTULO 16

A RELAÇÃO ENTRE O ENSINO E A SAÚDE NA PERSPECTIVA DA INTERDISCIPLINARIDADE

THE RELATIONSHIP BETWEEN EDUCATION AND HEALTH FROM THE PERSPECTIVE OF INTERDISPLINARITY

 

DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.16

Submetido em: 30/11/2023

Revisado em: 28/12/2023

Publicado em: 09/01/2024

 

Rosa Cruz Macêdo

Centro Universitário UNILEÃO, Mestrado Profissional em Ensino em Saúde, Juazeiro do Norte-CE

http://lattes.cnpq.br/1123159140022797

Maria Francimar Teles de Souza

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano, Mestrado Profissional em Educação Profissional e Tecnológica, Salgueiro-PE

 http://lattes.cnpq.br/8232117182394902

Edina Nicolau Marques

Centro Universitário UNILEÃO, Mestrado Profissional em Ensino em Saúde, Juazeiro do Norte-CE

http://lattes.cnpq.br/9337418976059931

Francilda Alcântara Mendes

Universidade Federal do Ceará – UFC, Doutora em Educação Brasileira, Fortaleza-CE

http://lattes.cnpq.br/5510003322219485

Heloiza Jhennifer de Souza Santos

Faculdade Integrada de Araguatins, FAIARA, Araguatins-TO

http://lattes.cnpq.br/7388998582667978

Flaviane Teles de Souza

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba, Campus Sousa, Sousa-PB

http://lattes.cnpq.br/3229479448560386
 

 

 

Resumo

Muitas mudanças ocorreram nos estudos de educação e saúde. Neste artigo faz-se uma reflexão sobre essa temática com o objetivo de apresentar a relação entre o campo do ensino e da saúde na perspectiva da interdisciplinaridade, discutindo sobre os conceitos de interdisciplinaridade, sua necessidade nas áreas de ensino e saúde, bem como as reflexões sobre as dificuldades e ganhos desse diálogo. Para isso, fez-se uma pesquisa de caráter bibliográfico, com fundamentação teórica baseada nas ideias de alguns educadores brasileiros como Freire (1985, 1987), Gadotti (2004), Fazenda (2008), Vilela (2003), Leis (2005), entre outros. A interdisciplinaridade não é um termo novo no Brasil, sua origem aconteceu por volta da década de 60 e 70 e vem atraindo atenção principalmente nas pesquisas científicas, produções e discussões acadêmicas e até mesmo nas legislações e políticas que regem a educação e a saúde. Em diversas áreas do conhecimento sabemos que a interdisciplinaridade representa um horizonte importante para o desenvolvimento de ações principalmente quando se relaciona ensino e saúde, que são consideradas áreas eminentemente interdisciplinares e se de fato ocorrer a integração de disciplinas no âmbito dos cursos que preparam recursos humanos para atuar nessas áreas, certamente teremos profissionais mais comprometidos com a realidade da saúde, da educação e com suas transformações.

Palavras-Chave: Educação, Saúde, Interdisciplinaridade.

Abstract

Many changes have taken place in education and health studies. This article reflects on this theme with the objective of presenting the relationship between the field of teaching and health from the perspective of interdisciplinarity, discussing the concepts of interdisciplinarity, its need in the areas of teaching and health, as well as reflections on the difficulties and gains of this dialogue. For this, a bibliographic research was carried out, with a theoretical foundation based on the ideas of some Brazilian educators such as Freire (1985, 1987), Gadotti (2004), Fazenda (2008), Vilela (2003), Leis (2005), among others. Interdisciplinarity is not a new term in Brazil, its origin happened around the 60s and 70s and has been attracting attention mainly in scientific research, academic productions and discussions, and even in the legislation and policies that govern education and health. In several areas of knowledge, we know that interdisciplinarity represents An important horizon for the development of actions, especially when it relates to teaching and health, which are considered eminently interdisciplinary areas, and if in fact there is the integration of disciplines within the scope of courses that prepare human resources to work in these areas, we will certainly have professionals more committed to the reality of health, education and its transformations.

Keywords: Education, Health, Interterdisciplinarity.
 

 

Introdução

No caminho percorrido pelas mudanças que aconteceram nos estudos de educação e saúde, faz-se uma reflexão sobre essa relação na perspectiva da interdisciplinaridade. Além das reflexões, o texto traz interlocuções com referenciais teóricos sobre aspectos que envolvem a integração ensino-saúde e são abordadas as relações da integração ensino-saúde com a prática do cuidado em saúde, e com o trabalho com a educação permanente.

É um trabalho que tem como objetivo apresentar a relação entre o campo do ensino e da saúde na perspectiva da interdisciplinaridade, discutindo sobre os conceitos de interdisciplinaridade, sua necessidade nas áreas de ensino e saúde, bem como as reflexões sobre as dificuldades e ganhos desse diálogo.

O texto está estruturado em três partes: Inicialmente traz-se uma discussão teórica sobre a origem e conceitos da interdisciplinaridade, com uma breve explicação sobre a temática; em seguida, apresenta a necessidade da interdisciplinaridade entre o ensino e a saúde, justificando a necessidade de aprofundar os estudos do tema; ao final, faz-se o registro dos principais ganhos e dificuldades para que o ensino e a saúde dialoguem entre si, usando os conceitos de Paulo Freire e outras obras e como isto pode ser usado no ensino e na saúde.

Para finalizar aponta-se a necessidade do diálogo nas diversas áreas, de forma que todos possam ter reais oportunidades de construir o próprio conhecimento. Assim, traz-se uma análise do pensamento de diversos autores evidenciando os conceitos, origem especialmente a relação entre ensino e saúde buscando demonstrar os nexos estabelecidos ao longo do texto.

Metodologia

Trata-se de uma pesquisa teórica de caráter bibliográfico, que considerou algumas ideias de importantes educadores brasileiros, em especial Paulo Freire (1985, 1987), Moacir Gadotti (2004) e outros autores que tratam do assunto, como Ivani Fazenda (2008), Vilela (2003) e Leis (2005).

A pesquisa bibliográfica permite um amplo alcance de informações e possibilita a utilização de dados de inúmeras publicações, auxiliando na construção, ou na melhor definição do quadro conceitual que envolve o objeto de estudo a que se propõe (GIL, 1994).

Resultados e Discussão
  • Interdisciplinaridade (origem e conceitos)

O conceito de interdisciplinaridade faz parte de um processo sempre em movimento, constituído por muitos estudiosos, pensadores e autores diversos, para superar a fragmentação e o caráter de especialização do conhecimento, causados por uma epistemologia de tendência positivista em cujas raízes estão o empirismo, o naturalismo e o mecanicismo científico do início da modernidade (THIESEN, 2008). Sobretudo pela influência dos trabalhos de grandes pensadores modernos como Galileu, Bacon, Descartes, Newton, Darwin e outros, onde as ciências foram sendo divididas e, por isso, especializando-se.

Assim, a partir de uma visão mais generalizada vão construindo novos conhecimentos a partir de um entendimento prático vivenciado em diversos contextos. Nessa perspectiva, a interdisciplinaridade se apresenta como uma possibilidade de superar a fragmentação das ciências e dos conhecimentos e torna-se até difícil apresentar um conceito único sobre ela. No entanto, apresentam-se as várias tentativas de conceituá-la e um recorte histórico de sua origem.

A interdisciplinaridade não é um termo novo no Brasil, sua origem aconteceu por volta da década de 60 (MINAYO, 1991) e vem atraindo atenção principalmente nas pesquisas científicas, produções e discussões acadêmicas e até mesmo nas legislações e políticas que regem a educação e a saúde, como se observa nos estudos de Vilela; Mendes (2003) e Schneider, Magalhães e Almeida (2022), entre outros.

Segundo Fazenda (2008) o conceito de interdisciplinaridade chegou ao Brasil através da obra “Interdisciplinaridade e Patologia do Saber” difundida por Hilton Japiassu (1976), a partir de uma discussão teórica que sinalizava a respeito do papel humanista do conhecimento, da ciência, e considera que “a interdisciplinaridade se caracteriza pela intensidade das trocas entre os especialistas e pelo grau de integração de um projeto de pesquisa”, orientado por Gusdorf. 

Mas, apesar de sua inovação teórico-metodológica, Japiassu sofre críticas às suas abordagens e à criação de uma linguagem única. A autora apresenta o conceito como sendo a relação entre as diferentes áreas do conhecimento, abrangendo um objeto de estudo em comum, apontando como visão de uma nova perspectiva acerca do ensino, pois propõe o ensinar a partir da reflexão e para a percepção das relações que estão ao nosso redor o tempo todo.

É importante destacar que Fazenda (2008) contribuiu de forma essencial no processo de consolidação da interdisciplinaridade em discussões ligadas à educação brasileira, pois na década de 1970 iniciou suas pesquisas a respeito do tema, com uma preocupação sobre a conceituação da interdisciplinaridade e a compreensão do quadro educacional nesse período.

Para ela, além da interdisciplinaridade promover o desenvolvimento de novos saberes, na educação favorece novas formas de aproximar a realidade social de todos proporcionando novas leituras das dimensões socioculturais das comunidades, assim a interdisciplinaridade assume um papel de grande importância para a humanidade.

Portanto, as atividades desenvolvidas sob uma visão interdisciplinar contribuem para a formação integral dos sujeitos, premissa central da Educação do Século 21, tendo em vista que instiga o educando a interrelacionar saberes, a mobilizar e a articular atitudes, valores e habilidades em prol do desenvolvimento de competências cognitivas e socioemocionais.

Para Paviani (2008) não existe, um modelo único e predeterminado de ação interdisciplinar, pois ela não é um fenômeno homogêneo, linear e uniforme. O autor explica que é preciso evitar a superficialidade do uso do termo interdisciplinaridade pois, a seu ver, muito prejudica o entendimento do fenômeno e contribui para o seu crescente desgaste conceitual.

Portanto, é necessário que os problemas do conhecimento sejam tratados de forma complexa e sob diferentes perspectivas. Pois de nada adianta afirmar que a interdisciplinaridade envolve integração de educadores, interação de disciplinas, intersecção entre conteúdos de duas ou mais disciplinas se não se explicita em que consiste essa integração e de que modo essa interação pode ser viabilizada. Assim, a interdisciplinaridade traz uma abordagem metodológica que integra conceitos, teorias, práticas e fórmulas, para obter a compreensão sistêmica do objeto de estudo.

Paulo Freire em diversas obras, principalmente associando às teorias de Edgar Morin (2002) destaca que é possível apontar que a interdisciplinaridade é experienciada como um processo de afeição, por meio de encontros com assuntos de áreas distintas do conhecimento, perpassado pelo diálogo que possibilita canais de reflexão, é uma atitude de espírito que se vive, feita de curiosidade sobre as relações existentes entre as coisas e que escapam à observação comum.

Em sua obra Pedagogia do Oprimido, Freire (1987) trata a interdisciplinaridade como um processo que se constrói ao afirmar que a interdisciplinaridade é o processo metodológico de construção do conhecimento pelo sujeito com base em sua relação com o contexto, com a realidade, com sua cultura. Na qual busca-se a expressão dessa interdisciplinaridade pela caracterização de dois movimentos dialéticos: a problematização da situação, por meio da qual se desvela a realidade, e a sistematização dos conhecimentos de forma integrada e interdisciplinar, visto que o processo educativo social é interdisciplinar a educação da escola formal deve se dar da mesma forma.

Para Gadotti (2004), a interdisciplinaridade visa garantir a construção de um conhecimento globalizado, rompendo as fronteiras das disciplinas e para que isso ocorra à integração dos conteúdos não seria suficiente, no plano teórico se busca uma fundamentação na ética e na antropologia, ao mesmo tempo em que, no plano prático, surgem projetos que reivindicam uma visão interdisciplinar, sobretudo no campo do ensino e do currículo.

Observa-se também que a Lei nº 5.692/1971 que instituiu as Diretrizes e Bases da Educação (LDB) já influenciava a interdisciplinaridade na educação brasileira, e foi reforçada pela nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), nº 9.394/1996, dando origem aos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). Conforme os PCNs, as propostas curriculares oficiais devem ser organizadas em disciplinas e/ou áreas, bem como, de acordo com a Base Nacional Curricular Comum – BNCC, na interdisciplinaridade, os objetivos específicos de cada disciplina devem ser preservados, mas superando o limite da disciplina através do diálogo, tratando e contextualizando um tema/objetivo comum entre diversas disciplinas, pois o seu principal objetivo é fazer com que as disciplinas dialoguem entre si e se complementem.

 Dessa forma, a interdisciplinaridade tem a capacidade de integrar as diversas áreas do conhecimento, permitindo a troca de experiências, assim como facilitando a interação entre os conteúdos apresentados, e que fazem parte da experiência dos alunos dentro e fora da sala de aula.

Para falar sobre a interdisciplinaridade no campo da saúde também são apontados conceitos semelhantes aos citados anteriormente, pois a abordagem não diferencia, é o que entendemos através das colocações de vários autores, de que a efetivação da interdisciplinaridade acontece com o desenvolvimento da sensibilidade, pois para aplicá-la não basta só ensinar e aprender, é preciso vivê-la e exercê-la (THIESEN, 2008).

O próprio conceito de saúde vem passando por algumas modificações, o que se definia como ausência de doença, hoje a Organização Mundial de Saúde (OMS) define saúde como “um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não somente ausência de afecções e enfermidades” (AROUCA, 2023, s/p) e esse conceito é positivo pelo paradigma da produção social da saúde e que deve atuar sobre os nós críticos dos problemas, baseado em um saber interdisciplinar e um fazer intersetorial.

Como exemplo pode-se citar que para a formulação de políticas públicas e programas voltados para o público em vulnerabilidade social, se faz necessário a participação popular, através de debates democráticos, construídos pela sociedade civil organizada, pelos movimentos sociais e pelo governo, sobretudo na educação e na saúde, visto que contribuem para uma formação cidadã.

Assim, a articulação da educação com a saúde têm sido cada vez mais utilizada com o intuito de promover a melhoria da qualidade de vida da população, apresentando-se como prioridade nas novas políticas para facilitar o acesso universal à educação e a saúde por meio de uma rede de atendimento gratuita.

É o que se percebe com a criação do Programa Saúde na Escola PSE, instituído Decreto nº 6.286, de 5 de dezembro de 2007, resultante de uma parceria entre os ministérios da Saúde e da Educação. Tendo como objetivo principal, contribuir para a formação integral dos estudantes da rede pública de educação básica por meio das ações de prevenção, promoção e atenção à saúde, integrando as redes do Sistema de Educação e do Sistema Único de Saúde (SUS) mediante articulação das escolas públicas, unidades básicas de saúde e unidades de Saúde da Família.

Esse programa se apresenta como um novo desenho na política de educação em saúde com o objetivo de ampliar a formação para a cidadania e promover a articulação de saberes com a participação de alunos, pais, comunidade escolar e sociedade em geral para tratar a saúde e a educação de forma integral. Nesse sentido, fica evidente a pertinência da saúde relacionada a um conjunto de hábitos e atitudes, sendo a escola compreendida como espaço privilegiado para seu desenvolvimento.

Assim, como afirma Leis (2005, p. 7), “a tarefa de procurar definições finais para a interdisciplinaridade não seria algo propriamente interdisciplinar, senão disciplinar”. Pois ela será sempre uma reação alternativa à abordagem disciplinar normalizadora seja no ensino ou na saúde dos diversos objetos de estudo. Mas, é necessário a interdisciplinaridade entre o ensino e a saúde.

  • A necessidade da interdisciplinaridade entre o ensino e a saúde

Em diversas áreas do conhecimento sabemos que a interdisciplinaridade representa um horizonte importante para o desenvolvimento de ações principalmente quando se relaciona ensino e saúde, pois as práticas pedagógicas e científicas qualificadas nestas duas grandes áreas se adequam à sua aplicação, sobretudo para uma melhor compreensão do que estar sendo abordado.

Por outro lado, entendemos que pode haver paradoxos e contradições que merecem muita atenção, para que não haja banalização do que é realmente interdisciplinaridade. Pois trata-se de um importante mecanismo de ampliação de discussões e da visão dos profissionais da saúde e dos docentes sobre suas práticas.

Nesse contexto destaca-se a necessária articulação entre educação e saúde para que se integrem e possam caminhar juntos para uma formação e transformação cidadã, fortalecendo a responsabilidade pessoal e social no sentido de ampliar o conhecimento e as práticas relacionadas aos comportamentos saudáveis e a promoção da saúde, visto que o conhecimento depende da experiência coletiva, da dialogicidade criativa, da escuta sensível e da convivência com a comunidade.

Portanto, promover a integração entre educação e saúde será fundamental para o desenvolvimento do senso de responsabilidade da saúde individual a partir da capacidade das pessoas assumirem o cuidado e o controle sobre o corpo e a vida, e da saúde coletiva incentivando os indivíduos para uma participação comunitária de maneira construtiva.

No final do século XIX e início do século XX aconteceu um marco histórico importante na construção de concepções e práticas de educação e saúde, numa interface, constituída com base no pensamento crítico sobre a realidade, a partir da atuação individual e coletiva de sujeitos político-sociais.

O que nos auxilia na compreensão das diferentes concepções que se constituem, recentemente, nas formas de abordar a educação e a saúde nas dimensões: social, ética, política, cultural e científica. Assim a saúde pode oferecer à educação a possibilidade de ações integradas e articuladas, de maneira crítica e reflexiva no sentido de atualizar os educadores, capacitando-os para a tarefa de ministrar o discurso sobre orientação à saúde de forma transversal e interdisciplinar na escola.

Dessa forma tanto o ensino como a saúde devem atuar a partir de uma perspectiva interdisciplinar, pois podem otimizar as ações em saúde com melhor qualidade aos usuários, e fortalece as estratégias de comunicação, resolução de conflitos e processos de tomada de decisões que poderão ser compartilhadas com o ensino.  

Contudo, promover saúde é proporcionar uma melhor qualidade de vida e diminuir a vulnerabilidade e os riscos que podem ser provocados por situações como: modo de vida, condições de trabalho, habitação, ambiente, educação, lazer, cultura, acesso a bens e serviços essenciais.

  • Principais ganhos e dificuldades para que o ensino e a saúde dialoguem entre

O ensino e a saúde têm um papel fundamental na sociedade, e quando ocorre o diálogo entre os dois além de levar informação e conhecimento à população sobre como podemos cuidar melhor da nossa saúde, principalmente de maneira preventiva, se promove saúde e é possível evitar doenças, usufruindo de uma vida com mais saúde e qualidade.

Pois, o diálogo estimula a reflexão, a necessidade de confrontar ideias e de se posicionar diante de assuntos importantes, contribuindo para a resolução de problemas e para o desenvolvimento moral. Nesse sentido há uma importante contribuição de Paulo Freire à educação a partir da prática do diálogo, tornando-se de grande importância para qualquer área do conhecimento como característica primordial para a prática. E assim afirma:

 

“O diálogo é o encontro entre os homens, mediatizados pelo mundo, para designá-lo. Se ao dizer suas palavras, ao chamar ao mundo, os homens o transformam, o diálogo impõe-se como o caminho pelo qual os homens encontram seu significado enquanto homens; o diálogo é, pois, uma necessidade existencial” (FREIRE, 1985, p.42).

 

Além de despertar a cidadania, responsabilidade pessoal e social, bem como a formação de agentes multiplicadores e cuidadores do seu bem-estar.

É notório observar que o diálogo entre a educação e a saúde é capaz de promover a reflexão, a autonomia de pensamento, a criticidade, a defesa de seus posicionamentos, a valorização das diferenças e a resolução de problemas (dos mais simples aos mais complexos).

Com isso ajuda o indivíduo a ter uma nova concepção de vida e ao mesmo tempo criar o comportamento de orientação ao próximo, bem como o transporte de informações agregando comportamentos saudáveis ​​individuais e coletivos, levando em consideração todas as características do homem, para desenvolver valores éticos e exercer plenamente sua cidadania, compreendendo seus direitos e deveres.

Considerações Finais

Saúde e educação são consideradas áreas eminentemente interdisciplinares e se de fato ocorrer a integração de disciplinas no âmbito dos cursos que preparam recursos humanos para atuar nessas áreas, certamente teremos profissionais mais comprometidos com a realidade da saúde, da educação e com suas transformações.

Desse modo, estudar sobre a interdisciplinaridade é uma forma de ampliar a nossa compreensão acerca dos processos que perpassam pela gênese e pelo desenvolvimento dos conhecimentos, reconhecendo as potencialidades e limites desse esforço.

Mas, ainda hoje a interdisciplinaridade promove amplos debates relacionados às discussões teóricas e incompatibilidades metodológicas, mesmo após este momento de consolidação da prática interdisciplinar como ferramenta transformadora. Pois, os conflitos ainda persistem, na aversão ou no receio às mudanças fazendo com que estas discussões se perpetuem.

Referências

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CAPÍTULO 17

APRENDIZAGEM ESCOLAR NO PÓS-PANDEMIA

SCHOOL LEARNING IN THE POST-PANDEMIC

 

DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.17

Submetido em: 04/01/2024

Revisado em: 10/01/2024

Publicado em: 15/01/2024

 

Lídia Cavalcanti da Silva

Graduação em Letras pela Universidade de Guarulhos, Especialização em Psicopedagogia, Guarulhos-SP

https://orcid.org/0009-0004-6002-1636

Marina Tavares Souza dos Santos

Graduada em Pedagogia pelas Faculdades Guarulhos, Especialização em Psicopedagogia, Guarulhos-SP

https://orcid.org/0009-0002-1695-7061

Flávio Borges do Nascimento

Doutor em Ensino de Ciências pela Unicamp, Mestre em Geociências, Especialista em Astronomia e Educação Inclusiva, Graduado em Geografia e Pedagogia, Guarulhos-SP

https://orcid.org/0000-0001-5102-0181

Kelly Yuki Komori

Especialização em língua Inglesa pela Harvard University, (modalidade presencial), Graduada em Letras e Pedagogia, Guarulhos-SP

https://orcid.org/0009-0002-5170-2080

 

Resumo

Os impactos da Pandemia ao aprendizado dos estudantes podem ser apreciados neste sucinto estudo a partir das narrativas oriundas da percepção de docentes. O objetivo consiste em identificar as dificuldades de aprendizagem existentes no contexto escolar oriundas do isolamento social causado pela Pandemia de Covid 19. O estudo se enquadra na perspectiva da pesquisa qualitativa, utilizou-se uma entrevista estruturada para coleta dos dados e análise por meio da metodologia dos Núcleos de Significação. Os resultados demonstram que a Pandemia gerou insegurança, dificuldades de socialização e proporcionou dificuldades acentuada de aprendizagem aos estudantes.  

Palavras-Chave: Contextualização; Dificuldade escolar; Pós-Pandemia.

Abstract

The impacts of the Pandemic on student learning can be appreciated in this brief study based on narratives arising from the perception of teachers. The objective is to try to identify the learning difficulties that exist in the school context as well as the possible causes generated by the Pandemic. The study fits into the perspective of qualitative research, using a structured interview to collect data and analyze it using the Meaning Centers methodology. The results demonstrate that the Pandemic generated insecurity, socialization difficulties and caused severe learning difficulties for students.

Keywords: Contextualization; School difficulty; Post-Pandemic.

Resumen

Los impactos de la Pandemia en el aprendizaje de los estudiantes se pueden apreciar en este breve estudio basado en narrativas surgidas de la percepción de los docentes. El objetivo es tratar de identificar las dificultades de aprendizaje que existen en el contexto escolar así como las posibles causas generadas por la Pandemia. El estudio se encuadra en la perspectiva de la investigación cualitativa, utilizando una entrevista estructurada para recolectar datos y analizarlos mediante la metodología de Centros de Significado. Los resultados demuestran que la Pandemia generó inseguridad, dificultades de socialización y provocó severas dificultades de aprendizaje en los estudiantes.

Palabras clave: Contextualización; Dificultades escolares; Pospandemia.

 

Introdução

As aulas em caráter não presencial clarificaram muitas incertezas, lacunas e dificuldades em todas as áreas do conhecimento. A educação se tornou uma das áreas de atuação para onde boa parte dos olhares se voltam acompanhados de suposições, críticas e questionamentos. O trabalho docente passou por um momento delicado onde é preciso ressignificar as ações e práticas em prol do sucesso do estudante em meio ao contexto de isolamento social (Nascimento et al., 2020).

É de bom tom salientar que, diante de contextos extremos, como o caso da Pandemia amplamente disseminada em 2020, o direito à educação está previsto na Constituição Federal (Brasil, 1988), em seu Art. 205: A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (Brasil, 1988).

A pesquisa desenvolvida por Nicholson (2009) assevera que o isolamento social pode ser definido como o estado no qual os humanos têm pouco contato com outros humanos, gerando uma quantidade mínima de contatos sociais, onde se apresentam, consequentemente, as dificuldades na manutenção e qualidade dos relacionamentos.

Este artigo pretende contribuir com pais e professores que buscam compreender as dificuldades dos educandos no processo de aprendizagem, visando esclarecer algumas angústias obtidas pela não realização de atividades e tarefas comuns no ambiente escolar e que necessitam ser adequadas para atender de forma individualizada, a fim de tornar-se possível o aprendizado mesmo com algumas limitações. O objetivo geral desta pesquisa consiste em identificar as dificuldades de aprendizagem existentes no contexto escolar oriundas do isolamento social causado pela Pandemia de Covid 19.

Fundamentação Teórica

A história das dificuldades de aprendizagem, de acordo com Sánchez (1998, apud OSTI, 2012), se faz em três momentos, o primeiro é a de fundação e abrange a época anterior a fundação oficial do campo das dificuldades de aprendizagem.

O segundo é referente aos primeiros anos e teve início em 1963 até 1990, foi marcada pela organização de pais, médicos e especialistas com o propósito de esclarecer dúvidas sobre as dificuldades de aprendizagens, isso ocorreu em Chicago. A partir dessa reunião são abandonados os modelos médicos e passa-se a incluir modelos institucionais e educativos.

 O terceiro momento é a de projeção, que se inicia nos anos noventa e é notado pelo envolvimento de vários profissionais, pesquisadores e pais tanto na área educacional como clínica, ocorrendo um avanço nos estudos nessa área.

O que foi sugerido pelo estudo desenvolvido por García (1998, p.31-32) está concordando com a proposta do National Joint Committee on Learning Disabilities, que considera consensual ao se referir ao tema dificuldade de aprendizagem: Dificuldade de Aprendizagem (D.A.)  é muito amplo, pois refere-se a um grupo heterogêneo de transtornos que surgem por dificuldades relevantes na aquisição e uso da escuta, fala, leitura, escrita, raciocínio ou operações matemáticas.  Esses transtornos são inerentes ao indivíduo, seja devido à disfunção do sistema nervoso central, e podem ocorrer durante a vida.

É possível que existam junto com as dificuldades de aprendizagem, problemas de autorregulação, percepção social e interação social, mas não podemos concluir que sejam dificuldades de aprendizagem, ainda que estas possam ocorrer ao mesmo tempo que outras condições incapacitantes.

É natural que as dificuldades de aprendizagem sejam relacionadas e até confundidas com distúrbios/transtornos da aprendizagem, mas isso, não é um ponto final para um diagnóstico. A comunidade escolar e os pais enfrentam situações que, muitas vezes, não se sabe como intervir (Erildo; Bernarda; Romeiro, 2009).

No que diz respeito ao contexto escolar, é necessário que o professor considere os diferentes níveis do desenvolvimento dos estudantes e as possibilidades de sobrepor ambientes que signifiquem melhores saberes para eles, tornando a vivência escolar um princípio significativo para o desenvolvimento cognitivo.

Trilhando estas contemplações, Goldenberg (2000) enfatiza que cada estudante dentro de sua individualidade apresenta rendimento diferente, e isso deve ser respeitado, objetivando-se que o aluno aprenda o máximo possível e que se possa repensar o processo a fim de atender todas as diferenças individuais. É fundamental que fique bem claro que estas diferenças não devem ser pensadas apenas no que diz respeito ao cognitivo e/ou psicológico, mas também no que diz respeito aos aspectos de natureza socioeconômica e cultural, que possuem fatores diretamente implicados nas condições do aluno e com relações fundamentais com o processo ensino – aprendizagem.

As dificuldades de aprendizagem englobam vários fatores, uma vez que englobam a subjetividade do ser humano, portanto várias podem ser as causas que acometem dificuldade na aprendizagem como por exemplo: decorrentes de um problema fisiológico, um estresse grande vivido pela criança, como por exemplo problemas familiares envolvendo a perda de algum parente, problemas com alcoolismo ou drogas, separação dos pais, doenças, falta de alimentação, falta de material e estímulos, tédio na sala de aula, baixa autoestima, problemas patológicos como a TDAH (transtorno de déficit de atenção/ hiperatividade), dislexias, psicopatias, alterações no desenvolvimento cerebral, desequilíbrios químicos, hereditariedade, problemas no ambiente doméstico e/ou escolar.

Isto posto, é imprescindível que as pessoas que atendem ou convivem com um estudante que apresenta dificuldade de aprendizagem percorra por todas as esferas possíveis para conhecer a realidade do estudante tornando-se capaz de identificar qual fator é determinante para que apresente tais dificuldades.

Todo educador deve ser prevenido quanto às situações que envolvam problemas de aprendizagem, deve-se buscar entender os aspectos sejam eles: orgânicos, psicológicos, ambientais (família, situação socioeconômica etc.), a partir de então procurar soluções para amenizar as dificuldades de aprendizagem. (José, 1997, p.24).

Em relação ao processo de ensino-aprendizagem, (Silva; Piccolo, 2010, p. 195), afirma que quando este não apresenta avanços, mesmo que existam outros fatores, as causas normalmente são buscadas somente no educando, o qual torna-se incapaz e sendo o único responsável pelo seu insucesso escolar. Prematuramente, os estudantes vão sendo levados a acreditar que a não aprendizagem é um problema ou incapacidade dele, assim dentro desta circunstância as crianças com dificuldades vão criando um sentimento de fracasso escolar.

As dificuldades de aprendizagem é um assunto complicado, pois gera muitas discussões e trata-se de um efeito que afeta muitas pessoas e não pode ser direcionado somente para as crianças, pois jovens e adultos também podem ter o mesmo problema.

Com a pandemia do Coronavírus (Covid-19) que atingiu todo o mundo, acarretou o isolamento social da sociedade, inclusive foi exigido que para diminuição do contágio seria necessário a paralisação das aulas nas instituições escolares, a partir daí os estudantes tiveram de se adequar para terem aulas à distância, ou seja, ensino remoto. Neste contexto, para que as aprendizagens fossem significativas, foi necessário o acompanhamento e auxílio das famílias. A vida estudantil mudou, pois, a casa virou escola e a escola está na casa, pais e mães muitas vezes não conseguiram ajudar seus próprios filhos, por não terem formação. Os professores também passaram por dificuldades ao terem que lidar com as TICs (Tecnologias da Informação e Comunicação), adaptando-se aos aplicativos para as aulas remotas. 

O estudo desenvolvido por Zurawski, Boer e Scheid (2020), as rotinas foram roubadas da noite para o dia e muitas informações foram modificadas a cada momento, trazendo sentimento de impotência e medo, criando insegurança em relação às aprendizagens e a socialização escolar.

Nesse contexto, é essencial, entender as consequências da pandemia e os desafios a serem enfrentados pela educação e, subsequentemente, buscar respostas para o restabelecimento da aprendizagem de forma a possibilitar diversificados meios, pautados nas especificidades de cada educando (Lima; Sousa, 2021). 

O estudo realizado por Pozzobon, Mahendra e Marin (2017) mostram a importância do educador no processo de ensino e de aprendizagem, com maior atenção do professor às diversidades dos alunos e a adequação dos métodos de ensino e de avaliação. Desse modo, ressalta-se o papel da escola e do professor na progressão de ações apropriadas segundo as particularidades de cada estudante. 

A dificuldade de aprendizagem apresenta várias causas, isto é, crianças que demonstram dificuldade de aprendizagem não necessariamente apresentam distúrbios neurobiológicos. Os problemas de aprendizagem possuem caráter momentâneo, ou seja, mediante intervenções adequadas realizadas sobre a dificuldades elas podem ser sanadas, e os fatores surgem de variados aspectos, como problemas sociais, pedagógicos, psicoafetivos, psicocognitivos, orgânicos (Cruz, 2014).

Na perspectiva do estudo realizado por  Szymanski (2012), existem três condições que dificultam a aprendizagem: primeiro: condições sociais, como conflitos familiares, os aspectos socioeconômicos, a violência familiar e o ambiente conflituoso; segundo: condições escolares, trata-se da falta de professores, desmotivação pelo exercício da função, falta de infraestruturas adequadas; terceiro: condições de saúde da criança, agitação excessiva, violência escolar e o desinteresse e a falta de estímulos. No âmbito que se refere à legislação, os estudantes com dificuldades de aprendizagem não possuem direito ao atendimento legal nas Salas de Recursos Multifuncionais, visto que o Decreto nº 7.611, de 17 de novembro de 2011 que estabelece o Atendimento Educacional Especializado, não engloba estes educandos, somente o público que apresenta superdotação, transtorno e/ou síndrome (Brasil, 2011).           

A pesquisa desenvolvida por Soares e Guimarães (2017, p. 181), afirma que “esses educandos experimentam o insucesso na vida acadêmica ano após ano”. Assim, os sujeitos que apresentam dificuldades de aprendizagem não possuem respaldo legal e cabe somente ao professor da sala regular propiciar meios para superar os obstáculos enfrentados. Dessa forma, a metodologia adequada e direcionada e o modo de organização da instituição para a resolução desse problema, é o que permite o êxito no processo de ensino e de aprendizagem. 

Delineamento

O projeto de pesquisa se enquadra no panorama da pesquisa qualitativa. A expressão, pesquisa qualitativa, denota distintos significados na área das ciências sociais. Compreende-se como um conjunto de táticas interpretativas que visam descrever e decodificar os componentes de um sistema complexo de significados. Tem por objetivo traduzir e expressar o sentido dos fenômenos do mundo social; trata-se de reduzir a distância entre indicador e indicado, entre teoria e dados, entre contexto e ação (Maanen, 1979a, p.520).  

A investigação apresentada neste artigo classifica-se como qualitativa. Os estudos de pesquisa qualitativa diferem entre si quanto ao método, à forma e aos objetivos. Godoy (1995a, p.62) ressalta a diversidade existente entre os trabalhos qualitativos e enumera um conjunto de características essenciais capazes de identificar uma pesquisa desse tipo, a saber:

(1) o ambiente natural como fonte direta de dados e o pesquisador como instrumento fundamental;

(2) o caráter descritivo;

(3) o significado que as pessoas dão às coisas e à sua vida como preocupação do investigador;

(4) enfoque indutivo.

Como metodologia de levantamento de dados utilizaremos um questionário estruturado para entrevistar os docentes participantes da pesquisa. A análise dos dados será feita à luz dos procedimentos metodológicos dos histogramas.

Para efetivação do trabalho, optamos em desenvolver uma pesquisa de abordagem metodológica quantitativa para o levantamento de dados, contendo questões para a análise do ciclo de vida docentes de acordo com a premissas de Huberman (1992) e a respeito das dificuldades de aprendizagem no contexto escolar, que foi elaborada por meio de um questionário formulado pelo Google Forms para docentes 16 participantes.

As questões apresentadas para os educadores podem ser apreciadas no quadro 1.

 

 

 

Quadro 01: Descrição da entrevista estruturada.

Tipo de entrevista

Perguntas do formulário estruturado

Forma de coleta de dados

Entrevista com formulário estruturado

Formação acadêmica e tempo de atuação.

Como foi a participação dos estudantes durante o período de pandemia nas aulas remotas?

Como aspectos socioeconômicos e socioemocionais impactaram na participação dos estudantes nas aulas remotas e no retorno ao presencial?

Quais os principais aspectos na socialização escolar sofreram mudanças no retorno às aulas presenciais?

Houve mudança no perfil dos estudantes quanto às aprendizagens ou socialização pós pandemia?

Planilha enviada via Google Forms e Transcrição de dados

 

Fonte: Próprios autores, 2023.

As entrevistas foram realizadas seguindo fielmente o questionário estruturado, onde as perguntas são previamente estabelecidas e têm-se a sensibilidade de não fugir a elas. O principal motivo deste zelo é a possibilidade de comparação com o mesmo conjunto de perguntas na análise de dados e que as diferenças devem refletir diferenças entre os respondentes e não diferença nas perguntas (Lodi, 1974 apud Lakatos, 1996).

Resultados e Discussão

Para respaldar as concepções discutidas até aqui, foi realizada uma pesquisa qualitativa, com educadores da rede pública e particular de Guarulhos, onde fica evidente que os educadores sentiram muita dificuldade em alcançar os estudantes durante o período de pandemia, por diversos motivos, seja falta de acesso, interesse ou comprometimentos das famílias, isso resultou em grandes perdas em habilidades básicas adquiridas pela convivência escolar, como por exemplo, a relação com o outro, autoestima, além das questões de aprendizagem propriamente dita.

Todos os profissionais relataram que os fatores sociais e econômicos foram determinantes para a falta de assiduidade e por consequência as dificuldades de aprendizagem que vieram nos pós pandemia. O distanciamento social, a ausência da vivência escolar, realidades diversas dentro das famílias, além dos problemas da própria pandemia, como pessoas acometidas pela covid-19 e óbitos de pessoas próximas, também impactaram muito na vida dos estudantes, o que reflete diretamente na relação deles com a escola.

Quadro 02: Descrição da entrevista estruturada.

Professor

Área de Formação

Tempo de magistério

P1

Pedagogia e Letras

9 anos

P2

Pedagoga

5 anos

P3

Pós-graduada

17 anos

P4

Psicopedagogia

24 anos

P5

Graduação Pedagogia

5 anos

P6

Pedagogia e artes

10 anos

P7

Pedagogia

27 anos

P8

Pedagogia

18 anos

P9

Letras e Pedagogia

21 anos

P10

Pedagogia

11 anos

P11

Pedagogia e História

30 anos

P12

Pós-graduada

21 anos

P13

Pedagogia

21 anos

P14

Superior completo em pedagogia

25 anos

P15

Pedagogia e psicopedagogia institucional

22 anos

P16

Magistério/ Psicologia

20 anos

Fonte: Próprios autores, 2023.

No gráfico 01 pode-se verificar o perfil dos dezesseis docentes participantes desta pesquisa de acordo com a classificação de Huberman (1992).

 

 

Gráfico 01: Ciclo de vida dos participantes

Fonte: Próprios autores, 2023.

Os dados coletados demonstram que nenhum dos participantes se encontram na fase de entrada de carreira, ciclo qual se trata do primeiro contato do docente com as situações dentro da sala de aula com uma visão mais uniforme. Huberman (1992) identifica esta fase como o momento inicial, onde o professor está começando a fazer a separação daquilo que imaginava e a realidade presente nas escolas.

Nesta fase, apesar do docente estar enfrentando esse momento de divisão, ele também tem a disposição e exultação de estar ali tendo seu primeiro contato como profissional da área. Logo, esta fase é denominada como “sobrevivência ou descoberta” (Huberman, 1992, p.39).

O ciclo da fase de estabilização é contemplado com 12,5% dos docentes participantes, momento no qual acontece “uma escolha subjetiva (comprometer-se definitivamente) e de um ato administrativo (a nomeação oficial)” (Huberman, 1992, p.40).

Ou seja, o profissional começa a enxergar a si mesmo como professor e começa a ter uma visão mais séria sobre sua escolha profissional.

Na estabilização é possível perceber que o profissional se torna mais apto a resolução de problemas que surgem em sala de aula por ter mais experiência. Esta fase engloba profissionais que já atuam em sua área por um período entre quatro a seis anos. O docente começa a ter um pouco mais de liberdade e prazer em seu ofício por ter esse domínio maior em sua profissão (Huberman, 1992).

A fase de diversificação e continuidade na carreira representada por 68,7% dos participantes. Representam a maior parte da pesquisa e englobam de sete a vinte e cinco anos de carreira docente. Nesta fase, o docente está então à procura de quebras de estado e fuga da rotina (Huberman, 1992).

Nesta fase, os docentes estão à procura de novas formas de ministrar suas aulas de forma que consigam, ao mesmo tempo, atingir positiva e efetivamente seus alunos e escaparem da solidez do sistema pedagógico. Já não se preocupam tanto com a inflexibilidade pedagógica; seu foco agora são os novos desafios que pode encontrar de modo a melhorar e inovar mais suas aulas (Huberman, 1992).

A fase de distanciamento afetivo e conservantismo é representada por 18,8%. Essa fase pode ser também de conservadorismo e lamentações, representa o ciclo da carreira dos professores dos 25 aos 35 anos de docência. Estes professores emanam “grande serenidade” em situações em sala de aula e apresentam-se menos vulneráveis à avaliação dos outros, quer se trate do diretor ou dos estudantes (Huberman, 1992).

As entrevistas estruturadas foram aplicadas para oito participantes da pesquisa conforme quadro 03. As respostas foram coletadas por meio de um formulário gratuito intitulado Google Forms.

Quadro 03: Questionário estruturado aplicado às participantes.

ENTREVISTA ESTRUTURADA

1

Como foi a participação dos estudantes nas aulas remotas durante o período de pandemia?

2

Como aspectos socioemocionais e socioeconômicos impactaram na participação dos estudantes nas aulas remotas e no retorno ao presencial?

3

Quais os principais aspectos na socialização escolar sofreram mudanças no retorno às aulas presenciais?

4

Houve mudanças no perfil dos estudantes quanto às aprendizagens ou socialização no pós-pandemia?

Fonte: Próprios autores, 2023.

Os dados analisados nessa etapa são originários das entrevistas com os 16 participantes. Os dados analisados demonstrados neste momento possibilitam definir os pré-indicadores que servem de base para a construção de indicadores e, posteriormente, dos núcleos de significação.

Ao agregar os pré-indicadores, por meio da leitura flutuante, pode-se entrar em contato com o conteúdo originário das falas dos participantes. A elaboração das palavras que denominam ou que expressam os pré-indicadores em cada quadro são constituídos a partir dos trechos dos discursos dos participantes.

Os pré-indicadores foram organizados em grupos para facilitar a elaboração dos indicadores, de acordo com “semelhança”, “complementaridade” e “contraposição”, seguindo a sugestão de Aguiar e Ozella (2006) e, as palavras ou trechos destacados em negrito significam os aspectos fundamentais do conteúdo de cada pré-indicador, ao apontar expressões contextualizadas e singulares do modo de pensar dos docentes participantes.

Quadro 04: Pré-indicadores (A) compostos por trechos dos discursos dos docentes participantes.

PRÉ-INDICADORES (A)

1) Participação dos estudantes nas aulas remotas durante o período de pandemia;

2) Aspectos socioemocionais e socioeconômicos impactaram na participação dos estudantes nas aulas remotas e no retorno ao presencial;

Em uma turma com 27 alunos, tive a participação diária de uma média de 15 a 20 em horário normal de aula (7h as 11:30). A maioria entrava logo no início e mantinha a interação, por áudio, msg ou vídeo. Devido ao confinamento, eu atendia a alguns dos alunos em outros períodos do dia, inclusive a noite, pois alguns só tinham acesso ao celular dos pais (único recurso de comunicação) nesse horário. Foi desgastante, mas extremamente significativo e proveitoso. A turma e as famílias já me conheciam do ano anterior e já entendiam a minha comunicação, estratégias e isso certamente contribuiu demais para os bons resultados a despeito das dificuldades óbvias do período pandêmico

Eles se sentiam tristes e preocupados com tudo que estava ocorrendo e, por muito tempo, eu usava dinâmicas divertidas que tinham objetivos voltados aos aspectos emocionais. Muitos se encontraram com as habilidades tecnológicas e ampliaram as interações fora de aula, criando grupos de estudos entre eles a partir dos meus estímulos. Os poucos que não corresponderam positivamente as minhas tentativas, na maior parte do tempo, tiveram impedimentos familiares ou mesmo limitações por não terem condições de acesso à internet e, mesmo materiais impressos disponibilizados, não conseguiram manter as atividades em dia, por falta de apoio físico mesmo, já que eu não podia ir até eles.

No retorno eu percebi de forma muito mais acentuada, questões de baixo estima, insegurança e timidez. Em parte dos estudantes, notei também um excesso de agitação e o desencadeamento de problemáticas na interação social, com recorrência de conflitos. (P1)

Muito não tinham recursos tecnológicos para acompanhar as aulas. Foi muito difícil. Os alunos com as condições financeiras melhores voltaram as aulas presenciais sem muitas dificuldades já os alunos com poucos recursos tiveram mais dificuldade no retorno pois não conseguem acompanhar a apresentação de novos conceitos pois sua aprendizagem está em defasagem. (P4)

Muito difícil devido a falta de acesso a tecnologias, falta de interesse e de conhecimento das famílias. Na minha turma, o aspecto socioeconômico foi mais impactante. (P5)

Muito precária, a maioria não tinha ferramentas necessárias. A falta de estrutura em casa, principalmente com equipamentos para auxiliá-los a assistir as aulas. (P8)

Razoável, na minha turma participaram 70% dos educandos. Socioemocional eles ainda refletem a agressividade e o individualismo. Socio económico manteve o que já estava, os pequenos não refletem tanto. (P10)

Como atuo na Educação Infantil, a participação estava mais ligada à ação dos pais e responsáveis do que especificamente das crianças. Uma parcela bem pequena das famílias nos dava devolutivas das propostas de interação que enviávamos pela plataforma Google Sala de Aula. Nas aulas remotas eram movimentadas pois, iniciava as 8h, com 1h de duração. Assim, no retorno ao presencial busquei trabalhar com dinâmicas, mas que eles não se aproximassem. Houve avanços nas hipóteses de escrita e leitura. (P12)

Por ter sido improvisado, acho que a sala no geral deu um bom retorno. A participação das famílias via internet foi bastante tímida, e através das pesquisas que fizemos, foi muito em função da qualidade dos planos é provedores de internet que tinham acesso, aliás, quando tinham acesso. No CEI, que recebe em período integral bebês e crianças de 0 a 3 anos, as famílias estavam muito ansiosas pelo retorno do atendimento presencial devido a necessidade de voltar ao mercado de trabalho. (P13)

Algumas famílias estiveram bem ativas nas atividades sugeridas. Outras, a maioria por motivo de trabalho, demonstrou participação menor no auxílio às crianças. Alguns alunos não tinham celular e internet, portanto acabaram sendo prejudicados. No retorno, as crianças ainda estavam com medo e os que perderam algum familiar estavam abalados e tristes. (P16)

Fonte: Próprios autores, 2023.

Quadro 05: Pré-indicadores (B) compostos por trechos dos discursos dos docentes participantes.

PRÉ-INDICADORES (B)

3) Principais aspectos na socialização escolar que sofreram mudanças no retorno às aulas presenciais;

4) Mudanças no perfil dos estudantes quanto às aprendizagens ou socialização no pós-pandemia;

Na insegurança em expor dúvidas e inseguranças para oralizar pensamentos ou opiniões. O autocontrole pra resolução de situações de conflito. Acredito que o grau de dificuldade aumentou após o período pandêmico, embora eu já tivesse lidado com crianças com déficit de aprendizagem extremamente acentuados. Mas a quantidade de crianças com dificuldade de aprendizagem é sim bem maior agora, do que antes do período pandêmico. O nível dos alunos dentro das expectativas (medianos e até, em certos aspectos, avançados) também reduziu, é importante mencionar. (P1)

Incivilidades, falta de paciência, dificuldade de concentração. Sim, eles apresentaram dificuldades na socialização e tolerância ao próximo. (P4)

O individualismo. Egocentrismo e agressividade. Sim, principalmente para alfabetização precisamos frisar mais no emocional (você é capaz, vai conseguir) para conquistar a aprendizagem. São crianças mimadas. (P5)

Foi muito difícil brincar sem se tocar. Pra mim foi muito difícil, mas nos cumprimentavam com acenos, sorrisos. Sim. Eu percebi muita dependência (normal) da criança com a família, no 2° ano, foi a turma que fiquei. Criança que não queria ir à escola, que chorava. (P8)

Os protocolos de saúde foram especialmente desafiadores em um ambiente coletivo para bebês, visto que o eixo do trabalho são as interações e brincadeiras. Acredito que vemos essa mudança de perfil muito mais entre os adultos, equipe escolar e famílias atendidas, do que nas relações estabelecidas com e entre os bebês e crianças. Os profissionais e comunidade atendida têm sido mais receosos com as situações de saúde que invariavelmente ocorrem no cotidiano de um espaço coletivo para bebês e crianças. (P10)

As crianças se mostraram assustados e mais distantes uns dos outros. Sim houve, as crianças se mostraram mais dispersos. (P12)

Muito difícil a socialização sem o contato físico, foi bem complicado manter o distanciamento na hora de brincar, nas refeições etc. Quanto a socialização acho que voltou ao normal, mas a aprendizagem ficou prejudicada, principalmente nas atividades mais complexas, como produção textual. (P13)

Foi possível observar dificuldades significativas em aspectos motores, com muitas crianças que perderam a Educação Infantil presencial que atualmente encontram mais desafios nas atividades de educação física. As crianças que não puderam participar ativamente das propostas sugeridas para casa apresentaram mais dificuldades nas aprendizagens no pós-pandemia. (P16)

Fonte: Próprios autores, 2023.

O processo de aglutinação ocorre na próxima etapa de análise dos pré-indicadores identificados anteriormente gerando os indicadores. Organizando os pré-indicadores dos quadros antecessores por meio da “similaridade”, “complementaridade” ou “contraposição” (Aguiar, Ozella, 2006) a partir das falas dos professores participantes foi possível estruturar os indicadores quadro 06, proporcionando assim identificar os aspectos, os sentidos e significados que são compreendidos a partir da fala proferida pelos docentes participantes.

Quadro 06: Pré-indicadores aglutinados em indicadores.

PRÉ-INDICADORES

INDICADOR

1) Fragilidade de acessos por ausência de recursos tecnológicos.

A) Fragilidade socioeconômica e ausência de recursos tecnológicos.

2) Dificuldade socioeconômica acentuando a defasagem de aprendizagem.

3) Insegurança e dificuldades de socialização.

B) Aprendizagem impactada pela insegurança e ausência de socialização

4) Dificuldade acentuada de aprendizagem.

Fonte: Próprios autores, 2023.

Para a legítima confecção dos núcleos de significação é preciso tentar identificar as transformações e contradições que ocorrem durante a etapa de construção dos sentidos e dos significados que a experiência proporcionou, isso possibilitará realizar uma análise mais consistente que nos permitiu tentar ir um pouco mais além dos aspectos superficiais e assim, considerar tanto as condições subjetivas quanto as contextuais e até mesmo históricas” (Aguiar, Ozella, 2006, p. 231).

O processo de análise é extremamente relevante para que se possa tentar avançar do aspecto empírico para o interpretativo, revelando características fundamentais sobre os estudantes participantes. O estudo desenvolvido por Santos (2012) salienta que “este esforço busca apreender o que é complexo: capturar o movimento dos significados das palavras rumo às zonas de sentidos a do material partir da organização discursiva” (p. 163), assim, sob a luz da perspectiva metodológica instruída por Aguiar e Ozella (2006) obtém-se os núcleos de significação quadro 07.

Quadro 07: Núcleos de significação dos participantes.

INDICADORES

NÚCLEOS DE SIGNIFICAÇÃO

Fragilidade socioeconômica e ausência de recursos tecnológicos.

I.  A condição socioeconômica e a ausência de recursos tecnológicos gerando insegurança ao impactar a socialização e aprendizagem.

B) Aprendizagem impactada pela insegurança e ausência de socialização.

Fonte: Próprios autores, 2023.

Doravante a leitura flutuante oriunda da coleta de dados organiza-se para realizar o levantamento dos pré-indicadores ao estabelecer um conjunto de quatro (4) pré-indicadores, por intervenção de palavras e frases proferidas pelos professores participantes. Os pré-indicadores que, em uma leitura secundária permitiram realizar o processo de aglutinação, utilizamos para isso a similaridade e complementaridade, esta tarefa nos possibilitou a construção de dois (02) indicadores, que por sua vez proporcionaram um (01) núcleo de significação. No quadro 08 pode-se observar de forma ordenada todo processo de produção dos núcleos de significação.

 

 

Quadro 08: Composição do processo de confecção dos núcleos de significação.

PRÉ-INDICADORES

INDICADORES

NÚCLEOS DE SIGNIFICAÇÃO

 

Fragilidade de acessos por ausência de recursos tecnológicos.

A) Fragilidade socioeconômica e ausência de recursos tecnológicos.

 

I. A condição socioeconômica e a ausência de recursos tecnológicos geram insegurança ao impactar a socialização e aprendizagem.

 

Dificuldade socioeconômica acentuando a defasagem de aprendizagem.

 

Insegurança e dificuldades de socialização.

B) Aprendizagem impactada pela insegurança e ausência de socialização.

Dificuldade acentuada de aprendizagem.

Fonte: Próprios autores, 2023.

A execução da composição do Núcleo de Significação denotado a partir do relato dos 16 professores participantes que a condição socioeconômica e a ausência de recursos tecnológicos geram insegurança ao impactar a socialização e aprendizagem.

Considerações Finais

Os indicadores apresentados neste estudo permitiram observar os sentidos e significados do aprendizado no pós-pandemia a luz do objetivo proposto de identificar as dificuldades de aprendizagem existentes no contexto escolar e buscar averiguar as possíveis causas.

A Pandemia gerou Insegurança e dificuldades de socialização, proporcionou dificuldades acentuada de aprendizagem.   O relato da participante P1, P4 e P16 demonstram este sentimento.

Na insegurança em expor dúvidas e inseguranças para oralizar pensamentos ou opiniões. O autocontrole para a resolução de situações de conflito. Acredito que o grau de dificuldade aumentou após o período pandêmico, embora eu já tivesse lidado com crianças com déficit de aprendizagem extremamente acentuados. Mas a quantidade de crianças com dificuldade de aprendizagem é sim bem maior agora, do que antes do período pandêmico. O nível dos alunos dentro das expectativas (medianos e até, em certos aspectos, avançados) também reduziu, é importante mencionar. (P1)

Não tinham recursos tecnológicos para acompanhar as aulas. Foi muito difícil. Os alunos com as condições financeiras melhores voltaram as aulas presenciais sem muitas dificuldades já os alunos com poucos recursos tiveram mais dificuldade no retorno pois não conseguem acompanhar a apresentação de novos conceitos pois sua aprendizagem está em defasagem. (P4)

Foi possível observar dificuldades significativas em aspectos motores, com muitas crianças que perderam a Educação Infantil presencial que atualmente encontram mais desafios nas atividades de educação física. As crianças que não puderam participar ativamente das propostas sugeridas para casa apresentaram mais dificuldades nas aprendizagens no pós-pandemia. (P16)

Os indicadores recolhidos e analisados a partir dos Núcleos de Significação contribuíram para demonstrar as reais dificuldades vivenciadas por estudantes a partir da percepção dos docentes, tais como, ausência de aparatos tecnológicos, inexistência de acesso a tecnologia compatível com as necessidades do momento. Estes fatores proporcionaram dificuldades de socialização, complicações na apreensão de conceitos básicos. Deste modo, fica evidente que o Pós-pandemia evidenciou o abismo educacional acarretado pelo isolamento e distanciamento social, este impacto foi descomunal nas classes socioeconomicamente vulneráveis.

Contudo, constatamos que o objetivo do estudo foi atingido, é preciso ter clareza de que uma pesquisa em aspecto macro pode ser feita e assim constatar de modo mais amplo os efeitos da Pandemia ao desempenho dos estudantes.

O sucinto estudo aqui apresentado foi realizado em um aspecto micro, os dados representam as percepções e vivências de dezesseis docentes. É de extrema importância ampliar este estudo e assim obter um estudo quantitativo com análise estatística que possa representar mais fidedignamente a realidade e a percepção docente sobre a aprendizagem escolar do município de Guarulhos em tempos pós-pandêmicos. 

 

 
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CAPÍTULO 18

METODOLOGIAS ATIVAS NO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM EM NUTRIÇÃO BÁSICA PARA ALUNOS DO ENSINO FUNDAMENTAL

ACTIVE METHODOLOGIES IN THE TEACHING-LEARNING PROCESS IN BASIC NUTRITION FOR ELEMENTARY SCHOOL STUDENTS

 

DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.18

Submetido em: 08/02/2024

Revisado em: 15/02/2024

Publicado em: 20/02/2024

 

Karina Midori Endo

Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO), Guarapuava-PR

http://lattes.cnpq.br/697259943534875527

Akemi Teramoto de Camargo

Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), Departamento de Biologia Geral, Ponta Grossa-PR

 http://lattes.cnpq.br/4237406950571995

 

 

Resumo

A alimentação saudável é um direito fundamental para o desenvolvimento do ser humano. A educação alimentar e nutricional é vista como uma estratégia para promoção de hábitos alimentares saudáveis e acredita-se que o ambiente escolar seja o espaço apropriado para ações voltadas à promoção da saúde. No entanto, para serem efetivas, é importante a implementação de metodologias ativas, especialmente os jogos didáticos, que podem ser uma considerável ferramenta para um aprendizado significativo. Portanto, o trabalho teve como objetivo a elaboração de metodologias ativas para avaliar o desenvolvimento de conhecimentos e estimular a motivação e participação dos alunos. O presente estudo foi desenvolvido com alunos da 7⁠ª série do ensino fundamental da rede pública de ensino do município de Ponta Grossa, Estado do Paraná. Este estudo caracterizou-se em pesquisa qualiquantitativa com aplicação de um questionário Pré-aula (Turmas A e B) e Pós-aula A (apenas aula expositiva) e Pós-aula B (aplicação de jogo didático), além da observação assistemática. Para aula expositiva, nas duas turmas, foi elaborada e aplicada a pirâmide alimentar 3D como recurso didático inicial. Os resultados indicaram que na turma A o acerto médio obtido após a aula foi de 56,92%, já para outra turma, obteve-se 69,23% após aplicação do jogo. Apesar da diferença quantitativa não significativa entre as duas turmas, observou-se qualitativamente que o jogo despertou interesse e motivação, favorecendo a participação e a construção do conhecimento. A partir dos resultados, pode-se concluir que houve uma melhoria no desempenho dos alunos com aplicação do jogo lúdico, mas destaca-se que a sua utilização estimulou o desenvolvimento de comportamentos alimentares saudáveis e habilidades práticas, cognitivas e analíticas dos estudantes. Dessa forma, o jogo didático pode ser um importante recurso na construção de conhecimento, contribuindo no processo de ensino e aprendizagem de forma significativa e na formação de indivíduos autônomos, protagonistas na vida pessoal e coletiva.

Palavras-Chave: Jogo didático. metodologia ativa. pirâmide alimentar. alimentação saudável. nutrição

Abstract

Healthy eating is a fundamental right for human development. Food and nutrition education is seen as a strategy for promoting healthy eating habits and it is believed that the school environment is the appropriate space for actions aimed at promoting health. However, in order to be effective, it is important to implement active methodologies, especially educational games, which can be a considerable tool for meaningful learning. Therefore, the aim of this study was to develop active methodologies to assess the development of knowledge and stimulate student motivation and participation. This study was carried out with 7th grade students from the public school system in the city of Ponta Grossa, state of Paraná. This study was characterized by qualitative and quantitative research with the application of a questionnaire Pre-class (Classes A and B) and Post-class A (only lecture) and Post-class B (application of educational game), as well as unsystematic observation. For the lectures in both classes, the 3D food pyramid was created and used as an initial teaching resource. The results showed that in class A the average correct answer obtained after the lesson was 56.92%, while for the other class, 69.23% was obtained after the game was applied. Despite the non-significant quantitative difference between the two classes, it was observed qualitatively that the game aroused interest and motivation, favoring participation and the construction of knowledge. From the results, it can be concluded that there was an improvement in the students’ performance with the application of the game, but it should be noted that its use stimulated the development of healthy eating behaviors and the students’ practical, cognitive and analytical skills. In this way, the educational game can be an important resource in the construction of knowledge, contributing to the teaching and learning process in a meaningful way and to the formation of autonomous individuals, protagonists in their personal and collective lives.

Keywords: Educational game. active methodology. food pyramid. healthy eating. nutrition

 

Introdução

A alimentação adequada e saudável é um direito humano básico essencial, amparada constitucionalmente, e deve garantir de forma permanente uma prática alimentar voltada aos aspectos biológicos e sociais do indivíduo (BRASIL, 2014). A formação dos hábitos alimentares é influenciada por fatores socioculturais, geográficos, econômicos, religiosos e afetivos (CASTELL; SAGNIER, 2004). Apesar disso, a adoção de uma alimentação balanceada constitui fator determinante para proteção contra má nutrição em todas as suas formas e na prevenção de diversas doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), como diabetes, doenças cardiovasculares, AVC e câncer (OPAS, 2019).

Nos últimos anos, têm sido observadas inúmeras alterações nos padrões alimentares, especialmente com o aumento da produção e consumo de bebidas e alimentos processados, a rápida urbanização e mudança de estilos de vida (OPAS, 2019; AZZAM, 2021). Associado a esses fatores, o impacto do comportamento sedentário também influencia os hábitos alimentares.

            A construção de práticas saudáveis voltadas para o saber em nutrição devem ocorrer desde cedo, durante o desenvolvimento do indivíduo, e grande parte desta formação pode ser conduzida nas instituições educacionais. Neste sentido, o ambiente escolar representa o espaço oportuno para ações voltadas à promoção da saúde baseadas na formação de hábitos alimentares saudáveis. As instituições de ensino têm o compromisso de estimular a reflexão e a análise aprofundada para o desenvolvimento de uma postura reflexiva na escolha alimentar (OLIVEIRA et al., 2016). O desenvolvimento de atividades em alimentação e nutrição podem articular com outros temas da saúde já incorporados no currículo, visando correlacionar o conteúdo do currículo escolar com a multiplicidade de fatores relacionados às práticas alimentares.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) (BRASIL, 1996) que determina a construção de um processo educativo baseado nas necessidades reais dos estudantes, não apenas na simples transmissão dos conhecimentos, e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), orientam os currículos do sistema de educação e das redes de ensino no Brasil e consideram o sujeito de aprendizagem em sua singularidade, integridade e diversidade, visando ao desenvolvimento humano global e que, ao longo das etapas de ensino, sejam estimuladas competências e habilidades gerais e específicas para responder às mais diversas situações e desafios contemporâneos (BRASIL, 2018).

A BNCC enfatiza a necessidade da adoção de metodologias e estratégias didático-pedagógicas para atingir as habilidades e competências fundamentais para a trajetória dos estudantes, e assegurar seus direitos de aprendizagem e desenvolvimento. Assim, restringindo-se à mera transmissão de conhecimentos, de modo a auxiliar o educando a ser o protagonista na vida prática e promovendo um processo de ensino-aprendizagem contextualizado em função das realidades regionais e locais (BRASIL, 2018). Dos Santos e colaboradores (2020) afirmam que métodos tradicionais de ensino, centrados no conteúdo, marcados por caráter formalista e passividade do aluno, não têm atendido às demandas dos estudantes. Desse modo, a prática docente deve ser constantemente reformulada para o desenvolvimento de metodologias que promovam a motivação, o interesse dos educandos e uma aprendizagem significativa.

As metodologias ativas podem ser caracterizadas como estratégias pedagógicas baseadas na participação efetiva dos estudantes para a formação do processo de ensino e aprendizagem. Portanto, a inserção destas metodologias ao ensino poderá possibilitar o desenvolvimento de estudantes autônomos, criativos e críticos, protagonistas na própria construção do conhecimento e atuantes diante dos desafios da vida real (BRASIL, 2018; (INOCENTE et al., 2018). Entre os inúmeros métodos ativos discutidos atualmente, pode-se destacar os jogos lúdicos ou didáticos. Os jogos podem ser considerados uma importante estratégia de ensino, visando a promoção de uma aprendizagem que possibilite a construção da autonomia e cooperação entre os alunos (DE LARA et al. 2017).

Diante do exposto, o objetivo deste estudo foi a aplicação de metodologias ativas sobre nutrição básica e alimentação saudável para alunos do ensino fundamental e avaliação das contribuições destes materiais na construção de conhecimento como estratégias no processo ensino-aprendizagem.

Metodologia

            Este estudo caracterizou-se em pesquisa de caráter quantitativo – qualitativo, pois quantifica os dados apresentados utilizando-se questionários para coleta de dados (ESTRELA, 2018), além da observação assistemática e não participante, descrevendo de forma detalhada, mantendo-se a espontaneidade dos alunos e sem interferências no comportamento dos mesmos, de modo a garantir a confiabilidade dos resultados (MARCONI; LAKATOS, 2010).

A pesquisa foi desenvolvida com 26 alunos de uma escola pública da sétima série do Ensino Fundamental do município de Ponta Grossa, Paraná. Para a realização do estudo, foi solicitada autorização da escola envolvida, e para utilização dos dados obtidos da aplicação dos questionários e das imagens, foram solicitados aos investigados a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Os alunos foram divididos aleatoriamente em turmas designadas em A e B. Na turma A foi aplicada somente a aula expositiva. Já a turma B também foi contemplada com a aula e ao final, empregou-se como metodologia ativa o jogo didático de tabuleiro elaborado com base na temática em nutrição básica. Para a aula expositiva, foi confeccionada uma pirâmide alimentar 3D, utilizada como primeira metodologia ativa inicial. Nas turmas A e B, uma síntese integradora foi realizada com base na utilização da pirâmide alimentar tridimensional, com a intenção de averiguar os conhecimentos prévios e despertar o interesse e instigar à reflexão.

Para a aula expositiva, os conteúdos da pesquisa de nutrição ministrados nas turmas foram elaborados com base nos livros didáticos utilizados pelo colégio. Foram abordados conceitos básicos de nutrição e alimentação saudável, o modelo da pirâmide dos alimentos, os nutrientes, suas fontes e funções, a importância da adoção de hábitos alimentares saudáveis ​​na vida diária e os riscos ocasionados pela ingestão de alimentos não saudáveis para a saúde humana.

Os discentes da turma B participaram do jogo didático de tabuleiro, e assim que a aula foi finalizada, as regras do jogo foram explicadas coletivamente, contidas em manual fornecido para os participantes.

Para o levantamento de dados, foi aplicado um questionário anterior à aula expositiva (pré-aula) para as duas turmas, que envolveu 10 questões de múltipla escolha para verificar os conhecimentos prévios dos educandos. Na descrição abaixo, estão contemplados os tópicos relacionados em cada questão e ordenados na sequência:

 

  1. Conceito de nutriente
  2. Existência de um modelo alimentar
  3. Funções dos carboidratos
  4. Fontes alimentares de carboidratos
  5. Funções das proteínas
  6. Fontes alimentares de proteínas
  7. Funções dos lipídios
  8. Funções das vitaminas e sais minerais
  9. Fontes alimentares de fibras
  10. Hábitos e boas práticas alimentares

 

Ao final da aula expositiva (turma A) e da aplicação do jogo didático (turma B), foi aplicado novamente o questionário (Pós-aula) contendo as mesmas questões anteriores e uma questão discursiva a respeito do tema em questão. Além desta questão aberta, para a Turma B, foram adicionadas duas questões discursivas relacionadas à opinião dos alunos sobre o jogo didático-pedagógico. Os alunos receberam orientações para responder aos questionários através da leitura das perguntas pelo professor-pesquisador. O esquema simplificado das etapas metodológicas está apresentado na Figura 1.

 

Figura 1. Etapas simplificadas da aplicação das metodologias ativas para alunos da 7⁠ª série divididos em turmas A e B.

Fonte: Os autores (2024).

 

  • Confecção da pirâmide alimentar

O modelo da pirâmide alimentar para a aula expositiva foi confeccionado com metal (100 cm de altura e 70 cm de base), composto por seis prateleiras de composição acrílica e espessura de 2 mm, para formar os níveis da pirâmide. Diversos alimentos representantes dos grupos alimentares, de composição plástica, foram adquiridos no comércio local. Alguns exemplares, como embalagem de caixa de leite, foram devidamente higienizados e reaproveitados e utilizados para compor a pirâmide.

  • Confecção do jogo didático

 O jogo é composto por 1 tabuleiro em formato de pirâmide alimentar, 66 figuras de alimentos, 21 Cartas Desafio, 12 Cartas Ação e Consequência, 29 Cartas Azuis, 42 Cartas Verdes, 5 peões, 2 dados e figuras de alimentos. O jogo didático-pedagógico (80 cm x 73,5 cm) é representado por um formato de pirâmide alimentar confeccionado em tabuleiro de madeira dobrável, na qual está inserida uma trilha que apresenta casas compostas de 4 cores (verde, azul, rosa e laranja) por onde os jogadores irão se movimentar (Figura 2a). As cartas confeccionadas com papel Filicoat A4, sob as cores verde, azul, laranja e rosa (9 cm x 6 cm), contém perguntas relacionadas ao conteúdo de Nutrição Básica (Figura 2b).  As figuras de diversos alimentos são fixadas na superfície do jogo didático através de velcros (face posterior) conforme regras do jogo (Figura 2c).

 

Figura 2. (A) Jogo didático de tabuleiro em formato de pirâmide alimentar confeccionado para aplicação Pós-aula contendo (B) cartas do jogo, peões, dados e figuras de alimentos inseridas conforme o andamento do jogo. (C) Detalhe de uma figura alimentar mostrando a face anterior e a face posterior com velcro para inserção no tabuleiro.

 

Fonte: Os autores (2024).

 

  • Análise dos dados quantitativos

A análise estatística dos dados foi feita utilizando One way da análise de variância (ANOVA), seguida pelo teste de Tukey por meio do software Graph Pad Prism 8. Foram considerados estatisticamente significativos os valores de p < 0,05.

Resultados e Discussão

Inicialmente foi levantado o perfil dos alunos, identificando o gênero e a faixa etária dos participantes. A faixa etária está compreendida entre 12 e 15 anos, com predominância para alunos com 13 anos (63,00%), seguida por 12 e 14 anos (14,80% cada) e 15 anos (7,40%). Dos 26 alunos, 48,15% se identificaram como do gênero masculino e 51,85% do gênero feminino.

Os resultados obtidos do questionário pré-aula para ambas as turmas estão representados na Figura 3. O acerto médio de questões correspondeu a 58,07% e mostram que as maiores dificuldades estão relacionadas à identificação das fontes alimentares (Questões 4 e 6, 38,46% e 42,31% de acerto, respectivamente) e das funções dos nutrientes (Questão 7, 38,46% de acerto). A questão 1 solicitava que os alunos indicassem o conceito de nutrientes e um percentual relativamente baixo (42,31%) respondeu corretamente. Sabe-se que no processo ensino-aprendizagem, é notória que uma das grandes dificuldades encontradas pelos alunos é a elaboração de conceitos científicos em todos os segmentos da escolaridade (JÚNIOR, 2013). Já na questão 2, grande parte dos alunos (84,61%) sabia da existência do guia de alimentação, porém, quando questionados sobre o nome do modelo, 40,1% responderam corretamente sobre a pirâmide alimentar. Isso indica que o maior percentual dos participantes desconhecia a existência deste modelo.

 

Figura 3. Representação dos acertos obtidos do questionário Pré-aula efetuado pelos 26 alunos.

Fonte: Os autores (2024).

 

            Outras perguntas (9 e 10) também tiveram percentual expressivo de acertos (88,46% e 73,08%, respectivamente) (Figura 3). A última pergunta é de grande relevância e diz respeito à escolha de boas práticas alimentares. Neste sentido, sugere-se que os participantes inicialmente apresentam entendimento da escolha por uma alimentação saudável na dieta alimentar, procurando consumi-los de forma variada e equilibrada.

Após o preenchimento do questionário pré-aula, foi dado início à aula expositiva para as turmas. A dinâmica a partir da pirâmide alimentar tridimensional foi a primeira metodologia ativa. Cada aluno foi solicitado para direcionar algum alimento nos níveis da pirâmide (Figura 4). Todos os alunos se mostraram interessados em participar, inclusive, escolhendo mais de um alimento na dinâmica. Observou-se que alguns alimentos, como as oleaginosas e os integrais, eram desconhecidos pelos educandos.

Durante a dinâmica, observou-se que os alimentos estavam posicionados corretamente, a exemplo dos doces, frutas e verduras, cada um em seu nível. No entanto, surgiram muitos equívocos, como na adição de manteiga e ovos junto às frutas. No decorrer da aula expositiva, o posicionamento dos alimentos na pirâmide alimentar era corrigido quando necessário, além disso, enfatizando-se a importância da classificação e composição daqueles alimentos. Ficou evidente que o momento de maior participação da aula foi a inserção do recurso pedagógico pirâmide alimentar.

 

Figura 4. Síntese integradora em aula expositiva onde os alunos posicionavam os alimentos no modelo da pirâmide alimentar tridimensional.

Fonte: Os autores (2024).

 

Após o término da aula expositiva, os participantes da turma A responderam ao questionário Pós-aula (Pós-aula A) com a finalidade de avaliar o aprendizado em nutrição básica. Já os discentes da turma B foram apresentados ao jogo lúdico didático sob orientação do professor-pesquisador. Logo de início, os alunos demonstraram grande entusiasmo e assimilaram positivamente as regras, assim como a proposta do jogo. A formação de pequenos grupos no jogo possibilitou maior engajamento e trabalho em equipe, numa colaboração conjunta.

            Na Figura 5 estão apresentados os dados correspondentes à coleta dos questionários Pós-aula A e Pós-aula B dos alunos de 7⁠ª série do ensino fundamental. De forma geral, os alunos que utilizaram o jogo didático como recurso didático-pedagógico obtiveram melhores rendimentos do que aqueles que assistiram à aula utilizando apenas a pirâmide alimentar como recurso metodológico, porém, não houve diferença estatisticamente significativa. O acerto médio de questões correspondeu a 69,23% para a turma B e 56,92% para a turma A. Mesmo assim, a utilização deste material lúdico possibilitou a construção do conhecimento, superando o acerto médio de questões da pré-aula. Pode ser verificado que a aula utilizando a pirâmide 3D e atuando em sinergismo com a aplicação do jogo didático apresentaram efeito positivo na aprendizagem do conteúdo exposto.

A análise constatou que das 10 questões, 6 delas (Questões 1, 4, 8 e 10) obtiveram percentual maior de acertos (92,30%, 53,85%, 69,23% e 92,30%, respectivamente) na turma B que utilizou o jogo didático em relação à turma A (61,54%, 23,08%, 30,76% e 53,85%, respectivamente). Nessa perspectiva, resultados semelhantes também foram observados no ganho de conhecimentos sobre alimentação saudável utilizando o recurso lúdico de jogo de cartas (VASCONCELLOS et al., 2022).

 

Figura 5. Representação dos acertos obtidos dos questionários Pós-aula A e Pós-aula B obtidos pelos 26

           

alunos.

Fonte: Os autores (2024).

Um dado interessante foi observado nas questões 1, 2 e 10, que abordaram as concepções básicas de Nutrição e envolveram o conhecimento de hábitos alimentares saudáveis, relacionados a uma dieta equilibrada e variada e os fundamentos gerais da pirâmide alimentar. Quando submetidos ao método lúdico, os alunos demonstraram um aumento significativo na compreensão conceitual quando perguntados para conceituarem a palavra “nutriente” (Questão 1). Esses dados são positivos, evidenciando que o jogo lúdico conseguiu contornar a dificuldade estabelecida no aprendizado dos conceitos em estudo. Já na questão 10, abordou-se sobre a escolha alimentar do indivíduo, seguindo os princípios básicos na pirâmide dos alimentos, quando questionados o que seria considerado um prato saudável. O destaque foi para a turma B com 92,30% de acertos, enquanto os alunos da turma A obtiveram 53,85%.

Isso pode ser atribuído a uma maior tendência da turma que utilizou o jogo didático em selecionar racionalmente os alimentos que devem ser consumidos para se obter uma dieta adequada e saudável, compreendendo a finalidade da pirâmide no que tange à escolha de alimentos mais nutritivos. Este fato mostra que o jogo colaborou como facilitador da aprendizagem do conteúdo abordado, promovendo uma melhor assimilação. 

Quando separadas as questões em três categorias, como conceitos gerais de nutrição (Questões 1, 2 e 10), funções dos nutrientes (Questões 3, 5, 7 e 8) e fontes alimentares (Questões 4, 6 e 9), de modo geral, em todas elas, o jogo didático promoveu melhoria nos acertos, com ligeiro aumento na categoria relacionada às funções dos nutrientes. Nesta ordem, a turma A (Pós-aula A) acertou, em média, 69,23%, 50,00% e 53,84%, contra 94,87%, 51,92% e 66,67% da média de acertos da turma B (Pós-aula B). De forma geral, os alunos das duas turmas mostraram uma relativa dificuldade nas questões relativas à definição das funções dos nutrientes. De fato, essas lacunas podem ser contornadas ao estabelecer um tempo maior da aula para aplicação do jogo didático, utilizando-se deste material lúdico para construção e ressignificação pelos educandos.

Para todos os alunos das turmas A e B (Pós-aula), foi perguntado sobre quais foram os aprendizados na aula sobre alimentação saudável. Nessa questão, a resposta era aberta e todos responderam. A maioria dos respondentes de ambas as turmas enfatizou aspectos relacionados à pirâmide alimentar, como exemplificado pelos estudantes da turma A em alguns depoimentos (transcrição literal): “Aprendi que devemos ter uma alimentação saudável comendo de tudo só que moderadamente”. Outras respostas foram (transcrição literal): “Que deve comer um pouco de tudo, mas com moderação”; “Para você ser uma pessoa saudável não é preciso substituir um alimento por outro basta consumir em quantidades adequadas”; “Eu aprendi que devemos ter uma alimentação saldável e balanceada”; “Eu aprendi que deve comer bastante frutas e saladas, como pimentão, ervilha e agrião e as frutas são banana, maçã e pera”. 

Pode-se destacar que o modelo pirâmide alimentar elaborado para a aula configurou-se como uma alternativa positiva no processo de ensino-aprendizagem, pois chamou a atenção dos participantes, que conseguiram compreender o que foi ensinado a partir deste guia, inclusive citando exemplos de alimentos que se apresentavam na pirâmide.

Da mesma forma, os alunos da turma B destacaram sobre a pirâmide dos alimentos através dos depoimentos que exemplificam este fato (transcrição literal): “Aprendi que todos os alimentos têm nutrientes carboidratos, etc.; outros em maior quantidade, e outros em menor e devemos fazer um equilíbrio na alimentação”; “Eu aprendi que não podemos só comer coisas muito gordurosas, comer verduras fazer uma alimentação balanceada comer um pouco de tudo só que moderadamente”. Algumas respostas foram (transcrição literal): “Se eu quiser ter mais disponibilidade, eu tenho que comer em maior quantidade frotas verduras e legumes e em menor doces e lanches”; “Que tudo que comemos está relacionado, fazer atividade física e tomar água em grande quantidade fazem parte da base da pirâmide”.

Assim, fica claro que a elaboração da pirâmide alimentar 3D mostrou ser um instrumento valioso durante a aula. Observa-se nestas respostas que os alunos entendem que a pirâmide é uma representação que estabelece as seguintes recomendações para uma dieta equilibrada: variedade, proporcionalidade e moderação (BRASIL, 2014). Este material possibilitou significar os conhecimentos abordados por parte dos alunos. 

Também foi possível destacar que os alunos percebem a importância de que a prática alimentar adequada associada à inclusão de exercícios físicos, se reflete na saúde humana. Essa constatação foi fortemente verificada nos depoimentos de alguns participantes da turma A (transcrição literal): “Eu aprendi que sem uma alimentação saudável a gente corre um risco muito maior do que pensamos de ficar com diabetes, hipertensão, obesidade e etc.”; “Que todos temos de comer as coisas saudáveis. E que se nos comer elas não a risco de doenças”; “Aprendi sobre fibras, carboidratos, lipídio etc. e que devemos se alimentar bem praticar exercícios para não ficar obeso”. Os participantes da turma B também conseguiram associar hábitos alimentares e ocorrência de doenças (transcrição literal): “Eu aprendi que a alimentação não é qualquer coisa, porque se você não cuida da alimentação você irá ficar obeso”; “Aprendi as funções dos nutrientes, os riscos da falta de nutrientes, quais as suas funções, como estão divididos”.

De acordo com as respostas dos alunos da Turma B que realizaram o jogo, ao serem indagados se o mesmo possibilitou aprendizado do conteúdo, todos revelaram que o recurso lúdico contribuiu positivamente. Percebeu-se aumento no interesse em aprender, característicos da atividade lúdica. A partir das respostas, foi possível inferir que os alunos entenderam que o jogo é um recurso de grande importância ao promover a aprendizagem de forma prazerosa, motivadora e permitindo a revisão dos conteúdos, como mostra os depoimentos de alguns alunos (transcrição literal):“Ajudou, porque você está se divertindo e ao mesmo tempo aprendendo”; “Sim por que além de ser divertido você concegue ficar mais concentrado e aprende muito mais”; “Sim porque fazia a gente rever o que tinhamos aprendido e a exercitar o que sabia nos divertindo”; “Sim Por quê você faz um revisão do que você aprendeu na aula”; “Sim, com as perguntas e desafios você se lembra melhor do que aprendeu”.  

Por meio da análise dos questionários, verificamos que os educandos apreciaram o jogo e responderam positivamente quando indagados sobre o que mais gostaram e o que gostaram menos do jogo e se aulas de Ciências ficaram mais interessantes associadas a este material didático.  A totalidade dos alunos aprovou o recurso didático pedagógico e respondeu que, através dele, as aulas não se tornam monótonas, desinteressantes, e que a aprendizagem pode ser proporcionada de forma prazerosa, divertida e dinâmica. Algumas respostas foram (transcrição literal): “Eu gostei mais de se divertir aprendendo. A aula ficou mais interessante, pois não ficamos só falando, a aula inteira e foi muito legal”; Gostei de tudo foi muito divertido. concerteza fica mais divertido e mais fácil de lembrar o que aprendemos pois estimula o raciocínio”.

Evidências claras mostram que o ensino passivo, baseado na exposição verbal do educador, centrado nos conteúdos, é ineficaz na aprendizagem de conceitos concretos e, principalmente, no desenvolvimento de competências essenciais para a vida (MOTA; ROSA, 2018).

            Outros participantes, no entanto, expressaram que o jogo didático tornou o processo de ensino e aprendizagem desafiador e motivador através de alguns depoimentos (transcrição literal): “Não o jogo é legal só não gosto de perder. As aulas sempre ficam melhores com um jogo porque aí entendemos melhor”; “Eu gostei dos desafios”. É importante reforçar que o jogo didático permite que haja uma competição saudável, assegurando que a atividade seja dinâmica, possibilitando maior interação e envolvimento dos alunos e promovendo desenvolvimento social, afetivo e intelectual. Para Pereira (2015), tornar o jogo didático desafiante e prazeroso pode facilitar o processo ensino-aprendizagem.

Diante dos depoimentos, corroborou-se a afirmação de Meng e colaboradores (2019) que o objetivo das atividades lúdicas não se restringe somente em facilitar a memorização do conteúdo exposto, mas que consiga induzi-lo ao raciocínio, à reflexão, ao pensamento crítico, sobretudo, permita a (re) construção do conhecimento.

Portanto, a adoção de metodologias ativas no espaço escolar, como jogos didáticos, podem promover práticas alimentares saudáveis, priorizando o desenvolvimento de competências e habilidades que gerem autonomia e participação ativa dos educandos.

 Considerações Finais

 O desenvolvimento de metodologias ativas como as atividades lúdicas possibilitam o desenvolvimento físico e sensorial dos estudantes, além de permitir o compartilhamento e a expressão de sua identidade. Neste estudo foi possível observar que a utilização da pirâmide alimentar 3D como recurso pedagógico inicial despertou sentimentos de curiosidade, motivação, participação e integração. Deste modo, o aprendizado em sala de aula torna-se mais cativante e dinâmico. Além disso, o jogo didático também se mostrou bem aceito por parte dos alunos, que expressaram integração social e afetiva, atenção, alegria, estimulando a construção do conhecimento.

Os resultados apresentados demonstram que a inserção de metodologias ativas, como jogo lúdico, especialmente o jogo de tabuleiro da nutrição, é uma importante ferramenta didático-pedagógica, ao favorecer o processo de ensino e aprendizagem, com potencial para ser incorporado em sala de aula. Não obstante, o emprego do modelo da pirâmide alimentar tridimensional também se mostrou importante na condução da aula, a partir das observações registradas, despertando maior interesse dos alunos em participar ativamente da aula, e reforçando de maneira positiva o ensino em nutrição na promoção de saúde e alimentação saudável.

Os instrumentos metodológicos apresentados constituem-se como elementos fundamentais à aprendizagem, principalmente em conteúdos de nutrição, que requerem o desenvolvimento de reflexões sobre as práticas alimentares. É fundamental que a escola seja a ponte do saber no desenvolvimento de conscientização crítica a respeito dos hábitos e práticas alimentares saudáveis. Desta forma, a utilização das metodologias de ensino aqui apresentadas está em consonância com as prerrogativas da BNCC, ao permitirem a transformação do aluno em protagonista do seu próprio aprendizado.

Agradecimentos

Os autores agradecem a CAPES/Brasil pela bolsa concedida.

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CAPÍTULO 19

DOCÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR EM SAÚDE E USO DE TECNOLOGIAS DIGITAIS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO

TEACHING IN HIGHER EDUCATION IN HEALTH AND USE OF DIGITAL INFORMATION AND COMMUNICATION TECHNOLOGIES

 

 

DOI: https://doi.org/10.56001/22.9786500458152.19

Submetido em: 03/08/2023

Revisado em: 22/08/2023

Publicado em: 14/04/2024

 

Iara Guimarães Rodrigues

Universidade de Uberaba – UNIUBE, Departamento de Pós-Graduação em Docência do Ensino Superior, Uberaba-MG

http://lattes.cnpq.br/2711137345406594

Sueli Heloisa Doriguetto Ferreira

Universidade de Uberaba – UNIUBE, Departamento de Psicopedagogia, Uberaba-MG

http://lattes.cnpq.br/6582553747694687

Gabriel Mendes dos Santos

Instituto Master de Ensino Presidente Antônio Carlos, Departamento de Medicina, Araguari-MG

https://lattes.cnpq.br/5810279548584332
 

 

 

 

Resumo

Introdução: A docência no ensino superior em saúde tem passado por transformações significativas nos últimos anos, impulsionadas pelo avanço das tecnologias digitais de informação e comunicação. E os usos dessas ferramentas foram ainda mais requisitados devido a pandemia de COVID-19 e suas restrições. Desse modo, ficaram mais presentes nas salas de aula, com inúmeras possibilidades para o processo de ensino e aprendizagem. Objetivo: descrever as principais dificuldades relatadas pelos docentes do ensino superior em saúde em relação ao uso das TDIC. Como procedimento metodológico utilizou-se da revisão de literatura, realizada por meio do Portal de Periódico Capes e da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) com o uso dos descritores: docentes; comunicação e tecnologia da informação. Foram incluídos artigos publicados entre 2016 a março de 2021; disponibilizados com idioma português e inglês; texto completo e de livre acesso. A amostra final contemplou cinco artigos. Dessa forma, evidenciou dentre as principais limitações: a falta de políticas pedagógicas integrativas; déficits na formação e capacitação do docente; e o sentimento de acúmulo de responsabilidades. Conclui-se que é necessário maior investimento em políticas educacionais mais assertivas junto as Instituições de Ensino Superior (IES) e estímulo frequente em capacitação estrutural e docente, de forma a estimular o uso mais frequente e confiante das TDIC junto as metodologias de ensino.

Palavras-Chave: Docentes, comunicação, tecnologia da informação.

Abstract

Introduction: Teaching in higher education in health has undergone significant transformations in recent years, driven by the advancement of digital information and communication technologies. And the uses of these tools were even more requested due to the COVID-19 pandemic and its restrictions. In this way, they became more present in classrooms, with countless possibilities for the teaching and learning process. Objective: to describe the main difficulties reported by higher education health teachers in relation to the use of TDIC. As a methodological procedure, a literature review was used, carried out through the Capes Periodical Portal and the Virtual Health Library (VHL) using the descriptors: teachers; communication and information technology. Articles published between 2016 and March 2021 were included; available in Portuguese and English; full text and free access. The final sample included five articles. In this way, it highlighted among the main limitations: the lack of integrative pedagogical policies; deficits in teacher training and training; and the feeling of accumulation of responsibilities. It is concluded that greater investment is needed in more assertive educational policies with Higher Education Institutions (HEIs) and frequent encouragement in structural and teaching training, in order to encourage more frequent and confident use of TDIC along with teaching methodologies.

Keywords: Teachers, communication, information technology.

 

 

Introdução

Diante de um contexto pandêmico com inúmeras incertezas, além da saúde, como de políticas econômicas e sociais, a educacional passou a ser mais do que nunca a pauta entre diversas tecnologias digitais da informação e comunicação no processo de ensino-aprendizagem.

As TDIC são instrumentos situados na história e na cultura da sociedade, aprimoram-se e organizam-se ao redor das tecnologias digitais para realização de atividades produtivas (COSTA et al., 2015). Neste artigo o termo TDIC será usado para referir: a computador, tablet, celular, smartphone e qualquer outro dispositivo que permita navegação na internet. Nesse âmbito, com o desenvolvimento de ambientes de aprendizagem a partir da aprimorarão e modernização das práticas docentes no contexto educacional, as TDIC podem potencializar a aprendizagem dos discentes.

Na atualidade, depara-se com uma geração de aprendizes que desde o nascimento está familiarizada com o uso de computadores, smartphones, redes sociais e pesquisas na internet. Nesse contexto, a abordagem de ensino baseada apenas na transmissão de conteúdo revela-se inadequada e insuficiente.

Segundo Modelski (2015), o professor hoje é desafiado no seu cotidiano pela inserção das tecnologias digitais e pelo impacto da cibercultura, pois o fato de um discente trazer seu smartphone fará com que “o mundo do discente venha com ele”. Dessa forma, os dispositivos digitais são uma presença constante no cotidiano dos indivíduos, o que permite o acesso a uma ampla quantidade de informações a qualquer hora e em qualquer lugar. Essas informações, por sua vez, podem ser transformadas em conhecimento por meio das reflexões individuais de cada pessoa. Neste sentido, a aprendizagem ultrapassa os limites da sala de aula, e, por conseguinte, o tempo em que o discente passa em sala de aula; dentro deste contexto, faz com que ele se torne gestor e principal responsável pela sua aprendizagem e instaura uma nova ideia de gestão da aprendizagem (CARVALHO, 2019).

Diante da emergência das Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC) no processo de aprendizagem, é fundamental que tanto os estudantes quanto os professores estejam conscientes das diversas inovações no mundo tecnológico e de seu uso no contexto educacional contemporâneo. Entretanto, a sua utilização como instrumento, ainda encontra muitas barreiras: grande parte dos docentes apresenta resistência ao uso do método na educação. Além disso, existe carência de atualização profissional nessa temática e a formação do professor não contempla a capacitação e o manuseio prático das diversas tecnologias existentes (WANDERLEY et al., 2018).

No ensino de saúde o uso de tais tecnologias também está em processo de consolidação, e pesquisas demonstram que os estudantes apresentam um desempenho acadêmico melhor quando possuem acesso ao material complementar online associado às aulas tradicionais (SILVA et al;2013). Contudo, percebe-se que as Instituições de Ensino Superior (IES) que atuam nos cursos da área de saúde não usam as TDIC efetivamente com toda a sua potencialidade pedagógica na educação (Wanderley, 2018) e neste sentido, conhecer como o docente se sente quanto a utilização das TDIC, pode ser uma questão chave para a elaboração de uma proposta mais atrativa e assertiva no processo ensino-aprendizagem. Desta forma, identificar os principais fatores que os limitam e/ou desestimulam faz-se necessário para sobrevivência nessa nova era educacional.

Ademais, a proximidade com o aluno e o paciente sempre foi muito evidenciada nos cursos da saúde e conhecer como o docente se sente quanto a utilização das tecnologias da informação e comunicação – TDIC neste contexto, pode ser a questão chave. Por fim, vale ressaltar que inúmeros estudos destacam o adoecimento mental causado pela Covid-19 nos docentes junto a necessidade constante deles reinventarem-se, o que reafirma a necessidade de entender como os docentes se sentem em relação a essa modernização e incessante necessidade tecnológica da modernidade. Enfim, o presente estudo tem por objetivo descrever as principais dificuldades relatadas pelos docentes do ensino superior em saúde em relação ao uso das TDIC.

Metodologia

A presente pesquisa trata-se de um artigo de revisão, traz como linha a pesquisa de abordagem qualitativa, sua realização foi conduzida por meio de uma revisão narrativa da literatura, e nessa modalidade, a busca de materiais da literatura em questão não necessita esgotar as fontes de informações disponíveis e a seleção dos estudos e a interpretação das informações podem estar sujeitas à subjetividade dos autores (FERENHOF; FERNANDES; 2016).

Os materiais para estudo foram coletados por meio do Portal de Periódico Capes e da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS). A coleta foi realizada com a utilização dos seguintes descritores: docentes; comunicação; tecnologia da informação. Foram encontradas 1143 publicações nas bases de dados pesquisadas e, ao serem aplicados os critérios de inclusão e exclusão, obteve-se uma amostra de cinco artigos, em sua totalidade foram obtidos na Biblioteca Virtual em Saúde, uma vez que um dos artigos selecionados através da BVS se apresentou duplicado no Portal de Periódicos da Capes/MEC. Tais artigos buscam responder ao problema: Quais as principais dificuldades relacionadas à saúde dos docentes do ensino superior quanto ao uso de tecnologias de informação e comunicação?

Foram considerados como critérios de seleção: artigos publicados de 2016 até 20/03/2021; o conteúdo relacionado à docência no ensino superior em cursos da área da saúde e uso das TDICs; idioma português e inglês; texto completo e de livre acesso. Foram excluídos textos repetidos e que não contemplavam o objetivo da pesquisa (Figura 1). Para o estudo do material contemplou-se uma leitura criteriosa dos textos e análise do conteúdo.

 

 
Resultados e Discussão

Tópico 1

Os resultados foram analisados e apresentados de forma descritiva e tabular (Quadro 1). Neste contexto, foi percebido que Vilarinho-Pereira (2021) refere-se às TDCI como uma forma de mediação entre o aluno e o conteúdo. Destacam ainda que o grande papel das tecnologias durante o processo de ensino-aprendizagem consiste no potencial de expandir habilidades relacionadas à atenção, raciocínio, pensamento crítico e percepção. Quanto ao uso por parte dos docentes, não foi observado muita variação de tecnologia junto ao método de ensino, observou-se uma média de uso de três tipos de tecnologias.

Figura 1: Desenho do estudo.

DOCÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR EM SAÚDE E SUAS LIMITAÇÕES EM RELAÇÃO AO USO DE TECNOLOGIAS DIGITAIS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO: UMA REVISÃO DE LITERATURA

 

DESCRITORES: DOCENTES; COMUNICAÇÃO; TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO

 

BIBLIOTECA VIRTUAL EM SAÚDE: 130 PUBLICAÇÕES

PORTAL DE PERIÓDICOS CAPES: 1013 PUBLICAÇÒES

 

BIBLIOTECA VIRTUAL EM SAÚDE: 130 PUBLICAÇÕES

 

APÓS APLICAÇÀO DE CRITÉIOS: 23

 

ATENDEM AO OBJETIVO DA PESQUISA = 5(AMOSTRA FINAL)

PORTAL DE PERIÓDICO CAPES:1013 PUBLICAÇÕES

 

APÓS APLICAÇÃO DE CRITÉRIOS: 352

 

ATENDEM AO OBJETIVO DA PESQUISA = 1

 

APÓS APLICAÇÃO DE CRITÉRIO DE EXCLUSÃO (DUPLICAÇÃO) = 0 (AMOSTRA FINAL)

AMOSTRA FINAL PARA ESTUDO = 5

Fonte: Autores (2021).

Tópico 2

A falta de afinidade com o uso das ferramentas, vinculadas às TDCI, inabilidade para associá-las ao conteúdo e disciplina, e a distância entre as gerações etárias entre professor-aluno também foram elencados como dificultadores da aplicação das tecnologias em sala de aula como destaca Alves et al (2020).

Bezerra (2020) em seu estudo reflexivo, aponta a portaria 343/2020 do Ministério da Educação brasileira, publicada em 18 de março de 2020, que em caráter excepcional, diante do contexto pandêmico da COVID-19, instituiu a execução das aulas não presenciais mediadas por essas tecnologias, até nos cursos da área da saúde, inclusive a medicina (BRASIL, 2020). Dessa forma, destaca que o professor passa a ter duas responsabilidades significativas: criar uma atmosfera para a aprendizagem que ofereça experiências encorajadoras para cada indivíduo alcançar seu potencial máximo, para isso deve aceitar a diversidade de estilos e incorporação das ferramentas tecnológicas em seu processo de trabalho e; a partir de uma análise crítica dos fundamentos das abordagens educacionais, incluir diferentes abordagens.

Já Wanderley et al (2018) aborda o assunto através de um estudo de revisão com pesquisas publicadas entre 2008 a 2018, com destaque nas dificuldades dos docentes em saúde na inserção das TDIC no processo de ensino-aprendizagem, como exemplo: formação acadêmica deficiente na inclusão de novas tecnologias; estrutura escolar inadequada; resistência de professores às novas tecnologias; falta de investimento financeiro; formação continuada para professores inexistente; currículos escolares tradicionais; falta de tempo para preparar as TIC; dificuldade para avaliar a aprendizagem por meio das tecnologias; acesso limitado às tecnologias e ausência de políticas pedagógicas.

Por fim, Pereira et al (2016) aponta em seu estudo, realizado com amostra aleatória de professores do ensino em saúde da Unifesp, que as TICs mais utilizadas rotineiramente pelos docentes são: computador, internet, pesquisa em bases dados de saúde, processador de texto, programa de apresentação e buscadores de e-mail. Reitera ainda que a quantidade de instrumentos de TIC usados decresce à medida que a idade aumenta e cresce de acordo com a titulação e participação em cursos preparatórios para docência. (Quadro 1).

Quadro 1:  Estudos sobre docentes, comunicação e tecnologia da informação (2016- 2021).

Autor

Título

Periódico

Ano

Vilarinho-Pereira, DR et al.

Uso criativo das tecnologias da informação e comunicação segundo professores e estudantes universitários

Estudos de Psicologia

2021

Alves, AG et al.

 

Tecnologia de informação e comunicação no ensino de enfermagem

Acta Paulista de Enfermagem

2020

Bezerra, IMP

Estado de arte sobre o ensino de enfermagem e os desafios do uso de tecnologias remotas em época de pandemia do Coronovírus

Revista Brasileira Crescimento e Desenvolvimento Humano

2020

Wanderley, TPSP

Docencia em saúde: tempo de novas tecnologias da informação e comunicação

Revista Eletronica de Comunicação, Informação e Inovação em saúde

2018

Pereira, TA et al.

Uso das tecnologias de Informação e comunicação por professores da área da saúde da Universidade Federal de São Paulo

Revista Brasileira de Educação Médica

2016

Fonte: Autores (2021).

Tópico 3

O processo ensino-aprendizagem, principalmente na área da saúde, passa por um contexto desafiador. Nesse âmbito, Kenski (2008) já dizia que novos parâmetros para o ensino aprendizagem estão em surgimento e transformam a forma de construir o conhecimento, assim como, a metodologia do ensino, o papel do professor e a relação com os alunos.

Diante disso, Cyniro et al (2015) e Cohen; Hofner (2016), destacam que na formação em saúde, as utilizações de novas metodologias de ensino possibilitam cada vez mais a compreensão de diferentes cenários através de tecnologias que reproduzem vivências educacionais promovidas por meio de ambientes virtuais. Porém, como destaca Alves et al (2020), no cenário educacional brasileiro, percebe-se uma falta de habilidade no uso das TDIC e de fazer o seu vínculo junto à metodologia de ensino.

O momento vivenciado é um cenário ainda de muita insegurança, de formação docente ainda muito deficiente, com falta de investimento estrutural e financeiro, e a existência de um currículo ainda muito arraigado na metodologia de ensino tradicional (WANDERLEY et al., 2018). No entanto, uma pesquisa realizada na Europa, evidenciou que professores que têm opiniões positivas sobre o uso das tecnologias e possuem alto acesso à infraestrutura de tecnologia na escola, são vistos como mais solidários e confiantes digitalmente (SURVEY OF SCHOOLS, 2013), o que de certa forma acaba por agregar um maior vínculo entre professor-aluno e tecnologia.

Além disso, as tecnologias contemporâneas geram a demanda por um contínuo aprimoramento do conhecimento, o que leva a buscas de novas formas de adquirir fluência e expandir o horizonte de conhecimento. Dessa maneira, o uso das tecnologias ainda está muito relacionado com o alto grau de escolaridade (PEREIRA et al., 2016). O que se faz necessário democratizar e socializar cada vez mais o seu uso.

De acordo com a compreensão de Gabriel (2013), duas habilidades são consideradas essenciais para que os docentes possam atuar de forma eficaz em um novo contexto educacional. Primeiro, a habilidade consiste em assumir a responsabilidade pelo futuro dos estudantes e reconhecer que os instrumentos utilizados na educação não devem ser o objetivo final, mas sim moldados de maneira a capacitar os alunos para a vida. Já a segunda habilidade, envolve a adoção de novas abordagens no trabalho docente, por meio da colaboração entre professores, o que resulta em melhores desempenhos. Nesse sentido, é necessário utilizar o conteúdo para ensinar novas habilidades, sobre demanda de uma atuação docente inovadora.

No Brasil poucas pessoas não possuem acesso à internet, celular e computador. Mesmo assim, essas pessoas, geralmente com renda mais baixa do que as demais, não podem deixar de ser consideradas quando se planeja o uso de tecnologias no ensino (KNOP, 2018). Na atualidade, as instituições de ensino têm investido no uso de plataformas virtuais, que permitem a interação professor- aluno. Entretanto, o que se tem percebido é que a utilização dessas plataformas tem se limitado ao depósito de materiais, muito distante de práticas educativas inovadoras o que pode comprometer tanto o ensino híbrido quanto à distância (RAMAN, 2015).

No Brasil, existe um número reduzido de indivíduos que não possuem acesso à internet, celular e computador. No entanto, é crucial considerar essas pessoas, geralmente de baixa renda, ao planejar a utilização de tecnologias no ensino, como apontado por Knop (2018). Atualmente, as instituições de ensino têm investido no uso de plataformas virtuais para promover a interação entre professores e alunos. No entanto, tem-se observado que o uso dessas plataformas tem se limitado à simples disponibilização de materiais o que se distancia das práticas educativas inovadoras. Conforme mencionado por Raman (2015), essa falta de inovação pode comprometer tanto o ensino híbrido quanto o ensino à distância.

Notadamente, a adoção das tecnologias no contexto educacional demanda processos de acomodação e adaptações dos docentes e aprendentes, quando se trata dos cursos de saúde, o mercado de trabalho já necessita e exige um profissional qualificado e habituado ao uso das várias ferramentas tecnológicas, em consideração de que já vive-se um momento de informatização de clínicas, hospitais, com prontuários eletrônicos e equipamentos. Assim, quanto mais o profissional em formação utilizar das tecnologias antes de adentrar no mercado de trabalho, mais facilmente ele será habituado a usá-las no atendimento ao seu paciente (WANDERLEY et al., 2018).

­­Considerações Finais

Conclui-se que as políticas educacionais juntamente com as Instituições de Ensino Superior (IES) precisam investir mais em capacitação estrutural e docente. Visto que as limitações demonstradas por eles, quanto ao uso das tecnologias, só serão efetivamente resolvidas quando esse tornar-se capaz de incorporar essa modernização na sua realidade através do seu desenvolvimento pessoal e profissional. Com isso, uma das ferramentas mais potentes e estimuladoras para esse avanço é o desenvolvimento de uma formação mais contínua e focada nos avanços da atualidade.

Referências

ALVES, F.C.; CESAR, C.; MARTINS, C.A.; et al; Tecnologia de informação e comunicação no ensino de enfermagem. acta Paulista de Enfermagem, 2020 p.1-8.

BEZERRA, I.M.P; SORPRESO, I.C.E. Concepts and movements in health promotion to guide educational practices. J Hum Growth Dev. 2016;26(1):11-20. DOI: http://dx.doi.org/10.7322/jhgd.113709

BRASIL. Ministério da Educação. Portaria Nº 343, de 17 de março de 2020. Dispõe sobre a substituição das aulas presenciais por aulas em meios digitais enquanto durar a situação de pandemia do Novo Coronavírus – COVID-19. Disponivel em:http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria- n-343-de-17-de-marco-de-2020-248564376

CARVALHO Aline DeAnne Santana de., O uso de tecnologias digitais na gestão da aprendizagem por discentes de graduação. Dissertação de mestrado UFT 2019.

COSTA, S.R.S, DUQUEVITZ, B.C, & PEDROZA, RLS (2015). Tecnologias Digitais como instrumentos mediadores da aprendizagem dos nativos digitais. Psicologia Escolar e Educacional, 2015 p. 603–610. https://doi.org/10.1590/2175-3539/2015/0193912

CYRINO, E.G; PINTO H.A; OLIVEIRA F.P, et al. Há pesquisa sobre ensino na saúde no Brasil?. ABCS Health Sci 2015;40(3):46-155. DOI: https://doi.org/10.7322/abcshs.v40i3.787

COHEN E.L, HOFFNER C. Finding meaning in a celebrity’s death: the relationship between parasocial attachment, grief, and sharing educational health information related to Robin Williams on social network sites. Comp Hum Behavior. 2016;65:643-50. DOI: https://doi.org/10.1016/j.chb.2016.06.042

FERENHOF H.A, FERNADES R.F. Desmistificando a revisão de literatura como base para redação científica: Método Ssf. Rev ACB. 2016 p. 550-63.

GABRIEL M. Educ@ar: a (r)evolução digital na educação. São Paulo: Saraiva; 2013

KNOP MF. Exclusão digital, diferenças no acesso e uso de tecnologias de informação e comunicação: questões conceituais, metodológicas e empíricas. CADECS. 2018;5(2):39–58

KENSKI VM. Tecnologias e ensino presencial e a distância. 6 ed. São Paulo: Papirus, 2008; p.78.

PEREIRA T.A et al. Uso das tecnologias de informação e comunicação por professores as área da saúde da Universidade Federal de São Paulo. Revista Brasileira de Educação Médica, 2016 p.59-66.

RAMAN J. Mobile technology in nursing education: where do we go from here? A review of the literature. Nurse Educ Today. 2015 May;35(5):663–72

SURVEY OF SCHOOLS: ICT in Education [on line]. Belgium: European Union; 2013 [cited 2015 Jan 25]. Available from: file:///C:/Users/Home/Downloads/Surveyofschool- sICTinEducation.pdf

VILARINHO-PEREIRA, Daniela.; FLEITH, Denise. Creative use of information Technologies according to university professors and students. Estudos de Psicologia. 2021, p.1-12.

WANDERLEY, T.P.S.; BATISTA, L.D.; DUTRA, JR. Docência em saúde: tempo de novas tecnologias da informação e comunicação. Revista Eletron. De Comunicação, Informação e Inovação em Saúde. 2018.

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